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EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES RACIAIS: PRODUÇÃO DE MATERIAIS PARA A PRÁTICA ESCOLAR

Agna Fernandes[1]

Gilmara Oliveira Gomes[2]

 

RESUMO:

Em conformidade com a lei 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares para a Educação das Relações Étnico Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (DF, 2004), este texto tem por objetivo apresentar um relato de experiência, a partir de alguns materiais produzidos por alunos do 3º ano do Ensino Médio da Rede Estadual de Sorriso/MT, onde o público alvo desta produção foram alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I. Nesta perspectiva, abordaremos a produção e o uso dos livros didáticos em ambiente escolar, assim como as possibilidades de produzir materiais sobre esta temática, em conformidade com a legislação citada. Para desenvolver este trabalho utilizaremos a pesquisa bibliográfica com revisão de literatura, segundo (Gonçalves,2011).

 Palavras- Chave: África, sala de aula, ensino de História.

 

INTRODUÇÃO

Uma Escola da Rede Pública de Sorriso adota no seu Plano Político Pedagógico - PPP desde 2015 um evento chamado “Feira Afro-Indígena” que visa trabalhar com as temáticas da Lei 10.639/03 e Lei 11.645/08 e tem sua culminância na semana da Consciência Negra, com o intuito de desenvolver e apresentar projetos e trabalhos desenvolvidos pelos professores e alunos, tendo o envolvimento de toda unidade escolar. Este relato de experiência tem como objetivo apresentar a produção de materiais didáticos produzidos por alunos do 3ª ano do Ensino Médio de uma Escola Estadual do município de Sorriso/MT que teve como princípios norteadores desta ação, reflexões acerca da Lei Federal 10.639/2003, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, tornando obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Raciais Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura  Afro-Brasileira e Africana (DCN, 2004) redirecionando e colocando novos desafios e perspectivas sobre os profissionais da educação e consequentemente em seu trabalho desenvolvido no ambiente escolar. O ensino de História e Cultura Africana se fará por diferentes meios, inclusive a realização de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano letivo, com vistas à divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes na diáspora [...] (DCNERER, p.22, 2004).

Sendo assim, o tema proposto da Feira Afro-Indígena de 2016 foi “Conhecendo Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa”, propõe a cada professor dentro da sua área específica, oportunidade de desconstruir imaginários vigentes sobre a África e o lugar do negro na atualidade, com recorte aos países africanos de língua oficial portuguesa. Pensando nesta temática, que ora nos pareceu desafiadora, propomos aos alunos do 3º ano do Ensino Médio que produzissem livros que abordassem o tema da feira deste ano, com materiais disponíveis como cartolina, tinta, barbante, lápis de cor, canetas colorida, cola, tesoura entre outros.

A metodologia adotada para trabalhar com os educandos num primeiro momento foram à organização de divisões de três grupos nesta turma de 3º ano, a realização de pesquisa e estudo sobre literatura africana para contribuir na formação deste projeto que se gerava.
           Segundo Choppin (2004), é de suma importância nas pesquisas que lidam com políticas educacionais para o objeto cultural, com função ao centro do desenvolvimento de escolarização, construindo ferramentas de unificação e uniformização nacional, linguística, cultural e ideológica.  Nesta perspectiva a confecção de livros didáticos pelos educandos recebe uma regulamentação distinta de outros materiais, que determina sua produção, forma, conhecimentos que serão transmitidos, sua distribuição e uso.

            Dessa forma, o livro didático possui legislações e regulamentos que regem toda a sua estrutura, forma e conteúdo para que quando for para a sala de aula o livro já possua a forma física adequada e o conteúdo elaborados especificamente para os alunos daquele período.

             De acordo com Bittencourt (2005), os livros didáticos tiveram sempre uma avaliação por características específicas ao longo da história da educação.  Segundo Figueiras (2011), no final dos anos de 1950 fortificaram-se discussões acerca do fim dos exames de admissão, necessitando reformular currículos, a questão da qualificação dos professores e programas de ensino básico. No ensino superior os debates eram em torno da ampliação ao seu acesso e a reformação de sua estrutura. Foram retomados ainda os debates em torno da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

            Assim, na unidade escolar os livros didáticos tiveram uma renovação e uma expansão do seu acesso ao longo dos anos, sua estrutura foi reformulada e os debates acerca dos materiais didáticos continuam.  E ao trazer a produção de livros didáticos sobre a temática racial para a escola estamos

“diante da necessidade de crianças, jovens e adultos estudantes sentirem-se contemplados e respeitados, em suas peculiaridades, inclusive as étnico-raciais, nos programas e projetos educacionais; diante da importância de reeducação das relações étnico/raciais no Brasil; diante da ignorância que diferentes grupos étnico-raciais têm uns dos outros, bem como da necessidade de superar esta ignorância para que se construa uma sociedade democrática”. (DCN; DF, p. 27; 2004).

           Conforme Batista (2002), durante os anos 1960 as mudanças socioeconômicas trouxeram modificações na área editorial, que motivaram a expansão da indústria dos livros didáticos.  Já o processo de construção e produção de manuais didáticos passou por alterações em sua forma física, leitura e utilização. Apareceram assim os livros didáticos e novas técnicas de ensino. Com a expansão da formação educacional e do mercado editorial de livros didáticos o Estado começou a estabelecer normas de intervenção através de políticas para regular os livros didáticos.

            Pode-se dizer que as mudanças nas condições sociais e econômicas fez com que a indústria expandisse o mercado de produção de livros didáticos, enquanto que o Estado entra com normas regulatórias dos materiais didáticos. Por isso ao vermos os resultados dos livros didáticos confeccionados pelos alunos como A bonequinha Preta; Países Africanos; O menino de cor e Princesa Agna e a interação dos alunos neste sentido de algo que não estão habituados de encontrar em seus materiais do dia- a dia.

          Segundo Ferreira e Franco (2008), a produção de materiais atualizados fazem com que sejam necessário profissional da educação atualizado para melhor usufruir desses livros didáticos. Nesse sentido academia e produção de materiais necessitam estar em harmonia pois estão lutando pelos mesmos interesses. Se não existir essa harmonia haverá uma separação entre academia e produção acarretando um quadro preocupante, pois:

“O continente africano é múltiplo [...], [onde] existem várias “Áfricas”. Um dos primeiros erros que geralmente cometemos ao estudar a história africana é identificar no Continente uma única história ou um único processo histórico. Uma palavra capaz de sintetizar a África é “diversidade ”. [...] Vários povos, etnias, línguas, tradições, religiões, economia, enfim, várias sociedades compõem o mosaico africano e possuem características próprias que, quando tornadas homogêneas, empobrecem a compreensão do que é a África.” (PENNA FILHO, p.05, 2010).

 A concepção de que a África é um território marcado pela igualdade, baseado apenas pela cor da pele de grande parcela de seus habitantes, nos mostra a urgência de conhecermos e levarmos ao contexto escolar novos olhares sobre a África. E ao realizarmos este trabalho com os alunos No processo proliferação de imagens e representações distorcidas sobre a África, suas histórias e culturas, contamos com a mídia, de forma geral, que contribui sobremaneira na propagação de estereótipos acerca da África e dos africanos, estereótipos que são apreendidos, refletidos e percebidos na sala de aula. Desta forma, “a mídia detentora da capacidade de dominar a linguagem escrita, torna-se capaz de produzir diferentes significados para um mesmo fato de acordo com determinadas ideologias a partir daqueles que são reais detentores do poder.” (ANJOS, p.25, 2011).  Dessa forma o resultado foi muito gratificante, pois possibilitou mudanças nas reflexões dos alunos.

Considerações Finais

            Considerando os aspectos discutidos sobre o estudo e a aplicação da História da África e dos afro-brasileiros nas salas de aula e a percepção dos alunos, nos faz compreender que também cabe aos profissionais da educação, sensibilizar-se com a temática e procurar mecanismos para trabalhar estes conteúdos. O olhar que muitas vezes, os alunos têm sobre este continente, é resultado de uma mídia eurocêntrica e de uma literatura que visa, de forma superficial a África.

            Entende-se também que a transferência da responsabilidade governamental, transferida para os profissionais da educação em desenvolver as temáticas das relações raciais é uma prova da necessidade de romper com o racismo institucional, melhorando assim cada vez mais a educação deste país, que não terá excelência, enquanto não amenizar as dívidas históricas com os afros descendentes.

            Alguns estudos estão sendo lançados, materiais que irão auxiliar nesta luta, mas ainda há um caminha longo a ser percorrido, ate que as desigualdades provocadas em parte pela história eurocêntrica, da construção desta nação sejam corrigidas.

           

Referências Bibliográficas

BATISTA, Antônio Augusto Gomes. Um objeto variável e instável: textos, impressos e livros didáticos. In: ABREU. Márcia (org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado das Letras/ALB/Fapesp, 2002, p. 529-575.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de história: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2005.

CHOPPIN, Alain. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. Educação e Pesquisa, v. 30, n. 3, 2004, p. 549-566.

FERREIRA, M. D. M.; FRANCO, R. Desafios do ensino de história. Estudos Históricos, v.21, n.41, p.79-93, 2008.

GONÇALVES, Vanda Lúcia Sá. Metodologia Científica. Cuiabá: EdUFMT,2012.

PENNA FILHO, Pio. Introdução à História da África. Curso de Especialização. EdUFMT, 2011.

 

 

[1] Professora da Rede Municipal de Sorriso/MT. Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Instituição de Ensino Superior de Nova Andradina.

[2] Professora da Rede Estadual. Especialista em Relações Raciais e Educação na Sociedade Brasileira, pelo NEPRE/IE/UFMT.