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Direito à educação e deficiência intelectual: um breve estudo sobre a efetividade das políticas inclusivas no Brasil

Andréa Bezerra Ferreira
Flávia Micheli Ferreira Oliveira
Ladyanne Peasion Gomes Sereparan
Lígia Mara Ormond Pereira
Maria José Nunes Mota

 

DOI: 10.5281/zenodo.16621066

 

 

Resumo:

Este artigo avalia o avanço e os desafios das políticas educacionais inclusivas para estudantes com deficiência intelectual no Brasil. A pesquisa, baseada em revisão bibliográfica e documental, aponta lacunas entre a legislação e a prática, destacando problemas como infraestrutura precária, formação docente insuficiente e desigualdade de recursos. Conclui-se que a inclusão efetiva requer práticas pedagógicas adequadas, investimento contínuo e uma cultura institucional que valorize a diversidade. O estudo também enfatiza o papel da formação continuada, da colaboração entre educadores e de recursos acessíveis para a concretização do direito à educação.

 

Palavras-chave: Educação Especial. Direito.

 

 

Introduçao

 

A educação especial no Brasil tem passado por significativas transformações, impulsionadas por um movimento global pela inclusão e cidadania plena. Essa transição de um modelo segregacionista para o inclusivo busca não apenas inserir estudantes com deficiência intelectual no ensino regular, mas reformular metodologias e ambientes para suas particularidades. Nesse contexto, políticas públicas são cruciais para remover barreiras e assegurar o acesso à educação de qualidade.

O estudo visa analisar a eficácia dessas políticas no Brasil, focando em marcos legais e iniciativas de promoção da participação de alunos com deficiência intelectual. A pesquisa aborda a fundamentação conceitual, o panorama jurídico (LDB, LBI, PNEEPEI), desafios práticos, e avanços e recomendações. A metodologia baseia-se em levantamento bibliográfico e documental (Lakatos e Marconi, 2017), valorizando teoria e evidências empíricas.

A deficiência intelectual implica limitações notáveis no intelecto e comportamento adaptativo antes dos 18 anos, conforme a American Association on Intellectual and Developmental Disabilities (2010). O diagnóstico considera a interação indivíduo-ambiente e exige apoio com metodologias flexíveis. No ensino, é crucial adaptar conteúdos, recursos, avaliações e usar tecnologias assistivas para o pleno desenvolvimento dos alunos com deficiência intelectual.

Nesse sentido, conforme a Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde:

 

Transtornos de desenvolvimento intelectual são um grupo de condições de etiologias diferentes que se originaram durante o período de desenvolvimento, projetadas por funcionalidade intelectual e comportamento adaptativo significativamente abaixo da média, que estão aproximadamente dois ou mais desvios padrão abaixo da média (aproximadamente menor do que o percentil 2,3), com base em testes padronizados, normatizados e administrados individualmente. Quando testes desenvolvidos normatizados e padronizados não estão disponíveis, o diagnóstico de transtornos do desenvolvimento intelectual exige maior dependência do julgamento clínico baseado em avaliação de indicadores comportamentais comparáveis (WHO, 2025).

 

A educação inclusiva difere da mera integração, exigindo transformação das estruturas escolares para valorizar a diversidade e promover a igualdade (Mantoan, 2003). Esse princípio é sustentado pela valorização das diferenças, participação comunitária e respeito mútuo. A Constituição Federal de 1988 e a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) reforçam a educação como direito universal. No Brasil, a educação especial é regulamentada pela LDB (Lei nº 9.394/1996), que instituiu o Atendimento Educacional Especializado (AEE), pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI, 2008), e pela Lei Brasileira de Inclusão (LBI, Lei nº 13.146/2015).

Apesar da sólida base legal, a prática escolar ainda não acompanha as normas inclusivas. Fontenele e Cantero (2024) apontam que a implementação das políticas é prejudicada por obstáculos estruturais e de formação. A efetividade depende de alocação orçamentária e monitoramento (Prieto, 2008; Sassaki, 2006). Werner (2023) destaca a falta de adaptações físicas, como rampas e sanitários, que impedem a autonomia de alunos com deficiência intelectual. A escassez de formação específica leva a práticas padronizadas e preconceituosas (Mantoan, 2022). A desigualdade na distribuição de recursos compromete a uniformidade das ações inclusivas, com municípios menores dependendo de repasses federais insuficientes (Pinto, 2012; Alves e Pinto, 2020).

O impacto das políticas públicas se reflete no aumento de matrículas de alunos com deficiência intelectual. Iniciativas de colaboração entre professores e projetos-piloto de formação continuada mostram resultados positivos (Diversa, 2020). Werneck (2000) enfatiza a comunicação acessível e materiais didáticos adaptados. Contudo, desafios em infraestrutura, formação docente, financiamento e barreiras atitudinais persistem. A consolidação da inclusão requer mais investimentos, formações específicas e respeito à diversidade. A educação inclusiva é um compromisso social que exige engajamento de gestores, educadores, famílias e comunidade. Sem essa mobilização, a inclusão permanece teórica.

A perspectiva pós-pandemia (Fontenele e Cantero, 2024) revela que a efetividade das políticas foi comprometida pela falta de infraestrutura e descontinuidade das práticas. A pandemia evidenciou a insuficiência de recursos tecnológicos e o abandono de estratégias adaptadas (Lopes, 2022 apud Fontenele e Cantero, 2024). Essa lacuna crítica aponta para a falta de comprometimento institucional em manter práticas inclusivas. O Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA) é crucial, mas sua aplicação é dificultada pela formação inadequada de professores (Fontenele e Cantero, 2024; Miskalo, 2022). Siqueira (2018) corrobora esses desafios, citando escassa adesão docente e poucos profissionais qualificados também na escolarização profissional.

Fonseca (2019) aprofunda o histórico legislativo e conceitual da deficiência intelectual. Historicamente, a deficiência era vista sob ótica médica e segregacionista. Com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) (ONU, 2006), a deficiência passou a ser vista como característica humana, e barreiras (arquitetônicas, comunicacionais, atitudinais) como os verdadeiros impedimentos à inclusão. Essa mudança culminou na Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que adota o modelo social dos direitos humanos. O aumento contínuo de matrículas de alunos com deficiência no ensino superior reflete o impacto da LBI.

Concluindo esse artigo, as políticas públicas brasileiras para educação inclusiva são cruciais, mas a implementação efetiva enfrenta desafios de infraestrutura, formação e cultura institucional. A pandemia exacerbou fragilidades e a descontinuidade das práticas. Para consolidar a inclusão, é fundamental que as políticas públicas garantam não só o acesso, mas a permanência em ambientes que atendam às necessidades dos alunos. Isso exige comprometimento institucional, formação continuada de docentes e adaptação de estruturas e recursos. A inclusão é um compromisso social contínuo que demanda esforço coletivo para se tornar uma realidade tangível e duradoura.

 

 

Referências

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