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LÍNGUA PORTUGUESA E DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR – ANÁLISE DO DIALETO MARANHENSE

 

Francisco Ribeiro dos Santos[1]

  

RESUMO:

O presente artigo tem como objetivo central, debater de maneira conceitual sobre a importância da análise do dialeto maranhense. De modo que foi possível notar que a dialetologia e a elaboração de atlas linguísticos de regiões, bem como do Brasil como um todo, podem oferecer um subsídio acadêmico importante para estudiosos empreenderem pesquisas acerca das tradições e formações linguísticas regionais, bem como ampliando sua compreensão por parte da sociedade. Sendo assim, a análise do dialeto é importante a fim de fazer compreender determinada população, sua região, história, tradições, costumes e fala, podendo então compreendê-la por meio de uma perspectiva social, histórica e cultural. A justificativa para a escolha do tema paira sobre sua contemporaneidade, além da expectativa de contribuir para o âmbito acadêmico. O método de pesquisa empreendido segue natureza qualitativa com pesquisa do tipo bibliográfica.

Palavras-chave: Dialetologia; Maranhão; Linguística.

 

ABSTRACT

The main objective of this article is to discuss in a conceptual way the importance of the analysis of the Maranhão dialect. Thus it was possible to note that dialecology and the elaboration of linguistic atlases of regions as well as of Brazil as a whole may offer an important academic subsidy for scholars to undertake research on regional linguistic traditions and formations, Part of society. Thus, the analysis of the dialect is important in order to understand a particular population, its region, history, traditions, customs and speech, and can then understand it through a social, historical and cultural perspective. The justification for choosing the theme hovers about its contemporaneity, besides the expectation of contributing to the academic scope. The research method followed is qualitative with research of the bibliographic type.

Keywords: Dialecology; Maranhão State; Linguistics.

 

 

  1. INTRODUÇÃO

 

Quando se lança uma ótica sobre o léxico de determinada comunidade, certamente se traz à baila algumas semelhanças e contrastes linguísticos que tal comunidade possui em comparação a outras, seja no sentido diastrático, seja no diatópico. No bojo teórico, tal tipo de estudo fica ao cargo da sociolinguística e da dialetologia, como as linhas responsáveis por estudar as variações encontradas na fala espontânea.

Ao passo que, em sentido dialetológico, as pesquisas tendem a ser documentadas em atlas linguísticos, que apresentam cartas com as realizações mais importantes no sentido fonético, lexical e morfossintático. Sendo assim, os atlas regionais que foram publicados até o momento, não causam impactos nas propostas de elaboração de um atlas linguístico brasileiro.

Na realidade, a bibliografia encontra uma ausência de um estudo que contribua de maneira mais efetiva para o conhecimento de particularidades geolingüísticas de cada região brasileira e dos segmentos sociais que as constituem e que nela atuam de maneira direta ou indireta.

Assim, o mapa linguístico do Maranhão, tenta auxiliar na tomada de conhecimento acerca da realidade sócio linguística e cultural do estado, contribuindo para a compreensão da língua portuguesa como um instrumento social de comunicação que é diversificado e pluricultural (FEITOSA et al., 2000).

Em vista do cenário supraexposto, desenha-se como objetivo central do presente artigo, debater de maneira conceitual sobre o dialeto maranhense e formas de avaliar este dialeto. A fim de traçar um caminho coerente para o desenvolvimento da pesquisa, elencam-se como objetivos específicos: conceituar sobre o preconceito linguístico; apresentar a importância da análise dialetológica para a compreensão sócio cultural da região; e, debater sobre o dialeto maranhense neste bojo.

Sendo assim, a problemática de pesquisa a ser solucionada à finalização deste, paira sobre a questão: Qual é a importância sócio cultural da análise do dialeto maranhense?

O presente artigo justifica-se, pois pretende contribuir para o âmbito acadêmico oferecendo através da pesquisa em tela uma visão diferenciada acerca do tema, ampliando o material teórico, que poderá ser utilizado a fim de desenvolver estudos e pesquisas posteriores, estimular o aprofundamento sobre o tema, assuntos relacionados e demais vertentes científicas que possam originar-se a partir do interesse por este.

Além da relevância acadêmica, a pesquisa em questão também intenciona servir como fonte de informações para o âmbito social, podendo oferecer dados relevantes para que os públicos de interesse envolvidos na área colham dados para notar a importância da abordagem e aplicabilidade do tema em estudo.

Para além, o trabalho também tem a finalidade de fomentar conhecimento no pesquisador, além de seu leitor, que durante o desenvolvimento da pesquisa terá condições de desenvolver um pensamento reflexivo-crítico a fim de formar uma trajetória analítica do tema, culminando assim em sua conclusão apresentada como resultado preliminar deste estudo, podendo resultar em aprofundamentos, demais vertentes e debates acerca do assunto.

Sobre o método de pesquisa empreendido Lakatos e Marconi (1996, p. 15) definem que “Pesquisar não é apenas procurar a verdade; é encontrar respostas para questões propostas, utilizando métodos científicos”, através desta ótica é possível notar que a pesquisa é algo mais amplo do que se imagina em um primeiro momento.

Segundo Santos e Candeloro (2006) existem duas naturezas diferentes para uma pesquisa metodológica, são elas, qualitativa e quantitativa. Sendo assim:

 

“A pesquisa de natureza qualitativa é aquela que permite que o acadêmico levante dados subjetivos, bem como outros níveis de consciência da população estudada, a partir de depoimentos dos entrevistados, ou seja, informações pertinentes ao universo a ser investigado, que leve em conta a ideia de processo, de visão sistêmica, de significações e de contexto cultural. [...] A pesquisa qualitativa é a que tem o objetivo de mensurar algumas variáveis, transformando os dados alcançados em ilustrações como tabelas, quadros, gráficos ou figuras. [...] Em geral, o instrumento de levantamento de dados mais adequado a este tipo de pesquisa é o questionário, em que questões fechadas correspondem a respostas codificadas”. (SANTOS e CANDELORO, 2006, p.71-72).

Desta forma, a natureza escolhida para a criação deste trabalho é qualitativa, buscando assim, levantar todas as informações teóricas a fim de se chegar à conclusão, utilizando-se de abordagem exploratória através de pesquisa do tipo bibliográfica para colher e avaliar os dados, as pesquisas bibliográficas podem ser através de obras ou artigos científicos. (GIL, 2008).

Segundo Mayring (2004) as técnicas de análise de dados qualitativos servem como contribuição para a interpretação de questões abertas ou mesmo de textos, o que ocorrerá por meio de uma descrição objetiva, sistemática e qualitativa de seu conteúdo. O autor apresenta a metodologia de análise lexical, que possibilita a interpretação por meio da leitura adequada e dinâmica de questões abertas das enquetes, através de processos automáticos com bases na matemática ou estatística e mesmo nos textos.

Tal procedimento não é o mais rigoroso do que uma análise clássica de conteúdo, nesta modalidade o tratamento de dados é mais objetivo, porém, vale também a leitura subjetiva, uma vez que é por meio dela que será possível a comunicação da impressão, seguindo cada constatação a ser explanada.

Existem ainda outras técnicas de análises possíveis na metodologia qualitativa, segundo Soares et al. (2011) existe, por exemplo, a análise documental, que trata-se de uma técnica importante na abordagem de dados, tanto através do complemento de informações obtidas por meio de outras técnicas, quanto pelo desvelamento de tema ou problema novos.

Os autores propõem ainda a técnica de análise de conteúdo onde questiona-se o que a mensagem diz, o que quer dizer, o que significa. Esta técnica é considerada inicialmente como uma modalidade de análise e interpretação de textos, porém, no decorrer do último século passou a tomar caráter científico, ao passo que foi otimizada no sentido de ser uma técnica aplicada às mais diversas ciências, dentre elas as sociais e de saúde. Este será o modelo de análise de dados empreendida nesta pesquisa.

 

  1. DESENVOLVIMENTO

 

2.1  Preconceito linguístico: alguns conceitos

 

Marcos Bagno tornou-se célebre nome entre os âmbitos acadêmicos de letras e pedagogia no Brasil por conta de sua obra intitulada “Preconceito linguístico: o que é, como se faz” (2007). O nome de Bagno é trazido à baila com frequência nos cursos de especialistas em linguística e em explicações acadêmicas acerca do tema.

A abordagem que o autor apresenta em seu livro paira sobre o impacto do preconceito linguístico. Sai em defesa do português brasileira, de modo que na totalidade de suas obras faz o possível para demonstrar a importância de incorporar a gramática normativa ao vernáculo brasileiro contemporâneo, formando-o partindo de avaliações realizadas por pesquisadores nos últimos quarenta anos.

Em sua obra em questão, Bagno ainda é tomado como referencial teórico em grande parcela dos cursos superiores que trazem o assunto do preconceito linguístico ao debate. A obra possui mais de 50ª edições, sendo a quinquagésima publicada no ano de 2007 – obra esta que serviu para a confecção deste artigo.

Antes de debater sobre as teorias expostas pela obra em questão, cabe citar ainda outro texto de Bagno (2005) que demonstra e reafirma o conteúdo político que se encontra imbuído em seus escritos. O autor então expõe que entende a educação será encarada como um conjunto de fatores de cunho sociocultural que, durante toda a existência de um sujeito possam lhe permitir a aquisição, desenvolvimento e ampliação do conhecimento de/sobre sua língua materna, de/sobre outras línguas, sobre a linguagem de maneira geral e ainda sobre todos os sistemas que se relacionam à semiótica.

 

“Desses saberes, evidentemente, também fazem parte as crenças, superstições, representações, mitos e preconceitos que circulam na sociedade em torno da língua/linguagem e que compõem o que se poderia chamar de imaginário linguístico ou, sob outra ótica, de ideologia linguística. Inclui-se também na educação linguística o aprendizado das normas de comportamento linguístico que regem a vida dos diversos grupos sociais, cada vez mais amplos e variados, em que o indivíduo vai ser chamado a se inserir” (p. 63).

 

Ainda neste bojo, o autor explica que, dentro de uma perspectiva, contudo, é possível compreender que a educação linguística de cada sujeito inicia-se juntamente com sua própria vida, ao passo que, em interações familiares e comunitárias, o indivíduo apreende sua língua materna e, atrelado a ela, de maneira progressiva, toda uma cultura de linguagem característica do meio social em que se encontra.

Em diversas sociedades, explica o autor, tal como a brasileira, a educação linguística pode se transformar em um objeto de formalização, uma sistematização, institucionalização, de modo que será promovida por instâncias de poder que formam o aparato do Estado.

Para Bagno (2005) a educação linguística aplicada nas escolas brasileiras perpassa, no cenário contemporâneo, uma crise inegável. Na realidade, ampliando o enfoque da análise, o autor acredita que o panorama geral de relações entre língua e sociedade, demonstra um conjunto de distorções e mal-entendidos.

Notando a ótica política e militante social que o autor imputa sob seus textos, nota-se que parte sobre uma defesa ferrenha de que a educação linguística deve respeitar culturas e saberes individuais, ao invés de doutrinar o certo e errado por uma educação institucionalizada e repleta de ditames que não são aplicáveis a uma parcela relevante da população brasileira.

 

“Existe, antes de mais nada, uma demanda social por educação linguística que suscita, da parte das diferentes instâncias ocupadas com o tema, conjuntos variados de respostas. De um lado, as diferentes políticas oficiais de ensino (sobretudo as de âmbito federal) vêm gerando um acervo cada vez mais volumoso de reflexões teóricas, consubstanciadas em documentos da mais diversa natureza (leis, parâmetros curriculares, diretrizes, matrizes curriculares, princípios e critérios para avaliação de livros didáticos, etc.), aliadas a ações efetivas de intervenção nas práticas pedagógicas (exames de avaliação do ensino fundamental e médio, sistemas de avaliação de cursos superiores, programas de avaliação do livro didático, programas de formação docente etc.)” (BAGNO, 2005, p. 64).

 

Assim, o autor complementa dizendo que todo o esforço de cunho político oficialmente, paira sobre o atendimento das demandas de educação linguística de sua população, de modo que este passa a se atribuir de um ritmo muito lento e gradativo, bem como um impacto social que fica muito aquém de sua função, mesmo por instituições de ensino superior, ainda que sejam conceituadas.

Tomando como base a obra de Marcos Bagno intitulada “Preconceito linguístico: o que é, como se faz” (2007), realiza-se uma reflexão crítica, partindo da premissa de uma sociedade que, ao menos de maneira externa e oficial, é avessa ao preconceito, torna-se o ponto de partida de Bagno a questão de que, é de surpreender que uma das formas mais usuais deste seja praticada com frequência – e até certa naturalidade – além de amplamente difundida na realidade, a forma linguística.

Assim, a gramática normativa tradicional, expõe o autor, passou a tomar caráter de língua vernácula, isto é, atribuiu-se do português brasileiro por si, sendo então imposta como a forma “culta”, ou correta de aceitar a escrita e a pronuncia da língua, abrindo ainda margem a um poder de repressão notável acerca do que não é aceito como correto dentro desta norma.

Ao traçar uma reflexão crítica sobre o texto do autor, é possível ponderar sua ótica de que, de fato a educação fora cada vez mais institucionalizada ao longo dos anos, em todos os níveis, transformando a língua culta em língua oficial do país e concomitantemente aceitando suas normas como o correto. Também é compreensível a ótica de Bagno sobre o preconceito com questões de línguas regionais, tais como do sertão nordestino ou da população rural.

Porém, dentro de seu texto também é notada a defesa de uma gramática informal, isto é, escrever como se fala, de modo que o ‘como se fala’ nem sempre se encontra dentro das normas cultas. Equilibrando estes dois polos, é possível aceitar que determinadas populações dentro de uma mesma nação constituam-se em tribos, em comunidades que possuem um dialeto ou linguagem própria, suas próprias formas de expressão.

Dentro desta ótica, certamente é notável que – assim como ocorre em muitas comunidades indígenas no Brasil – esta população determinou sua própria linguagem, dentro desta comunidade existem regras linguísticas que se aplicam que tornam as normas daquela língua correta, tal como as normas cultas do português. Porém, o que se nota em alguns trechos dos trabalhos de Bagno é a defesa de um modo de fala e escrita de uma população que somente não fora imersa na língua culta por conta de uma baixa qualidade educacional, um direito constitucional que lhes fora amputado, não por conta de sua origem cultural em si.

Sendo assim, torna-se compreensível que algumas palavras sejam escritas ou faladas de maneira diferente por comunidades que possuem seus próprios dialetos e, dentro destes, suas próprias normas que tornam culta sua língua, mas em indivíduos que se inserem dentro de uma comunidade que possui por norma de língua um determinado padrão, não cabe acreditar que o modo errôneo de escrita e fala será facilmente aceito, sem que o sujeito seja considerado ‘errado’.

Certamente na ótica do autor tal posicionamento seria considerado preconceito linguístico, porém, seria subestimar um problema educacional em um país cujo a educação é uma das mais falhas e decrépitas do mundo, tornar a falta de acesso a este ambiente educacional uma justificativa cultural sobre o certo e o errado. Sendo assim, é preciso pensar em mães de baixa renda que dormem em filas para assegurar que seus filhos sejam matriculados nas escolas, para que possam ter uma oportunidade de falar e escrever “certo”, que elas nunca tiveram, diante deste cenário, é questionável a posição sobre a institucionalização da educação, ao passo que paga-se – e muito bem – para receber título na educação superior, que esta sim pode ser considerada um comércio cada vez mais voraz e que desvirtua os propósitos sociais do conhecimento.

Porém, não há de retirar o valor da obra de Bagno, apenas neste livro que está em debate, são mais de 160 páginas que o autor dedica tão somente a expor suas opiniões e tentar quebrar o preconceito linguístico, na primeira parte tratando de desmistificar o mesmo, logo demonstrando as consequências deste preconceito, partindo para a elucidação acerca de como romper este paradigma e terminando com a explicação do preconceito contra a linguística e os linguistas. O autor assume, durante todo o livro, bem como em outros de seus textos, que falar sobre língua é tratar sobre um assunto de cunho político, de modo que não há como desvincular a política de um posicionamento teórico determinado e, portanto, parcial, explicitando que é justamente a intenção de suas obras a incitação de reflexões acerca de intolerâncias – inclusive pessoais, sobre a linguística da sociedade brasileira.

Dentro de sua obra, Bagno é muito enfático ao tratar de um tema – que ele atribui ao título de mito – de que o brasileiro não sabe falar português, ao passo que o português só seria bem falado em Portugal, atribuindo esta questão a um complexo perpetuo de inferioridade nacional, delegando ao Brasil a eterna posição de colônia portuguesa. Neste ponto é possível alinhar ideias com as de Bagno, e agregar ainda uma crítica sobre a ampla valorização do internacional em detrimento do nacional, isto é, assim como no Brasil as pessoas seguem ou não a fala e escrita da língua culta – encarada como oficial – em outros países, inclusive em Portugal, ocorre o mesmo, de modo que, ainda que fosse uma língua pura, o português não seria falado de maneira ampla nem mesmo no país.

Um exemplo bastante prático e cotidiano possível de apresentar neste sentido, são os ‘americanismos’ que o brasileiro adere, não é preciso ir longe para descobrir uma série de termos de natureza inglesa (norte-americana) que são amplamente aceitos e falados pela população brasileira, assim como é muito comum encontrar esta mesma parcela da população que fala e escreve o que é considerado ‘errado’ na língua portuguesa, vestindo roupas com frases escritas em inglês. É um cenário completamente sem sentido.

Deste modo, é possível notar que as ideias de Bagno cumprem sua função de estimular o pensamento crítico, analítico, cumprem bem o papel de polemizar um assunto e fazer com que o pesquisador lance uma ótica muito mais aquém do que o autor escreve, traçando comparativos e paralelos que fazem ora questionar, ora concordar, ora discordar do posicionamento do autor, o que demonstra que, certo ou errado, Marcos Bagno possui uma obra rica e preciosa para o estudo de letras, sobretudo da linguística envolvida no curso.

 

2.2  Dialeto maranhense

 

Mané (2012) traça um paralelo entre a questão da língua e do dialeto, explicando que não existe sociedade sem linguagem, que por sua vez pode manifestar-se por meio de línguas diversas, variantes de seu tempo e espaço. Sendo que a maior parte das sociedades se forma de maneira plurilíngue, contudo, os idiomas raramente possuem a mesma função.

 

“Afirmar com exatidão o número de línguas faladas no mundo é uma tarefa muito complexa devido à ambiguidade dos termos “língua” e “dialeto”. A dicotomia “língua” e “dialeto” é melhor compreendida dentro da linguística que, por definição, é a ciência da linguagem. A língua, um dos componentes dessa dicotomia, é o elemento fundamental no estudo dessa ciência. A diversidade de conceituação do termo “língua” nos leva a tentar fazer distinções entre as línguas específicas como o francês, o português e mandarim, da língua em geral. Para as línguas específicas, muitos linguistas acreditam que todas elas tenham importantes propriedades comuns, e para a língua em geral, cada língua particular é uma combinação dessas propriedades universais com um certo número de características, muitas vezes idiossincráticas” (p. 40).

 

Mané (2012) explica então que língua e dialeto são termos capazes de conferir alguma ambiguidade de sentido, tornando complexo seu entendimento. Isto porque não existe um consenso universal acerca dos critérios que são utilizados para sua diferenciação, ainda que exista um número de paradigma que se torna, por vezes, resultados contraditórios. Assim, o autor explica que “Língua e dialeto são duas denominações que se aplicam a aspectos diferentes, mas não opostos, do fenômeno extremamente complexo que é a comunicação humana” (p. 40).

Ramos et al. (2010) explicam que o trabalho realizado quanto aos estudos dialetológicos e geolinguísticos, que se desenvolvem em todo o Brasil, demandam de continuidade para que não percam o que já foi encontrado e estudado ao longo destes 500 anos de história. Neste sentido os pesquisadores da universidade federal do Maranhão passaram a se comprometer com o devassamento do estado e na coleta de materiais amplos com a finalidade de elaboração do atlas linguístico do mesmo.

 

“Com esse empreendimento, poderemos, por um lado, preencher as inúmeras lacunas relativas aos estudos sobre o português falado no Maranhão e dar continuidade ao caminho traçado, no século passado, no Estado, por estudiosos, contribuindo ora para desconstruir ideias cristalizadas e equívocos sobre o falar maranhense, ora para confirmar suposições feitas sobre esse falar, uma vez que a recolha de dados empíricos, resultado de pesquisa in loco, permitirá fazer afirmações com bases científicas sobre esse falar. Por outro lado, com a participação do Maranhão na elaboração do Atlas Linguístico do Brasil - Projeto ALiB, contribuiremos para a macrodescrição do português brasileiro. Este projeto que nasceu do desejo de um grupo de pesquisadores motivados não só pelo empenho do Comitê Nacional do ALiB em concretizar o sonho de Serafim da Silva Neto, Antenor Nascentes, Celso Cunha e Nelson Rossi e elaborar o atlas do Brasil, como também pelo anelo de pesquisadores maranhenses de ver fotografada a língua falada no Maranhão, tem como objetivos: (i) elaborar o atlas linguístico do Maranhão; (ii) descrever a realidade do português do Maranhão para identificar fenômenos fonéticos, morfossintáticos, lexicais, semânticos e prosódicos que caracterizam diferenciações ou definem a unidade linguística no Estado; (iii) registrar aspectos da cultura maranhense e (iv) oferecer materiais resultantes da pesquisa para a elaboração do Atlas Linguístico do Brasil” (p. 42).

 

Os autores prosseguem dizendo que a compreensão do cenário sócio histórico e cultural de todo o Brasil, demanda de um conhecimento mais sistemático acerca da realidade linguístico-cultural brasileira, especialmente quanto ao levantamento e análise de dados que demonstrem características da variedade do português falado em cada um dos estados brasileiros, considerando suas especificidades locais, costumes, hábitos linguístico-culturais e a compreensão da amplitude do país, além das dificuldades de financiamento para pesquisas científicas, que devem ser realizadas gradativamente e de maneira fragmentada.

Ramos et al. (2010) a fim de buscar a retratação de peculiaridades de utilizações, traços, formas e estruturas linguísticas, o projeto dos autores toma como ponto inicial o léxico, ao considerar como a forma mais legitima de registrar e tentar revelar a história da comunidade local, história que encontra-se registrada na memória linguística do estado.

 

“As vertentes selecionadas distribuem-se nos seguintes temas: produtos extrativistas e agroextrativistas, reggae, manifestações culturais de raízes africanas, bumba-meu-boi, culinária e línguas indígenas. Para cada uma dessas vertentes, foi elaborado um questionário específico semântico-léxico-cultural que nos tem possibilitado, por um lado, registrar, muitas vezes, a originalidade de elementos de um determinado vocabulário que ganham sentido ao aparecerem unidos à herança cultural popular de uma comunidade; por outro lado, identificar, na língua falada no Estado, a presença e o vigor de elementos desse vocabulário” (p. 43).

 

O estudo dos autores, o mais completo de existe disponível quanto ao estado do Maranhão, proposto neste artigo, elege duas vertentes principais, que tangem a compreensão das atividades importantes para a economia e cultura do estado, isto é, a de produtos extrativistas e agroextrativistas, especialmente o arroz e o caranguejo e o reggae.

No que tange a corrente de pensamento de Ramos et al. (2010) os produtos extrativistas e agroextrativistas demonstram que foi por meio da agricultura que o Maranhão inseriu-se na economia nacional. Sendo que fora o algodão que deu vida ao estado, transformando-o em produtos, contudo, o arroz também contribuiu de maneira mais modesta para a ocupação de destaque do estado no Brasil colônia.

 

“Hoje, a agricultura, baseada no extrativismo e no cultivo vegetal, continua sendo uma das principais atividades econômicas do Estado. Extraem-se da natureza vários produtos; entre eles, o babaçu e o caranguejo, que têm importância relevante na cultura e no léxico regional. Além desses produtos, cultivam-se o arroz, a mandioca, o milho e a cana-de-açúcar, igualmente importantes. Considerando, por um lado, o valor desses produtos para a economia e a cultura maranhenses e, por outro lado, o entendimento de que o léxico é “um instrumento de produção da cultura e, ao mesmo tempo, seu reflexo.” (PAIS, 1995, p. 1331), elegemos também como objeto de nossa investigação o universo lexical desses produtos” (RAMOS et al., 2010, p. 44).

 

No que tange os produtos extrativistas, como o babaçu e o caranguejo, os campos semânticos selecionados pelos autores foram: colheita (babaçu) e captura (caranguejo), processamento, comercialização e aplicação dos produtos. Ao passo que quanto aos produtos agroextrativistas – arroz, mandioca, milho e cana de açúcar – além dos campos supracitados, acrescentaram o campo cultivo, que inclui a preparação da terra para o plantio e as pragas e ervas daninhas que atacam a plantação. Ao passo que, quanto ao reggae, outra vertente analisada por Ramos et al. (2010) em seu atlas linguístico, os campos são: música, equipamentos, participantes e alucinógenos, de modo que estas vertentes são o enfoque dos estudos dos autores, que se encontram presentes e latentes no cenário socioeconômico e cultural maranhense.

Os autores explicam que, no que tange à linguagem do reggae, a mesma apresenta um vocabulário próprio e que, muitas vezes possui termos muito específicos, espécie de código que identifica e legitima o regueiro como um membro de um grupo que adota o ritmo como um elemento de lazer e, através dele, passa a desenvolver um movimento de concepção de sua identidade étnica.

 

“Examinar o léxico, como espaço privilegiado do processo de transformação dos sistemas de valores, visão de mundo e práticas sociais e culturais de um grupo humano, significa investigar a língua em sua relação com a história e a cultura, levando em conta que sobre o desenvolvimento da língua atuam fatores extralinguísticos, que nos oferecem subsídios para uma compreensão mais ampla da realidade da língua. A língua, como fenômeno social que vive e se desenvolve como uma elaboração coletiva (cf. LÉVI-STRAUSS, 1975, p.73), não só faz parte da cultura como é o meio que nos permite a apropriação da própria cultura, seu conhecimento, preservação e divulgação” (RAMOS et al., 2010, p. 47).

 

No sentido da língua, sociedade e cultura, os autores acreditam que tais elementos são indissociáveis, bem como sua interação é contínua, construindo na realidade um complexo único. Quanto à inter-relação entre língua, cultura e sociedade, é justamente no âmbito lexical que tais relações passam a ser mais explícitas e evidentes, uma vez que:

 

“O vocabulário fornece (...) uma matéria muito abundante, de que se servem historiadores da sociedade e da cultura. O vocabulário conserva testemunhos insubstituíveis sobre as formas e as faces da organização social, sobre os regimes políticos, sobre os modos de produção que foram sucessivamente empregados, etc.”. (BENEVISTE, 1989, apud RAMOS et al., 2010, p. 47).

 

Deste modo, no sentido das relações que estabelecem-se entre a língua, cultura e a sociedade, o léxico passa a ocupar um local privilegiado, uma vez que sua natureza primária pode nomear, designar, compreender e pertencer ao real, compreendendo-o como um conjunto formado por vários subconjuntos, tanto de conhecimento geral por aqueles faltantes da língua, como por subconjuntos, que são também denominados de léxicos de especialidade, uma vez que se atrelam aos domínios das ciências, tecnologias, profissões e atividades mais particulares (RAMOS et al., 2010).

Assim, os autores explicam que os léxicos de especialidade são campo de estudo da terminologia, compreendida como um subconjunto específico do léxico de dada língua, de modo que cada área específica do conhecimento humano lhe compõe, de maneira inicial com a proposta interessada somente em vocabulários científicos e tecnológicos, ampliando-se de maneira progressiva para outros campos.

Santana e Bezerra (2011) traçam também um atlas linguístico do Maranhão, a fim de levantar dados de identidade da comunidade, avaliando a fala de 40 indivíduos de maneira igual por dois gêneros, escolarizados até o 5º ano do ensino fundamental e vindos de dez diferentes municípios do estado. A fim de avaliar a questão da escolaridade, os autores questionam também indivíduos com nível superior completo, sendo que existe então uma articulação vogal – com as vogais labiais – demonstrando que a variável mais importante para a ocorrência da síncope seria esta.

Em seguida, os autores apontam que, no âmbito fonológico precedente, as alveolares favorecem uma regra, assim como as líquidas /l/ e /r/ no cenário fonológico seguinte. De modo que a ampliação da palavra também demonstra relevância, porém, os autores alegam que o resultado não é preciso por conta da qualidade reduzida de vocábulos polissílabos. Quanto ao elemento localidade, o fator relevante único dentre os extralinguísticos, destaca-se no município de Tuntum, onde o fenômeno mais fora observado pelos autores, sendo que nos elementos gênero e idade, não demonstraram relevância para a ocorrência da regra, bem como a escolaridade não fora selecionada como determinante no estudo (SANTANA; BEZERRA, 2011).

Brito (2012) explica então que, entre os níveis fundamental e discursivo da análise, existe ainda o nível narrativo, um grau onde o sentido é apresentado na figura de uma configuração narrativa abstrata onde os sujeitos relacionam-se com objetos e com outros sujeitos na tentativa de encontrar valores. Seu entendimento na ótica do autor, contudo, se limita que é na manipulação destes níveis distintos que o sentido passa a se permear. Sendo que o nível fundamental consiste no patamar inicial de todo o processo de concepção do sentido, este que se faz presente, na ótica semântica, acerca de uma forma totalmente simples e abstrata, esta forma que o autor explica:

 

“[...] pode ser apreendida como uma oposição semântica, por exemplo: /vida/ versus /morte/, /natureza/ versus /civilização/, /liberdade/ versus /opressão (dominação, coerção)/ etc. Para examinar um texto por esse primeiro nível do percurso gerativo, é preciso, portanto, realizar um processo de abstração que permita identificar uma forma elementar do seu sentido geral”. (BRITO, 2012, p. 3).

 

Tais oposições, como prossegue dizendo o autor, é possível notar em exemplos que apresentam uma oposição entre si, de modo que os termos se pressupõem, de maneira recíproca. Então, o sentido de liberdade, por exemplo, seria inexistente sem que houvesse a noção da opressão, sendo que o oposto também é válido.

Deste modo, a compreensão mais apurada de heterogeneidades da língua tem sido mais evidentes em estudos voltados para a sociolinguística e para a dialetologia. Sendo que a primeira delas prevê o estudo de variações da língua falada e sua interferência com limitações sociais, como gênero, tipificação etária, escolaridade, localização, renda e diversas outras. Ao passo que a segunda manifesta-se partindo da cartografação dos resultados ou apenas pela análise contrastiva das realizações linguísticas que são encontradas em regiões, quais sejam. Para Chambers e Trudgill (1980, p. 70) duas linhas de análise descritiva da língua não são indissociáveis, isto é:

 

“Os dialetólogos estabeleceram há muito tempo que a língua varia de lugar para lugar. Os sociolinguistas enfatizam que a língua também pode variar de pessoa para pessoa no mesmo lugar. Tanto para os dialetólogos, quanto para os sociolinguistas, não é o simples fato da variação linguística que é importante. O que é importante é que essa variabilidade correlaciona-se com outros fatores, de modo que certas variantes são mais estreitamente associadas a uma vila do que a outra, a trabalhadores mais do que aos gerentes, a pessoas que falam com amigos próximos, em vez de estranhos, ou a algum outro fator”.

 

Blanch (1978) reforça a relação sociolinguística com estudos dos dialetos, alegando que a dialetologia pode, de maneira evidente, beneficiar-se de maneira extrema das contribuições da sociolinguística como, de fato, já ocorre. Assim, o progresso metodológico que a sociolinguística estipula com sua rigorosa e sólida consideração de aspectos sociológicos, antes apenas tratados de maneira superficial pela dialetologia, que são amplamente utilizados na análise descritiva da língua.

 

3.    CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Através das pesquisas realizadas a fim de compor o presente artigo, foi possível compreender que a realização de uma análise dialetológica, além da elaboração de um atlas linguístico regional, tende a complementar, ampliar e atualizar trabalhos realizados neste sentido, conformando de maneira dialetológica os aspectos de determinados estados, como o Maranhão.

Tal pesquisa deve ocorrer por meio de um mapeamento de caracteres fonéticos, fonológicos, morfossintáticos e semânticos. Para além, deve ainda ofertar subsídios para linguistas, lexicólogos, etimólogos, filólogos, pedagogos, geógrafos e profissionais de áreas similares que desejem inserir-se no bojo destas pesquisas, atuando no processo de ensino e aprendizagem e permitindo o aprofundamento do conhecimento acerca da realidade linguística e cultural maranhense, já que deve haver ainda a reflexão sobre variáveis que integram de maneira natural a língua portuguesa que é falada no Brasil.

Conclui-se o presente artigo com a crença de que tanto objetivo geral quanto específicos foram atendidos, bem como a problemática de pesquisa foi solucionada. Contudo, como não era de intento, o assunto não fora esgotado, fora dado um primeiro e importante passo para o fomento de conhecimento e estímulo para o aprofundamento no tema, que pode ser feito em estudos posteriores, que visem corroborar, refutar ou complementar as constatações obtidas até o momento.

 

REFERÊNCIAS

 

BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 50ª ed. São Paulo:

Loyola, 2007.

 

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[1] Professor das Séries Iniciais de Lucas do Rio Verde-MT. Licenciado em Pedagogia pela URCA – Universidade Regional do Cariri Cratos - CE e Pós-Graduado em Língua Portuguesa e Literatura pela Faculdade Venda Novas do Imigrante Faveni, Espírito Santo. Trabalha atualmente na Escola Municipal de Ensino Fundamental Caminho Para o Futuro. Email: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo..