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Transtorno do espectro autista: principais características e tratamentos

Josiane Caroline de Oliveira

Paloma Cabrini Araujo

 

DOI: 10.5281/zenodo.15800594

 

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar as características do Transtorno do Espectro Autista (TEA) e as intervenções terapêuticas aplicadas no tratamento. O TEA é um distúrbio do desenvolvimento caracterizado por dificuldades na comunicação social, comportamento repetitivo e interesses restritos. A pesquisa foi realizada por meio de uma revisão bibliográfica, com fontes consultadas em bases de dados como Scielo e Google Acadêmico. A definição do autismo foi inicialmente proposta por Leo Kanner, em 1943, e mais tarde expandida por Hans Asperger, com ênfase na dificuldade de interação social e comunicação. O artigo discute os diferentes níveis de gravidade do transtorno e seus sintomas, como atraso na fala, dificuldades motoras e comportamentos repetitivos. Além disso, são apresentados métodos de diagnóstico, como a triagem de Entrevista para o Diagnóstico do Autismo (ADI-R) e a Escala de Observação para Diagnóstico do Autismo (ADOS). O estudo também aborda as principais formas de tratamento, incluindo intervenções como terapia fonoaudiológica, Análise Comportamental Aplicada (ABA), e programas como PECS e TEACCH. O artigo conclui que, apesar da variedade de métodos terapêuticos, a escolha da intervenção deve ser personalizada e realizada por uma equipe multifuncional, levando em consideração a individualidade de cada criança com TEA.

 

Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Sintomas. Diagnóstico.

 

 

INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho tem como objetivo realizar uma análise detalhada acerca das principais características do Transtorno do Espectro Autista (TEA), bem como apresentar as intervenções terapêuticas atualmente disponíveis, com foco em tratamentos baseados em evidências científicas. Para isso, optou-se por realizar uma revisão bibliográfica, a fim de reunir informações relevantes e atualizadas sobre o tema. A revisão bibliográfica, segundo Bento (2012), consiste em um levantamento sistemático de produções acadêmicas já publicadas, com o propósito de construir uma base teórica sólida que permita compreender de forma crítica a temática estudada. Esse tipo de metodologia é amplamente utilizado em pesquisas das áreas da saúde e educação por possibilitar uma visão ampla e fundamentada dos assuntos investigados. A busca pelas fontes teóricas foi realizada em bases científicas reconhecidas, como a Scielo – Scientific Electronic Library Online, que é um portal de periódicos com parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – e também no Google Acadêmico, que disponibiliza artigos científicos, teses e dissertações. Foram utilizados como critérios de seleção os estudos que apresentassem as palavras-chave “Autismo”, “Tratamento” e “Intervenções”, considerando produções com relevância comprovada na comunidade científica. A primeira definição oficial de autismo foi realizada pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner, em 1943, a partir da observação clínica de 11 crianças que apresentavam um padrão de comportamento semelhante, caracterizado pelo isolamento social desde os primeiros meses de vida, o que sugeria tratar-se de um distúrbio de natureza inata. Conforme Batisti (2015), esses primeiros relatos indicavam que o autismo não era um distúrbio adquirido ao longo do desenvolvimento, mas sim uma condição que já se manifestava de forma precoce, sendo observável logo nos primeiros anos de vida da criança. As crianças descritas por Kanner demonstravam uma forte dificuldade de se relacionar com o meio social, além de apresentarem comportamentos repetitivos e estereotipados, como andar nas pontas dos pés, balançar o corpo e manter fixação em determinados objetos ou rotinas. Mesquita et al. (2013) acrescentam que uma das características marcantes desse grupo de crianças era o “desligamento” do mundo ao redor, o que se evidenciava na ausência de respostas a estímulos sociais, como o contato visual ou a busca por interação com outras pessoas. O termo “autismo” tem origem no radical grego “autos”, que significa “de si mesmo”, o que reforça essa ideia de isolamento e fechamento em relação ao mundo externo. A etimologia do termo, conforme Mesquita (2013, p. 324), já sugere a principal característica do transtorno: a dificuldade de interação e a limitação no estabelecimento de vínculos sociais espontâneos e recíprocos. Posteriormente, em 1944, Hans Asperger – também psiquiatra austríaco – ampliou as descrições feitas por Kanner, incluindo na sua observação casos de crianças com comprometimento orgânico, mas com certo grau de desenvolvimento cognitivo preservado. Essa diferenciação entre os tipos de manifestações do transtorno contribuiu para o entendimento de que o autismo poderia apresentar diferentes níveis de gravidade e formas de expressão. Bosa (2002) destaca que, apesar das descrições distintas, tanto Kanner quanto Asperger concordavam em aspectos centrais, como a dificuldade de comunicação, o prejuízo nas interações sociais e a rigidez comportamental, sendo o relacionamento interpessoal prejudicado de forma significativa em todos os casos analisados. Com o passar dos anos, o autismo passou a ser objeto de intensa investigação científica, o que proporcionou uma ampliação do conhecimento a respeito da condição e possibilitou avanços importantes tanto no diagnóstico quanto no tratamento. Graças a esses estudos, novas abordagens terapêuticas foram desenvolvidas, visando promover o desenvolvimento global das pessoas com TEA. Dentre essas intervenções destacam-se a terapia da fala, a linguagem pragmática e sócio-pragmática, o PECS (Picture Exchange Communication System), a comunicação facilitada, os métodos desenvolvimentistas, o programa TEACCH (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados à Comunicação), além da terapia fonoaudiológica e da Análise Comportamental Aplicada (ABA), conforme citado por Mesquita et al. (2013). Dessa forma, este trabalho se propõe a aprofundar o conhecimento sobre o Transtorno do Espectro Autista, destacando suas principais características clínicas, critérios diagnósticos, manifestações comportamentais e alternativas de tratamento, a fim de contribuir com a compreensão e o acolhimento adequado de indivíduos diagnosticados com TEA. Trata-se de um tema de extrema relevância social, educacional e científica, especialmente em virtude do aumento da prevalência dos casos nas últimas décadas, e da necessidade de inclusão efetiva dessas pessoas na sociedade.

 

 

DESENVOLVIMENTO

 

2.1 DEFINIÇÃO: Transtorno do Espectro Autista

 

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é classificado como um distúrbio do neurodesenvolvimento que compromete de forma significativa diversas áreas da vida da pessoa diagnosticada. Segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – 5ª edição (DSM-5), publicado pela American Psychiatric Association (2013), o TEA é caracterizado por déficits persistentes na comunicação e na interação social, aliados à presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Essas características não são eventuais, mas manifestam-se desde os estágios iniciais do desenvolvimento e afetam o funcionamento cotidiano da criança, interferindo nas suas relações sociais, escolares e familiares (BRASILIENSE, et al., 2018).

As manifestações do autismo podem variar bastante de uma criança para outra. Há casos em que os sinais se tornam evidentes ainda nos primeiros meses de vida, enquanto em outros só se tornam perceptíveis por volta dos dois ou três anos, quando a criança começa a frequentar ambientes sociais mais complexos, como a escola. O prejuízo na interação social pode incluir desde a ausência de contato visual e dificuldades em iniciar ou manter uma conversa, até comportamentos inapropriados em contextos sociais. Brasileense et al. (2018) observam que tais dificuldades impactam diretamente a capacidade da criança de desenvolver autonomia e compreender as regras sociais implícitas no convívio com outras pessoas, prejudicando seu processo de aprendizagem e de inserção na sociedade.

Um exemplo claro desse comprometimento é a forma como as crianças com autismo interagem com os colegas no ambiente escolar. Muitas vezes, preferem brincar sozinhas, apresentam dificuldade para compreender a linguagem corporal ou expressões faciais dos outros, e podem não responder quando são chamadas pelo nome. Essa limitação na comunicação não verbal é uma das marcas do TEA. Almeida (2018) aponta que:

 

A marca do TEA é o déficit na comunicação não verbal que varia desde a total falta de expressão facial até a inexistência da integração da comunicação gestual (contato visual, sorriso, apontar, acenar com a cabeça, mandar beijo, dar de ombros) com a comunicação verbal. A linguagem receptiva, geralmente, é menos comprometida do que a linguagem expressiva em crianças altamente verbais com TEA. (ALMEIDA, et al., 2018, p. 73 ).

 

Além disso, outra característica frequentemente observada em crianças com TEA é a presença de padrões restritivos e repetitivos de comportamento. Isso inclui desde a repetição contínua de palavras ou frases que ouviram anteriormente – fenômeno conhecido como ecolalia – até comportamentos motores estereotipados, como balançar o corpo, bater palmas, sacudir as mãos ou andar constantemente nas pontas dos pés. Esses movimentos muitas vezes surgem como uma forma de autorregulação diante de situações que provocam ansiedade, frustração ou excitação (ALMEIDA, et al., 2018).

Outro aspecto que merece destaque são as dificuldades no brincar simbólico. Enquanto crianças neurotípicas utilizam o brinquedo como forma de simular situações da vida real (como brincar de casinha, escolinha ou dirigir um carrinho), crianças com autismo tendem a se fixar em detalhes específicos dos objetos – como rodas de um carro ou etiquetas de um brinquedo – e a realizar ações repetitivas, sem o uso do faz-de-conta. Esse tipo de brincadeira revela, segundo Almeida (2018), uma limitação na criatividade e na flexibilidade cognitiva, habilidades essenciais para o desenvolvimento emocional e social.

A gravidade do transtorno varia bastante entre os indivíduos, podendo ser classificada em três níveis de suporte, conforme descrito pelo DSM-5 e complementado por Pedrosa (2015). O nível 1 é caracterizado por indivíduos que necessitam de apoio, apresentando dificuldades notáveis na comunicação social, mas com capacidade de interação em determinados contextos. O nível 2 inclui casos que exigem apoio substancial, com limitações mais evidentes nas habilidades verbais e não verbais, bem como dificuldade acentuada em lidar com mudanças e aceitar estímulos novos. Já o nível 3 representa os casos mais severos, em que há necessidade de apoio muito substancial, e o comprometimento atinge praticamente todas as esferas da vida, com interações sociais quase inexistentes, dificuldades extremas de adaptação e comportamentos repetitivos intensos (PEDROSA, et al., 2015).

Além dos aspectos cognitivos e comportamentais, o TEA também pode comprometer o desenvolvimento motor da criança. Muitas apresentam atraso na coordenação motora fina, o que afeta habilidades como segurar o lápis corretamente, recortar com tesoura, abotoar roupas, entre outras tarefas que exigem precisão e controle. Esse comprometimento impacta diretamente o desempenho escolar e a independência nas atividades do dia a dia  (ALMEIDA, et al., 2018).

Os padrões de comportamento também incluem rigidez alimentar, sensibilidade sensorial exacerbada (como reações exageradas a sons, luzes ou texturas), apego a rotinas rígidas e resistência a mudanças. Por exemplo, uma criança com TEA pode recusar alimentos por causa da cor, cheiro ou textura, ou ainda reagir de forma intensa ao barulho de uma sirene ou ao toque de determinada roupa. Essas respostas são manifestações da forma como o cérebro do indivíduo com autismo processa os estímulos do ambiente – muitas vezes de maneira amplificada ou atenuada, dificultando a adaptação a situações comuns (ALMEIDA, et al., 2018).

 

2.2  DIAGNÓSTICO E SINTOMAS

 

O diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um processo complexo e multifatorial, que envolve a análise de uma variedade de sintomas comportamentais e comunicativos. Para que esse diagnóstico seja feito de maneira precisa, é essencial a atuação de uma equipe multidisciplinar formada por profissionais da saúde e da educação, como psicólogos, fonoaudiólogos, neuropediatras, pedagogos e terapeutas ocupacionais. Esses profissionais são responsáveis por avaliar a criança em diferentes contextos, considerando tanto os aspectos clínicos quanto o histórico social e afetivo, além de observar o desenvolvimento neuropsicomotor (ALMEIDA, et al., 2018).

De acordo com Almeida (2018), o diagnóstico do autismo não é baseado em exames laboratoriais ou de imagem, como acontece em outras condições médicas. Trata-se de um diagnóstico eminentemente clínico, fundamentado na observação do comportamento da criança, no relato dos pais e responsáveis, e na aplicação de instrumentos específicos validados cientificamente. Entre os principais sinais de alerta que podem indicar o risco de autismo estão: a ausência de balbucios ou tentativas de comunicação verbal aos 6 meses de idade; ausência de gestos comunicativos, como apontar ou acenar, aos 12 meses; ausência de fala funcional com frases de duas ou mais palavras aos 24 meses; e a perda de habilidades previamente adquiridas, tanto verbais quanto não verbais, em qualquer momento do desenvolvimento.

Diante da identificação de tais sinais, o pediatra deve encaminhar a criança para uma avaliação especializada. Nesse contexto, são frequentemente utilizados protocolos e instrumentos padronizados para triagem e apoio ao diagnóstico, como o ADI-R (Entrevista Diagnóstica para o Autismo) e o ADOS-2 (Escala de Observação para Diagnóstico do Autismo). Esses instrumentos permitem uma avaliação estruturada e comparável de comportamentos típicos do espectro autista, aumentando a confiabilidade do diagnóstico  (ALMEIDA, et al., 2018).

Vale ressaltar que a confirmação do TEA nem sempre ocorre de forma precoce, principalmente em países como o Brasil, onde ainda há desigualdades no acesso a serviços especializados. O diagnóstico precoce, entretanto, é fundamental para o prognóstico, pois quanto mais cedo se inicia o processo de intervenção, maiores são as chances de a criança desenvolver habilidades funcionais que favoreçam sua autonomia e inclusão social. Crianças diagnosticadas até os dois ou três anos de idade têm maiores possibilidades de responder positivamente aos tratamentos e de se adaptar ao ambiente escolar e familiar com menor sofrimento emocional (ALMEIDA, et al., 2018).

Os sintomas do TEA costumam se tornar mais evidentes entre o primeiro e o segundo ano de vida. Em muitos casos, observa-se um período inicial de desenvolvimento aparentemente típico, seguido por uma regressão em aspectos como a linguagem e a interação social. Essa regressão ocorre em cerca de 30% dos casos, conforme relatado por Almeida (2018), e representa uma das maiores preocupações para os pais e educadores. A criança pode parar de falar palavras que já havia aprendido ou deixar de responder quando chamada pelo nome, além de perder o interesse por brincadeiras interativas.

Além dos sintomas ligados à comunicação e à interação social, o autismo também envolve padrões comportamentais restritos e repetitivos. Esses padrões podem se manifestar de várias formas, como movimentos estereotipados (bater palmas, sacudir as mãos, andar em círculos), repetição de palavras ou frases ou interesse intenso e fixo por determinados objetos ou temas. A ecolalia, por exemplo, é uma forma comum de linguagem repetitiva, em que a criança repete de forma automática o que ouviu, sem necessariamente compreender o significado (ALMEIDA, et al., 2018).

De acordo com Almeida et al. (2018), outra manifestação importante é a presença de alterações sensoriais, como hipersensibilidade (resposta exagerada) ou hipossensibilidade (resposta diminuída) a estímulos visuais, auditivos, táteis, gustativos ou olfativos. Uma criança com TEA pode reagir com irritação a sons considerados comuns, como o de um aspirador de pó, ou pode não se incomodar com estímulos normalmente dolorosos, como um machucado ou um corte. Esse processamento sensorial atípico contribui para a dificuldade em lidar com ambientes sociais complexos, como escolas e festas, que costumam apresentar uma variedade de estímulos simultâneos.

Em relação ao contexto alimentar, muitas crianças autistas demonstram seletividade alimentar extrema, recusando alimentos com determinadas cores, texturas ou cheiros. Isso pode gerar complicações nutricionais, além de tornar mais difícil a convivência social durante as refeições em casa ou na escola. A rigidez comportamental também se manifesta na necessidade de manter rotinas fixas: mudanças bruscas na organização do dia, como uma alteração no trajeto até a escola, podem gerar crises de ansiedade, irritabilidade ou comportamentos agressivos (ALMEIDA, et al., 2018).

Estudos de prevalência têm apontado um aumento significativo nos diagnósticos de TEA nas últimas décadas. De acordo com Almeida (2018)

 

Segundo as estimativas do estudo Autism and Developmental Disabilities Monitoring (ADDM), a prevalência de TEA em crianças de 8 anos nos Estados Unidos aumentou de 1/150 no ano de 2000, para 1/88 em 2008 e 1/68 no ano de 2012. No Brasil, em 2010, a estimativa foi de 500 mil autistas. O TEA é diagnosticado em todos os grupos raciais, étnicos e socioeconômicos (ALMEIDA,  et al, 2018, p. 73).

 

Mais recentemente, Nunes (2021) aponta que o número pode ter aumentado ainda mais, atingindo 1 em cada 54 crianças. No Brasil, embora os dados sejam escassos e muitas vezes subnotificados, estima-se que cerca de 600 mil pessoas possam estar dentro do espectro autista, segundo a Associação Brasileira de Autismo.

A literatura também revela que há uma incidência significativamente maior do TEA entre meninos do que entre meninas. A proporção é estimada em cerca de 4 para 1, o que levou a escolha da cor azul como símbolo internacional do autismo. Além disso, estudos genéticos mostram que irmãos de crianças autistas têm maior probabilidade de também desenvolverem o transtorno, com risco de recorrência até 25% quando dois irmãos já foram diagnosticados (ALMEIDA, et al., 2018).

O reconhecimento da importância do diagnóstico e da inclusão de pessoas com TEA levou a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2008, a instituir o dia 2 de abril como o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. A data visa promover a informação, combater o preconceito e mobilizar a sociedade para garantir os direitos das pessoas com autismo, estimulando políticas públicas mais eficazes de saúde, educação e assistência social (PEDROSA, 2015).

 

2.3  TRATAMENTO

 

O tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA) exige uma abordagem abrangente, individualizada e multidisciplinar, uma vez que cada indivíduo apresenta manifestações distintas do transtorno, que variam em intensidade e forma. Atualmente, não há cura para o autismo e nem medicamentos específicos que eliminem os sintomas centrais do TEA, como os déficits na comunicação social e os comportamentos repetitivos. No entanto, é possível melhorar significativamente a qualidade de vida da criança e de sua família por meio de intervenções precoces e contínuas, adaptadas às necessidades particulares de cada caso (PEDROSA, 2015).

Apesar da inexistência de uma medicação própria para o autismo em si, em muitos casos são prescritos medicamentos com o objetivo de controlar sintomas associados, como hiperatividade, crises de agressividade, ansiedade, insônia, depressão, distúrbios do humor e comportamentos autolesivos, assim afirmado por Pedrosa (2015),

 

Existem diversas medicações, desenvolvidas para outras situações que são eficientes para tratar alguns dos sintomas e dos comportamentos encontrados frequentemente nas pessoas com autismo. Alguns destes sintomas incluem: ansiedade, impulsividade, dificuldades de atenção e hiperatividade (Pedrosa, 2015, apud Brasil, 2013). Dentre os fármacos usados para o tratamento são: Paxil, Ritalin, Risperal, Prozac, Addrerall, tendo ainda Desipramina e Nortiptylina (anti-depressivos tricíclicos), estabilizadores de humor (Valproate, Lítio), beta bloqueadores (Nadolol, Clonidina), a Clomipramina e a Fluoxetina. O objetivo da medicação é diminuir estes comportamentos para permitir que as pessoas com autismo tenham vantagem nos tratamentos educacionais e comportamentais (PEDROSA, 2015, p. 9, apud VARGAS; SCHIMIDT, 2011).

 

Entretanto, é fundamental destacar que a prescrição de medicamentos deve ser cuidadosamente avaliada por um profissional habilitado, com monitoramento contínuo dos efeitos adversos. O uso de remédios é considerado apenas uma parte do tratamento e, sozinho, não proporciona avanços significativos em aspectos essenciais, como a aquisição da linguagem, a interação social e o desenvolvimento cognitivo. Por isso, o enfoque principal do tratamento do TEA recai sobre as terapias comportamentais, educacionais e de desenvolvimento (MESQUITA, 2013).

Segundo Mesquita (2013), o sucesso das intervenções depende da precocidade do diagnóstico, do nível de comprometimento da criança e da qualificação dos profissionais envolvidos. A atuação de uma equipe multidisciplinar é imprescindível, pois o tratamento do autismo exige integração entre diferentes especialidades, como psicologia, pedagogia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e neurologia.

Dentre as terapias utilizadas, destaca-se a fonoaudiologia, que tem um papel fundamental no tratamento de crianças com autismo, sobretudo em relação ao desenvolvimento da linguagem verbal e não verbal. A comunicação é uma das áreas mais afetadas no TEA, e muitos pais procuram ajuda ao perceberem que seus filhos não desenvolvem a fala de forma esperada. A terapia fonoaudiológica trabalha o aumento do vocabulário, a emissão de sons, a construção de frases e a interpretação dos contextos comunicativos. De acordo com Mesquita (2013), essa abordagem tem apresentado resultados expressivos, com ganhos qualitativos e quantitativos na linguagem após intervenções adequadas, como o aumento no número de palavras emitidas, maior uso espontâneo da fala e melhoria na entonação.

Além disso, diversas abordagens terapêuticas têm sido criadas ou adaptadas para atender às necessidades específicas de indivíduos com TEA. Um exemplo é o PECS (Picture Exchange Communication System), um sistema de comunicação alternativa baseado na troca de figuras. Ele permite que a criança autista se comunique apontando ou entregando imagens que representam desejos, sentimentos ou objetos, facilitando a interação com o ambiente e com as pessoas. Esse método é bastante utilizado para crianças não verbais ou com dificuldades severas na fala, promovendo avanços importantes na comunicação funcional (MESQUITA, 2013).

Outra técnica amplamente utilizada é o TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handicapped Children), que foi desenvolvido na Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. O TEACCH enfatiza a organização do ambiente físico, o uso de apoios visuais (como quadros de rotina, agendas e painéis) e a previsibilidade das atividades diárias, com o objetivo de diminuir a ansiedade e aumentar a autonomia da criança. Essa abordagem prioriza o ensino estruturado, respeitando o ritmo e os interesses do indivíduo autista. Segundo Cavalcanti (2014, apud Cunha, 2011), o TEACCH também tem como meta adaptar o ambiente à criança e não forçá-la a se adaptar a um padrão rígido, o que é extremamente relevante diante das dificuldades de flexibilidade comportamental características do TEA.

A linguagem pragmática e sócio-pragmática é outro campo explorado nas terapias de comunicação, focando no uso da linguagem em contextos reais e sociais. O objetivo dessas intervenções é ensinar a criança a se comunicar de maneira funcional, compreendendo o contexto, o momento certo para falar, e o uso adequado da linguagem corporal e da entonação. De acordo com Mesquita (2013),

 

Em estudos realizados durante a terapia da linguagem, contextos que forneciam atenção e jogos compartilhados maximizavam o uso comunicativo da linguagem, ao passo que contextos pobres (com cadeiras e meses, por exemplo) não atingiam o mesmo efeito (MESQUITA, 2013, p. 327).

 

Assim, contextos ricos em interações sociais, como atividades lúdicas e brincadeiras compartilhadas, são os que mais favorecem o desenvolvimento da linguagem pragmática, em comparação com situações formais ou estruturadas de forma rígida (MESQUITA, 2013).

Além dessas estratégias, destaca-se a Análise Comportamental Aplicada (ABA - Applied Behavior Analysis), uma das abordagens mais estudadas e utilizadas no tratamento do autismo. O método ABA baseia-se na identificação e modificação de comportamentos, reforçando positivamente aqueles socialmente adequados e reduzindo os comportamentos inadequados ou disfuncionais. A ABA é composta por programas estruturados, com objetivos específicos, definidos de forma individualizada, e que são constantemente avaliados e ajustados conforme o progresso da criança. Conforme afirma Cavalcante (2014, p. 8),

 

O método ABA permite que a criança aprenda de forma mais agradável por meio de estímulos, onde os comportamentos inadequados são analisados antes de qualquer intervenção na perspectiva de descobrir o que promove esses comportamentos. Esses estímulos são relevantes para que se compreenda a melhor forma de lhe dar com cada criança com foco em suas necessidades subjetivas.

 

A escolha da intervenção adequada deve levar em consideração fatores como idade, nível de comprometimento, habilidades pré-existentes e histórico familiar. Em muitos casos, é necessário ensinar habilidades básicas do dia a dia, como o uso do banheiro, a alimentação independente e a autorregulação emocional em situações desafiadoras. Para isso, elabora-se um Plano de Intervenção Individualizado, que define metas terapêuticas específicas e estratégias para alcançá-las, considerando o potencial de desenvolvimento da criança. Pedrosa (2015, apud Surós, 2009; Borges et al., 2010) reforça que essas intervenções devem ser adaptadas sempre que necessário, principalmente quando não apresentam os resultados esperados.

Outro aspecto importante do tratamento é o uso de métodos lúdicos, como jogos, histórias e atividades simbólicas, que estimulam a criatividade, a cognição e a socialização, assim afirmado por Pedrosa (2015)

 

No caso das Habilidades como a Comunicativa Verbal (HCV) são necessárias abordagens diferentes como inserir atividades lúdicas, jogos com regras e contos de histórias, Aumentativa e Alternativa (CAA) para desenvolver a linguagem oral, além de usar o sistema temporal, aonde as sessões vão diminuído sistematicamente à medida que os resultados aparecem. (PEDROSA, 2015, apud PESSIM; HAFNER, 2011; DRUMMOND, 2013)

 

Esses recursos permitem que a criança aprenda de forma mais leve e prazerosa, facilitando o desenvolvimento da linguagem e da empatia. Pedrosa (2015) também aponta que o uso da Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA), como o uso de figuras, gestos e sinais, pode ser essencial para desenvolver a linguagem oral, especialmente em crianças não verbais. Tais recursos são aplicados gradualmente, conforme os avanços da criança, com sessões sistematicamente ajustadas ao progresso individual.

Por fim, é importante destacar que o prognóstico do TEA depende de três fatores principais: a idade em que a criança recebe o diagnóstico, a precocidade do início do tratamento e o grau de comprometimento nas áreas da linguagem, cognição e interação social. Quanto mais precoce e intensa for a intervenção, maiores são as chances de desenvolvimento de habilidades e de uma vida mais funcional e independente para a criança. Portanto, é essencial que pais, educadores e profissionais da saúde estejam atentos aos sinais do autismo e atuem de maneira colaborativa, garantindo um suporte eficaz e humanizado (MESQUITA, 2013).

 

 

CONCLUSÃO

 

A partir dos estudos realizados e das evidências analisadas por meio da revisão bibliográfica, foi possível compreender de forma mais aprofundada que o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição complexa do neurodesenvolvimento, que afeta a comunicação, a interação social e o comportamento de forma variável, exigindo uma abordagem diferenciada para cada indivíduo. A prevalência crescente do TEA, conforme apontam as estatísticas nacionais e internacionais, indica uma necessidade urgente de se ampliar o debate público e científico sobre o transtorno, bem como de garantir políticas públicas voltadas para o diagnóstico precoce, tratamento eficaz e inclusão social.

O autismo deixou de ser uma condição rara, e hoje compreende uma diversidade de perfis e manifestações, o que justifica o uso da terminologia "espectro". Este aspecto destaca a importância de se observar os sinais desde os primeiros meses de vida, uma vez que o diagnóstico precoce possibilita o início imediato das intervenções, o que está diretamente relacionado a melhores prognósticos no desenvolvimento da criança. O reconhecimento e a compreensão dos sintomas, como os déficits na linguagem, dificuldades na interação social, comportamentos repetitivos e interesses restritos, são fundamentais para que pais, cuidadores e profissionais da saúde possam agir com agilidade e precisão.

Ao longo do trabalho, foi possível observar que não existe um tratamento único e definitivo para o autismo, mas sim um conjunto de estratégias terapêuticas que, quando bem aplicadas, proporcionam melhorias significativas na qualidade de vida da pessoa com TEA e de sua família. As intervenções variam desde o uso de medicamentos para tratar sintomas associados até terapias comportamentais, fonoaudiológicas e métodos educacionais estruturados, como ABA, TEACCH e PECS. Essas abordagens devem ser planejadas de forma individualizada, levando em consideração o grau de comprometimento, as habilidades específicas da criança e seu histórico familiar e social.

Outro aspecto fundamental é a atuação de uma equipe multidisciplinar, composta por profissionais de diferentes áreas, que atuam de maneira integrada para promover o desenvolvimento global da criança. O envolvimento da família também é imprescindível, pois ela exerce um papel de apoio, continuidade e reforço das práticas terapêuticas fora do ambiente clínico ou escolar.

Além disso, destaca-se a importância da conscientização social sobre o autismo, combatendo o preconceito e promovendo a inclusão das pessoas com TEA em todos os espaços da sociedade. A celebração do Dia Mundial da Conscientização do Autismo, instituído pela ONU em 2 de abril, é uma das formas de mobilizar a sociedade em torno dessa causa, mas é necessário que o engajamento seja contínuo e vá além de uma data simbólica.

Portanto, embora não exista um caminho único, a chave para o sucesso do tratamento está na individualização das intervenções, na detecção precoce dos sintomas, na atuação interdisciplinar e no compromisso da sociedade com a inclusão. Investir em pesquisas, formação profissional e políticas públicas voltadas para o TEA é uma medida não apenas necessária, mas urgente, para garantir uma vida mais digna, plena e funcional às pessoas com autismo.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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