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Releitura de obras famosas na Educação Infantil

Enevania Aparecida ReducinoSgobbi

 

DOI: 10.5281/zenodo.13541898

 

 

RESUMO

As Artes entretêm e enriquecem culturalmente as pessoas de todas as faixas etárias, mas também auxiliam as crianças em seu desenvolvimento. Assim, este trabalho de pesquisa qualitativa bibliográfica aborda a releitura de obras famosas na Educação Infantil, o que se justifica pela contribuição que pode oferecer aos professorandos e professores da área educacional em questão. O objetivo geral deste estudo é investigar como as obras de arte famosas podem ser usadas em releituras para o desenvolvimento dos alunos e os objetivos específicos são pesquisar acerca da postura docente nas atividades de Artes Visuais, bem como detalhar as releituras que podem ser aplicadas no ambiente da escola. Constatou-se que a atuação docente ao longo das atividades é indubitavelmente relevante, havendo a sua orientação aos alunos para a interpretação pessoal nas releituras. Para o desenvolvimento dos alunos com as referidas atividades percebeu-se que é importante haver a formação de relações entre as representações visuais apresentadas e as vivências deles. Verificou-se também que a postura docente deve ser a de entender a arte como conhecimento e de se atualizar, sempre que possível. As releituras sugeridas envolvem autorretratos, land art e colagem, mas existem muitas opções disponíveis.

 

Palavras-chave: Releitura. Artes. Educação Infantil .

 

 

Introdução

 

As Artes possuem a magia do entretenimento e enriquecimento cultural para pessoas de todas as idades. Em se tratando das crianças, as Artes podem, ainda, auxiliá-las em seu desenvolvimento, servindo de valioso apoio para a prática pedagógica.

Este trabalho aborda a releitura de obras famosas na Educação Infantil, justificando-se pela contribuição que pode proporcionar aos professorandos e professores da área em questão .

O objetivo geral é investigar como as obras de Arte podem ser usadas em atividades de releitura para o desenvolvimento discente. Os objetivos específicos, por sua vez, são pesquisar sobre a postura docente nas atividades de Artes Visuais e detalhar tipos de releituras que podem ser aplicadas no ambiente escolar.

Questiona-se até que ponto a atuação do professor durante as atividades é relevante.

A metodologia usada neste estudo caracteriza-se como pesquisa qualitativa bibliográfica. A abordagem da pesquisa qualitativa, conforme atesta Cardano (2017), tem como característica o aprofundamento de seu estudo, necessitando de um maior domínio referente ao objeto a ser pesquisado, e resultando em uma pesquisa mais direcionada e singular. O procedimento técnico, por sua vez, é de teor bibliográfico, posto que a elaboração da pesquisa ocorre a partir de material previamente publicado (MOREIRA, 2004; WEBSTER; WATSON, 2002 apud RODRIGUES; NEUBERT, 2023).

 

 

Desenvolvimento

 

Para que as atividades de releitura de obras na Educação Infantil contribuam significativamente para o o desenvolvimento dos alunos é preciso que existam atualização docente, a fim de que a prática pedagógica não se manifeste em propostas retrógradas, bem como interação criança-arte, além da reprodução de modelos.

 

 

A docência e a atualização nas Artes Visuais

 

Freitas (2023), em análise de estudos realizados com docentes licenciadas em Artes Visuais que atuam na Educação Infantil, constatou que, mesmo se tendo identificado algumas ações que aproximavam da arte compreendida como conhecimento, ainda se nota práticas retrógradas, apontando que a formação específica nem sempre é suficiente para o trabalho nesta fase educacional. Sugere-se que o docente, após seus estudos iniciais, continue a se aprimorar, atualizando-se, sempre que for possível.

Richter (2021) pondera que , nas duas décadas mais recentes, o país tem passado por um processo que se intensifica a respeito de discussões e reflexões acerca da formação docente para o ensino das artes. De acordo com a autora, a maior parte das instituições de ensino universitário brasileiro já fez ou está fazendo modificações em seus programas, com base, principalmente, em sua tradição histórica. Assim, universidades que oferecem cursos de bacharelado em Artes Visuais tendem a estabelecer licenciaturas vinculadas à formação do artista, enquanto que as universidades que estabeleceram seus cursos de licenciatura em Educação Artística a partir da Lei 5692/71 tendem à reformulação curricular , sendo que alguns consensos têm sido procurados para que distorções geradas pelos cursos do passado do professor de Educação Artística sejam eliminadas e se efetue uma profunda reflexão referente ao ensino da arte e ao perfil do seu respectivo educador .

 

 

A criança e a Arte e interação

 

A partir do momento em que é oportunizado o trabalho envolvendo imagens de produção artística, assim como o contato com os respectivos artistas, são criadas possibilidades para o desenvolvimento das crianças em termos da relação formada entre as representações visuais e suas vivências (tanto a nível pessoal quanto grupal). Como consequência, as crianças enriquecem seu conhecimento do mundo e das linguagens das artes, instrumentalizando-as como leitoras e criadoras de trabalhos artísticos. Levando-se em consideração que a interpretação infantil ocorre de acordo com suas informações e interesses, fundamentados em suas vivencias, a releitura de obras com a apreciação e a leitura de imagens proporciona à criança o conhecimento e o estabelecimento de relações com o seu espaço cultural e social (PINHEIRO [et al.], 2017).

Mais do que simples atividades despretensiosas, a arte possui profundos significados que enriquecem as vidas das crianças:

 

[...] a arte vai muito além de meras atividades propostas para as crianças como forma de ocupar o tempo ou entretê-las, sendo uma dimensão importante da construção subjetiva de cada indivíduo, na medida em que colabora para a expressividade do sujeito para além do que o discurso verbal pode manifestar (BRITO; ALVES, 2023, p.220).

 

Logo, compreende-se que, através da arte, a criança pode se expressar de um modo diferente do efetuado somente com palavras.

Ostetto (2011 apud NASCIMENTO; CIRELE, 2021) menciona a necessidade do trabalho das diferentes linguagens na infância e critica determinadas formas de ensino das Artes porque têm havido

 

[...] a simplificação e o empobrecimento da “arte” em uma versão escolarizada, encerrada no fazer e visando a um produto, colocando em ação“o mesmo para todos”, “sigam o modelo”, “é assim que se faz”. Na Educação Infantil, frequentemente, a arte mostra-se com a roupagem de um conteúdo a ser ensinado em determinados momentos ou um conjunto de técnicas e instruções para o exercício de habilidades específicas (os “trabalhinhos” e as “atividades artísticas” vão por esse caminho) (OSTETTO, 2011, p.5 apud NASCIMENTO; CIRELE, 2021, p.113).

 

Simplesmente seguir um modelo estipulado previamente pelo professor nas atividades certamente não contribui para o desenvolvimento das crianças através da arte. Por outro lado, explorar as possibilidades de conhecimento contidas nas variadas modalidades artísticas existentes é permitir que os alunos se aprimorem. Freitas (2023) afirma que

 

[...] as Artes Visuais, como uma de suas linguagens e o desenho, o artesanato, a escultura, o cinema e tantas outras modalidades artísticas inseridas na grande área das Artes Visuais, são portadoras de conhecimentos próprios, que dizem respeito às formas de conversão de ideias em imagens, às percepções que despertam, as sensações que provocam e as soluções encontradas na manipulação de suas materialidades que tornam visível o que ainda não o era, por exemplo. Conhecimentos que precisam ser também despertados, refletidos e aprendidos [...] (FREITAS, 2023, p.118).

 

Percebe-se, assim, que embora seja comum associar as Artes Visuais apenas ao desenho e pintura, existem outras modalidades, como o artesanato, a escultura, ao cinema e outras, ainda.

Em relação ao desenho de observação , Barbieri (2012 apud FREITAS, 2023) elucida que a criança não reproduz necessariamente o que observa, mas torna visível o que seus olhos selecionam como significativo e que no desenho de memória, representado até na figura humana, do mesmo modo, a criança torna visível não os aspectos aparentes da imagem representada, mas uma interpretação do que observa.

 

Releituras: sugestões

 

As sugestões de releituras não se esgotam nas atividades abrangendo autorretratos, land art e colagem especificadas, mas são uma amostra expressiva do que pode ser feito com os alunos da Educação Infantil.

 

 

Autorretratos

 

Foram selecionados dois artistas estrangeiros do passado como sugestão para os autorretratos, Frida Kahlo e Vincent Van Gogh.

Através da releitura de autorretratos de artistas renomados, como Frida Kahlo e Vincent Van Gogh, as crianças podem conhecer acerca da técnica sobre um retrato ou uma imagem que o autor faz de si mesmo. Os retratos também podem conter expressões fisionômicas relevantes, como na obra “O Grito”, de Edvard Munch, e atividades relacionadas às expressões conhecidas, como demonstrar expressões de bravo, triste, feliz e assustado diante de um espelho podem ser realizadas (PINHEIRO [et al.], 2017).

Conhecendo os autorretratos de artistas , os pequenos discentes encontram uma oportunidade de se conhecerem melhor, também, pois estarão trabalhando expressões e emoções que fazem parte deles mesmos.

 

 

Land art

 

Procurou-se por um representante significativo da land art, chegando-se ao nome do artista estrangeiro, falecido, Robert Smithson.

A land art, corrente artística que apareceu ao fim da década de 1960, utilizava o meio ambiente, espaços e recursos naturais para a realização de suas obras. A proposta pedagógica da land art, por se destacar não apenas porque o material utilizado para produção das obras, costumeiramente, é retirado da natureza, organicamente, gerando um custo baixo, ou nenhum, para ser conseguido , mas também por trazer a compreensão da relevância da experiência e a discussão referente à materialidade e à efemeridade. A obra “Spiral Jetty”, do artista Robert Smithson pode ampliar o repertório visual e imagético das crianças (NASCIMENTO; CIRELE, 2021). “Spiral Jetty” foi construída com 6.650 toneladas de rocha e terra, formando uma espiral (HOLT/SMITHSON FOUNDATION, [s.d.] apud NASCIMENTO; CIRELE, 2021).

Assim, as crianças , em um primeiro momento podem desenhar ou fazer com massinha a representação inicial de algo que , posteriormente , será uma land art, por exemplo: uma espiral de folhas de árvore que será construída no pátio da escola. Nascimento e Cirele enfatizam a importância da atividade para enriquecer as experiências infantis:

 

Nesse contexto, é possível destacar que ações pedagógicas que desterritorializam espaços e extrapolam a sala de atividades se tornam potentes para movimentar os corpos, possibilitando as experiências estéticas e estésicas, tão necessárias para um ensino contemporâneo da arte (NASCIMENTO; CIRELE, 2021, p.125).

 

As atividades deslocam o ambiente tradicional de ensino e aprendizagem, a sala de aula, para outros espaços da escola, onde, com material reciclado retirado da natureza, os alunos podem vivenciar a releitura de uma land art, adaptada para a sua realidade.

 

 

Colagem

 

Para representar a arte da colagem foi escolhida a artista plástica brasileira, ainda em atividade, Beatriz Milhazes.

A artista Beatriz Milhazes realiza uma arte voltada para um trabalho mais abstrato. Suas obras, bem coloridas, são repletas de colagens, recortes, pinturas e materiais diversificados, despertando a atenção das crianças (CAMPOS, 2019).

Pode ser realizado um ótimo trabalho com alunos pequenos explorando as criações de Beatriz Milhazes, com as suas formas geométricas e as cores vivas, primárias e secundárias, presentes em suas obras . Multicoloridas, a colagem “Leblon 2”, por exemplo, possui círculos e quadrados , ao passo que “O Paraíso” contém círculos e retângulos (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL, 2022).

A colagem com material reciclado pode ser uma forma agradável e estimulante para atividades de releitura de obras de arte da autora. Braga menciona a colagem da artista feita com embalagens de chocolate chamada “Sonho de Valsa” e o processo complexo de desenvolvimento de suas produções artísticas, envolvendo materiais como folhas de plástico e tinta acrílica, em fases de preparação que podem horas ou até mesmo anos (BRAGA, 2022). O tempo das atividades, logicamente, deve ser adaptado para a prática das mesmas na escola.

 

 

Conclusão

 

As obras de Arte famosas podem ser usadas em atividades de releitura para o desenvolvimento discente, formando relações entre as representações visuais que são apresentadas e as vivências, tanto de cada criança, em sua individualidade, quanto em grupo. Assim, os alunos podem enriquecer seu conhecimento do mundo, entrando em contato com criações e criadores, e das linguagens das Artes, aproximando-se de técnicas e materiais variados, fazendo leituras de trabalhos conhecidos e releituras, com suas criações.

A atuação do professor durante as atividades é indubitavelmente relevante, havendo o empenho em orientar os alunos para que não se concentrem na reprodução das obras, mas que as interpretem de acordo com as percepções despertadas em cada trabalho. Caso contrário, as aulas de Artes abordando a releitura se converterão em meras atividades despretensiosas, como era comum em práticas pedagógicas do passado.

A postura docente nas atividades de Artes Visuais deve ser a de compreender a arte como conhecimento e de não efetuar práticas retrógradas, procurando atualizar-se, sempre que possível.

Com este trabalho, comprovou-se a existência de três ótimas opções de abordagem: usando autorretratos de artistas renomados e expressões fisionômicas conhecidas, as crianças podem trabalhar suas próprias expressões e emoções; com a land art, os trabalhos artísticos conquistam novos espaços; nas colagens inspiradas nas obras de Beatriz Milhazes, as crianças podem lidar com formas geométricas, bem como cores primárias e secundárias. Ademais, tanto na land art quanto na colagem, os alunos são estimulados a valorizar a reciclagem. Todavia, os tipos de releituras que podem ser aplicadas no ambiente escolar são muito diversificados.

 

 

Referências

 

 

BARBIERI, Stela. Interações: onde está a arte na Infância? São Paulo: Blucher, 2012.

 

BRAGA, Paula. Arte contemporânea: modos de usar. São Paulo: Editora Elefante, 2022.

 

BRITO, Isabela Sarah Trigueiro Custódio de; ALVES, Beatriz Guedes de Carvalho. A UAEI e a arte na Educação Infantil. In: SOUZA, Rayffi Gumercindo Pereira de [et al.] (Orgs.). Da creche ao colégio de aplicação: as crianças em cena na UFCG há 45 anos. Campina Grande: EDUFCG, 2023. Disponível em: http://dspace.sti.ufcg.edu.br:8080/xmlui/bitstream/handle/riufcg/34059/DA%20CRECHE%20AO%20COL%C3%89GIO%20DE%20APLICA%C3%87%C3%83O%2020EBOOK%20EDUFCG%202023.pdf?sequence=1&isAllowed=y#page=110. Acesso em: 4 fev. 2024.

 

CAMPOS, Janaina Miranda de. Um estudo sobre práticas artísticas na educação infantil: redescobrindo artistas brasileiras. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização) Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2019. Disponível :<https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/33353>. Acesso em: 3 mar. 2024.

 

ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL . Beatriz Milhazes. 2022. Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9441/beatriz-milhazes. Acesso em: 4 mar. 2024.

 

FREITAS, Ana Cláudia de Oliveira. Entre conversas e visualidades: as práticas em Artes Visuais na Educação Infantil em instituições públicas da cidade de Guanambi-BA. Dissertação (Mestrado) UFPB/CCTA. João Pessoa, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/123456789/26737. Acesso em: 20 fev. 2024.

 

HOLT/SMITHSON FOUNDATION . Spiral Jetty. Disponível em: Spiral Jetty | Holt/Smithson Foundation (holtsmithsonfoundation.org). Acesso em: 8 fev. 2024.

 

MOREIRA, Walter. Revisão de literatura e desenvolvimento científico: conceitos e estratégias para confecção. Janus, Lorena, v. 1, n. 1, p. 19-30, 2004. [Online]. Disponível em: http://www.fatea.br/janus/pdfs/1/artigo01.pdf. Acesso em: 4 mar. 2024.

 

NASCIMENTO, Thais Martins do; CIRELE, Larissa Carvalho. Land art e Educação Infantil: desterritorializando os espaços para além da sala de atividades . Revista Pró-Discente, v.27, n.2, 2021. Disponível em: https://periodicos.ufes.br/prodiscente/article/view/37268

 

RICHTER, Ivone Mendes. A formação do professor de Artes Visuais em uma perspectiva internacional: implicações para o ensino de arte no Brasil. In: OLIVEIRA, Marilda Oliveira de; HERNÁNDEZ. Fernando. A Formação do Professor e o Ensino das Artes Visuais. Editora UFSM, 2021.

 

OSTETTO, L. E. Educação infantil e arte: sentidos e práticas possíveis, 2011. Disponível em:

https://acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/320/1/01d14t01.pdf. Acesso em: 8 fev. 2024.

 

PINHEIRO, Marilene Jacobsen [et al.]. As expressões artísticas no fazer pedagógico com as crianças: releitura de obras de artes na educação infantil. In. SEMINÁRIO INSTITUCIONAL PIBID/ UNISINOS, 2. 2017, São Leopoldo.

Anais[...]. Rio Grande do Sul: Unisinos, 2017.

Disponível em: http://repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/7762. Acesso em: 4 fev. 2024.

 

RODRIGUES , Rosângela Schwarz; NEUBERT, Patricia da Silva. Introdução à pesquisa bibliográfica .[Online] Florianópolis : Editora da UFSC, 2023.Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Rosangela- Rodrigues/publication/373506797_Introducao_a_pesquisa_bibliografica/links/65 5c8dc6b1398a779da39855/Introducao-a-pesquisa-bibliografica.pdf. Acesso em: 4 mar. 2024.

 

WEBSTER, Jane; WATSON, Richard T. Analyzing the past to prepare for the future: writing a literature review. MIS Quarterly, v. 26, n. 2, p. xiii-xxiii, June 2002. [Online]. Disponível em: https://abre.ai/f9L4. Acesso em: 4 mar. 2024.