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RANÇOS SEMÂNTICOS EDUCACIONAIS NA PRODUÇÃO ACADÊMICA ATUAL DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DOCÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR DE UMA INSTITUIÇÃO NO MUNICÍPIO DE ARARAS

Maria Estela Hernandes Carlotti

Orientadora: Profa. Dra. Claudia Cristina Fiorio Guilherme

 

 

RESUMO

Este estudo teve como objetivo resgatar a produção acadêmica de alunos formados no Curso de Pós-Graduação – Especialização em Docência para o Ensino Superior de uma instituição localizada no município de Araras. Analisamos termos utilizados na Língua Portuguesa, que por questões semânticas ainda se referem às palavras remanescentes da concepção de ensino “Tradicional”. Embora os trabalhos tenham sido produzidos nos últimos quatro anos do Curso de Pós-Graduação oferecido neste local, com referenciais atualizados e novas tendências, encontramos na linguagem escrita os ranços de abordagens mais antigas e arraigadas no ideário pedagógico. Nesse sentido, problematizamos o discurso dos artigos científicos entregues como trabalho de conclusão de curso, visando encontrar as indicações de termos como, por exemplo: transmitir, reter, passar, fixação, etc. que remetam a termos de abordagens tradicionais e que nos permitiu uma análise semântica e pedagógica conflitante.

 

Palavras-chave: Conceitos educacionais. Semântica. Abordagens de ensino.

 

 

INTRODUÇÃO

 

Nos últimos anos intensificaram-se os debates e as análises sobre a produção semântica e a problematização do desempenho discursivo através da análise de produções escritas.

Desta forma torna-se relevante retomar os conceitos que envolvem os modelos semânticos a partir de referencias que problematizam a concepção de linguagem como atividade verbal e mediadora da interação humana – e como espaço da constituição dos sujeitos no mundo real.

Para tanto, a proposta incide sobre a análise da gênese e do pensamento em relação à linguagem, e as relações que se estabelecem na modelação, organização, e a orientação da atividade mental pela materialização da palavra como signo social (BAKHTIN, 1995).

Entretanto, é preciso ampliar a visão sobre linguagem entendendo como leitura, escrita, letramento, práticas e abordagens pedagógicas a colocar em evidência a premente necessidade de (re)avaliar o trabalho que está sendo produzido nas Instituições de Ensino Superior. A pesquisa buscou compreender estes ranços semânticos dentro de um processo educacional e de ensino-aprendizagem que enfrenta problemas históricos de formação dos alunos.

A discussão que se propôs nesta pesquisa consistiu em analisar os termos das produções dos TCCs - Trabalho de Conclusão de Curso - dos alunos da Pós-Graduação em Docência no Ensino Superior de uma instituição do município de Araras, à luz das concepções das abordagens de ensino tradicionais e às teorias argumentativas da língua.

A importância deste trabalho encontrou-se na possibilidade de verificar o conflito entre os vocábulos utilizados na produção dos alunos e compreender a dinâmica, as marcas, os resquícios destes termos que estão sendo superados, mas que prevalecem na escrita destes alunos, desde a formação inicial até aos trabalhos finais de conclusão de cursos.

Para buscarmos uma melhor compreensão desta questão, foi realizada uma revisão de literatura, constituída de diversos autores que discutem a concepção de linguagem, de modelos semânticos e desempenho discursivos a partir da perspectiva bakhtiniana, vygotskiana e outros autores que tratam de vínculos entre linguagem e educação.

Este trabalho está organizado em três tópicos. O primeiro refere aos aspectos teóricos que fundamentam a concepção de linguagem. O segundo concentra-se em analisar ensaios sobre modelos semânticos. O terceiro apresenta e os ranços semânticos encontrados nas produções dos TCCs dos alunos (Trabalhos de Conclusão de Curso –TCCs- apresentados no formato de artigo científico. Finalizando apresenta-se as considerações finais e as referências bibliográficas.

 

 

CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM: REFLEXÕES SOBRE OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS

 

Na perspectiva de Vygotsky (2001), o homem cria instrumentos podendo transformar e facilitar sua ação sobre a natureza. Os instrumentos desenvolvidos modificam o comportamento do homem que deixa de ter uma ação direta sobre o meio. Desta forma o ser humano transforma a natureza e a si mesmo.

Neste contexto o signo para Vygotsky (2001) constitui um instrumento psicológico usado pelo homem para representar, evocar ou tornar presente o que está ausente, por exemplo: a palavra, o desenho, os símbolos como uma bandeira ou emblema, etc.

Enquanto o instrumento está orientado externamente para modificar o ambiente, o signo é internamente orientado para modificar o funcionamento psicológico do homem (FONTANA, 1997).

Os signos e os instrumentos são usados na experiência pessoal de cada pessoa e também pela incorporação de experiências das gerações anteriores que são passadas de geração em geração; assim como a escrita, as notações musicais, as convenções gráficas e a palavra que adquirimos através da interação como outro. Por exemplo, a linguagem, que é o sistema de signos mais importante para o homem, é produto das relações históricas entre os homens.

Quanto ao pensamento e a linguagem, para Vygotsky (2001), o pensamento passa a existir por meio das palavras, ou seja, da linguagem. A linguagem tem duas funções: de intercâmbio social, que seria a necessidade comunicação que todo ser humano possui inclusive os bebês que utilizam sons, gestos, expressões para comunicarem o que precisam. E a outra função é o pensamento generalizante, ou seja, ordenar fatos, falas, objetos, tudo o que representa o real de forma que as ocorrências de uma mesma classe de eventos e situações sejam agrupadas sob o mesmo conceito. Por exemplo, a palavra ’gato’ sempre tem o mesmo significado para as pessoas que usam a Língua Portuguesa.

Em função da linguagem ser um instrumento do pensamento, isto pressupõe um processo de internalização da língua, que é denominado discurso interior, ou seja, é uma forma interna de linguagem, dirigida ao próprio sujeito e não a um interlocutor externo, um discurso sem vocalização, sem som, voltado para o pensamento com a função de auxiliar o indivíduo nas suas operações psicológicas.

Por outro lado, tem-se o discurso enunciado, expressivo, que na perspectiva de Bakhtin (2000 apud LIMA, 2003) constitui a expressividade, que denota a intenção e a contextualização, ou seja, quando utilizamos uma palavra apresentamos intenções que presidem nosso discurso.

 

[...] a expressividade da palavra isolada não é, pois propriedade da própria palavra, enquanto unidade da língua, e não decorre diretamente de sua significação. Ela se prende quer à expressividade padrão de um gênero, quer à expressividade individual do outro que converte a palavra numa espécie de representante do enunciado do outro em seu todo – um todo por ser instância determinada de um juízo de valor (BAKHTIN, 2000, apud LIMA, 2003, P. 75)

 

Para Pêcheux (apud LIMA, 2003), ao reconhecer que a formação discursiva é o lugar da constituição do sentido acrescenta que o indivíduo é o sujeito do seu discurso que representa as formações ideológicas que lhes são correspondentes.

 

A tendência atual de considerar a linguagem como um lugar privilegiado de interlocução e de constituição de sujeitos, bem como de afirmar que a interação entre os homens é a sua finalidade maior, não nos autoriza a ignorar a vocação pensante (e, consequentemente, criativa) do ser humano, no processo singular de estabelecer a sua visão de mundo (LIMA, 2003, 77)

 

Neste sentido a produção escrita dos autores dos TCCs, objeto de análise deste trabalho, representa a ideologia e a visão de mundo dos mesmos. Nossa hipótese inicial era de que na produção acadêmica, apesar de grandes avanços conceituais na área da educação, ainda poderiam existir “ranços” que remetessem aos conceitos mais ligados à Abordagem Tradicional de ensino (MIZUKAMI, 1986). Tais conceitos podem ser identificados quando a concepção ideológica envolve a tradição escolar pautada na memorização, transmissão de saberes, reprodução de conteúdos, disciplina, etc.

 

 

ENSAIOS SOBRE MODELOS SEMÂNTICOS

 

Segundo Viaro (2015) os modelos semânticos atuais possuem como elementos essenciais o estudo da diacronia e da aquisição da linguagem. Alguns destes modelos possuem elementos comuns, outros enunciam diversas perspectivas teóricas e mudanças dentro do desenvolvimento do sistema linguístico num determinado período de tempo. Ao compreender estes modelos e processos é possível analisar a utilização de vocábulos que remetem ao modelo tradicional de ensino num dado momento histórico e avaliar a produção, herança histórica e cultural da linguística que permeiam a realidade.

Ainda de acordo com Viaro (2015) alguns pressupostos para análise dos campos semânticos da língua fornecem subsídios para a interpretação das produções dos artigos que constituem objeto de estudo desta pesquisa. São eles:

 

Pressuposto (1): Os fenômenos de língua não nasceram no momento atual. Pressuposto (2): Os fenômenos de Língua sistematizam combinações de sons (modelos fônicos) e lidam com um grande conjunto de conceitos e visões culturais acerca dos fatos. Pressuposto (3): Os fenômenos de língua sistematizam combinações de sons (moldes fônicos) e lidam com um grande conjunto de conceitos e visões culturais acerca dos fatos (VIARO, 2015, p. 1)

 

A partir de tais pressupostos e já relacionando com o estudo diacrônico e da aquisição da linguagem é possível verificar a importância dos fenômenos da língua na atualidade e as concepções e conceitos histórico-culturais que a envolvem. Uma vez que, o aluno que se encontra concluindo a formação de uma pós-graduação em ensino superior e produz um trabalho utilizando termos referentes ao ensino tradicional como: transmitir, memorizar, repetir, expor – compreende-se a expressão das relações históricas e culturais, ou seja, traz em sua produção os aspectos da formação básica enquanto aluno do ensino fundamental fruto do ensino tradicional.

A proposta tradicional de ensino visa a reprodução, a memorização, estabelece uma relação ensino-aprendizagem distante em que o aluno recebe um conteúdo pronto do professor que constitui o detentor do saber (MIZUKAMI, 1986). Desta forma, o imperativo prevalece à reflexão.

O contexto em que o aluno se formou vai refletir na sua postura e assim, em sua produção escrita. A aprendizagem do ser humano possui como finalidade desenvolver as suas capacidades, permitindo assim que haja interação como o meio em que vive. Para isso os fatores afetivos, sensórios-motores, cognitivos e linguísticos são essenciais. Isso significa que a aprendizagem é um processo complexo, tornando assim difícil apontar uma única causa das dificuldades de aprendizagem.

No processo de desenvolvimento humano, existem alguns fatores que influenciam, interferem negativamente na aprendizagem. No contexto escolar, surgem fatores externos e/ou internos ao aluno que originam as chamadas dificuldades de aprendizagem que são definidas como:

 

[...] dificuldade de aprendizagem refere-se a um retardamento, transtorno, ou desenvolvimento lento em um ou mais processos da fala, linguagem, leitura, escrita, aritmética ou outras áreas escolares, resultantes de uma deficiência causada por uma possível disfunção cerebral e/ou alteração emocional ou condutual. Não é o resultado de retardamento mental, deprivação sensorial ou fatores culturais e instrucionais (KIRK, 1962 apud SÀNCHEZ, 1998, p.33)

 

Muitos alunos possuem problemas no processo de ensino-aprendizagem. Tais dificuldades na aprendizagem são bastante comuns no ensino da leitura, da escrita que se perpetua da educação básica ao ensino superior. Para Silva (2009):

 

Entre as críticas mais frequentes ao ensino de língua portuguesa, dito tradicional, destacavam-se: a desconsideração de atividades de uso da língua; o uso do texto como pretexto para ensinar valores morais e para o tratamento de aspectos gramaticais; a excessiva valorização da norma linguística, através de regras de exceção; ensino descontextualizado, com ênfase na metalinguagem, normalmente vinculado à memorização de terminologias e associado à identificação de fragmentos em frases soltas; e a apresentação de uma teoria gramatical, sem a devida reflexão do funcionamento da língua em seus vários níveis (fonológico, morfológico, sintático, semântico e pragmático) (SILVA, 2009, p. 77-78).

 

Sendo assim, o uso de termos que restringe sua forma de pensar, que limitam sua reflexão pode ser associado ao contexto de sua aprendizagem da língua nos anos iniciais. Momento este em que o foco estava na decodificação e armazenamento dos aspectos da gramática e à interpretação que preconizava uma espécie de alicerce da educação.

Por outro lado, a mesma autora (SILVA, 2009) apresenta a Teoria da Argumentação da Língua como um contraponto à proposta tradicional do ensino da língua, a qual possibilita a reflexão acerca do uso da língua e o desenvolvimento de suas competências interativas e argumentativas.

 

(...) o tratamento da língua em uso, com ênfase em atividades de leitura e de produção de texto, e a abordagem dos mecanismos gramaticais como meio para o desenvolvimento das competências interativa e textual. Nesse sentido, é dado relevo à questão gramatical como estando a serviço das estratégias argumentativas do autor na leitura e na escrita. Com isso, o nível semântico da língua, através do trabalho com os efeitos de sentido dos usos lexicais e da organização sintática produzidos na interlocução, passa a ser bastante tematizado. (...) É justamente por isso que consideramos relevante a abordagem da Semântica Argumentativa no tratamento da língua em uso e em sua reflexão para o desenvolvimento das competências interativa, textual e gramatical. Na Teoria da Argumentação na Língua, as relações argumentativas do enunciado são o foco de estudo, porque o discurso não é composto de informação, mas de argumentação. Como exemplo podemos citar o segmento “este livro é interessante”, que não traz uma informação acerca do livro, mas uma argumentação em favor dele. Ligada a isso, temos a defesa, na teoria, de que o discurso é doador de sentido e que, portanto, não é a situação de enunciação que lhe garante significação, já que esta é justamente construída pelo enunciado. Assim, é o discurso que constrói o contexto, e não o contrário, o que possibilita interpretar a palavra pelas relações que ela mantém no discurso e pelos pontos de vista ali expressos (SILVA, 2009, p. 94).

 

Como evidencia a autora, o foco nos aspectos gramaticas do ensino da língua, traz em sua essência uma concepção tradicional de ensino que estará evidente apenas na produção escrita do aluno. Por outro lado, a abordagem argumentativa trará remete à reflexão, ao questionamento e permite a construção de interpretação das palavras pelas relações expressas e construídas.

No subitem a seguir os termos levantados nos TCCs serão apresentados e analisados à luz destas concepções teóricas estabelecendo um paralelo entre as concepções tradicionalistas e contemporâneas de ensino.

 

 

OS RANÇOS NA PRODUÇÃO ESCRITA: DAS PRÁTICAS CONSERVADORAS AS PERSPECTIVAS DESAFIADORAS

 

A produção textual dos alunos que finalizaram os trabalhos de conclusão de curso (TCCs) foi selecionada a partir de leituras e pesquisas realizadas no banco de dados de uma Instituição de Ensino Superior em Araras. A pesquisa dos compêndios das três turmas reuniu dezessete artigos, sendo esse número o total de produções existentes até o momento, produzidos pelos discentes como Trabalho de Conclusão de Curso no cumprimento dos requisitos para obtenção do Certificado de Especialista do Curso de Docência para o Ensino Superior. Foram analisadas e destacadas as seguintes produções:

  • Compêndio - Especialização em Docência Para o Ensino Superior Turma B-  ano de publicação 2012;

  • Compêndio - Especialização em Docência Para o Ensino Superior Turma C-  ano de publicação 2012;

  • Compêndio - Especialização em Docência Para o Ensino Superior -  ano de publicação 2014;

Para melhor compreensão da proposta, enquadraram-se as palavras e a contextualização num quadro associativo para expor às finalidades discursivas dos relatos produzidos pelos alunos.


Quadro: Ranços Semânticos

Palavras encontradas

Concepção no texto

Significado no dicionário

Absorção

compreensão e absorção do conhecimento adquirido

Ato ou efeito de absorver, deixar penetrar, reter (...)

Passam

docentes passam o conteúdo para esses alunos através das análises de revisões de literaturas

Passar. Transpor, atravessar, percorrer de um lado a outro (...)

Fixação

estudos sobre os diferentes tipos de abordagens, visando a fixação dessa aprendizagem.

Tornar (se) fixo firme (...)

Receberá

 

na vida acadêmica preocupando-se com a fixação do conteúdo, é como esse receberá o conhecimento da parte do docente

Receber, obter, ganhar, conseguir algo como recompensa, favor ou merecimento (...)

Ordens

Racional

...as práticas e ordens pedagógicas sejam analisadas a fim de obtermos os melhores resultados para que o processo racional de ensino-aprendizagem chegue aos seus determinados fins com a maior qualidade possível a esses alunos.

 

Ordem, determinação emanada de uma autoridade (...)

Racional, que se fundamenta na razão e no raciocínio (...) que é razoável, coerente, lógico, inteligente (...)

Implantar

...a nunca conseguirá implantar uma aprendizagem significativa.

Estabelecer (se), introduzir (se),

fixar (se) (...)

Transmitir

...abordagem adotada pelo docente a fim de transmitir o conhecimento...

Ato ou efeito de transmitir, fazer algo chegar a alguém, passar (...)

Repassado

...alunos consigam compreender o conteúdo, e também que estes, mostrem esforços e interesse no conhecimento repassado, a fim de aplicar em sua futura profissão...

Tornar a passar, voltar (...)

Reter

...reter menos conhecimento para sua qualificação profissional...

Guardar na memória, saber de cor (...)

Fonte: quadro produzido pela autora.

 

Como se verifica nessas primeiras passagens o aluno identifica que o “conhecimento” deve ser absorvido. Essa forma de interpretar a construção do conhecimento demonstra uma educação verticalizada e pouco dialógica. Os conteúdos que deveriam sugerir diferentes orientações, a partir de problemáticas e temas postos pela prática social, ao longo do texto são definidos como instrumentos e práticas voltadas a memorização, ou seja, os professores precisam “passar” e os alunos precisam “fixar” os conteúdos apresentados.

Os textos escritos mostram alunos passivos que apenas receberam o conhecimento ao longo de sua trajetória escolar. A prática pedagógica no texto é contemplada de forma “racional” e os resultados devem ser estabelecidos como “ordens” pedagógicas. Os alunos utilizam a palavra “transmitir” para delimitar essa concepção. Em outro ensaio as palavras “repassar” e “reter” são enunciadas num processo de relação vertical entre o educador e o educando e vice-versa.

Essas abordagens foram descritas por Paulo Freire (1981) como uma concepção bancária de educação, ou seja, o ensino tradicional pautado pelo “adestramento” entre opressor e oprimido. Segundo o autor:

 

[...] Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada sabem, cabe àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser de “experiência feito” para ser de experiência narrada ou transmitida. [...] Não é de estranhar, pois, que nesta visão ‘bancária’ da educação, os homens sejam vistos como seres da adaptação, do ajustamento (FREIRE, 1981, p.68).

 

A partir da (re)produção escrita pelos alunos, percebemos um modelo de educação que parte do pressuposto que o aluno nada sabe e o professor é detentor do saber. Neste contexto os alunos abandonam a perspectiva de um ensino pautado em constantes interações, diálogos, troca de experiências e vivências. Pelo contrário, os ensaios semânticos pautados nos textos remetem concepções de ensino sem sentido e desprovido de um processo de ensino-aprendizagem contextualizado.

Ainda pode-se constatar, além da presença marcante das palavras que envolvem a educação tradicional em que o professor detém o conhecimento e os transmite aos alunos para sua “absorção”, há também a presença de alguns indicativos da abordagem Comportamentalista, pois a repetição, o treino constante resultaria em aprendizagem, nesse sentido, as palavras “ordem pedagógica” e “fixação”, podem indicar laços conceituais ainda evidentes.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A partir de algumas palavras extraídas do texto dos alunos formados no Curso de Pós-Graduação – Especialização em Docência verificou-se a concepção bancária intrínseca ao discurso, assim como ainda a presença do comportamentalismo que espera que o aluno fixe o conteúdo. Essa constatação foi possível a partir da análise de termos utilizados na Língua Portuguesa, uma vez que as palavras possuem apelo semântico a qual prioriza a transmissão do conhecimento, memorização, imposição e constituem uma perspectiva tradicional de ensino.

Embora os trabalhos tenham sido problematizados pelos professores com perspectivas e referenciais atualizados de novas tendências educacionais, que valorizam uma educação problematizadora, que instiga o aluno a pensar, a criar, a construir seus próprios conhecimentos – sobrepôs-se nos textos analisados, uma linguagem escrita com muitos ranços de abordagens tradicionais que foram se constituindo historicamente na produção escrita destes alunos. Portanto, este trabalho finaliza oportunizando novas questões para futuras problemáticas, a partir de novas análises semânticas no campo da pedagogia conflitante.

 

 

REFERÊNCIAS

 

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Dicionário escolar da Academia de Letras: Língua Portuguesa/ Evanildo Bechara (organizador), - São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2011.

 

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1995.

 

 

FONTANA, R. A. C. e CRUZ, M. da C. N. Psicologia e trabalho pedagógico. São Paulo. Atual. 1997.

 

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 9. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

 

LIMA, M. C. A. de. Produção textual e ensino: os aspectos lógico-semântico-cognitivos da linguagem e o desempenho discursivo escolar. Tese de doutorado, Assis: 2003.

 

MIZUKAMI, M. G. N., Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1986.

 

SILVA, C. L. da C. Teorias do discurso e ensino. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009.

 

SÀNCHEZ, J. N. G. Historia y Concepto de las Dificultades de Aprendizaje. In BERMEJO, V. S. e LLERA, J. A. B, Dificultades de Aprendizaje. Madri: Sintesis, 1998.

 

SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2000.

 

VIARO, M. E. Estudo diacrônico na formação e mudança semântica dos sufixos eiró/eira na Língua Portuguesa. São Paulo: FFLCH/USP, s/d. disponível em http://www.usp.br/gmhp/publ/Via33.pdf Acesso em 03/02/2015.

 

VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.