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A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NO CONTEXTO INSTITUCIONAL FRENTE AO AUTISMO

Francisca Oliveira da Silveira
Patrícia Fávero de Oliveira

 

RESUMO

Este artigo aborda a intervenção psicopedagógica no contexto institucional frente ao autismo. Também, conceitua de forma breve esse transtorno que gera prejuízos na comunicação, interesse social e aprendizagem. No DSM-IV (2002), o autismo é classificado como uma síndrome que pertence aos Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) e se manifesta no comprometimento de três áreas: socialização, comunicação e aprendizagem. A presente pesquisa tem como objetivo compreender o processo de intervenção psicopedagógica, de forma que contribua com a inclusão do autista nas classes regulares de ensino. Em relação à metodologia adotada, trata-se de uma abordagem de pesquisa qualitativa, baseada na revisão de literatura. Considera-se esta pesquisa de grande relevância por compreender, a partir dos autores apresentados, como se dá o processo de intervenção psicopedagógica, ao qual submete a pessoa com autismo, que por se tratar de um sujeito com um desenvolvimento global diferente do padrão, representa um desafio para a educação. Daí a sua importância, principalmente para a socialização da criança autista, que aliado ao trabalho do professor promove o seu desenvolvimento e autonomia.

 

Palavras-chave: Autismo. Intervenção psicopedagógica. Métodos.

  1. INTRODUÇÃo

Apesar da grande quantidade de pesquisas realizadas sobre o autismo, o transtorno continua ocultando sua origem e apesentando desafios à intervenção educativa e terapêutica.

O autismo é um transtorno global do desenvolvimento marcado por três características fundamentais: inabilidade para interagir socialmente, dificuldade no domínio da linguagem para comunicar-se ou lidar com jogos simbólicos e padrão de comportamento restritivo e repetitivo.

Segundo a Associação Psiquiátrica Americana, no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM – IV, 2002, p. 98), algumas características comuns, agrupam estes transtornos, a saber: “comprometimento grave e global em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de interação social recíproca, habilidades de comunicação ou presença de estereotipias de comportamento, interesses e atividades”.

Nessa categoria encontra-se o Autismo ou Síndrome do Espectro Autista, que junto com a Síndrome de Rett, da Desordem Desintegrativa da Infância, da Síndrome de Asperger e do Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação se constituem nos Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) ou Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID).

Na década de 90, as instituições de ensino passaram a se adequar quanto ao atendimento de crianças com necessidades educativas especiais, uma vez que a Lei nº 9.394/96, cap. XIV que trata da educação especial, garantiu o direito das pessoas com necessidades educativas especiais de se matricular em uma escola de ensino regular. Mas, ao mesmo tempo em que a lei rezou a garantia do direito de fazerem parte de um contexto educativo levantou-se a discussão para as instituições de ensino regular que era de adequar no que se refere ao espaço físico e preparação dos profissionais para atenderem esses alunos, como também aos procedimentos metodológicos a serem aplicados.

Em face do que foi exposto, na orientação destes procedimentos encontra-se o psicopedagogo que tem papel fundamental como agente de inclusão na escola e na sociedade, principalmente por tornar-se o mediador aluno-escola-família. Diante disso, levantou-se a problemática: Como se dá a intervenção do psicopedagogo junto ao autista? Quais os métodos utilizados em uma intervenção psicopedagógica que podem beneficiar os autistas em suas potencialidades, no seu desenvolvimento de aprendizagem nas classes regulares de ensino? Para tanto, esta pesquisa buscou como objetivo compreender o processo de intervenção psicopedagógica, de forma que contribua com a inclusão do autista na classe regular de ensino.

Nessa perspectiva, a justificativa desta pesquisa advém do desconhecimento dos métodos utilizados em uma intervenção psicopedagógica, de forma que trabalhe com as peculiaridades do transtorno autismo, vindo então a aprofundar-se em alguns estudos a partir da revisão de literatura.

  1. A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NO CASO DO AUTISTA.

Bernardo e Martim (1993) afirmam que as áreas de intervenção na educação da criança autista são aquelas em que demonstram maiores dificuldades, como a comunicação, a linguagem e o desenvolvimento cognitivo. Outras áreas não poderão ser esquecidas, já que se deve proporcionar à criança uma aprendizagem na sua globalidade são a psicomotricidade (global e fina), a coordenação viso motora, a autonomia pessoal e os comportamentos disruptivos e inadequados (LOPES, 2011). 

Nilsson (2004) diferencia o aprendizado de uma criança autista e a não autista em uma visão cognitiva. O autista apresenta um pensamento literal concreto, visual, fragmentado. Ocorre um tipo de estímulo sensorial por vez, enquanto que em uma criança não autista ocorre a coordenação de todas as modalidades sensoriais. “Pessoas com autismo pensam de sua própria maneira associativa, e isto torna difícil de manter uma conversação, mesmo quando eles têm a habilidade de usar a linguagem” (NILSSON, 2004, p.52-53). Portanto, faz-se necessário e fundamental identificar o que se deve ensinar a uma criança autista, pois a mesma não se ajusta às formas habituais de avaliação. 

As principais estratégias de intervenção para com o autista devem estimular o desenvolvimento social e comunicativo; aprimorar o aprendizado e a capacidade de solucionar problemas; diminuir comportamentos que interferem com o aprendizado e com o acesso às oportunidades de experiências do cotidiano; e ajudar as famílias a lidarem com o autismo. Para isso, pontuam-se os principais métodos de intervenção de aprendizagem: ABA; PECS; TEACCH. 

A ABA (Análise Aplicada do Comportamento) é um tratamento comportamental indutivo que objetiva ensinar por etapas as habilidades que o autista não possui. Cada habilidade é ensinada, em geral, em plano individual, de maneira associada a uma indicação ou instrução, levando a criança autista a trabalhar de forma positiva. De acordo com Mello (2001, p.21):

 

o método ABA recebe como crítica a de supostamente robotizar as crianças, o que nos parece correto, já que a ideia é interferir precocemente o máximo possível, para promover o desenvolvimento da criança, de forma que ela pode ser maximamente independente o mais cedo possível.”

 

A esse método junta-se o uso funcional de figuras de comunicação, conhecido como PECS (Sistema de Comunicação por Figuras) que funciona através da troca de figuras.

O método PECS foi desenvolvido com o intuito de ajudar crianças e adultos autistas e com outros distúrbios de desenvolvimento a adquirir capacidade de comunicação. Método considerado simples e de baixo custo, e quando bem implantado apresenta resultados inquestionáveis na comunicação através de cartões em crianças que não falam, e na organização da linguagem verbal para as crianças que falam, mas que precisam organizar a linguagem. 

Outro método utilizado é TEACCH (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficit relacionados com a Comunicação). Trata-se de uma intervenção bastante utilizada em todo o mundo para avaliar a criança, caracterizado como um programa de aprendizado individualizado. Gomes e Silva (2007, p.3) afirmam que “neste método, a programação individual de cada aluno é uma das ferramentas essenciais, pois possibilita o entendimento do que está ocorrendo, propicia confiança e segurança”.

Vale ressaltar que a ação de intervenção deve ocorrer em três etapas:

1. Criação do vínculo: momento em que o diagnóstico de conhecimento dos autistas em relação ao seu comportamento e seu contexto natural tem prioridade;

2. Interação com a família: complementação do conhecimento das funcionalidades naturais do indivíduo, sendo o fator crucial para escolha das habilidades a serem trabalhadas, além da possibilidade de conhecer o contexto da família na sua totalidade, momento este, essencial para a proposta metodológica;

3. Ação interventiva específica: processo de docência, que acontece em conjunto com a professora, com o desenvolvimento de atividades que contemplem de maneira funcional e natural os indivíduos tratados, na perspectiva de melhorar sua qualidade de vida (MAROCCO e REZER, 2009).

No que diz respeito ao diagnóstico e à intervenção psicopedagógica, encontra-se diversos recursos que podem ser usados como jogos, caixa de areia, brincadeiras, provas piagetianas, livros, softwares, entre outros. Cabe ao profissional analisar cada situação e decidir por aplicar o recurso que for conveniente ao sujeito, enfatizando que o psicopedagogo não deve utilizar recursos exclusivos de outras áreas, assim não estará ferindo a ética profissional, ainda estará zelando pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas, conforme reza o Código de Ética da Psicopedagogia.

Durante o processo de intervenção, é importante a definição de um plano de ação, registrado por escrito, onde devem ser incluídas as estratégias e os tipos de intervenção, as orientações pré-estabelecidas, bem como a reorientação da intervenção, sempre que necessário, por meio de novas estratégias. 

Contudo, para que uma intervenção seja eficiente, o psicopedagogo deve ter consciência do seu papel, esclarecendo-o para outros profissionais da educação, com segurança de suas convicções teóricas e de suas atitudes práticas. E que tenha uma ideia clara que sozinho nada conseguirá e que precisará de seus parceiros, aluno-família-professor, para a construção de uma ação conjunta (NEVES, 2005).
Outro aspecto relevante é o processo de avaliação que se baseia nas descrições obtidas através das ações desenvolvidas com o aluno, também com a família, demonstrando se houve mudanças no comportamento do autista, no período da intervenção, analisando as possibilidades psicopedagógicas que se busca no intuito de evoluir o processo de aprendizagem de tal sujeito e como se deu esta relação nas atividades da sala de aula regular.

 

2.1 O PSICOPEDAGOGO, O AUTISTA E A ESCOLA REGULAR.

 

Há décadas, o autismo vem mobilizando muitos pesquisadores na tentativa de compreender e esclarecer sua origem, sua evolução e suas características, buscando entender o que acontece com o autista, e assim propor formas de intervenção e métodos que possa promover seu desenvolvimento e a melhoria da atuação de professores do aluno autista. Porém, muitos são os desafios que surgem e nesse sentido Bosa e Baptista (2002, p. 37) afirmam que:

 

O autismo é uma síndrome intrigante porque desafia nosso conhecimento sobre a natureza humana. Compreender o autismo é abrir caminhos para o entendimento do nosso próprio desenvolvimento. Estudar o autismo é ter nas mãos um laboratório natural de onde se vislumbra o impacto da privação das relações recíprocas desde cedo na vida.

 

Eis que é um desafio, inclusive para a escola, que se apresenta em dificuldades desde o primeiro dia de aula, sendo evidenciadas na dificuldade de estabelecer relações sociais, levando muitas vezes, o professor a não saber o que fazer.

Para Freire (2005), o professor estará diante de um aluno com comportamentos imprevisíveis, incomuns e muitas vezes complexos, em que algumas teorias e as formas mágicas estarão desmoronando, forçando o profissional, humildemente, a ser um aprendiz. Bosa e Baptista (2002) contribuem com esse pensamento, quando afirma que:

 

Em meio à diversidade de opiniões e teorias a respeito do assunto, surgem controvérsias e mesmo verdadeiras polêmicas, principalmente sobre o diagnóstico e formas de intervenção. [...], compreender o autismo exige uma constante aprendizagem, uma (re) visão contínua sobre nossas crenças, valores e conhecimentos sobre o mundo e, sobretudo, sobre nós mesmos (2002, p.11-12).

 

Ao reconhecer as dificuldades enfrentadas, evidencia a necessidade de socializar junto ao professor da classe regular o acesso às formas diferenciadas de comunicação, a riqueza de estímulos nos aspectos físicos, emocionais, cognitivos, psicomotores e sociais e a relação social de forma que favoreçam a convivência com as diferenças, as relações interpessoais, o respeito e a valorização da criança, enquanto aluno.

 

Na constituição do sujeito, sublinha-se a força dos encontros, das relações, da cultura como possibilitadoras ou limitadoras do humano. O foco desloca-se para os contextos, os discursos, o acolhimento do outro, do diferente, por meio de uma rede simbólica capaz de ligar, organizar, valorizar, amparar e sustentar o exercício de uma função e de um lugar para escolas, professores e alunos. Dessa delicada trama, (re) nascem as múltiplas possibilidades de aprender e ensinar (VASQUES, In: Revista Pátio, 2013, p. 29).

 

Assim, diante de uma inclusão adequada, mesmo que uma criança apresente deficiências cognitivas importantes e apresente dificuldades em relação aos conteúdos do currículo da educação comum, como pode ser o caso do autismo, ela pode beneficiar-se das experiências sociais. O objetivo do aprendizado de coisas simples como conhecer-se, estabelecer relações seria o de as tornarem mais autônomas e independentes possíveis, podendo conquistar seu lugar na família, na escola e na sociedade. Assim, na medida em que esses “conteúdos” vão sendo desenvolvidos e “aprendidos” por esses alunos, torna-se possível a entrada de outros conteúdos da alfabetização e da matemática (ZILMER, 2003, apud GONÇALVES, 2011).

Quando se faz necessário uma adaptação curricular, primeiramente, o psicopedagogo deve realizar uma avaliação onde possa observar o contexto escolar e o projeto curricular da escola, se esses atendem o aluno autista apenas com algumas modificações metodológicas ou se é necessária uma adequação curricular que contemple as necessidades do aluno inserido. O primeiro passo para que seja organizado um currículo adaptado às necessidades do autista é que logo que o psicopedagogo conheça quais as limitações e desafios a serem incluídos na rotina do autista, possa montar um programa pedagógico individualizado.

Considerando a visão tanto de Wallon quanto de Vykotsky, o social e o afetivo contribuem muito para o desenvolvimento global do educando. Portanto, é fundamental que a escola se atente para as possibilidades e singularidades que o aluno autista apresenta para continuar se desenvolvendo em seus diferentes aspectos, assim é essencial pensar no desenvolvimento afetivo como base que sustentará o desenvolvimento cognitivo.

 

3 CONCLUsão

Apesar de ainda não saber realmente o que ocasiona o autismo, sabe-se que é um caminho cheio de desafios a percorrer, mas com a parceria escola-família, dedicação e muita paciência pode-se conquistar grandes avanços nessa caminhada. 
Dessa forma, considera-se esta pesquisa de grande relevância por compreender, através de estudos, como se dá o processo de intervenção psicopedagógica que submete a pessoa com autismo, que por se tratar de um sujeito com um desenvolvimento global diferente do padrão, representa um desafio para a educação.

É notável o quanto a intervenção psicopedagógica é importante para a criança autista, principalmente para a sua socialização, que aliado ao trabalho do professor promove o seu desenvolvimento e autonomia. E, uma vez inserido em uma escola regular, o psicopedagogo deve também auxiliar na interação com o meio social e na adaptação das crianças com desenvolvimento típico em relação ao autista, pois esta reciprocidade faz-se necessária para que a interação seja completa e para que haja harmonia no ambiente escolar. Deve-se ter sempre em mente que o psicopedagogo é responsável em conciliar as inesperadas situações que podem surgir como interferência no processo de ensino-aprendizagem (CARVALHO e CUZIN, 2008).

Essa intervenção deve ser significativa para a criança, caso contrário, a imposição da mesma limita a sua motivação para a realização, ocasionando problemas no comportamento. Esse atendimento para potencializar a sua aprendizagem deverá ocorrer em um ambiente estruturado e sem estímulos individualmente. Cabe à família estimulá-la ao máximo que puderem em casa, ensinando de forma gradativa as atividades da vida diária e prática, usando sempre uma linguagem clara e consistente. E, quando for necessário, também contar com outros profissionais como fonoaudiólogos, psicólogos e neurologistas.

Entende-se que trabalhar com alunos autistas é uma tarefa complexa que exige dos governantes mais investimentos, com cursos que incentivem os profissionais da educação na busca de novos conhecimentos e proporcionem-lhes a troca de experiências, além da implementação de escolas inclusivas eficazes que poderão contribuir com o desenvolvimento global de alunos com necessidades educativas especiais.

 

4. REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasilia: MEC\SEF, 2001.

 

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: Acesso em: 08 ago. 2019.

 

BRITO, Teca Alencar. Música na educação infantil. São Paulo; Peirópolis, 2003.

 

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1987.

Bibliografia de Piaget. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org>. Acesso em: 26 de janeiro de 2011.

 

SAVIANI, Demerval. A educação musical no contexto da relação entre currículo e sociedade. Revista HISTEDBR On-line, n. 1, 2000.