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REFLEXÕES GEOPOLÍTICAS: CORRENTES E CONTRACORRENTES DO RACIONALISMO MODERNO

Larissa Pereira Dias1

Gisele da Costa Silva2

 

RESUMO:

O objetivo principal deste trabalho é analisar os fundamentos filosóficos da geografia científica, em particular, da Geografia Política. Busca-se desta feita, assimilar as características dos dois polos epistemológicos do século XVIII, que fomentaram os primeiros debates no âmbito da Geografia Política, exercendo, pois, influência em seu desenvolvimento. Fica latente, portanto, a intenção de demonstrar como as proposições dos geógrafos tradicionais coincide largamente com os discursos dos filósofos das correntes e das contracorrentes do racionalismo moderno. Destacamos, todavia, que alguns intelectuais sobressaíram-se, sobremaneira, durante o período que ora nos preocupa, o Século das Luzes. Notadamente, sobre Montesquieu e Herder, podemos aduzir que os mesmos, se inserem na história da ciência moderna, como um quadro teórico de referência para os geógrafos do século XIX e XX. Tomando alguns exemplos possíveis, haja vista, que os debates em torno deste tema não se encerram nessa sucinta abordagem, realizou-se uma pesquisa bibliográfica a fim de delimitar algumas linhas de reflexão consideradas primordiais para interpretar o pensamento, particularmente, como dito, dos filósofos acima mencionados. Reiteramos que é fundamental compreender a gênese deste ramo da Geografia que se dedica a analise das questões políticas, para aprofundar os debates nessa área, além de se obter uma melhor definição conceitual sobre o próprio termo Geografia Política desviando assim, dos discursos superficiais.

 

Palavras-chave: Geografia Tradicional. Montesquieu. Herder.

 

Introdução

 

Em vista da complexidade com que se apresentam as questões geopolíticas contemporâneas, sobretudo, no continente europeu, acredita-se que “[...] somente percorrendo a complexa história dos acontecimentos políticos até o sistema atual dos Estados-nações é possível compreender a gênese das divisões internas na Europa” (MUSCARÀ, 2009, p.38), bem como, a atual Divisão Internacional do Trabalho.

Nesse seguimento, objetiva-se analisar o modo como a Geografia, enquanto ciência recém-constituída, se inseriu no âmbito das discussões políticas em fins do século XIX e início do século XX, tendo em vista que, “[...] o espaço geográfico é intrinsicamente político, ou seja, ele é arena de conflitos e, consequentemente, de normas para a regulação que permite o seu controle” (CASTRO, 2005, p.139).

Para tanto, parte-se do entendimento de que, no seu princípio, “[...] a geografia política procurou na natureza o marco teórico para explicação da vida política” (GOMES, 2007, p.18), todavia, “no caso específico da Alemanha, em processo de unificação e de constituição do Estado Nacional, é mais que notória a força desse contexto nos primeiros estudos em geografia política” (COSTA, 1992, p.20). Logo, fundamental é constatar de imediato que, inscrevendo-se como uma referência nacional, Friedrich Ratzel é o principal representante na perspectiva do pensamento determinista, fomentando discussões primordiais sobre as “[...] relações entre política e território, componentes essenciais do processo histórico de formação das sociedades” (CASTRO, 2005, p.15).

Acredita-se, portanto, ser necessário recorrer à filosofia do século XVIII, incorporando, assim, o contexto histórico em que se inserem as principais proposições dos filósofos deste século, para, de fato, compreender as nuanças da Geografia Política Tradicional. Pois, tal como aponta Castro (2005),

 

a tradição do determinismo da natureza na disciplina foi, na realidade, um prolongamento de uma velha preocupação dos filósofos, entre eles Montesquieu, sobre a possibilidade de explicar a fluidez da vida política com argumentos fundados em fatores estáveis, como o meio físico. (CASTRO, 2005, p.18)

 

Todavia, no processo de institucionalização da razão como base para a ciência moderna, processo este, em que os filósofos franceses foram sem dúvida, protagonistas, “[...] reações críticas também deram lugar a uma tradição de oposição ao próprio racionalismo [...]” (GOMES, 2007, p.94).

Nesse seguimento, recorreu-se à base epistemológica da Geografia Clássica, às correntes e, ainda, às contracorrentes do racionalismo moderno, que igualmente nortearam o pensamento geográfico tradicional, a fim de depreender os principais debates dos intelectuais que se detinham na análise das questões geopolíticas da época.

 

Metodologia

 

Pesquisa bibliográfica e revisão da literatura selecionada referente ao tema em questão.

 

Resultados e discussão

 

Considerando, pois, que “a Geografia Política pode [...] ser compreendida como um conjunto de idéias [sic] políticas e acadêmicas sobre as relações da geografia com a política e vice – versa” (CASTRO, 2005, p.17), cabe, portanto, “[...] destacar a presença do naturalismo no discurso da geografia política” (COSTA, 1992, p.19), sobretudo, “[...] na chamada geografia positivista tradicional” (COSTA, 1992, p.19).

De fato, “o positivismo é sem dúvida o herdeiro legítimo da ciência do Século das Luzes [...]” (GOMES, 2007, p.85). Nesse seguimento, Rouanet (20019) explica que “[...] o Iluminismo é uma tendência trans-epocal, que cruza transversalmente a história e que [...] não [...] se extinguiu no século XVIII” (ROUANET, 2009, p.28), de tal maneira, que “a geografia confere a Mostesquieu [sic] uma grande importância” (GOMES, 2007, p.80).

Refletindo esta visão, Castro (2005) explica que, “[...] a expressão geografia política foi usada pela primeira vez em 1750 pelo filósofo francês Turgot [...], inspirado provavelmente no livro IV de O espírito das leis de Montesquieu” (CASTRO, 2005, p.19). Suscetivelmente, em fins do século XIX, “indo além do determinismo do meio natural como fundamento do ‘espirito das leis’, Ratzel procurou elaborar uma verdadeira teoria das relações entre a política e o espaço [...]” (CASTRO, 2005, p.20).

Todavia, “no início da modernidade, as frentes eram claras: o Contra-Iluminismo combatia [...] o pensamento iluminista [...] numa ótica romântica, como os historicistas alemães [...]” (ROUANET, 2009, p. 28-29). Nessa linha de pensamento, destaca-se aqui, “a obra Ensaio político sobre o Reino da Nova Espanha [...] sendo esse trabalho considerado pioneiro na área de geografia regional e política” (NETO, ALVES, 2010), sendo que, o mesmo foi redigido por Humboldt. Como esclarece Gomes (2007), apesar da preponderante influência filosófica francesa, “[...] é importante notar que Humboldt foi também contemporâneo de um movimento de ruptura com o Iluminismo” (GOMES, 2007, p.152).

Teoricamente, nesta tradição, a “[...] influência fundamental reside no pensamento de Herder [...]” (GOMES, 2007, p.102) e, ainda, de “Schelling (1775-1861), Novalis (1772- 1801), Fichte (1762-1829), A. W. Schlegel (1767-1845) e seu irmão, f. Schlegel [...] personagens centrais do [...] Romantismo, pilares do idealismo alemão nascente” (GOMES, 2007, p.152). Ademais, sobretudo, Herder “critica vivamente a concepção determinista de Montesquieu e acrescenta que não é possível deduzir leis gerais pela via do determinismo” (GOMES, 2007, p.144).

É bem verdade que, a partir do Idealismo alemão, “surge um novo nacionalismo, [...] e levado ao extremo, este tipo de nacionalismo pode desembocar em um messianismo idealista, agressivo e perigoso” (GOMES, 2007, p.103). Sendo assim, expõe-se aqui, que “após a Primeira Guerra Mundial, geógrafos e o conhecimento por eles produzido foram mobilizados para ajudar a traçar as novas fronteiras da Europa” (CASTRO, 2005, p.20).

Posteriormente, na Segunda Guerra Mundial, “[...] a escola de geopolítica alemã, inspirada em alguns conceitos de Ratzel, forneceu a justificativa intelectual para o autoritarismo do III Reich e para o expansionismo alemão” (CASTRO, 2005, p.20). Por fim, “os desdobramentos do nazismo, do fascismo e do Holocausto conduziram a disciplina ao ostracismo [...]” (CASTRO, 2005, p.20).

Todavia, obedecendo à proposta deste trabalho de analisar os primeiros debates no âmbito da Geografia Política, reiteramos que, “nada é mais significativo do que encontrar nestas obras do Século das Luzes discussões ou alusões a problemas que, um século mais tarde, serão retomadas como campo da geografia” (GOMES, 2007, p.70-71). Pois, tal como afirma Vidal de La Blache (2012), “a Geografia é uma velha ciência, mas se rejuvenesce periodicamente à medida que mergulha em suas fontes vivas, ou seja, na diversidade dos espetáculos terrestres” (VIDAL DE LA BLACHE, 2012, p.82).

 

Conclusão

 

Tendo em vista que, os discursos da Geografia Política Tradicional, consolidada, pois, como ciência social somente em fins do século XIX e início do século XX, é fruto dos anseios epistemológicos dos filósofos iluministas, sobretudo, dos franceses e dos alemães, nada é mais justo, que atribuir a estes intelectuais o mérito de inserir na ciência moderna, os primeiros debates sobre território, Estado, Nação e, consequentemente, sobre o espaço geográfico e sua gestão.

 

Referências bibliográficas

 

CASTRO, I. E. de. Geografia e política: território, escalas de ação e instituições. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.

 

COSTA, W. M. Geografia e política e geopolítica: discursos sobre território e poder. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; HUCITEC, 1992.

GOMES, P. C. da C. Geografia e modernidade. 6. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.

 

MUSCARÀ, L. A heurística de Jean Gottmann: um dispositivo psicossomático. In: SAQUET,

M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. 1. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2009.

 

NETO, D. P.; ALVES, F. D. Alexander Von Humboldt: viajante naturalista e entusiasta da harmonia da natureza. In: GODOY, P. R. T. de. (Org.). História do pensamento geográfico e epistemológico em Geografia. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.

 

ROUANET, S. P. As razões do iluminismo. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

 

VIDAL DE LA BLACHE, P. Aula inaugural do curso de geografia. Tradução de Guilherme Ribeiro. In: HAESBAERT, R.; PEREIRA, S. N.; RIBEIRO, G. (Orgs.). Vidal, vidais: textos de geografia humana, regional e política. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012. p.67-84.

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