DETERMINISMO E EXCLUSÃO SOCIAL: ATÉ QUE PONTO NOSSOS DIREITOS SÃO IGUAIS?
Lúcio Mussi Junior[1]
Resumo
O presente artigo traz um estudo sobre o “Determinismo Social” bem como o questionamento sobre até que ponto, na prática, os brasileiros nascem com os mesmos direitos. Observando o contraste entre as possibilidades oferecidas às pessoas nascidas em diferentes classes sociais e diferentes localidades, nota-se o quanto a maioria dos jovens acabam impelidos a manterem quando adultos as mesmas condições sociais em que foram criados. Percebeu-se que nossa legislação determina a igualdade de direitos para todos os indivíduos assim como garante às crianças e adolescentes uma série de direitos visando garantir-lhes o adequado desenvolvimento. Contudo, percebe-se que na prática os jovens das classes menos favorecidas crescem em condições precárias que acabam, em boa parte dos casos, por condená-los a uma vida de miséria ou mesmo atirá-los na criminalidade. Para constituição do presente trabalho valeu-se do método de revisão bibliográfica à luz de teóricos como Blackburn (1992), Macedo (2010), Petrin (2014), Silva e Sousa (2012), entre outros.
Palavras-chave: Determinismo Social. Oportunidades. Igualdade de Direitos.
Abstract
This article presents a study on "Social Determinism" as well as the questioning of the extent to which, in practice, Brazilians are born with the same rights. Observing the contrast between the possibilities offered to people born in different social classes and different localities, one notices how much the majority of young people impelled to maintain as adults the same social conditions in which they were created. It was realized that our legislation determines equal rights for all individuals as well as guarantees to children and adolescents a series of rights aimed at ensuring their adequate development. However, it can be seen that in practice the young people of the less favored classes grow up in precarious conditions that end up, in most cases, by condemning them to a life of misery or even throwing them into crime. For the constitution of the present work, it was used the method of bibliographical revision in the light of the theorists like Blackburn (1992), Macedo (2010), Petrin (2014), Silva and Sousa (2012), among others.
Keywords: Social Determinism. Opportunities. Equal rights.
Introdução
A presente pesquisa busca esclarecimentos acerca do “Determinismo Social” em nosso país. Questiona-se prioritariamente até que ponto é possível afirmar que os brasileiros nascem com os mesmos direitos.
Busca-se traçar um breve contraste entre a qualidade de vida e as condições de desenvolvimento oferecidas às crianças de diferentes classes sociais.
Observa-se ao longo da pesquisa que o “Determinismo Social” ainda impera no Brasil e, em parte significativa dos casos, impele os filhos de famílias necessitadas a seguirem os mesmos destinos de privações vividos pelos seus pais.
Por fim, percebe-se no poder público as condições estruturais, financeiras e a obrigatoriedade legal de buscar meios para garantir que as crianças de famílias necessitadas tenham o mínimo necessário ao seu bom desenvolvimento.
Para o cumprimento dos objetivos propostos nesta pesquisa, valeu-se da metodologia de revisão bibliográfica à luz de teóricos como Blackburn (1992), Macedo (2010), Petrin (2014), Silva e Sousa (2012), entre outros.
Desenvolvimento
Para Silva e Sousa (2012) foi o fortalecimento do capitalismo industrial no século XVIII que trouxe os fundamentos da sociedade como conhecemos hoje. Nesse momento originava-se a relação entre capital e trabalho onde o capitalista consolidava-se como o patrão e o trabalhador vendia o único bem que lhe restava, a força de trabalho, tornando-se assalariado e dependente dos meios de produção que passaram a ser propriedade do capitalista.
A justificativa encontrada para esta nova fase foi o liberalismo que se baseava na defesa da propriedade privada, comércio liberal e igualdade perante a lei. A velha sociedade medieval estava sendo totalmente transformada, assim o nome de homem de negócios era exaltado como virtude, e eram-lhe dadas todas as credenciais uma vez que ele poderia fazer o bem a toda sociedade. (SILVA E SOUSA, 2012, P.6)
Giddens (1991) esclarece que, quando as relações se mostram mais complexas a partir das relações capitalistas e da constante busca pela modernização da sociedade, muitos indivíduos passam a não ser capazes de suprir suas necessidades básicas não alcançado sua liberdade.
A ordem social emergente da modernidade é capitalista tanto em seu sistema econômico como em suas outras instituições. O caráter móvel, inquieto da modernidade é explicado como um resultado do ciclo investimento-lucro-investimento que, combinado com a tendência geral da taxa de lucro a declinar, ocasiona uma disposição constante para o sistema expandir (GIDDENS, 1991, p.20).
Já para Blackburn (1992), ao analisar esse processo é possível perceber o homem e a natureza como vampiros da razão ao passo em que dificultam a satisfação das necessidades e também a liberdade. Para o autor a natureza é mais que um palco, ela interfere diretamente na história do homem.
Harvey (1992) afirma que, a modernidade extrapola a ruptura com todas as condições históricas caracterizando-se como um interminável processo de rupturas.
Amparo legal
A Constituição Federal de 1988 determina que todos os indivíduos são iguais perante a lei, independente de sexo, cor, classe social, orientação religiosa ou qualquer outro parâmetro.
Esta mesma Carta Magna afirma também o que se segue:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Art. 227 da Constituição Federal Brasileira)
Deste modo, fica evidente a preocupação em proteger o direito de igualdade entre os cidadãos brasileiros, bem como proteger os direitos da criança e do adolescente para que possam receber, ao menos o imprescindível, para crescerem e se desenvolverem de modo a ocupar com dignidade seu lugar na sociedade.
No entanto, observa-se em nosso país grande discrepância entre a legislação vigente e a realidade com a qual nos deparamos.
Ao passo que nossa constituição federal prega a igualdade de direitos, na prática é possível ver a todo instante que a acentuada desigualdade social acaba imponto severas diferenças.
Toda a criança tem seu direito à vida assegurado por lei, mas na prática o governo não encontra meios de impedir o grande número de abortos que são feitos todos os dias em clínicas clandestinas. Também não se consegue garantir a assistência médica adequada nem tampouco a boa alimentação a todas as crianças.
Nota-se que o Brasil é um país de dimensões continentais e como tal, apresenta grande diversidade de culturas, de grau de desenvolvimento, de clima, de topografia, em fim, entende-se que todas essas variantes acabam por impor dificuldades ao poder público. No entanto, percebe-se que nosso país é bastante produtivo e que a carga tributária incide de forma pesada sobre todas as áreas de produção, comercialização, transporte, sobre a renda e sobre a propriedade. Assim, entende-se que se esse dinheiro fosse melhor administrado pelo poder público e os índices de corrupção fossem menores, seria possível fazer muito mais para se garantir de forma adequada o direitos básicos à população carente.
Determinismo Social
Petrin (2014) define determinismo como sendo a afirmação de que escolhas, bem como as ações humanas não estão sujeitas ao livre arbítrio de cada indivíduo, mas acontecem por pura relação de causalidade.
Macedo (2010) corrobora dizendo que o determinismo costuma pensar nas relações existentes entre as coisas, objetos e os meios como causa e efeito, sujeito e objeto. O autor afirma ainda ser muito difícil evitar pensamentos deterministas.
Deste modo, é possível notar que a cada dia o “determinismo social” se fortalece em nosso país. Imagina-se que duas crianças nascidas no mesmo dia, na mesma cidade, com os mesmos direitos à vida, saúde, alimentação, educação, segurança, entre outros, devidamente assegurados pela nossa Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Supondo que uma dessas crianças seja o quinto filho de um casal que mora em um barraco improvisado com restos de madeira, localizado em um bairro pobre e violento na periferia. Que a mãe dessa criança seja desempregada e analfabeta. Que o pai dessa criança seja operário e saia de casa às cinco horas da manhã para trabalhar e volte às vinte horas devido à distância e que receba um ordenado de um salário mínimo como única renda de sua família. Vamos supor agora que a outra criança é filha de um dos sócios da empresa que o pai da primeira criança trabalha. Supomos que o pai dessa segunda criança recebe um farto pró-labore, além de participação nos lucros da empresa da qual é sócio. Mora em um bairro nobre da cidade em uma casa que oferece todas as condições de conforto e higiene onde o bebê recém-nascido já possui sua própria suíte montada com tudo de que necessita.
Perante essa situação hipotética, mas similar a muitas que acontecem todos os dias, podem-se fazer várias indagações: - Na prática, essas duas crianças têm o mesmo direito à vida? Terão o mesmo tipo de assistência á saúde? As duas terão a alimentação adequada para seu bom desenvolvimento físico e mental? Terão acesso à educação de qualidade? Esses dois indivíduos terão direitos iguais no tocante ao acesso a laser e ao convívio social?
Mostra-se evidente a impossibilidade de se garantir a mesma qualidade de vida a todos os brasileiros. No entanto, nossa Carta Magna determina que todas as crianças têm direito ao menos ao mínimo necessário para seu adequado desenvolvimento. Deste modo pergunta-se: A primeira criança citada em nossa situação hipotética terá o mínimo necessário para se desenvolver adequadamente? Ao analisar-se a situação narrada, podemos supor que está primeira criança terá no futuro condições de oferecer a seu filho uma qualidade de vida melhor do que seu pai está oferecendo pra ela?
Claro que existem muitos fatores envolvidos no desenvolvimento de uma criança e que muitas pessoas de origem humilde conseguem mudar sua situação financeira e ascender socialmente, mas estatisticamente o “determinismo social” impera em nosso país.
Outro ponto que merece destaque é o da criminalidade. Pesquisas apontam que a maior parte dos presidiários tem origem em famílias desestruturadas e possuem parentes que já tiveram passagens pela polícia. Tal fato vem reforçar ainda mais o “determinismo social”. Fica evidente que uma criança que cresce em meio à criminalidade, convivendo constantemente com o crime terá muito mais chances de entrar para o mundo do crime se comparada com uma criança educada em um meio onde as pessoas buscam no estudo e no trabalho os meios de ganhar a vida.
Assim percebe-se que, ao passo que o indivíduo não encontra meios para garantir os direitos de seu filho, o poder público deveria agir de forma adequada para que estas necessidades básicas fossem supridas.
Garantir às crianças e adolescentes seus direitos mínimos para o adequado desenvolvimento e formação é a peça fundamental na construção de uma sociedade mais justa, segura e produtiva.
Conclusão
Nota-se com a presente pesquisa que, embora nossa legislação garanta direitos iguais a todos os brasileiros e assegure para as crianças e adolescentes as condições básicas necessárias ao seu adequado desenvolvimento, na prática ainda há muito a se fazer no sentido de frear o “determinismo social”.
Entende-se que a maioria das crianças e jovens acaba impelida a dar sequência à estrutura social em que foram educados. Com isso, percebe-se a necessidade da criação e ampliação de projetos sociais que atuem de forma a garantir de fato que as crianças e jovens de classes sociais carentes tenham acesso ao menos ao mínimo necessário ao seu adequado desenvolvimento. É preciso ainda que sejam apresentadas a estes jovens, opções de subsistência capazes de mantê-los fora da criminalidade na idade adulta.
Outro fator de destaque é a necessidade de um combate mais eficaz ao crime de modo a garantir efetivamente a segurança da população bem como evitar que indivíduos já inseridos no mundo do crime continuem aliciando os jovens para práticas de delitos.
Portanto, é possível concluir que o “determinismo social” no Brasil ainda é muito forte e que apenas uma ação ampla e efetiva do governo, com o apoio da sociedade, no sentido de garantir às crianças e adolescentes carentes ao menos o mínimo necessário ao se desenvolvimento adequado e paralelamente a isso um combate realmente eficaz à criminalidade poderá amenizar esse problema de nossa sociedade.
Referências
BLACKBURN, R J. O Vampiro da Razão. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.
GIDDENS, A. As consequências da Modernidade. 1991
HARVEY, D. Condição pós moderna. São Paulo: Ed. Loyola, 1992
MACEDO, L. O Determinismo em Educação, hoje. Manuscrito não publicado. São Paulo: Maio de 2010. Disponível em http://www.escolasanti.com.br/media/files/3400/3218-o-pensamento-determinista-na-educacao-hoje.pdf. Acesso em março de 2017.
Petrin, Natália. Determinismo. Estudo Prático. 2014. Disponível em http://www.estudopratico.com.br/determinismo/. Acesso em março de 2017.
SILVA, Cristiane Freitas da; SOUSA JUNIOR, Airton Silva de. Pobreza e Desigualdade no Brail: Uma Análise da Contradição Capitalista. Universidade do Porto. 2012. Disponível em http://www.aps.pt/vii_congresso/papers/finais/PAP0692_ed.pdf. Acesso em março de 2017.
[1] Licenciado em Letras. Especialista em Docência do Ensino Superior e Linguística Aplicada à Educação. Coordenador do Instituto Saber de Ciências Integradas.