O DIREITO À DIFERENÇA
NA PRÁTICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA: UMA REFLEXÃO
Edna Apolinário1
RESUMO
A criança com deficiência deve ser incluída em todas as disciplinas escolares, visto que por meio de métodos adaptados, a aula de educação física permite que os alunos com algum tipo de deficiência tenham acesso à prática esportiva e que desfrutem seus benefícios. O estudo bibliográfico objetiva com bases doutrinárias e legislações vigentes demonstrar o direito a inclusão de pessoas com deficiência nas aulas de educação física com um ensino de qualidade, bem como demonstrar à complexidade do tema para auxiliar no desenvolvimento das competências necessárias ao atendimento de alunos deficientes. Ao final do estudo percebe-se que, na grande maioria das escolas, quando uma criança com algum tipo de deficiência consegue frequentar as aulas, logo obtém dispensa da disciplina de educação física. Esse comportamento é extremamente equivocado e leva a um distanciamento do hábito da prática de atividades físicas.
Palavras-chave: Educação Física. Direito. Inclusão.
1 INTRODUÇÃO
A legislação brasileira garante que a educação de qualquer pessoa, independentemente de sua condição humana, deve ser na rede regular de ensino, nas salas de aula comuns. A inclusão escolar pede que diferentes contextos escolares sejam instituídos para que todos os educandos, independentemente de suas condições humanas, possam participar da escola.
Dessa forma pessoas com deficiências devem ser incluídas em todas as disciplinas escolares, visto que por meio de métodos adaptados, a aula de educação física permite que os alunos com algum tipo de deficiência tenham acesso à prática esportiva e que desfrutem seus benefícios, dentre os quais pode-se destacar, além de melhorar o desenvolvimento geral da habilidade física, um enorme ganho de independência e autoconfiança para a efetivação das atividades diárias, além da melhora do autoconceito e da autoestima.
Portanto, existe um universo de possibilidades determinadas pelas necessidades, pelos desejos e pelas habilidades do aluno. O planejamento de um programa deve observar o desenvolvimento do saber, do saber fazer, do saber ser e do saber conviver, o que implica atender o individuo no seu todo, compreendidos os campos cognitivo, motor, emocional e social.
Este estudo justifica-se pela relevância de aprofundar conhecimentos sobre o tema, pois sabe-se que é dever do Estado proporcionar uma educação inclusiva de qualidade para os portadores de deficiências.
Diante do exposto, o estudo de cunho bibliográfico objetiva com bases doutrinárias e legislações vigentes demonstrar o direito a inclusão da criança com deficiência nas aulas de educação física com um ensino de qualidade, analisar o processo de inclusão na disciplina Educação Física, bem como, demonstrar à complexidade do tema para auxiliar no desenvolvimento das competências necessárias ao atendimento de alunos deficientes.
2 LEGISLAÇÃO SOBRE INCLUSÃO
Direitos fundamentais, no dizer de Canotilho (2003, p. 359), “são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos [...] os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta”. São os direitos inatos ao ser humano, previstos, principalmente na Declaração Universal dos Direitos dos Homens e dos Cidadãos confirmada na Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948 e presentes nos Estados Democráticos de Direito.
São direitos que protegem os indivíduos, restringindo o desempenho do Estado, asseverando e afirmando os direitos de liberdade, os direitos políticos, compreendendo a participação dos membros da sociedade no exercício do poder político, e protegendo os direitos sociais.
A educação é direito de todos e dever compartilhado do Estado, da família e da sociedade, que de acordo com Silva et al (2011, p. 215), a promoverão e incentivarão, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, ao seu preparo para o exercício da cidadania e à sua qualificação para o trabalho, conforme o art. 205 da Constituição Federal (CF) e previsto, também, nos arts. 53, 54 e 55do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).
Além de ser um direito petrificado na CF, foi atribuída, ao direito à educação, fundamentalidade também pela Organização das Nações Unidas (ONU), através da Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, da qual resultou, segundo Silva et al (2011, p. 219):
A Convenção relativa à luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, que relacionou como discriminação toda e qualquer iniciativa que privasse qualquer pessoa ou grupo do acesso aos tipos de graus de ensino; limitasse a educação de qualquer pessoa ou grupo, a um determinado nível inferior ou impusesse condições incompatíveis com a dignidade do homem.
Assim, o direito à educação vai além da possibilidade da leitura, da escrita e do cálculo. E o reconhecimento do papel imprescindível dos fatores sociais na formação intelectual e moral de um indivíduo, transformando estas possibilidades em realizações úteis e efetivas, tanto no âmbito escolar como no seio familiar.
Para Maliska (2001, p. 159),“os pais não somente possuem o direito de educar os filhos e de determinar o gênero de educação a ser dado a eles, como possuem o dever de exercê-lo”.
No entanto, embora existam amplos direitos relacionados à educação garantidos na CF, percebe-se que a grande concentração de renda da sociedade brasileira transforma o direito de todos à educação em um direito de uma minoria. Nesse sentido, o constitucionalista Ferreira (2002, p. 92) afirma que, “[...] não havendo poder aquisitivo do povo em seu conjunto, é impossível que ele venha a desfrutar os benefícios da civilização”, visto que a educação ainda é para os brasileiros, privilégio da minoria e não a herança da própria sociedade.
A Educação Especial está protegida pela CF que prevê como dever do Estado o atendimento educacional individualizado aos alunos com deficiências, preferencialmente na rede regular de ensino.
A Unesco garantiu em seus documentos, que a inclusão dos alunos com necessidades educativas especiais decorre de um processo de melhoria integral do sistema educativo tradicional, “cuja meta é a criação de uma escola comum que ofereça uma educação diferenciada a todos, em função de suas necessidades e num marco único e coerente de planos de estudos” (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994).
No Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8069/1990) a Educação Especial é dever do Estado de “garantir o direito à educação à criança e ao adolescente, e que o atendimento educacional, deverá ser oferecido, preferencialmente na rede regular de ensino”.
A Educação Especial é tratada na LDB, Lei 9.394/96, no capítulo V, nos arts. 58 a 60, assim dispondo:
Art. 58. Entende-se por Educação Especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.[...]
Art 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; [...]
Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público.
Além dos artigos acima transcritos da LDB, há, regularizando tais dispositivos legais, o Decreto 7.611, de 17.11.2011, que “dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado, e estabelece outras providências”.
A relevância dessa norma não pode ser desconsiderada uma vez que ela estabelece a obrigatoriedade do portador de necessidades educacionais especiais frequentar o ensino regular ao mesmo tempo que institui a concepção de serviços de apoios especializados nas escolas regulares, além de indicar para o sistema de ensino organização curricular especial, com procedimentos, práticas e recursos educacionais adaptados a esses alunos. De acordo com Glat (2011, s.p):
O art. 58, § 2°, da LDB versa sobre um tema de suma importância e que está na pauta do Ministério da Educação como política pública educacional prioritária. Tal artigo prevê que o atendimento educacional dos alunos com deficiência será ministrado em classes, escolas e serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.
Cabe frisar que essa prioridade política a favor da inclusão escolar do indivíduo portador de deficiência no Brasil, parece estar muito mais presente no papel (texto legal) do que na ação. Pelas dificuldades que enfrentam as escolas públicas brasileiras, torna-se evidente que há muito pouco investimento, não apenas no que diz respeito ao processo de inclusão escolar da pessoa portadora de deficiência, mas no sistema educacional como um todo.
2.1 EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Pautado na concepção mundial de escola inclusiva, o Ministério da Educação (MEC) publicou em 2008 a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, defendendo o direito dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação de se matricularem e frequentarem o ensino comum como os demais alunos. Além disso, esse documento buscou assegurar o acesso, a participação e a aprendizagem no ensino comum, atendendo aos princípios do direito à diferença, da acessibilidade, da não discriminação e da efetiva participação, possibilitando o desenvolvimento das capacidades de todos os alunos e a sua inclusão social (BRASIL, 2008).
Percebe-se que o Governo possui, assim, uma política educacional inclusiva, onde os educandos com deficiência interagem na mesma sala de aula com outros educandos sem deficiência. Nesse sentido dispõe o próprio art. 1°, inc. I, do Decreto 7.611/11 ao enunciar que “uma das diretrizes da educação especial é a garantia de um sistema educacional inclusivo em todos os níveis”. Percebe-se que esta é a política que melhor concretiza o direito dos alunos com deficiência, pois admite a interação constante com os educandos regulares, permitindo estabelecer melhor suas competências e integrando-os ao meio social.
A inclusão no âmbito escolar é um movimento cujo maior empenho é estabelecer uma sociedade de igualdade para todos. Para Glat et al (2011, s.p.), um dos grandes problemas da inclusão é a elaboração de políticas educacionais voltadas para o estabelecimento de uma escola realmente aberta a alunos com suas diferenças, escola esta acessível a todos, dando-lhes garantia de que seus direitos serão respeitados.
Surge, então, segundo Pedrinelli (2011, p. 35), a discussão a respeito de qual seria o melhor tratamento ao aluno com necessidade especial, “separado em salas de aula especializadas, somente com outros alunos com deficiência ou, se integrado em salas regulares, com alunos sem deficiência”.
O termo inclusão só tem “significado e definição para os deficientes, quando representa e expressa a realidade de uma participação ativa de convivência, em qualquer grupo social”. (LEMOS, 2001, p. 45). Assim, pensar em uma escola inclusiva significa, em um primeiro momento, pensar em uma escola para cada um, isto é, em uma escola em que cada aluno seja atendido de acordo com suas necessidades e dificuldades, com recursos e metodologias que propiciem o seu desenvolvimento; uma diversidade de ensino em que todos ganham, alunos deficientes e alunos não deficientes.
Nesse sentido, Norwich (2002) contribui afirmando que quanto mais flexíveis forem o ensino e a aprendizagem para a inclusão, menores os impactos negativos de o sujeito diferente se sentir efetivamente inserido nas classes regulares.
Portanto, a escola atual precisa desenvolver novas atitudes e formas de interação, o que toma necessária a inclusão de alterações no relacionamento pessoal e social, e na maneira de concretizar os processos de ensino e aprendizagem.
2.2 EDUCAÇÃO FÍSICA ESPECIAL
Atualmente, os direitos sociais garantem o direito de igual oportunidade, independentemente da condição distinta e peculiar que um indivíduo possa apresentar. Apesar dessa premissa legal, muitas ações refletem a influência de modelos precursores, como o de destruição (quando pessoas com deficiência eram sacrificadas), de segregação (quando a segregação em instituições especializadas era a única opção), ou de cura ou prevenção (quando as pessoas eram focalizadas sob a ótica da restrição, da doença, da invalidez). Tais moldes ainda têm intensa influência e definem modos que colocam as pessoas que apresentam diferentes e peculiares condições para a prática das atividades físicas em desvantagem.
A Educação Física Especial ganha aos poucos novos adeptos e amadurece como área de conhecimento e intervenção, segundo Rodrigues (2006, p. 68):
A intervenção profissional em Educação Física atinge um largo espectro de conhecimentos, visando, sobretudo, orientar as pessoas a praticar atividades físicas como ginástica, dança, jogo, esporte entre outros. Participar de um processo inclusivo é estar predisposto a considerar e a respeitar as diferenças individuais, criando a possibilidade de aprender sobre si mesmo e sobre cada um dos outros em uma situação de diversidade de ideias, sentimentos e ações.
Se a escola, por exemplo, considera crianças e adolescentes seres sociais e construtivos, distingue as diferenças, considera os valores e as experiências de cada um, aprecia a relação adulto-criança/adulto-adolescente, caracterizada pelo respeito recíproco, pelo afeto e pela confiança e promove autonomia, espírito crítico, criatividade, responsabilidade e cooperação, (FERREIRA, 2012, p. 41) então o processo de inclusão se instituirá de modo natural. O aluno terá uma condição diferente e peculiar não será considerado mais um, isto é, se o grupo era composto por 35 alunos, não será agora de 35 + 1, mas sim de 36 alunos. Para Rodrigues (2006, p. 71):
É importante que a rotulação das diferentes e peculiares condições apresentadas por alguma criança ou adolescente deve ser evitada, senão abolida, pois os rótulos enfatizam o que a pessoa não pode fazer versus o que pode fazer, ou eventuais problemas são associados à pessoa e não ligados ao método de intervenção ou ao ambiente, ou, ainda, encorajam a estabelecer expectativas inapropriadas, subestimando as capacidades e as potencialidades do aprendiz participante.
Talvez seja indispensável que o profissional ressignifique sua prática pedagógica e sua percepção de diversidade. Segundo Carvalho (1999, p. 21), aceitar a ideia de caleidoscópio é aceitar que todos são importantes e significativos, e quanto maior a diversidade, mais complexa e rica será a situação. Tal como afirmam Munster e Almeida (2006, p. 61) é fundamental que o respeito às diferenças e a valorização da diversidade estejam implícitos na filosofia do programa. Neste sentido, vale destacar a ideia de que o processo de inclusão é uma oportunidade de celebrar a diferença. Para Mendes et al (2013, s.p):
A Educação Física tem muito a contribuir para as pessoas portadoras de necessidades especiais, promovendo uma maior integração do deficiente com o ambiente social, estimulando o interesse pelas atividades físicas, ou até mesmo pela formação profissional na área. A educação física inclusiva envolve não só alterações nas práticas físicas existentes, mas também a criação de novas atividades.
Assim, em um processo de formação e transformação permanente, Friedman (2009, p. 27) sugere algumas ações que podem contribuir para a intervenção profissional. Entre elas, propor a discussão de regras e leis, em vez de impô-las. Caberia aos participantes elaborar e decidir as regras, pois, desse modo, exerceriam uma atividade política e moral. Ao possibilitar a troca de ideias para se chegar a um acordo comum sobre as regras, pratica-se a descentralização e a coordenação de pontos de vista. Ao permitir que se escolha qual regra deverá ser aplicada, motiva-se a atividade mental das crianças. Atividades e eventos cooperativos podem servir de exemplo para concretizar tais atitudes.
Segundo Costa (2011, p. 35), há programas inclusivos muito bons, assim como programas para grupos específicos. Frequentemente, a qualidade do programa reflete a qualidade da intervenção profissional, ou seja, a qualidade está mais relacionada com o profissional do que com o contexto em que os serviços são oferecidos. Costa (2011, p. 35), ainda recomenda a adoção de princípios, como preservar os objetivos propostos, modificando-os apenas quando necessário, e incentivar a realização de atividades apropriadas. De acordo com Bianconi e Munster (2009, s.p):
Através destas modificações de programas, os alunos com necessidades educacionais especiais, que antes eram segregados e dispensados da Educação física, conseguem praticá-la. É necessário, por óbvio, que o professor não deixe que haja desvantagens durante a prática das atividades. A prática esportiva deve ser um desafio para todos os participantes, dando-lhes a oportunidade de se superar. Para transpor os obstáculos expostos acima, como a falta de apoio da diretoria e a má gestão do tempo, várias escolas têm adotado a tutoria, o ensino colaborativo e a consultoria.
Garantir um ambiente para dividir tentativas, socializar os medos e as angústias, problematizar mitos e tabus e instituir coletivamente maneiras de enfrentamento de resistência serão assuntos efetivos para uma ação confiante. Para Glat et al (2011, s.p):
A inclusão contempla o direito à educação, à igualdade de oportunidades e de participação. Porém, mais do que garantir o acesso das pessoas com deficiência às escolas ou demais espaços sociais é necessário viabilizar a sua permanência e aprendizagem através da construção de propostas pedagógicas que possam responder às necessidades específicas dos alunos e educá-los na e para a diversidade […]
Lidar com as diversidades estabelece Ferreira (2012, p. 45) grande desafio nas relações interpessoais. Sobre a maximização do potencial individual, é relevante focalizar o desenvolvimento das capacidades, escolhendo atividades adequadas, providenciando um lugar favorável à aprendizagem encorajando a auto-superação.
3 DISCUSSÃO SOBRE A INCLUSÃO DE PCD NA EDUCAÇÃO FÍSICA
A prática pedagógica é um elemento-chave na transformação da escola, estendendo essa possibilidade de transformação à sociedade. Em razão do tema da diversidade, as práticas pedagógicas têm caminhado no sentido da pedagogia das diferenças (MENDES; FERREIRA; NUNES, 2003).
Promover a inclusão significa, sobretudo, uma mudança de postura e de olhar acerca da deficiência. Implica quebra de paradigmas, reformulação do nosso sistema de ensino para a conquista de uma educação de qualidade, na qual, o acesso, o atendimento adequado e a permanência sejam garantidos a todos os alunos, independentemente de suas diferenças e necessidades.
A palavra ‘diferença’ em seu sentido usual significa propriedade de quem ou do que é diferente. É comum pessoas utilizarem a palavra diferença para expressar individualidade, contudo essas diferenças podem ser vistas como positivas ou negativas, e para defini-las a sociedade se baseia no conceito da normalidade.
O conceito da normalidade parte do princípio que nossos comportamentos e desenvolvimento sejam baseados no esperado socialmente. (PERANZONI; FREITAS, 2011). No entanto, quando os ajustes aos padrões sociais não são possíveis pelas mais variadas circunstâncias surgem as diferenças, as desvantagens, os estigmas e a condição de desviante.
Para Oliveira (2014), nascer com uma deficiência do tipo sensorial ou física gera não apenas comparações, como também estereótipos e rótulos sobre essas pessoas. Em primeiro momento é questionado até mesmo o valor de sua vida, pois desde a antiguidade os valores são determinados pela contribuição dada pelo indivíduo à sociedade, e se ele não se enquadrar neste quesito, passa a ser um peso, um incapaz com o qual a sociedade terá que arcar.
A deficiência é compreendida como uma diferença que se contrapõe a ideia de normalidade; essa diferença se manifesta diante de uma audiência que a julga como tal, e em geral, traz um significado social de desvantagem frente aos padrões desejados e imposto por uma sociedade desigual cujos valores predominantes são os da classe ideologicamente dominante.
O processo de inclusão de pessoas com deficiência vem sendo alvo de inúmeras discussões no âmbito social e educacional. Conhecer esse processo pode implicar práticas mais efetivas, por profissionais que estão diretamente envolvidos com o processo de ensino-aprendizagem.
A inclusão total e irrestrita, com o direito à diferença nas escolas, é uma oportunidade que se tem para reverter a situação da maioria das escolas, as quais atribuem aos alunos as deficiências que são do próprio ensino e raramente analisa o que e como a escola ensina, de modo que os alunos não sejam penalizados pela repetência, pela evasão, pela discriminação, pela exclusão (MANTOAN, 2003).
A legislação garante o direito de todos à educação, principalmente, a inclusão das pessoas com deficiência no processo educacional. A partir de janeiro de 2016, entrou em vigor a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), Lei 13.146/2015, que garante a pessoa com deficiência igualdade civil com as demais pessoas. Sendo assim, essas pessoas devem frequentar escolas, clubes e academias com os mesmos direitos que os outros cidadãos.
Segundo Pedrinelli (2011), a Educação Física desenvolve a dimensão motora e afetiva das pessoas com deficiências, em consonância com os campos cognitivos e sociais, pois trabalha com o corpo, sendo assim, um caminho privilegiado para a Educação. Dentre os diversos assuntos educacionais da atualidade, a Educação Física atua também na inclusão social.
Como as atividades físicas podem ser executadas em conjunto, possibilitam a integração e interação entre todos os participantes. Alguns dos valores trabalhados na atividade física são: ética, trabalho em equipe, respeito às normas, respeito à diversidade, respeito aos demais participantes e suas diferenças e o despertar da autoestima. Assim, a atividade física deve ser ofertada a todos, pois, além da inclusão social, ela proporciona valores para a promoção da saúde em deficientes, tanto no quesito físico quanto na questão psíquica.
Em razão desse novo posicionamento multidisciplinar e da reformulação dos conteúdos da Educação Física, pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, a postura atual da Educação Física frente à questão da deficiência é:
A Educação Física escolar deve dar oportunidade a todos os alunos para que desenvolvam suas potencialidades, de forma democrática e não seletiva, visando seu aprimoramento como seres humanos. Nesse sentido, cabe assinalar que os alunos portadores de deficiência física não podem ser privados das aulas de Educação Física. (BRASIL, 2008, p. 28).
A Educação Física para abranger todos os alunos precisa tirar proveito dessas diversidades ao invés de configurá-las como desigualdades. A multiplicidade de ações pedagógicas implica que o que torna os alunos distintos é exatamente a aptidão de se expressarem de maneira diversa.
Para Aguiar e Duarte (2015) a presença da pessoa com deficiência na escola pressupõe uma mudança de grandes proporções no interior da mesma, quer seja na metodologia de ensino, na avaliação, no currículo, enfim, em todas as esferas do sistema escolar.
Nessa perspectiva, compreende que a aula de Educação Física no ambiente escolar se constitui num ‘evento’, que tem por objetivo promover a educação e contribuir para o desenvolvimento das crianças e jovens, por meio de um processo de interação social entre professor e alunos.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Foi possível verificar que o propósito fundamental neste trabalho, foi atingido, visto que a legislação brasileira deixa claro o direito à educação de qualidade para todos, nos estabelecimentos regulares de ensino, compreendendo que a pessoa com necessidades educacionais especiais é parte integrante da expressão ‘todos’.
Partindo-se dessa prerrogativa, deve-se entender que os responsáveis pela asseguração desse processo (Governo, Estado, Municípios, Escolas, professores, outros), devam disponibilizar recursos e condições de acesso a essa população. É papel das instituições de ensino formular e apresentar propostas pedagógicas que atendam a todos os alunos, sem nenhum tipo de ônus ou distinção.
Na grande maioria das escolas, quando uma criança com algum tipo de deficiência consegue frequentar as aulas, logo obtém dispensa da disciplina de educação física. Esse comportamento é extremamente equivocado e leva a um distanciamento do hábito da prática de atividades físicas.
Este fato se torna um empecilho para a aproximação entre a criança com deficiência e o esporte. É preciso reverter essa situação dramática do país, até porque, conforme prega a Constituição Federal de 1988, a educação, o esporte e o lazer são direitos de todos os cidadãos e é dever do Estado fornecer condições básicas para sua prática.
A escola pode ser de fato um lugar de competência social para qualquer criança, mas pode ser especialmente importante para as crianças com deficiência. E nesse espaço que elas podem aprender com outras crianças, exercitar a sociabilidade por mais comprometida que seja e, finalmente, exercer um direito indisponível, o da educação.
Espera-se que este trabalho aponte alguns enfoques que venham a contribuir para que os educadores de uma forma geral reflitam sobre suas práticas, de forma a garantir a todos os alunos deficientes a total integração nas salas de aula regulares.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, J. S.; DUARTE, E. Educação inclusiva: um estudo na área da educação física. Revista Brasileira de Educação Especial Vol. 11, n° 15, Ago/2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-65382005000200005&script=sci_arttext>. Acesso em: 28 mar. 2018.
BIANCONI, Elizabeth de Cássia; MUNSTER, Mey de Abreu Van. Educação Física e pessoas com deficiências: considerações sobre as estratégias de inclusão no contexto escolar. 2009. Disponível em: <http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2009/ anais/pdf/1995_991.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2018.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988.
______. Lei 9.394/96. de 20.12.1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília. 2013. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e estabelece outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 10 out. 2017.
______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990. São Paulo: Saraiva, 2017.
______. Ministério da Educação. Política nacional para a integração da pessoa portadora de deficiência. Brasília: MEC/SE-ESP, 2008.
CANOTILHO, José J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 2003.
CARVALHO, R.E. Integração e inclusão: do que estamos falando? In: Salto para o futuro: tendências atuais. Brasília, Ministério da Educação, Secretaria de Educação a Distância, 1999.
COSTA, A.M. Atividade física e esportes para portadores de deficiência física In: Lazer, atividade física e esporte para portadores de deficiência. Brasília, SESI-DN, Ministério do Esporte e Turismo, 2011.
FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva,2002.
FERREIRA, S. Atividades motoras para deficientes auditivos. In: Educação física e desporto para pessoas portadoras de deficiência. Brasília, MEC-SEDES, SESI-DN, 2012.
FRIEDMAN, A. Brincar: crescer e aprender o resgate do jogo infantil. In: BROTTO, F.O. Jogos cooperativos: o jogo e o esporte como um exercício de convivência. Santos, Projeto Cooperação, 2009.
GLAT, Rosana; et al. Inclusão de pessoas com deficiência e outras necessidades especiais na escola e no trabalho. Rio de Janeiro, ago. 2011. Disponível em: <http://www.sjp.pr.gov.br/wp-content/uploads/2013/04/CIEE_texto_GLAT_et_all_final _agosto_2011.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2018.
MALISKA, Marcos Augusto. O direito à educação e a Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor. 2001.
MANTOAN, M.T.E. Inclusão escolar: O que é? Porquê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003.
MENDES, E.G.; FERREIRA, I. R.; NUNES, L.R.O.P. Integração/inclusão: O que revelam as teses e dissertações em educação e psicologia. In. NUNES SOBRINHO, RR (org.). Inclusão educacional: pesquisas e interfaces. Rio de Janeiro: Livre Expressão, 2003.
MENDES, Rodrigo Hubner; CONCEIÇÃO, Luiz Henrique de Paula; GALERY, Augusto. O caso de educação física inclusiva, dez. 2013. Disponível em: <http://www.diversa.org.br/estudos-de-caso/caso/o_caso_de_educacao_fisica_inclusiva_ brasil>. Acesso em: 15 mar. 2018.
MUNSTER, M.A. Van; ALMEIDA, J.J.G. Um olhar sobre a inclusão de pessoas com deficiência em programas de atividade motora: do espelho ao caleidoscópio. In: David Rodrigues (org.). Atividade motora adaptada: a alegria do corpo. São Paulo, Artes Médicas, 2006.
OLIVEIRA, A. A. S. O conceito de deficiência em discussão: representações sociais de professores especializados. Revista. Bras. Educação Especial. Marília. V. 10, N. 1, 2014.
PEDRINELLI, V.J. Educação física adaptada: a criança portadora de DM, DA, DV, DF e a prática de atividade física. Curso de Extensão Universitária, USP.EEF, 2011.
PERANZONI, V. C; FREITAS, S. N. A evolução do (pré) conceito de deficiência. Caderno de Educação Especial / Universidade Federal de Santa Maria -LAPEDOC. Santa Maria: Vol. 2, n° 16, 2012. Disponível em: <http://coralx.usfm.br/ revce/ceesp/2000/02>. Acesso em: 21 mar. 2018.
RODRIGUES, D. (Org.). Atividade motora adaptada: a alegria do corpo. São Paulo, Artes Médicas, 2006.
SILVA, Rogério Luiz Nerv da: HAHN. Paulo; TRAMONTINA. Robison. Educação: direito fundamental universal. Espaço Jurídico. Joaçaba, v. 12, n. 2, p. 211-231 JuL/dez. 2011.
UNESCO. Declaração de Salamanca: linha de ação sobre necessidades educativas especiais (trad. Edílson Alckmin da Cunha). Brasília: CORDE, 1994.