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O ensino da matemática na Base Nacional Comum curricular: críticas e reflexões

Andréa Bezerra Ferreira

Dayane Ferreira Amaral Côrtes

Flávia Michelle Ferreira Oliveira

Lígia Mara Ormond Pereira

Maria José Nunes Mota

 

DOI: 10.5281/zenodo.13854833

 

 

RESUMO

O ensino de matemática é crucial para o desenvolvimento cognitivo e social dos alunos, desempenhando um papel central na formação de cidadãos críticos e competentes. A escola, como espaço privilegiado de promoção do conhecimento, enfrenta desafios significativos na implementação de diretrizes curriculares e na superação de desigualdades educacionais. Este estudo analisa o ensino de matemática no Brasil com base nos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) dos anos de 2011, 2015, 2017, 2019 e 2021. Os dados revelam uma evolução moderada nas médias de proficiência, com melhorias pontuais, mas também evidenciam desigualdades regionais persistentes e impactos negativos da pandemia de COVID-19 no desempenho dos alunos. Críticas à BNCC apontam para a falta de clareza nas orientações, excesso de conteúdo e insuficiente ênfase na resolução de problemas e aplicação dos conceitos matemáticos na realidade (Lira, 2018; Andrade e Moreira, 2019; Santos, 2021). A análise destaca a necessidade de políticas públicas inclusivas e formação contínua dos professores para promover uma educação matemática equitativa e de qualidade.

 

Palavras chave: Desenvolvimento cognitivo e social. Promoção do conhecimento. Superação de desigualdades

 

 

O ensino de matemática no Brasil enfrenta desafios significativos que impactam diretamente a formação dos estudantes e a qualidade da educação básica. A matemática, como disciplina fundamental, está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento cognitivo e ao raciocínio lógico dos alunos. No contexto brasileiro, a implementação de avaliações externas, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), desempenha um papel crucial na análise da qualidade educacional. O SAEB fornece dados essenciais que permitem a formulação de políticas públicas e a implementação de práticas pedagógicas voltadas para o aprimoramento do ensino e da aprendizagem da matemática.

Este estudo tem como objetivo principal realizar uma análise crítica do ensino de matemática no Brasil, utilizando os dados fornecidos pelos relatórios do SAEB. Para tanto, serão identificadas tendências nos resultados das avaliações de matemática ao longo dos anos, destacando possíveis avanços ou retrocessos. Além disso, o estudo examinará os desafios enfrentados pelos professores na prática pedagógica, considerando suas percepções sobre o impacto das avaliações externas. Será explorada também a utilização de tecnologias digitais como ferramentas didático-pedagógicas no ensino de matemática, avaliando seu potencial de transformação no contexto educacional. Por fim, discutirá a aplicabilidade da Educação Matemática Crítica (EMC), enfatizando suas contribuições para o desenvolvimento de habilidades matemáticas, políticas e sociais.

A relevância deste estudo reside na necessidade de aprimorar a qualidade do ensino de matemática no Brasil, fundamental para o desenvolvimento educacional e social dos estudantes. A análise crítica dos resultados do SAEB permitirá identificar áreas que necessitam de melhorias e propor intervenções pedagógicas que promovam uma educação mais equitativa. Além disso, compreender a percepção dos professores e explorar o uso de tecnologias digitais no ensino de matemática são aspectos essenciais para a formulação de políticas públicas que busquem uma educação mais inclusiva e transformadora. A discussão sobre a Educação Matemática Crítica oferece uma perspectiva teórica que pode enriquecer o debate sobre as práticas pedagógicas e suas implicações para a formação cidadã dos alunos.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece diretrizes para o ensino de matemática no Brasil, visando garantir uma formação sólida e equitativa para todos os alunos. Andrade & Moreira (2019) destacam que a BNCC busca uniformizar os conteúdos e competências essenciais que devem ser desenvolvidos ao longo da educação básica, promovendo um currículo integrado e contextualizado.

Segundo Lira (2018), a implementação da BNCC implica uma revisão das práticas pedagógicas e da formação docente, exigindo que os professores se adaptem a novas metodologias de ensino que favoreçam o desenvolvimento do pensamento crítico e a aplicação prática dos conhecimentos matemáticos. As diretrizes da BNCC também enfatizam a importância da resolução de problemas e do raciocínio lógico, preparando os alunos para enfrentar os desafios da vida cotidiana e do mundo do trabalho.

No campo das teorias de ensino e aprendizagem de matemática, a abordagem etnomatemática proposta por Ubiratan D'Ambrósio (1998) destaca a importância de contextualizar o ensino da matemática nas práticas culturais dos alunos. D'Ambrósio argumenta que a matemática deve ser compreendida como uma construção humana, presente em todas as culturas e contextos sociais. A etnomatemática valoriza os conhecimentos matemáticos tradicionais e busca integrá-los ao currículo escolar, promovendo uma educação mais inclusiva e relevante.

Por outro lado, Paulo Freire (1970), com sua pedagogia crítica, enfatiza a necessidade de uma educação que promova a conscientização e a transformação social. Freire critica o modelo tradicional de ensino, que considera opressor e alienante, propondo uma pedagogia que valorize o diálogo, a reflexão e a participação ativa dos alunos no processo de aprendizagem.

As avaliações externas, como o SAEB, desempenham um papel crucial na análise da qualidade da educação no Brasil. Essas avaliações fornecem dados que permitem identificar problemas e direcionar políticas públicas voltadas para a melhoria do ensino. O conceito de qualidade da educação, entretanto, é complexo e multifacetado, indo além dos resultados obtidos em testes padronizados. Veríssimo (2021) critica a dependência excessiva das avaliações externas como indicadores exclusivos de qualidade, argumentando que muitas vezes elas não consideram o contexto sociocultural dos estudantes. No entanto, ela também reconhece que essas avaliações podem fornecer informações valiosas para a formulação de políticas educacionais mais equitativas.

Santos (2017), ao discutir a Educação Matemática Crítica, destaca a importância de uma abordagem pedagógica que considere as dimensões políticas e sociais do conhecimento matemático. A Educação Matemática Crítica visa desenvolver nos alunos habilidades que vão além do conhecimento técnico, preparando-os para serem cidadãos críticos e participativos.

Este estudo adota uma abordagem descritiva e analítica para examinar o ensino de matemática no Brasil, utilizando dados fornecidos pelos relatórios do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) dos anos de 2011, 2015, 2017, 2019 e 2021. A pesquisa descritiva detalha e caracteriza o cenário atual do ensino de matemática com base nos dados do SAEB, enquanto a análise comparativa examina mudanças e padrões ao longo do tempo, conforme os fundamentos apresentados por Marconi e Lakatos (2017).

A análise dos dados segue uma abordagem comparativa. Primeiramente, comparam-se as médias de proficiência em matemática entre os anos de 2011, 2015, 2017, 2019 e 2021, destacando variações e possíveis fatores contribuintes para essas mudanças. Em seguida, avalia-se a distribuição percentual dos alunos por níveis de proficiência nos diferentes anos, identificando tendências de melhoria ou declínio. O desempenho dos alunos em diferentes regiões do Brasil e em diferentes tipos de escolas também é comparado, buscando identificar desigualdades regionais e administrativas. Por fim, são investigados os efeitos da pandemia de COVID-19 sobre o desempenho dos alunos em 2021, com base nos dados fornecidos pelos relatórios e em informações adicionais sobre a adaptação das práticas pedagógicas durante este período.

A metodologia descrita proporciona uma estrutura robusta para a análise crítica do ensino de matemática no Brasil, utilizando os dados do SAEB como base empírica. Ao combinar uma abordagem descritiva com análises comparativas, este estudo busca oferecer uma visão aprofundada sobre as tendências e os desafios enfrentados no ensino de matemática, além de sugerir caminhos para a melhoria contínua da educação matemática no país.

Os dados dos relatórios do SAEB de 2011 a 2021 fornecem uma visão detalhada sobre o desempenho dos alunos em matemática em diferentes níveis de ensino. Em 2011, a média nacional de proficiência em matemática no 5º ano do ensino fundamental foi de 221 pontos, enquanto no 9º ano foi de 256 pontos e no ensino médio foi de 267 pontos. Em 2015, a média para o 5º ano foi de 219 pontos, no 9º ano foi de 256 pontos e no ensino médio permaneceu em 267 pontos. Em 2017, a média no 5º ano subiu para 224 pontos, no 9º ano foi de 262 pontos e no ensino médio foi de 267 pontos. Em 2019, as médias foram de 220 pontos no 5º ano, 259 pontos no 9º ano e 270 pontos no ensino médio. Finalmente, em 2021, as médias foram de 219 pontos no 5º ano, 256 pontos no 9º ano e 267 pontos no ensino médio.

 

Tabela 1 - Médias de Proficiência em Matemática (SAEB 2011-2021)

 

Ano 5º Ano Ensino Fundamental (EF) 9º Ano Ensino Fundamental (EF) 3ª Série Ensino Médio (EM) Observações
2011 221 256 267 Desempenho inicial, com disparidades regionais significativas.
2015 219 256 267 Pequena queda na proficiência do 5º ano, manutenção das médias nos outros níveis.
2017 224 262 267 Melhoria pontual nas médias de proficiência, especialmente no 5º e 9º anos.
2019 220 259 270 Melhoria contínua nas médias, com destaque para o ensino médio.
2021 219 256 267 Impacto da pandemia de COVID-19 resultando em queda nas médias de proficiência, aumento das desigualdades.

 

Legenda:

  • EF: Ensino Fundamental
  • EM: Ensino Médio

Fonte: Dados adaptados dos relatórios do SAEB (INEP, 2011, 2015, 2017, 2019, 2021).

A análise das médias de proficiência ao longo dos anos mostra variações moderadas, com algumas melhorias pontuais, especialmente entre 2017 e 2019. No entanto, a pandemia de COVID-19 em 2021 interrompeu essa tendência, resultando em uma ligeira queda nas médias de proficiência. A distribuição dos alunos por níveis de proficiência também revela disparidades significativas, com uma porcentagem considerável de alunos situando-se nos níveis mais baixos de proficiência, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.

Comparando os resultados ao longo dos anos, observa-se que, embora tenha havido algumas melhorias nas médias de proficiência, estas não foram suficientes para reduzir significativamente as desigualdades regionais e administrativas. A evolução dos resultados indica que as políticas educacionais implementadas ao longo da década tiveram um impacto limitado na melhoria do desempenho em matemática dos alunos.

A comparação dos desempenhos entre diferentes regiões e tipos de escolas revela disparidades significativas. Estados das regiões Sudeste e Sul, como São Paulo, Paraná e Santa Catarina, consistentemente apresentaram as maiores médias de proficiência. Em contraste, estados das regiões Norte e Nordeste, como Maranhão, Alagoas e Pará, registraram as menores médias. Além disso, as escolas privadas tendem a apresentar melhores resultados em comparação com as escolas públicas, refletindo desigualdades no acesso a recursos educacionais e qualidade de ensino.

A pandemia de COVID-19 teve um impacto significativo no desempenho dos alunos em 2021. A transição para o ensino remoto, a falta de acesso equitativo à tecnologia e as condições socioeconômicas adversas exacerbaram as desigualdades existentes. Os dados de 2021 mostram uma estagnação ou ligeira queda nas médias de proficiência em matemática, indicando que a pandemia afetou negativamente a aprendizagem dos alunos. Estados com infraestrutura educacional mais precária foram os mais impactados, evidenciando a necessidade urgente de políticas públicas que mitiguem os efeitos da pandemia e promovam a equidade no acesso à educação de qualidade.

A análise dos resultados dos relatórios do SAEB de 2011 a 2021 revela tendências importantes no desempenho dos alunos em matemática. Houve melhorias pontuais nas médias de proficiência, especialmente entre 2017 e 2019, mas o progresso geral foi moderado. A pandemia de COVID-19 em 2021 trouxe uma estagnação ou queda nas médias, evidenciando a vulnerabilidade do sistema educacional frente a crises. A comparação ao longo dos anos mostra que, apesar das iniciativas políticas e educacionais, os desafios persistem, principalmente em relação à equidade e ao acesso a uma educação de qualidade.

As desigualdades regionais e administrativas são uma constante nos resultados do SAEB. Estados das regiões Sudeste e Sul consistentemente apresentam melhores desempenhos em comparação com estados das regiões Norte e Nordeste. Essa disparidade reflete diferenças socioeconômicas, qualidade da infraestrutura escolar, formação e valorização dos professores, e acesso a recursos educacionais. Além disso, as escolas privadas tendem a apresentar melhores resultados em comparação com as escolas públicas, indicando uma desigualdade de oportunidades entre os alunos.

A percepção dos professores sobre o impacto do SAEB na prática pedagógica é mista. Alguns docentes reconhecem a importância das avaliações externas como ferramenta para identificar deficiências no aprendizado e orientar políticas públicas. No entanto, muitos professores criticam o uso excessivo dessas avaliações como única medida de qualidade educacional. A pressão para "ensinar para o teste" pode limitar práticas pedagógicas mais criativas e inclusivas. A formação contínua dos professores e a valorização do seu papel são apontadas como fundamentais para a melhoria do ensino de matemática.

A pandemia de COVID-19 acelerou a adoção de tecnologias digitais no ensino de matemática. O ensino remoto se tornou uma necessidade, e ferramentas digitais passaram a ser amplamente utilizadas para manter o processo de ensino-aprendizagem. Embora as tecnologias digitais tenham potencial para enriquecer o ensino, sua eficácia depende do acesso equitativo a dispositivos e à internet, bem como da formação adequada dos professores para utilizar essas ferramentas de maneira pedagógica. A desigualdade no acesso à tecnologia exacerbou as disparidades educacionais, especialmente em regiões menos favorecidas.

A Educação Matemática Crítica (EMC) propõe uma abordagem que vai além do ensino tradicional, visando desenvolver nos alunos habilidades matemáticas, políticas e sociais. A EMC enfatiza a importância de contextualizar a matemática no cotidiano dos alunos, promovendo uma educação que valorize a reflexão crítica e a transformação social. Essa abordagem tem o potencial de tornar o ensino de matemática mais significativo e relevante, capacitando os alunos a utilizarem o conhecimento matemático como ferramenta para compreender e intervir em sua realidade social.

A análise dos dados do SAEB de 2011 a 2021 revela um progresso moderado no desempenho dos alunos em matemática, com melhorias pontuais, mas também desafios persistentes, especialmente em termos de desigualdades regionais e impacto da pandemia de COVID-19. As políticas públicas devem ser direcionadas para abordar essas disparidades e implementar intervenções pedagógicas que possam melhorar a qualidade do ensino de matemática de forma inclusiva e equitativa.

Os resultados sugerem a necessidade de políticas públicas mais inclusivas e equitativas, que considerem as especificidades regionais e as condições socioeconômicas dos alunos. É fundamental promover a formação contínua dos professores e valorizar seu papel na melhoria da educação. Além disso, a integração de tecnologias digitais no ensino deve ser acompanhada por políticas que garantam o acesso equitativo a esses recursos.

Pesquisas futuras podem explorar estratégias pedagógicas que combinem a Educação Matemática Crítica com o uso de tecnologias digitais, investigando como essas abordagens podem ser implementadas de maneira equitativa. Também é necessário investigar o impacto de políticas públicas direcionadas a reduzir as desigualdades regionais e administrativas, além de estudos longitudinais que acompanhem o desenvolvimento dos alunos ao longo de sua trajetória escolar.

 

 

Referências

 

Andrade, S. C. C. de; MOREIRA, M. A. A Base Nacional Comum Curricular e o ensino de matemática: uma análise crítica. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 41, n. 1, p. 1-11, 2019.

 

D'ambrósio, U. Etnomatemática: um programa. Campinas: Papirus, 1998.

 

Freire, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Relatório de Resultados do SAEB 2011 – Volume 2. Brasília: INEP, 2011.

 

Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Resumo dos Resultados do SAEB 2015. Brasília: INEP, 2015.

 

Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Relatório SAEB 2017. Brasília: INEP, 2019.

 

Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Relatório de Resultados do SAEB 2019 – Volume 2. Brasília: INEP, 2020.

 

Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Relatório de Resultados do SAEB 2021 – Volume 2. Brasília: INEP, 2023.

 

Lira, L. A BNCC e o ensino de matemática: uma análise crítica. Revista de Ensino, v. 22, n. 1, p. 45-53, 2018.

 

Marconi, M. A.; Lakatos, E. M. Fundamentos de Metodologia Científica. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

 

Santos, J. N. Educação Matemática Crítica: contribuições para o desenvolvimento de habilidades matemáticas, políticas e sociais em sala de aula. 2017. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Matemática) – Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei, 2017.

 

Veríssimo, T. E. O Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e a Qualidade do Ensino de Matemática. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Matemática-Licenciatura) – Universidade Federal de Pernambuco, Caruaru, 2021.