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A ADEQUAÇÃO DE ALUNOS SURDOS-MUDOS AO ENSINO REGULAR EM INSTITUIÇÕES NÃO ESPECIAIS

Léo Ricardo Mussi[1]

Marcia Regina Rocha[2]

 

  1. INTRODUÇÃO

 

Em uma sociedade que enxerga (acertadamente) cada vez mais valor nos processos de inclusão, é fácil entender a importância a conquista de se ter em salas de aula regulares a matrícula de alunos surdos, devendo ser essencialmente um processo mais vantajoso aos próprios alunos. Embora, infelizmente, não seja sempre assim.

Este projeto busca analisar a situação atual de alunos surdos matriculados no ensino regular, no entanto, abordar a educação de alunos surdos nos leva a caminhar muito fortemente no campo da inclusão escolar.

Por isso, ao longo desse trabalho, serão analisados não somente os dispositivos legais que protegem a educação inclusiva, mas principalmente sua vivência prática. As reais dificuldades dos alunos surdos, o que ajuda ou atrapalha em suas aprendizagens, bem como quais seriam as adaptações necessárias nas escolas e em seus colaboradores de forma geral e quais suas dificuldades em realizá-las.

Estuda-se também o papel do professor em sala, bem como o papel do intérprete, e porque estes não devem ser confundidos entre si. Ademais, apontam-se propostas e processos de treinamento direcionados à escola e a seus profissionais, a fim de reduzir as barreiras de comunicação e aprimorar o processo educacional dos alunos.

 

  1. DESENVOLVIMENTO

 

O presente estudo de caso objetiva acompanhar e debater o desenvolvimento e a adaptação de alunos surdos no ensino regular, analisando o caso concreto, as dificuldades apresentadas, os benefícios e prejuízos que podem ser tidos como resposta pelo estudante.

Para tanto, tomou-se como estudo uma sala de ensino médio regular, que conta com alunos surdos, e estudando-se suas características e determinando suas particularidades de escolarização e ensino.

Na coleta de dados e elaboração do projeto, fez-se uso majoritário de entrevistas e observação, além de intensa pesquisa bibliográfica, afim de alcançar uma maior compreensão da situação apresentada e debatida,

Pode-se observar historicamente que o caminho percorrido pela comunidade brasileira de surdos, muito se assemelha com o caminho já percorrido pelas mesmas comunidades em outros países, em especial europeus e também na américa do norte. Até o século XVIII era comuns que as famílias os confinassem em ambientes domésticos ou os abandonassem à própria sorte.

Isso partia majoritariamente da falta de conhecimento da época, que trazia no senso comum a ideia de que tudo o que seria diferente seria algo “anormal” no pior dos sentidos, devendo assim ser afastado da normalidade da vida social, bem como dos sistemas de ensino regular.

Dessa maneira, ao passar do século XIX estes grupos passaram a ser sistematizados, e a ser-lhes oferecida uma educação majoritariamente normalizadora e assistencialista, em instituições específicas e separatistas, os colocando mais ainda à margem da educação, sem nenhuma preocupação com a inclusão. Através desse período, surdos que estudassem em instituições regulares não possuíam nenhum suporte extra nem tampouco atendimento diferenciado.

A partir da década de 90, no Brasil, em especial pelo advento da nova Constituição Federal de 1988 (muito mais humanitária, moderna e inclusiva) que as políticas de inclusão passaram a ser revistas e readequadas partindo de novas perspectivas majoritárias, onde instituições regulares deveriam compreender, respeitar e se adequar as especificidades das pessoas surdas, visando aprimorar e facilitar sua inclusão em meio a educação e a sociedade.

As atuais leis educacionais que pautam esse assunto trazem justamente como base a referida Constituição Federal de 88, ainda reafirmada pela Declaração Mundial sobre Educação para Todos de 1990, que traz em seu conteúdo a novas definições e abordagens acerca da aprendizagem, da dignidade e da inclusão.

A partir disso, nota-se ser de majoritária importância a inclusão de alunos surdos no ambiente educacional convencional, bem como a essencialidade do preparo e formação dos grupos profissionais que trabalharão com estes alunos, a fim de alcançar uma adequada inclusão escolar.

É essencial também compreender a real situação do aluno, o que pode ser feito através de práticas pedagógicas aplicadas pelos profissionais capacitados, para compreender não somente as questões inerentes ao aluno, mas também as dificuldades que a própria escola terá para lhe garantir um atendimento adequado e correto.

Torna interessante observar também que atualmente vem evoluindo as questões legais que objetivam abraças as necessidades desse grupo educacional, facilitando seu acesso ao ensino regular, como por exemplo a Lei nº 10.436/02 e o Decreto nº 5.626/05 que garantem ao surdo um acesso ao ensino em LIBRAS.

A inclusão deve garantir não apenas o ingresso do aluno no sistema de ensino, mas sim principalmente sua permanência neste, igualando as oportunidades e reduzindo o máximo possível as evasões através de um ensino de qualidade.

Para DORZIAT são essenciais três critérios para a educação inclusiva, sendo estas a interação por meio da língua de sinais, a relação entre o conteúdo e a cultura surda e a valorização dos conteúdos escolares.

É preciso que, em um caráter humano, o professor tenha habilidades para superar preconceitos e lidar com as diferenças, além de se mostrar adaptável e pronto para lidar adequadamente com eventos novos ou diferentes que ocorram durante sua regência. Seria altamente adequado que o professor tivesse domínio da linguagem de sinais, a fim de se comunicar de forma mais direcionada com estes grupos de alunos.

A escola pode abraçar resultados muito mais próximos do ideal se conseguir oferecer, mesmo em salas comuns, professores que sejam efetivamente capacitados a oferecer os referidos atendimentos direcionados às necessidades dos alunos surdos, bem como, se for o caso de um intérprete direcionado ao aluno, principalmente nos casos em que os professores não detêm o domínio da língua.

Também pode (e deve) ser feito bom uso das salas de apoio, salas de recurso, atendimentos domiciliares e todos os outros meios de acompanhamento aos quais a escola dispuser e que possam ter valia no andamento do desenvolvimento acadêmico e educacional do aluno.

Deve também o próprio poder público, com base na Lei nº 10.098/00 tomar adequadas providências para sanar possíveis barreiras de comunicação, garantindo o acesso dos surdos à educação e informação, mesmo que para isso seja necessária a formação de intérpretes.

No entanto, infelizmente é facilmente observável, conforme ressaltaram SOUZA e GÓES que o processo de inclusão vem sendo prejudicado ao ter seu acompanhamento por profissionais que, embora muitas vezes bem-intencionados, não se sentem preparados para tal, por principalmente não conhecerem a língua de sinais, dificultando significativamente suas interações com os alunos surdos.

Devemos lembrar que não é o aluno que deve adaptar-se à escola, e sim esta que deve se alterar e adaptar a fim de atender as particularidades de cada aluno. Para LORENZETTI, a realidade se diverge do que seria correto. Em sua maioria os professores têm uma grande dificuldade em lidar com alunos surdos, oriunda da falta de conhecimento. Por vezes os professores apontam as defasagens educacionais de alunos surdos como sendo decorrentes exclusivamente de suas deficiências, o que não se demonstra uma afirmativa correta, e mostra o quanto se faz necessária a formação dos professores através de cursos, debates, seminários, etc.

Foi notado, conforme BORGES ressalta, que os próprios alunos, ao relatar suas vivências e experiências, apontam como dificuldade o obstáculo da comunicação com os professores e colegas.

Estes mesmos alunos sugerem as medidas necessárias para que se sanem essas adversidades, a se listar, a divulgação da língua de sinais (LIBRAS) e a necessidade de intérpretes, além de serem necessárias metodologias diferenciadas de estudo que levem tais diferenças em conta.

Falando acerca do intérprete, este tem como foco servir como uma espécie de tradutor preciso, encontrando função de intermediar e possibilitar a comunicação entre o aluno surdo e outras pessoas que não detenham conhecimento em LIBRAS.

Devemos lembrar que a função do intérprete é meramente comunicativa. A ele não cabe a responsabilidade de “ensinar” o aluno. E sim a de intermediar a comunicação entre este e o professor, que por sua vez é o responsável pelo ensino. A simples presença do intérprete, como salienta LACERDA, não garante a aprendizagem do aluno e sim a comunicação deste com seus pares.

Não se pode também desconsiderar ou minimizar o imenso impacto da importância desse profissional da vida acadêmica de alunos surdos, visto que ele é responsável por ser a “ponte” que permite a comunicação e o entendimento entre os alunos surdos e qualquer outro não falante de LIBRAS, como seus professores ou colegas. Deve-se lembrar que essa comunicação é de suma importância para o processo de aprendizagem de qualquer aluno, e seu acesso não deve ser de maneira alguma dificultado.

Dessa maneira, recomenda-se como processo de treinamento aos profissionais da escola, e até mesmo aos demais alunos, se possível for, o ensino de fundamentos da linguagem de sinais, com a maior quantia de aprofundamento que for possível.

Uma aprendizagem ao menos básica da língua de sinais, tanto por parte dos professores como por parte dos outros alunos, pode ajudar de forma imensamente significativa na comunicação com o aluno surdo, rompendo parte da barreira comunicativa tão limitante no quesito aprendizagem.

Essa formação pode ser aplicada em finais de semana aos professores em forma de qualificações e capacitações, melhorando suas habilidades conforme se perdurarem os treinamentos. Da mesma maneira, pode-se inserir na grade educacional o ensino de libras (mesmo que gradativo) aos alunos. Não sendo possível a inserção na grade, pode-se trabalhar a linguagem de sinais em turnos opostos, na condição de horas extracurriculares aos alunos, podendo assim ser feito um trabalho até mesmo mais intensivo, gerando-se um nível de aprendizagem elevado.

Ademais, o professor deve ser orientado a ajudar os alunos a encontrar a solução para os problemas ao invés de entregá-los prontos por mera praticidade; procurar falar de frente para o aluno surdo quando estiver falando com ele, sem gritar, já que isso nada muda na compreensão; adequar seu material expositivo, como por exemplo se certificar de que vídeos apresentados em sala possuam legenda adequada; e procurar inserir no máximo possível a família no contexto do processo educacional.

É inegável o quanto a comunicação é essencial ao trabalhar-se com alunos surdos, e como esse é o principal empecilho em seus processos educacionais. Criar e viabilizar ferramentas e projetos para reduzir essa dificuldade de comunicação e melhorar o entendimento através da linguagem é a ação divisora de águas no que tange aos processos educacionais para surdos.

 

  1. CONCLUSÃO

 

Por muitas vezes, podemos observar que o professor tem visões muito superficiais de como funcionaria o processo educacional de alunos surdos, e por vezes subestima a importância de uma adequada comunicação ente aluno-professor, prejudicando a aprendizagem.

É preciso esforço por parte principalmente das escolas e dos docentes para não se deixarem levar apenas por moldes pré-determinados, nem por rótulos e preconceitos que por muitas vezes permeiam os processos de inclusão, para que posam efetivamente compreender suas necessidades educacionais, sejam relacionadas à linguagem ou às próprias técnicas de aprendizagem.

Os treinamentos, capacitações e formações continuadas, são basicamente as mais importantes formas de se auxiliar profissionais da escola, em especial (mas não somente) os professores, que possuem uma influência tão substancial no processo formativo destes alunos. É por meio desses treinamentos, do esforço destes profissionais e da aplicação de políticas públicas e adaptações nos processos educacionais, que poderá se evoluir no caminho pela inclusão e melhora do processo de ensino e aprendizagem para alunos surdos.

 

  1. REFERÊNCIAS

 

BORGES, A. R. A inclusão de alunos surdos na escola regular. Revista Espaço. Rio de Janeiro, v. 21, p. 63-68, 2004.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed.

______. Lei N° 10.098, de 23 de março de 1994. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadores de deficiência ou com mobilidade reduzida.

DORZIAT, A. Educação de surdos no ensino regular: inclusão ou segregação. Revista do Centro de Educação, v.24, p.1-7, 2004.

LORENZETTI, M. L. A inclusão do aluno surdo no ensino regular: a voz das professoras. Revista Espaço Rio de Janeiro, v. 18/19, p. 63-69, 2002/2003.

SOUZA, R. M.; GÓES, M. C. R. O ensino para surdos na escola inclusiva: considerações sobre o excludente contexto da inclusão. In SKLIAR, C. (Org.). Atualidade da educação bilíngue para surdos 1. ed. Porto Alegre: Mediação, v. 1, 1999. p. 163-188.

UNESCO. Declaração mundial sobre educação para todos e plano de ação para satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. Jomtien, Tailândia: UNESCO, 1990. UNESCO.

 

 

[1] Advogado e Psicanalista. Pós-Graduado em Docência do Ensino Superior e em Psicologia Clínica. Mestrando em Educação E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

[2] Mestranda em Educação.