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O PAPEL DA LITERATURA INFANTIL CLÁSSICA NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DAS SÉRIES INICIAIS

Marcia Gabriela Schonton

RESUMO

Este estudo possibilitou a reflexão sobre o papel da Literatura Infantil Clássica e a análise da mesma como um elemento de fundamental importância para o desenvolvimento/aprendizado da criança. O presente estudo teve como objetivo evidenciar que a Literatura Infantil é fundamental e necessária ao ser humano que quer se comunicar e interagir com as pessoas e o mundo. Para tanto, utilizaram-se os métodos hipotético dedutivo, monográfico e estatístico e para a coleta de dados, com técnica de observação direta extensiva, se mostrou necessária, através do instrumento de pesquisa questionário, contendo perguntas abertas e fechadas. Ao final da pesquisa, pode-se perceber que os professores pesquisados utilizam a literatura infantil clássica como recurso no processo de ensino-aprendizagem das séries iniciais. Percebe-se ainda que os pesquisados trabalham diariamente a literatura infantil clássica em sala de aula e que os contos auxiliam na formação do leitor e contribuem para o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social do aluno. Portanto, a literatura infantil clássica exerce uma influência benéfica na formação da personalidade infantil pois através da história, as crianças aprendem que é possível vencer obstáculos e sair vitorioso.

Palavras-chave: Literatura Infantil Clássica. Séries Iniciais. Aprendizagem.

INTRODUÇÃO

Desde o início da vida, a maioria dos seres humanos procura ler e pesquisar sobre o tema Literatura Infantil. Os benefícios, a importância que este gênero literário desperta nas crianças ainda é um fascínio e. de certa forma, urna incógnita a ser desvendada.
As historias infantis exercitam a imaginação, ao ponto de ainda hoje estarem presentes na vida do indivíduo. É um prazer ler, imaginar outros lugares, outras pessoas, outras culturas. Deve-se este prazer à Literatura Infantil, pois como já dizia Mário Quintana "Uma vida não basta ser vivida, precisa ser sonhada".
A Literatura Infantil tem o poder de formar um ser humano criativo, sensível, social, crítico, imaginativo. Ela leva crianças e adultos a imaginar outras realidades que não a sua, a pensar de formas diferentes, a encontrar soluções para os seus problemas.
Portanto, como educadora, é necessário pensar que não é somente ensinar ou estimular a leitura por prazer, acredita-se que aí resida o estimulo para a leitura: começando a ler por prazer, para então ensinar outras possibilidades de leitura. Até porque ensinar a ler por prazer é procurar despertar a paixão pelo aprender e pelo ato de ler.
Este estudo objetiva evidenciar que a Literatura Infantil é fundamental e necessária ao ser humano que quer se comunicar e interagir com as pessoas e o mundo. A literatura-arte é caracterizada pelo prazer, pela vontade incontrolável de ler a próxima página, de saber o que vai acontecer com a personagem.
Dessa forma, a maneira como a escola vive e convive com o mundo literário, influencia muito na formação da sensibilidade da criança. O momento de ouvir ou inventar uma história representa um dos espaços mais significativos para a criança e para as atividades pedagógicas, porque proporciona um momento mágico para ela com um valor educativo sem igual. Assim, a melhoria na qualidade de ensino só será possível quando a escola formar leitores.
Espera-se com este trabalho mostrar o papel da Literatura Infantil Clássica para a aprendizagem nas séries iniciais e sensibilizar o professor do enorme compromisso que ele tem ao iniciar os seus alunos na literatura.

1 LITERATURA INFANTIL

As narrativas consideradas clássicas foram escritas para divertir os adultos, mas como crianças e adultos partilhavam dos mesmos locais e do mesmo modo de diversão, as crianças também tiveram acesso a ela. A Literatura Infantil para as crianças passa a ser considerada:
No início do século XVIII, quando a criança passa a ser diferenciada do adulto, em razão de suas características, e pelo tipo de educação que pretende prepará-la para a vida adulta. Antes disso a criança vivenciava muitas das experiências adultas: originária da nobreza, era orientada pelos preceptores a ler os clássicos, enquanto que a criança das classes desprivilegiadas lia e ouvia histórias de cavalaria, de aventuras. As lendas e os contos de caráter folclóricos formavam uma literatura de interesse das classes populares (ROSLER, 1994, p. 5).
É nesta época histórica que a infância passa a ser valorizada. Com ela, surge a necessidade de ensinar, instruir e divertir as crianças. Pensadas como seres fragilizados, foi necessária a criação de "meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança e a manipulação de suas emoções." (ZILBERMAN, 1994, p. 13). Então a Literatura Infantil, os contos clássicos, que começava a surgir, servia a este propósito, nascendo com a marca da pedagogia.
Historicamente, a Literatura Infantil tem início no século XVII, com Charles Perrault, na França do rei Luís XIV. Em primeiro lugar, PERRAULT (1975), coleta histórias do povo, da tradição oral, para provar a necessidade dos valores clássicos e ajudar a luta feminista. PERRAULT (1975) cria o primeiro núcleo da Literatura Infantil ocidental: "Histórias ou contos do tempo passado, com suas moralidades - Contos da Mamãe Gansa".
A seguir, redescobre todo o poder das narrativas maravilhosas, tentando provar a equivalência entre os Antigos grego-latinos e divertir as crianças, especialmente as meninas, orientando sua formação moral.
Publica, então, os oito "Contos da Mãe Gansa", que marca o nascimento da literatura infantil clássica. Pela primeira vez são publicados, A Bela Adormecida no bosque, Chapeuzinho Vermelho, O Barba Azul, O Gato de Botas, As fadas, A Gata Borralheira, Henrique do Topete e O Pequeno Polegar, todos originários dos antiquíssimos lais ou dos romances céltico-bretões e de narrativas orientais indianas, que, com o tempo, transformações e fusões com textos de outras fontes, já haviam perdido seus significados originais. (COELHO, 1991, p. 68).
Ê com Perrault que a Literatura Infantil tem início oficial. Segundo WARNER (1999), embora Perrault seja conhecido como o pioneiro a registrar contos folclóricos, ele foi um escritor entre muitas escritoras', que em muitos casos o precederam, mas cujas obras não possuem vestígios, atualmente. Segundo COELHO (1982, p. 35), “há muito tempo que somos aficionados pelo maravilhoso, pelas fadas, e o que fez Perrault - e o eternizou - foi registrar para a posteridade estas histórias.”
Além dele, já no século XIX, Jacob e Wilhelm Grimm recolhem da memória popular as antigas narrativas maravilhosas e começam a publicá-las, com o título de "Contos de fadas para crianças e adultos", entre 1812 e 1822.
Os Irmãos Grimm recolheram as histórias folclóricas da Alemanha, com o objetivo de registrar os elementos linguísticos e os textos tradicionais germânicos. Segundo COELHO (1982), o que eles encontraram foi a fantasia e o maravilhoso. Ao registrar estes contos, os Irmãos Grimm extrapolam seu objetivo inicial e criam uma obra prima da Literatura Infantil, traduzida para diversas línguas e conhecidas ainda hoje.
O Romantismo era a inspiração desta época. Assim, os Grimm adaptaram as histórias de acordo com estes ideais. A violência, ainda segundo COELHO (1982), dá lugar ao humanismo, à esperança e confiança na vida. Embora permaneçam aspectos negativos, os Irmãos Grimm, preocupados com as crianças, passam a suavizar suas histórias, retirando passagens muito violentas ou muito doutrinais, levando em conta a mentalidade infantil, em detrimento da adulta, visto que as crianças apreciavam mais estas histórias.
Os contos de Perrault e Grimm apresentam o mundo maravilhoso, as metamorfoses, as provas a serem vencidas. Prevalece um clima leve, de bom humor e alegria, que neutraliza os medos.
O mesmo não acontece com os contos retirados da cultura popular e criados pelo autor nórdico, Hans Christian Andersen, que publica entre 1835 e 1879, cerca de duas centenas de contos infantis. Destes, apenas uns 50 chegaram ao conhecimento do público. Seus contos têm o clima de tristeza ou dor, além de exaltar os valores cristãos de paciência, resignação, amor, caridade, obediência, recato, vivenciados num mundo onde temos que sofrer para chegarmos ao céu.
Para COELHO (1991, p. 77),
Andersen revela-se como o grande criador da literatura infantil romântica, pois conseguiu, de maneira admirável, a fusão entre o pensamento mágico das origens arcaicas e o pensamento racionalista dos novos tempos.
Com estes quatro autores, a Literatura Infantil clássica, que é apreciada atualmente, começou a tomar forma, pois os contos de fadas passaram a ser a "viga mestra" da Literatura Infantil.

1.1 LITERATURA INFANTIL NO BRASIL
Sobre a Literatura Infantil Brasileira, vale destacar, que se inicia no fim do século XIX, já que até este momento o que prevalecia era a tradição oral. As narrativas infantis que tínhamos aqui retratavam a linguagem e as tradições da cultura europeia. Segundo DINORAH (1995, p. 33),
Carlos Jansen e Alberto Figueiredo Pimentel foram os primeiros brasileiros a se preocuparem com a literatura infantil no país. traduzindo as mais significativas páginas dos hoje considerados 'clássicos' para a garotada. Com Thales de Andrade, em 1917. é que a literatura infantil nacional teve início. E foi em 1921 que nosso grande Monteiro Lobato estreou, com Narizinho Arrebitado [...].
Hoje, no Brasil e no mundo, existe uma tentativa de escrever histórias para as crianças, mas com o apuro estético das produções para adultos, sem a tentativa forçada de ser pedagógica ou instrutiva.
Acredita-se que se pode utilizar histórias infantis na escola, não para educar ou instruir, mas para ensinar o gosto e as possibilidades da leitura. SILVEIRA (1997, p. 159), afirma que:
Parece-me evidente. [...] a inexistência de algo que se possa denominar como "genuíno discurso estético", em função não só do seu caráter de produção cultural como qualquer outra, como também da assimetria inalienável que tinge tal literatura.
ZILBERMAN (1994, p. 10), parece conseguir elucidar esta questão, quando afirma que: “O fato de a literatura infantil não ser subsidiária da escola e do ensino não quer dizer que, como medida de precaução, ela deva ser afastada da sala de aula”. Sendo agente de conhecimento porque propicia o questionamento dos valores em circulação na sociedade, seu emprego em aula ou qualquer outro cenário desencadeia o alargamento dos horizontes cognitivos do leitor, o que justifica e demanda seu consumo escolar.

1.2 CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA INFANTIL
A Literatura Infantil, segundo COELHO (1982), tem características bem peculiares. A primeira delas é que não há um conceito sobre Literatura Infantil. A segunda é que ela parece "grudada" à escola. Estas duas características já a desprestigiam para muitos estudiosos, críticos e adultos. O consenso está no fato de o adulto, geralmente, achar que Literatura Infantil possui um valor menor do que outras manifestações literárias, pela característica da ludicidade que a acompanha.
COELHO (1982), afirma ser Literatura Infantil toda a produção literária destinada à criança, ao pequeno leitor. Essa ideia de Literatura Infantil abrange um grande número de textos, como contos, lendas, fábulas, poesias, narrativas fantásticas ou maravilhosas. Mas mesmo esta ideia não é definitiva. Ainda segundo Coelho (1982) não há um único conceito aceito pelos estudiosos do que seria Literatura Infantil.
Assim, segundo COELHO (1991, p. 10-11): "a Literatura é, sem dúvida, uma das expressões mais significativas dessa ânsia permanente de saber e de domínio sobre a vida, que caracteriza o homem de todas as épocas."
A literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou melhor, é arte: fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra. Funde os sonhos e a vida prática, o imaginário e o real, os ideais e sua possível/impossível realização.
Um critério satisfatório para distinguir o gênero é o consumo: "consideram-se infantis obras que, escritas ou não para crianças, são lidas e apreciadas por elas." (AZEVEDO, 2005, p. 39). Esta classificação é bem oportuna e vai ao encontro de COELHO (1982).
Nas histórias infantis, o maravilhoso encontra-se bem à vontade. O maravilhoso aparece para falar do real, de forma a deixar refletir sobre a vida real, pensando ser a fantasia. Mas mesmo pensando ser a fantasia, sabe-se que a realidade é que está sendo retratada. WARNER (1999), afirma que as histórias infantis, repletas de elementos fantásticos, nos ajudam a enxergar o mundo real. É através da fantasia que a criança encontra a oportunidade de entender a realidade que a cerca, mesmo que não perceba isso. Ainda sobre o maravilhoso, WARNER (1999, p. 18), lembra que:
[...] O verbo "to wonder" [encantar-se, perguntar-se] comunica o estado receptivo de maravilhar-se, bem como o desejo ativo de desejar saber, indagar, e portanto define muito bem no mínimo duas características do conto de fadas tradicional: sentir prazer no fantástico e curiosidade pelo real. A dimensão do maravilhoso cria um imenso teatro de possibilidades nas histórias: tudo pode acontecer. Essa ausência mesma de fronteiras serve ao propósito moral dos contos, que é precisamente ensinar onde se encontram os limites. O sonhar proporciona prazer por si mesmo, mas também representa uma dimensão prática da imaginação, um aspecto da faculdade do raciocínio, e pode abrir possibilidades sociais e públicas.
A Literatura Infantil sempre esteve ligada à escola. Foi com o desenvolvimento da escola que os livros para crianças começaram a ser publicados e vendidos. Era na escola que as crianças e os pais descobriam sugestões de Literatura Infantil.
TERZI (1995, p. 93), pesquisou sobre a oralidade e a construção da leitura e escrita de crianças que vivem em meios iletrados. Ela afirma que "[...] a exposição constante da criança à leitura de livros infantis expande seu conhecimento sobre estórias em si, sobre tópicos de estórias, estrutura textual e sobre a escrita [...]."
O que ocorre, entretanto, e que ela também comprovou, é que muitas crianças não são expostas à situações de letramento antes de chegar à escola. O contexto escolar, então, continua sendo o principal local em que muitas crianças tomam conhecimento de livros e leituras.
Oralmente é perceptível que as crianças conhecem contos de fadas, pois são histórias tão antigas que mesmo sem ir à escola todos nós aprendemos. O que se precisa fazer, na escola, é propiciar momentos para o encontro com livros, para que as crianças de meios iletrados também tenham a oportunidade de vivenciar outros contos, outras histórias, outras vidas.
Segundo SOSA (1978), os contos sempre serviram para ensinar algo. E é por estar vinculada à escola que a Literatura Infantil permanece vista como arte menor, sem status literário. "[...] O caráter formador da literatura infantil vinculou-a, desde sua origem, a objetivos pedagógicos [...]." (CADEMARTORI, 1986, p. 23).
Dessa forma, a Literatura Infantil sempre carregou a dúvida: ser arte ou pedagogia? COELHO (1982, p. 24), ilustra isso:
entretanto, se analisarmos as grandes obras que através dos tempos se impuseram como literatura infantil', veremos que pertencem simultaneamente a essas duas áreas distintas [...]: a da Arte e da Pedagogia.
Sempre houve essa confusão envolvendo a Literatura Infantil. CADEMARTORI (1986, p. 14), lembra que "[...] a ação pedagógica junto à criança, voltou a privilegiar o livro como elemento imprescindível ao crescimento intelectual e à afirmação cultural [...]".
Isto porque os contos, desde sua origem, destinavam-se a ensinar seja como se comportar na corte ou outras moralidades e jeitos de ser e agir. Mas a Literatura Infantil vai além disso.
Ela sintetiza, por meio dos recursos da ficção, uma realidade, que tem amplos pontos de contato com o que o leitor vive cotidianamente. Assim, por mais exacerbada que seja a fantasia do escritor ou mais distanciadas e diferentes as circunstâncias de espaço e tempo dentro das quais uma obra é concebida, o sintoma de sua sobrevivência é o fato de que ela fala de seu mundo, com suas dificuldades e soluções, ajudando-o, pois, a conhecê-lo melhor (ZILBERMAN, 1994, p. 22).
Dessa forma, a Literatura Infantil pode ser entendida, conforme SOSA (1978), como um alimento para o estético, a imaginação, o intelecto, a psique, e que instrui, diverte e educa.

1.3 LITERATURA INFANTIL EM SALA DE AULA

Trabalhar Literatura Infantil na sala de aula é sempre questionável: até onde consegue-se separar o caráter pedagógico do estético? Como lembra CADEMARTORI (1986, p. 18), "[...] nem tudo que circula como livro destinado à criança é, de fato, literatura infantil [...]", por isso, quem trabalha com Literatura Infantil precisa ter claro o que quer trabalhar e como, do contrário só irá vincular livro e tarefa escolar. Para ZILBERMAN (1994), a Literatura Infantil cumpre uma função formadora, que não deve ser confundida com missão pedagógica. Assim, a educadora precisa criar condições e possibilidades, na escola, para que as crianças queiram ler e conhecer outras leituras.
As histórias, segundo COELHO (1982), proporcionam conhecimentos e experiências que uma única vida não seria capaz de proporcionar. A criança vivência vidas diferentes da sua. conhece relações diferentes, lugares e culturas também diferentes. Elas ajudam a formar um ser crítico, de opinião, que reflete, que duvida, que se pergunta, que quer aprender e conhecer mais.
A Literatura, segundo ZILBERMAN (1994), irá estabelecer as necessárias ligações e diferenciações entre a fantasia e a realidade; irá capacitar a criança a dar sequência lógica aos fatos e às cenas; irá estimular a formação de suas próprias imagens e ideias, além de criar roteiros de histórias e vidas diferentes e completos; irá proporcionar o voo para outros mundos, outras realidades, outras vidas, porque na fantasia tudo pode acontecer inclusive o feio se tornar belo, o triste se tornar alegre.
É através de uma história que se pode descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir e de ser. outras regras, outra ética, outra ótica... É ficar sabendo história, geografia, filosofia, direito, política, sociologia, antropologia, etc... Sem precisar saber o nome disso tudo e muitos menos achar que tem cara de aula. Porque, se tiver, deixa de ser literatura, deixa de ser prazer, e passa a ser didática, que é outro departamento (ABRAMOVICH, 2009, p. 52).
Independente das discussões sobre o caráter estético ou pedagógico da Literatura Infantil, o que importa, para quem é educador, é possibilitar oportunidades de leitura e conotação de histórias infantis, para estimular nas crianças o gosto pela leitura e pelo belo, pela arte. Se ensinar "arte" é pedagógico, então a oportunidade configura-se como mais indicada ainda.

1.4 CONTOS DE FADAS
Existem diversas formas de narrativas infantis. Muitas delas são contos maravilhosos, onde a fantasia é a palavra-chave. O conto de fadas é um deles. Mas o que são os contos de fadas? São histórias em que as personagens são fadas?
Atualmente denomina-se contos de fadas todas as histórias consideradas clássicas: Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel, Cinderela... Na verdade, como afirma COELHO (1982), alguns destes contos são apenas "maravilhosos", pois não apresentam fadas. Porém, a tradição francesa chegou até nós, e a outros países do mundo, denominando estes contos de "fadas", rótulo que continua sendo utilizado até hoje.
Para melhor compreensão destes conceitos, propõe-se explicar um pouco a diferença entre eles.
As narrativas denominadas contos de fadas, segundo COELHO (1991), podem ou não ter fadas, mas via de regra desenvolvem-se em um universo feérico (reis, rainhas, príncipes, princesas, fadas, bruxas, anões, gigantes) e em um tempo e espaço não conhecidos (há muitos e muitos anos, num reino distante...).
O eixo gerador da história, segundo ZILBERMAN (1994), se expressa em uma problemática existencial: o herói ou a heroína precisa se auto-realizar. Para que isso seja possível, é necessário cumprir uma série de provas ou obstáculos, para que alcance seu o ideal, de forma a encontrar sua identidade ou seu amor ao final da história.
Sua origem, segundo ZILBERMAN (1994) é do povo celta, de onde se acredita que tenha surgido a idéia européia das fadas. No início, estes contos eram poemas de amores estranhos, fatais, eternos. Com o tempo, foram integradas ao ciclo novelesco arturiano (contos baseados nas lendas do Rei Arthur), essencialmente ligado aos valores do espírito. Foram sendo transformados e adaptados até chegar aos contos conhecidos hoje.
Há personagens maravilhosos que representam forças benéficas. São as fadas (do verbo fatare, encantar, que deu o substantivo fatum, fado ou destino, ambos do latim vulgar), responsáveis pelo destino brilhante. As fadas são sempre personagens que interferem no destino [...]. (KHÉDE, 1986, p. 22).

Também existem os contos maravilhosos que, ainda segundo COELHO (1991), tem o mesmo nível de forma, porém suas narrativas não possuem fadas, mas se desenvolvem em um universo mágico (animais falantes, objetos mágicos, gênios, duendes) e o tempo e espaço são reconhecíveis ou familiares.
Seu eixo gerador, segundo COELHO (1982), se expressa em uma problemática social, ou seja, o herói procurará se autorrealizar no âmbito socioeconômico, conquistando bens, riquezas, poder material e outros, sempre ligados à vida prática, concreta. A aventura da busca tem seu ponto de partida na miséria ou na necessidade de sobrevivência física do herói.
Os contos maravilhosos, segundo COELHO (1982), são originários das narrativas orientais, que enfatizavam a parte material, sensorial, ética do ser humano: as necessidades básicas (estômago, sexo e vontade de poder) e as paixões do corpo. Diferente dos contos de fadas, em que o amor seria eterno, nos contos maravilhosos o que existe é a paixão erótica efêmera.
Os contos de fadas têm data de estreia. Eles surgem, historicamente, com Charles Perrault (1628-1703), na França, em 1697. É nesta data que, segundo COELHO (1982), Perrault publica seus oito contos:
a) A bela Adormecida no Bosque (La Belle au Bois Dormant);
b) Chapeuzinho Vermelho (Le Petit Chaperon Rouge);
c) Barba Azul (La Barbe-Bleue);
d) Gato de Botas (Le Maître Chat ou Le Chat Botté);
e) A Gata Borralheira ou Cinderela (Cendrillon ou La Petite Pantofle de verre);
f) Henrique, o Topetudo (Riq|uet à la Houppe);
g) O Pequeno Polegar (Le Petit Poucet).
É com ele que, pela primeira vez, segundo BETTELHEIM (2005) são registrados os contos de fadas que circulam entre nós até hoje. Estes contos foram retirados da cultura popular francesa e adaptados para servir aos interesses da corte desta época.
O conhecimento do povo serviu de fundo principal para os contos de fadas que conhecemos. Os autores dos contos clássicos recolheram histórias da tradição oral de seus países de origem e os publicaram, fazendo as adaptações que consideravam adequadas para os ouvintes e leitores da época em que viviam. Para COELHO (1982), assim como Perrault, Jacob e Wilhelm Grimm - Irmãos Grimm - e Hans Christian Andersen serviram-se da cultura popular para escrever os contos que iriam ficar eternizados no imaginário mundial, ou pelo menos, europeu. As histórias registradas por estes autores possuem fortes semelhanças entre os temas e enredos. Isto sugere que as fontes para a maioria dos contos que circulavam na Europa sejam as mesmas.
A universalidade de certos temas ou conto, presentes entre raças tão distantes, ou de civilizações tão diferentes é um fenômeno que tem surpreendido os pesquisadores. No entanto é umas das provas que existe (ou existiu?) um fundo comum a que pertencemos todos e do qual perdemos a consciência há muito tempo.
Permanecem no mistério as circunstâncias que levaram tais contos e narrativas de um ponto a outro do globo, em tempos tão recuados, em que era tão difícil vender distâncias... daí a importância étnica e psicológica desses contos tradicionais, como documentos incontestes de um período em que a comunicação entre os homens se fazia predominantemente por meio do emocional (COELHO, 1982, p. 245).
Nestes tempos remotos, sem comunicação, com diversas aldeias isoladas, os contos já ganhavam o mundo na forma oral. De alguma maneira, ainda hoje desconhecida, os homens foram criando histórias e foram transmitindo-as e adaptando-as para cada comunidade. Hoje, em plena era da informação, onde tudo o que acontece no mundo é transmitido e informando rapidamente, os contos de fadas remetem a um novo desafio: o que será no futuro?
Dizem que se vive em uma ladeia global, pois a Internet aproxima pessoas, histórias e nações. Já é possível encontrar contos de fadas na íntegra em web sites. Aliás, existem sites que disponibilizam livros completos: é só clicar e "baixar".
Não é possível acreditar que, nesta nova era, os contos de fadas deixem de existir. Acredita-se que os contos continuarão a adaptar-se para as novas exigências da atualidade. Um exemplo disso, segundo COELHO (1982), é o livro "Cinderela Surda2", desenvolvida por Lodenir Becker Karnopp, Caroline Hessel e Fabiano Rosa, na ULBRA (Universidade Luterana do Brasil), em 2003, especialmente pensado para as crianças surdas.
Neste livro, a Cinderela e o Príncipe são surdos, segundo COELHO (1982), no lugar do sapato de cristal, a personagem principal perde uma das luvas. A escolha da luva se dá em virtude da peça ser uma referência às mãos, amplamente utilizadas pelos surdos do mundo inteiro para se comunicar.
Assim, acredita-se ser possível ver uma nova forma de contos de fadas surgir: versões diferentes para cada comunidade, sem perder o essencial de cada conto. E isso, dessa forma, é o que vem acontecendo desde sempre.
Os contos de fadas são derivados de histórias do imaginário humano perdidas no tempo. Ninguém sabe ou pode precisar de onde se derivam ou de que fontes exatas este ou aquele conto se originou, pois
[...] elementos do romance grego, dos moralistas romanos, das Mil e uma Noites, das fábulas com animais, dos chistes medievais e das vidas dos santos embaralham-se e unem-se com uma descontraída ausência de inibição nos contos de fadas [...]. (WARNER, 1999, p. 20).
COELHO (1991), em seu livro "O Conto de Fadas", faz um inventário das principais fontes já descobertas que serviram aos principais contos, fábulas e outras histórias que permanecem no imaginário mundial atual. Estas fontes são orientais, europeias, célticas, egípcias. De diferentes partes do mundo e de diferentes tempos, originando contos com os mesmos elementos.
Diversos autores, como CACLEMARTORI (1986) e SOSA (1978), afirmam ser a literatura popular, de diferentes regiões, o enredo principal dos contos de fadas. Assim como a literatura popular, as crianças eram vistas como ingênuas e ignorantes. Quando Perrault, Grimm e Andersen registram os contos populares, destinando-os às crianças, reforçaram a ideia, vigente ainda hoje, da ingenuidade, ignorância e fragilidade da infância, que deveria ler e ouvir histórias também ingênuas, com explicações fantasiosas para os acontecimentos da vida.
O que não sabiam é que estes contos possuíam uma forte identificação com a criança, por conta de suas raízes perdidas no tempo, que falam da condição humana de todos nós. BETTELHEIM (2005, p. 20), sobre isso, faz uma ressalva:
O prazer que experimentamos quando nos permitimos ser suscetíveis a um conto de fadas, o encantamento que sentimos não vêm do significado psicológico de um conto (embora isto contribua para tal) mas nas suas qualidades literárias - o próprio conto como uma obra de arte. O conto de fadas não poderia ter seu impacto psicológico sobre a criança se não fosse primeiro e antes de tudo uma obra de arte.
Segundo SOSA (1978, p. 135), "por tudo isso, afirmamos que a substância dos contos infantis não é o produto de elucubrações pessoais e caprichosas, e sim o fundo do conhecimento dos homens, tal como o sabiam e o diziam [...]."
É neste fundo comum a toda a humanidade que reside o sucesso dos contos de fadas ainda nos dias atuais. E, também, a importância do trabalho com os contos nas escolas. Quem lembra qual o primeiro conto que ouviu?
Acredita-se que aí resida o segredo dos contos de fadas: eles fazem parte da vida de todos e de cada um, sem data de início ou fim. Levando isso em consideração, penso que trabalhar com eles possa ajudar a transformar ou não crianças em leitoras, pois a leitura nasce da paixão pela história, pelo ler, pelo livro.
BETTELHEIM (2005, p. 32), lembra que:
[...] a maioria das crianças agora conhece os contos de fadas só em versões amesquinhadas e simplificadas, que amortecem os significados e roubam-nas de todo o significado mais profundo -versões como as dos filmes e espetáculos de tv, onde os contos de fadas são transformados em diversão vazia. através da maior parte da história da humanidade, a vida intelectual de uma criança, fora das experiências imediatas dentro da família, dependeu das estórias míticas e religiosas e dos contos de fadas. esta literatura tradicional alimentava a imaginação e estimulava fantasias. simultaneamente, como estas estórias respondiam às questões mais importantes da criança, eram um agente importante de sua socialização. os mitos e as lendas religiosas mais intimamente relacionadas ofereciam um material a partir do qual as crianças formavam os conceitos de origem e propósito do mundo, e dos ideais sociais que a criança podia buscar como padrão. [...]
Os contos de fadas servem ao propósito de ensinar, sem ser pedagógico. O mundo muda muito rápido, e as crianças adaptam-se rapidamente, porém, precisam de referenciais para poder encontrar conforto e confiança, para realizar-se.
CORSO e CORSO (2005, p. 25), em uma entrevista, afirmam que:
[...] Se outrora os contos folclóricos narraram de forma fantástica questões relativas à sexualidade e aos problemas de filiação, hierarquia e herança, hoje. trazidos para a intimidade doméstica, alguns desses relatos servem para finalidades similares. O mundo pode ter mudado totalmente, mas tornar-se mulher ou homem, assim como enfrentar o crescimento e a morte ainda são nossos problemas. No que diz respeito a certas questões, tudo mudou... para que pudesse continuar do mesmo jeito.
Ou seja, os contos de fadas são atemporais porque continuam falando ao mais profundo dos nossos sentimentos. Os contos seguem tocando nossos corações e nossas mentes sejamos adultos ou crianças. Eles misturam realidade e fantasia para nos falar do mundo real, e de como ele poderia ser.
Os contos de fadas acenam com a esperança, com a necessidade de confiança em si próprio. O mundo adulto é tão diverso do mundo infantil, que as crianças podem se sentir perdidas e com medo. Os contos de fadas ensinam que, mesmos que sejam pequenos, o mundo pode ser vivido e aproveitado. A criança desenvolve um tipo de "confiança básica" (BETTELHEIM, 2005), que vai guiá-la durante toda a vida.
Infelizmente, muitos adultos - pais e educadores - não leem ou contam os contos de fadas, por pensarem que os contos são muito velhos, infantis e fantasiosos, traindo a realidade atual, ensinando as crianças a viverem no "mundo da lua". COELHO (2005, p. 12) afirma que:
Ao ouvirem (ou lerem) tais contos, as crianças, mesmo sem o saber, estão formando as leituras de mundo que as ajudarão nos caminhos a serem trilhados na vida. Em cada uma dessas histórias maravilhosas, há uma verdade vital. Nesse nosso mundo-cão do "vale tudo" e de ausência de parâmetros para o comportamento humano, esses exemplos de vida. em que a virtude é exaltada, o mal é castigado e os altos ideais saem vitoriosos, sem dúvida podem ser ótimos "guias iluminadores" para os pequenos aprendizes de vida e leitura.
É por acreditar nesse ‘poder' dos contos de fadas, que tenta-se descobrir o que faz, na verdade, com que os contos sejam tão aceitos pelas crianças, seja qual for a idade.

1.5 O PAPEL DA LITERATURA INFANTIL
A questão da Literatura Infantil assume, a forma do apelo pedagógico. Ou seja, além do apelo estético, a prática pedagógica, as atividades realizadas em sala de aula levam a pensar em como utilizar a Literatura Infantil da melhor forma possível, dado o fato que a maioria das crianças só possuem a oportunidade de ler e conhecer a Literatura Infantil na escola.
Deixando de lado lugares-comuns, do tipo "quem lê bem, escreve bem", e outros tantos pragmáticos, acredita-se ser fundamental trabalhar os contos de fadas por estes tratarem da imaginação, emoção, lúdico, das "verdades humanas" (COELHO, 2005), com a ânsia de conhecer e entender o mundo, das nossas coragens e fraquezas interiores. Sentimentos comuns hoje, há 100 anos atrás, ou à frente. Essas histórias, que também são consideradas "pueris" (COELHO, 2005), são fundamentais para o "equilíbrio emocional da criança" (CADEMARTORI, 1986, p. 8).
Além disso, entender o que contos de fadas dizem às crianças é entender modos de estimular o gosto pela leitura.
Cada conto traz em si uma ou mais questões para serem reformuladas na psique infantil. Em Cinderela, conforme BETTELHEIM (2005), tem-se a questão da "rivalidade fraterna". Outros autores, como OLIVEIRA (2001), também trabalham com a ideia da rivalidade fraterna, além do reconhecimento da pessoa apesar dos "trapos" que utiliza. CORSO e CORSO (2005) trazem a problemática da rivalidade fraterna e reconhecimento, além da diferenciação dos papéis atribuídos à mãe, valor da memória dos pais na primeira infância, sedução e fetichismo no amor.
Os contos de fadas estão postos para encantar e criar condições de reflexão da própria vida, muito mais do que constituir identidades de gênero. Até porque, como afirma BETTELHEIM (2005), os contos falam dos "problemas humanos universais", de meninos e meninas. Existem diferenças, claro, mas o sentido mais profundo é o mesmo e é trabalhado inconscientemente da mesma forma.
BETTELHEIM (2005), fala da temática dos contos de fadas, que sempre terminam "felizes para sempre" para dar à criança a necessária volta à normalidade e racionalidade.
Assim como despertamos renovados de nossos sonhos, mais aptos a enfrentar as tarefas da realidade, da mesma forma o conto de fadas termina com a volta do herói ou com sua devolução ao mundo real. muito mais capaz de dominar a vida (BETTELHEIM, 2005, p. 79).
A rivalidade fraterna é o medo da criança de ser preterido no amor pelos pais. Como afirmam CORSO e CORSO (2005, p. 110):
Cinderela dá um colorido forte a sofrimentos como o de não ser amada pelo pai, que a abandonou à mercê da mulher perversa e da dor pela perda da mãe boa. Trazendo todos estes conflitos para dentro da cena doméstica, essa história permite uma empatia imediata de qualquer filho com ela. já que cada um sempre se sentirá demasiado injustiçado e exigido, assim como pouco amado [...].

Cinderela fala disso, do medo de ser pouco amado, mas, sobretudo da redenção: apesar de ter sido relegada às cinzas, ela é reconduzida à cena principal, descobrindo-se amada e digna de amor. Ela mostra esperança às crianças. E não somente quem tem irmãos, mas estes especialmente. Para BETTELHEIM (2005, p. 280):
Qualquer que seja nossa posição na família, em certos momentos da vida somos conturbados pela rivalidade fraterna de uma ou outra forma. Mesmo um filho único sente que outras crianças levam vantagem sobre ele. o que lhe produz ciúmes intensos. [...]. "Borralheira" é um conto de fadas que tem uma atração tão forte para os meninos quanto para as meninas, pois as crianças de ambos os sexos sofrem igualmente com a rivalidade fraterna, e têm os mesmos desejos de serem resgatadas de sua posição inferior e superar os que lhe parecem superiores.
É oportuno relembrar o que afirma COELHO (1982, p. 24) sobre a Literatura Infantil:
[...] como "objeto" que provoca emoções, dá prazer ou diverte e. acima de tudo, "modifica" a consciência de mundo de seu leitor, a Literatura Infantil é Arte. Por outro lado. como "instrumento" manipulado por uma intenção "pedagógica", ela se inscreve na área da Pedagogia.

Para CADEMARTORI (1986, p. 19):
[...] A literatura, por sua vez. propicia uma reorganização das percepções do mundo e. desse modo. possibilita uma nova ordenação das experiências existenciais da criança. A convivência com textos literários provoca a formação de novos padrões e o desenvolvimento crítico.

BETTELHEIM (2005, p. 283), afirma que ao ouvir histórias contadas pelos pais, as crianças sentem que estes acreditam nas "experiências internas, delas, que acreditam na fantasia delas e, então, elas se sentem seguras para acreditar e imaginar”. Os educadores, podem fazer com que as crianças sintam-se acolhidas nas suas fantasias e resgatadas para a realidade, contando histórias para elas.
A leitura, num sentido reducionista, pode ser vista como o ato mecânico de codificar e decodificar letras do código alfabético. Esta ideia é utilizada por SOARES (2000), para definir a alfabetização, mas creio que posso fazer um paralelo com a leitura, embora ela não seja só isso. Faz parte do ler a compreensão do que foi lido e a mobilização dos conhecimentos e experiências do leitor para interagir com o texto. Ou como afirma FREIRE e SHOR (1990, p. 22):
Eu digo que ler não é só caminhar sobre as palavras, e também não é voar sobre as palavras. Ler é reescrever o que estamos lendo. É descobrir a conexão entre o texto e o contexto do texto, e também como vincular o texto/contexto com o meu contexto, o contexto do leitor.
Ou seja, a leitura é este ato de decodificar e entender o que está escrito. Também SOLÉ (1998), lembra que podem ser vários os objetivos da leitura: aprender, informar-se, instruir, revisar, praticar, comunicar-se, ou ainda, por prazer. Na escola, devemos estar atentas e possibilitar o encontro do leitor com diferentes textos e portadores, mas textos com significado, de forma que os pequenos leitores sejam os sujeitos ativos da aprendizagem e do conhecimento.
“César Coll, no prefácio do livro "Estratégias de Leitura", de Isabel Solé, chama a atenção para a "dupla consideração da leitura como objeto de conhecimento e como instrumento de aprendizagem." (SOLÉ, 1998, p. 12), visto que a leitura envolve um grande esforço cognitivo.
Mas é a questão da leitura, do gosto, prazer ao ler que sempre pauta nossas dúvidas e objetivos como futuras educadoras. Contar histórias na sala de aula é, garantia de formação de leitores. Ao ler ou contar alguma história, os alunos buscam aquele livro para lê-lo muitas vezes.
O ponto comum que para grandes transformações é que devemos começar com pequenas ações. Dessa forma, creio que, para estimular a leitura, devo propor leituras por prazer, pois, segundo SOLÉ (1998, p. 96-97):
[...] o prazer é algo absolutamente pessoal, e cada um sabe como o obtém. [...] a leitura é uma questão pessoal, que só pode estar sujeita a si mesma. [...] o que importa, quando se trata deste objetivo, é a experiência emocional desencadeada pela leitura [...]. [...] Em geral, a leitura por prazer associa-se à leitura de literatura. É natural que isto aconteça, pois os textos literários, cada um no seu nível e no nível adequado dos alunos, poderão "enganchá-los" com maior probabilidade.
Como educadoras, é necessário pensar que não é somente ensinar ou estimular a leitura por prazer, acredita-se que aí resida o estímulo para a leitura: começando a ler por prazer, para então ensinar outras possibilidades de leitura. Até porque ensinar a ler por prazer é procurar despertar a paixão pelo aprender e pelo ato de ler.

2. ANÁLISE DOS DADOS

Participaram do estudo, 13 pesquisados, sendo que 100% são do sexo feminino*; 31% têm idade entre 25 a 32 anos; 38% trabalham na instituição entre 1 a 5 anos e 38% trabalham a menos de 1 ano; 46% têm especialização como grau de formação; 46% são solteiros e 77% têm renda mensal de 1 a 3 salários mínimos.
* Não foi intenção da pesquisadora trabalhar somente com professoras, na Educação Infantil não há o gênero masculino.
Verificou-se que todos os pesquisados utilizam a literatura infantil clássica em sua prática pedagógica.
Para KISHIMOTO (1999, p. 37), “os contos de fadas são tidos como recurso que ensina e educa com fins pedagógicos e como instrumento de ensino-aprendizagem no processo do desenvolvimento infantil.” Assim, os contos de fadas tornam-se importante como ferramenta educacional e caberá ao educador, por meio da intervenção pedagógica propiciar atividades significativas que induzam a uma verdadeira aprendizagem.
Notou-se que 47% dos pesquisados utilizam a literatura infantil clássica na contação de histórias.
As histórias contadas ou ouvidas é uma terapia tanto para quem conta como para quem ouve. “Dizem que contar histórias é um ato de amor [...] Alimento puro para nossas almas. Inspiração para nossa criação.” (STEFANI, 1997, p 22).
Através da história se desenvolve o gosto pela leitura, quando se dá continuidade ao trabalho do conto através de dramatizações, desenhos, construções e escritas a se produzir. Além de a criança viajar no mundo oferecido pela história, ela poderá elaborar e expressar sentimentos e pensamentos a partir desse momento.
Verificou-se que 92% dos pesquisados utilizam diariamente a literatura infantil clássica em sua prática pedagógica
Segundo NOVAES (1992, p. 28), "o ensino, absorvido de maneira lúdica, passa adquirir um aspecto significativo e efetivo no curso de desenvolvimento da inteligência da criança." É essencial que o educador, como mediador do processo ensino-aprendizagem, estimule o aluno a atividades lúdicas.
Verificou-se que 100% dos pesquisados afirmaram que a atividade lúdica é uma importante ferramenta educacional, que auxilia na aprendizagem.
Segundo ANTUNES (2003, p. 14), “a aprendizagem é tão importante quanto o desenvolvimento social e o lúdico constitui uma ferramenta pedagógica ao mesmo tempo promotora do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento social.” Portanto, as atividades com recursos lúdicos, funcionam como ferramentas para que o educador consiga por meio delas auxiliar o aluno a aprender a aprender, uma vez que estas agem como fator motivador para que os alunos se empenhem no processo de aprendizagem,
Todos os pesquisados afirmaram que os contos de fadas auxiliam no desenvolvimento afetivo, cognitivo e social dos alunos.
Para OLIVEIRA (2008, p. 160), “o faz de conta favorece o equilíbrio afetivo da criança e contribui para o processo de apropriação de signos sociais.”
Quando em sala os alunos realizam as atividades lúdicas por meio do faz de conta, cria-se um processo de interação mútua entre alunos e professor, ou seja, é criado um clima diferenciado e ao mesmo tempo favorável à produção de conhecimento que tende a ser significativo e dinâmico para o aluno.
Percebeu-se que a maioria dos pesquisados afirmaram que os contos de fadas auxiliam no desenvolvimento despertando o interesse pela leitura.
Segundo GILLIG (1999, p. 34), “os livros auxiliam a criança a entender a sua realidade.” As histórias infantis têm a função de dar novas perspectivas para a criança a fim de que se torne leitor da escrita e dela para o mundo e para a vida abrindo seus horizontes.
Todos os pesquisados afirmaram que a Literatura Infantil Clássica auxilia na formação do leitor.
Ler é viajar em um horizonte sem fronteiras, é um exercício prazeroso que tem como fruto o conhecimento.
Para FRANTZ (2001, p.54), “a literatura infantil é também ludismo, é fantasia, é questionamento, e dessa forma consegue ajudar a encontrar respostas para as inúmeras indagações do mundo infantil, enriquecendo no leitor a capacidade de percepção das coisas”.
O professor deve fazer das experiências de leitura algo que seja prazeroso para os alunos, pois as crianças das fases iniciais vivem a fase do pensamento mágico, lúdico, elas utilizam as brincadeiras, a fantasia para construir os seus conhecimentos.
Percebeu-se que a maioria dos pesquisados afirmaram que a Literatura Infantil Clássica auxilia na formação do leitor porque aumentam o interesse pela leitura.
A leitura infantil é fundamental para a criança buscar a sua concretização como pessoa humana, encarregando às novas gerações uma grande responsabilidade quanto à mudança de concepção ideológica, de forma que o costume da leitura seja defendido desde a mais tenra idade, contribuindo em sua formação sob todos os aspectos (FRANTZ, 2001, p. 23).
A literatura cumpre papel essencial na vida da criança, não apenas pelo seu conteúdo recreativo que exerce, mas também pela riqueza de motivações, sugestões e de recursos que oferece ao seu desenvolvimento e aprendizagem.
Notou-se que a maioria dos pesquisados afirmaram que o ponto positivo na utilização da Literatura Infantil Clássica na aprendizagem das séries iniciais é o incentivo a leitura.
O trabalho de leitura, na escola, tem por objetivo levar o aluno a análise e à compreensão das ideias dos autores e buscar no texto os elementos básicos e os efeitos de sentido. é importante que o leitor se envolva, se emocione e adquira uma visão dos vários materiais portadores de mensagem presentes na comunidade em que se vive (ZILBERMAN, 1994, p. 36).
Cabe a escola e ao professor tornar a leitura prazerosa para o aluno, incentivando-o não apenas descobertas de novos caminhos, mas também os meios de enriquecimento e desenvolvimento de sua personalidade.
Percebeu-se que a maioria dos pesquisados responderam que não existe ponto negativo na utilização da Literatura Infantil Clássica na aprendizagem das séries iniciais.
Para GILLIG (1999, p. 25), “a fantasia dos contos de fadas é fundamental para o desenvolvimento da criança.” Portanto, o faz de conta é um meio lúdico de ensinar, que faz com que a criança interaja e desenvolva capacidades, fazendo com que sejam decifrados enigmas, quebrados tabus, ocorrendo ainda, investigação e construção de conhecimentos.
Verificou-se que a maioria dos pesquisados sugeriram a dramatização, para se trabalhar mais com os contos de fadas nas séries iniciais.
Para NOVAES (1992, p. 28) "[...] o ensino, absorvido de maneira lúdica, passa adquirir um aspecto significativo e efetivo no curso de desenvolvimento da inteligência da criança".
Verificou-se no levantamento de dados que a presença de atividades lúdicas na escola oferece amplas possibilidades para o constante desenvolvimento dos aspectos cognitivos e psicomotores da criança e os efeitos de sua utilização podem ser observados a médio e longo prazo, visto que a socialização e interação dela com os outros se revela como fator importante do desenvolvimento.
Verificou-se que a maioria dos professores pesquisados acredita na importância da Literatura Infantil no processo de aprendizagem dos alunos das séries iniciais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo possibilitou a reflexão sobre o papel da Literatura Infantil Clássica e a análise da mesma como um elemento de fundamental importância para o desenvolvimento/aprendizado da criança.
'Era uma vez..." Este é um prenúncio da descoberta de um mundo novo, maravilhoso e significativo, do qual crianças, jovens e adultos sempre querem saber/ conhecer mais.
Embora muitos jovens, não gostem de ler, acredita-se que ao ouvir uma história, sentem prazer. Não importa a idade ou a classe social: todos gostam de ao menos, ouvir uma história. E uma história bem contada ajuda no desenvolvimento cognitivo, afetivo e psicológico dos seres humanos, em especial das crianças.
Existe uma série de narrativas e livros de histórias. O que precisa é vontade e conscientização para começar a tomar gosto pela leitura e, assim, poder transformar a sociedade.
O que não mudou durante o período da construção deste trabalho, é a certeza de que o trabalho com Literatura Infantil, antes de ser puramente pedagógico, é a possibilidade de levar beleza, conhecimento, educação e ludicidade às crianças, não importando a classe, idade ou sexo das mesmas.
O tempo da Literatura Infantil pode ser o agora ou o amanhã, mas o importante é que as crianças devem descobri-la na escola, muitas vezes o único local em que isso ocorre.
Acreditava-se no poder formador da Literatura Infantil ao iniciar este trabalho e ao finalizá-lo, é possível afirmar que foi comprovado o que se acreditava ser verdade, pois as "paixões da alma" estarão sempre presentes na prática pedagógica de qualquer educador.
Ao finalizar este relato, a ideia é de ter certeza que todos consigam trabalhar a Literatura Infantil nas escolas, pois o deslumbramento que existe é o despertar a vontade de ler, de virar a próxima página. O objetivo agora, é saber mais sobre isso, para que as práticas pedagógicas possam ser melhores e mais significativas para as crianças.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 2009.

ANTUNES, Celso. O jogo e a educação infantil. Rio de Janeiro: Vozes, 2003. Ática, 1986.

AZEVEDO, Ricardo. Aspectos instigantes da literatura infantil e juvenil. São Paulo: DCL, 2005.

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

CADEMARTORI, Ligia. O que é literatura infantil. São Paulo: Brasiliense, 1986.

COELHO, Nelly Novaes. A literatura infantil: história, teoria, análise: das origens orientais ao Brasil de hoje. São Paulo: Quíron/Global, 1982.

______. O conto de fadas. São Paulo: Ática, 1991.

______. O conto de fadas: o imaginário Infantil e a Educação. Revista Criança, Brasilia, n. 38, p. 10-12, jan. 2005.

CORSO, Diana Lichtenstein; CORSO, Mário. Fadas no divã: psicanálise nas histórias infantis. Porto Alegre: Artmed, 2006.

DINORAH, Maria. O livro infantil e a formação do leitor. Petrópolis: Vozes, 1995.

FRANTZ, Maria Helena. O ensino da literatura nas séries iniciais. Ijui: Unijui, 2001.

FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

GILLIG, Jean-Marie. O conto na psicopedagogia. Porto Alegre: Artmed, 1999.

KHÉDE, Sônia Salomão. Personagens da literatura infanto-juvenil. São Paulo: Ática, 1986.

KISHIMOTO, Tizuko M. Jogos tradicionais infantis. São Paulo: Cortez, 1999.

MARTINS, Gilberto de Andrade. Manual para elaboração de monografias e dissertações. São Paulo: Atlas, 2002.

NOVAES, J .C . Brincando de roda. Rio de Janeiro: Agir, 1992.

OLIVEIRA, Cristiane Madanêlo de. Presença da fada-madrinha nas ver conto Cinderela. 2001. Disponível em: <http://wvAv.graudez.com.br/litinf/trabalhos/ contosdefadas.htm>. Acessado em 10 de fev.2015.

OLIVEIRA, Zilma Ramos. Educação infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2008.

PERRAULT, Charles. Contos. Lisboa: Estampa, 1975.

ROSLER, Maria Regina. Oficina de literatura infantil. São Ângelo: URI, 1994.

SILVEIRA, Rosa Maria Hessel. Ela ensina com amor e carinho, mas toda danada da vida: representações da professora na literatura infantil. Revista Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 22. n. 2, p. 147-161, jul./dez. 1997.

SOARES, Magda Becker. Letrar é mais que alfabetizar. 2000. Disponível em: <http://intervox.nce.ufrj.br/-edpaes/magda.htm>. Acessado em 10 de fev.2015.

SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 1998.

SOSA, Jesualdo. A literatura infantil. São Paulo: Cultrix, 1978.

STEFANI, Rosaly. Leitura: Que espaço è esse? :uma conversa com educadores. São Paulo: Paulus, 1997.

TERZI, Sylvia Bueno. A oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados. Campinas: Mercado das Letras, 1995.

WARNER, Marina. Da fera à loira: sobre contos de fadas e seus narradores. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. São Paulo: Global. 1994.


APÊNDICE

QUESTIONÁRIO

1 Qual seu sexo?
( ) feminino ( ) masculino

2 Qual sua idade?
( ) entre 18 a 25 anos ( ) de 25 a 32 anos
( ) de 32 a 39 anos ( ) de 39 a 46 anos
( ) acima de 46 anos

3 Há quanto tempo você trabalha nesta instituição?
( ) menos de 1 ano ( ) de 1 a 5 anos ( ) de 5 a 10 anos ( ) mais de 10 anos

4 Qual seu grau de formação?
( ) ensino médio ( ) ensino superior incompleto
( ) ensino superior completo ( ) especialização

5 Qual o seu estado civil?
( ) casado ( ) solteiro ( ) união estável
( ) separado/divorciado ( ) viúvo

6 Qual a sua renda?
( ) menos de 1 salário ( ) de 1 a 3 salários
( ) de 3 a 5 salários ( ) de 5 a 7 salários
( ) acima de 7 salários

7 Você utiliza a literatura infantil clássica com recurso em sua prática pedagógica?
( ) sim ( ) não

8 Em caso de resposta sim na questão anterior, de que maneira você utiliza?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________

9 Com que frequência utiliza a literatura infantil clássica em sua prática pedagógica?
( ) diariamente ( ) semanalmente ( ) quinzenalmente
( ) mensalmente ( ) nenhuma das anteriores

10 Na sua opinião, a atividade lúdica é uma importante ferramenta educacional?
( ) sim ( ) não

11 Para você, os contos de fadas auxiliam no desenvolvimento afetivo, cognitivo e social dos alunos?
( ) sim ( ) não

12 Em caso de resposta sim na questão anterior, de que maneira auxilia?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________

13 Na sua opinião os contos de fadas auxiliam na formação do leitor?
( ) sim ( ) não

14 Em caso de resposta sim na questão anterior, por quê?
___________________________________________________________________________

15 Quais os pontos positivos na utilização da literatura infantil clássica na aprendizagem das séries iniciais?
___________________________________________________________________________

16 Quais os pontos negativos na utilização da literatura infantil clássica na aprendizagem das séries iniciais?
___________________________________________________________________________

17 Quais sugestões você daria para se trabalhar mais com da literatura infantil clássica nas séries iniciais?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________