A ALFABETIZAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA
LITERACY IN PANDEMIC TIMES
Simone de Oliveira Sansolotti1
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Silvia Maria dos Santos Stering2
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RESUMO:
Este texto apresenta um relato de experiência, sobre o processo de alfabetização em casa da aluna X, que estuda no primeiro ano “C” vespertino, da Escola Municipal Selvino Damiam Preve. Sua professora é a Pedagoga M. O processo de alfabetização em casa vem ocorrendo por que as crianças não podem frequentar o ensino presencial, em consequência da pandemia do Covid 19. Este relato é feito na perspectiva da mãe que é professora da Educação Básica, nas etapas do Ensino Fundamental II e Ensino Médio, e vem participando ativamente do processo de alfabetização da aluna X sob orientação pedagógica da Professora regente da turma. O objetivo deste trabalho é evidenciar a importância de se trabalhar com equidade com os alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental I, com vista a garantir um processo de aprendizagem que prime pela qualidade. Mas para que esse processo ensino aprendizagem possa transcorrer com eficácia em seus objetivos, é primordial que o número de alunos/professor seja considerável, para que os docentes possam realizar um trabalho com excelência.
Palavra chave: Qualidade. Equidade. Alfabetização.
ABSTRACT:
This text presents an experience report on the literacy process at home of student X, who studies in the first year “C” in the afternoon, at the Selvino Damiam Preve Municipal School. Her teacher is Pedagoga M. The literacy process at home has been occurring because children cannot attend face-to-face education, as a result of the Covid 19 pandemic. This report is made from the perspective of the mother who is a Basic Education teacher, in stages of Elementary School II and High School, and has been actively participating in the literacy process of student X under the pedagogical guidance of the teacher leading the class. The objective of this work is to highlight the importance of working with the students of the first year of Elementary School I with equity, in order to guarantee a learning process that excels in quality. But in order for this teaching-learning process to take place effectively in its objectives, it is essential that the number of students / teacher is considerable, so that teachers can carry out work with excellence.
Keywords: Quality. Equity. Literacy.
A alfabetização em tempos de pandemia: Alfabetizar com equidade para se garantir a qualidade.
Quando o assunto é a Educação no Brasil, o que mais se discute é o princípio da qualidade, e em tempos atuais, o princípio da equidade. A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDB, em seu artigo 3º estabelece, entre os princípios do ensino, a garantia de padrão de qualidade (LDB Art. 3º, inciso IX). Mas o que se verifica nos indicadores de avaliações de Sistema de Avaliação da Educação Básica -SAEB, Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM e Programa Internacional de Avaliação de Estudantes - PISA, é que este princípio está longe de ser uma realidade na Educação Básica no Brasil. E neste momento de pandemia3 a qualidade da educação vem sendo ainda mais comprometida pela falta de equidade, em consequência das estratégias utilizadas pelas secretarias e escolas para garantir o ensino e aprendizagem a seus alunos de forma não presencial.
No que tange ao uso das estratégias, as escolas vem se utilizando de inúmeras tecnologias que parte considerável dos alunos não dispõe de forma eficaz, independentemente da Unidade de Federação no Brasil.
Todavia, descrever, refletir, e compartilhar sobre essas novas estratégias nos processos didáticos, que vislumbram contornar o atual cenário na educação prejudicado pela pandemia do Covid 19, é importante para favorecer o desenvolvimento de políticas públicas presentes e futuras, identificando possibilidades de metodologias que coadunam para uma aprendizagem significativa e que prime pela equidade e qualidade.
A prática pedagógica que será descrita neste texto, está sendo utilizado pelas professoras do Ensino Fundamental I, da Escola Municipal Selvino Damiam Preve em Santa Carmem – MT, fazendo um recorte para a professora M, que atua no primeiro ano “C” vespertino, turma que estuda a aluna X, que é filha da autora deste texto, cujo mesmo descreve a prática pedagógica que vem sendo desenvolvida, e que se apresenta como um Relato de uma Experiência com o processo de alfabetização da mencionada aluna do primeiro ano do Ensino Fundamental I.
A descrição desta prática pedagógica se faz na perspectiva da mãe, que é professora, e atua no Ensino Fundamental II e Ensino Médio, não apresentando nenhuma experiência didática no Ensino Fundamental I.
As estratégias utilizadas pela professora M são simples4, mas requer a utilização das mídias digitais que são imprescindíveis neste momento em que as crianças devem ficar afastadas da escola, e necessitam da participação ativa dos pais para que o processo de aprendizagem se efetive com equidade e qualidade.
O que se pretende descrevendo esta experiência pedagógica, não é necessariamente evidenciar o processo utilizado pelas professoras da escola, mas ressaltar, que no processo de alfabetização nas turmas de 1º ano, que apresentam alunos entre seis e sete anos, o quantitativo de alunos/professor em sala deve ser considerado importante, para que os professores possam trabalhar com equidade, e os alunos possam construir suas competências e habilidades com qualidade, sendo essas essenciais para toda a sua trajetória na Educação Básica.
Em relação as competências e habilidades que as crianças precisam desenvolver nesta etapa do Ensino Fundamental, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece que:
É nos anos iniciais (1º e 2º anos) do Ensino Fundamental que se espera que ela se alfabetize. Isso significa que a alfabetização deve ser o foco da ação pedagógica. Nesse processo, é preciso que os estudantes conheçam o alfabeto e a mecânica da escrita/leitura – processos que visam a que alguém (se) torne alfabetizado, ou seja, consiga “codificar e decodificar” os sons da língua (fonemas) em material gráfico (grafemas ou letras), o que envolve o desenvolvimento de uma consciência fonológica (dos fonemas do português do Brasil e de sua organização em segmentos sonoros maiores como sílabas e palavras) e o conhecimento do alfa-beto do português do Brasil em seus vários formatos (letras imprensa e cursiva, maiúsculas e minúsculas), além do estabelecimento de relações grafofônicas entre esses dois sistemas de materialização da língua. (BNCC 2018, p. 90 e 91)
Para desenvolver essas habilidades os professoras de alfabetização encontram inúmeros desafios na escola. Dentre estes desafios, Rios “aponta para os diferentes níveis de desenvolvimento do conhecimento dos alunos e a falta de apoio familiar” (RIOS 2015, p. 2844), que segundo o autor, para solucionar tais dificuldades os professores argumentam sobre a necessidade de se trabalhar “com atividades diferenciadas, a partir do contexto social com o qual a criança está inserida” (RIOS 2015, p. 2844).
O trabalho com atividades diferenciadas coaduna com o princípio da equidade, mas para que os professores consigam identificar e propor procedimentos metodológicos que atendam a esses diferentes níveis de aprendizagem, o quantitativo de alunos/professor, associado a outros fatores são imprescindíveis para o desenvolvimento de práticas pedagógicas equitativas.
Antes de iniciar a descrição de como os alunos da professora M do 1º ano “C”, vem estudando neste período de pandemia, faz-se necessário elucidar o conceito de qualidade e equidade, e afirmar que em um país de tantas divergências como o Brasil, a garantia da qualidade, na maior parte das vezes, não ocorre sem equidade de oportunidades.
Definir o termo qualidade no âmbito da educação é muito complexo, Imbernón por exemplo, argumenta que o “conceito de qualidade não é estático, não existe consenso sobre ele, nem existe um único modelo de qualidade” (IMBERNÓN, 2016, p. 16), mas ele deve ser “definido pela perspectiva do grau de satisfação da comunidade educacional e não apenas como resposta a demanda social ou do mercado” (IMBERNON 2016, p. 19). Partido desta premissa, para Imbernón a qualidade:
No campo educacional deveria ser analisada a partir da consciência do quê, e como os alunos aprendem no processo ensino-aprendizagem, mediado por um professor e por seu contexto (...) vejo a qualidade como um processo democrático e de construção de um projeto contínuo e compartilhado na educação, baseado na igualdade de oportunidades e na equidade, onde todos os que participam na aprendizagem de crianças buscam um processo de melhoria educativa em seu conjunto e de melhoria das aprendizagens dos alunos em particular. (...) A meta da qualidade é a cidadania democrática. (IMBERNÓN 2016, p. 19 e 20).
Observe que Imbernóm, faz uma menção importante sobre a igualdade de oportunidades e a equidade, isso ocorre justamente, por que numa sociedade marcada por acentuada diversidade cultural e imensas desigualdades sociais como a brasileira, a equidade tem que ser utilizado como princípio educativo no sentido de proporcionar em igualdade de oportunidades, uma educação de qualidade, com vistas a superar essas desigualdades.
Para Aristóteles, equidade é definida como:
[...] a qualidade que nos permite dizer que uma pessoa está predisposta a fazer, por sua própria escolha, aquilo que é justo, e, quando se trata de repartir alguma coisa entre si mesma e a outra pessoa, ou entre duas pessoas, está disposta a não dar demais a si mesma e muito pouco à outra pessoa do que é nocivo, e sim dar a cada pessoa o que é proporcionalmente igual, agindo de maneira idêntica em relação a duas outras pessoas. A justiça, por outro lado, está relacionada identicamente com o injusto, que é excesso e falta, contrário à proporcionalidade, do útil ou do nocivo. [...] No ato injusto, ter muito pouco é ser tratado injustamente, e ter demais é agir injustamente (ARISTÓTELES, 1999, p. 101).
Nota-se como Aristóteles primava pela necessidade de proporcionar a cada pessoa o que lhe é proporcionalmente igual, o que coaduna com o que preconiza a Base Nacional Comum Curricular- BNCC, ao estabelecer que “os sistemas e redes de ensino e as instituições escolares devem se planejar com um claro foco na equidade, que pressupõe reconhecer que as necessidades dos estudantes são diferentes” (BNCC 2019, p. 15). E para atender a essas diferenças os currículos e as propostas pedagógicas devem ser flexíveis, no sentido de garantir a igualdade de oportunidades, garantindo a qualidade na educação.
Mas como proporcionar um processo ensino aprendizagem com equidade e qualidade aos alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental I, neste momento de pandemia, em que as escolas precisam utilizar de inúmeras estratégias, das quais as mídias são indispensáveis, e muitos famílias não tem acesso?
Na Escola Municipal Selvino Damiam Preve, ao seguir as diretrizes da Secretaria Municipal de Educação que estabeleceu que as atividades escolares retornaria de forma não presencial, as professoras do Fundamental I, e em especial a professora M que atua no 1º C vespertino, organizou todo o material dos alunos e solicitou que os pais fossem buscar na escola.
A escola utiliza do Programa de Alfabetização Alfa e Beta no Fundamental I, disponibilizando todo o material pedagógico para as crianças, como livros de Português, Matemática, Ciências e Grafismo, e os outros que são adquiridos pelos pais, como cadernos diversos, réguas, lápis, etc. Esses foram os materiais que os pais foram buscar na escola.
Utilizando o grupo de wattsap, criado no início do ano letivo, a professora coloca as atividades que as crianças devem desenvolver diariamente. Nesta dinâmica ela se orienta seguindo a organização das aulas semanalmente, como por exemplo, se na segunda as crianças tinha aula de matemática e ciência, então as atividades passadas são relacionadas a essas disciplinas, e assim sucessivamente.
As atividades são postadas no grupo todos os dias às 13 horas, horário de início das aulas. Nessas postagens, a professora utiliza de vários mecanismos, indicando por exemplo as páginas e as atividades em que as crianças tem que fazer naquele dia.
A professora faz vídeos explicativos, quando necessário, e utiliza-se de outros vídeos (terceiros) para explicar assuntos diversos. Ela procurar dinamizar as atividades, usando muitas vezes da ludicidade, para não criar um rotina monótona e cansativa, sendo muito criativa.
Quando os pais tem dúvidas, basta pedir a professora que ela faz as explicações necessárias.
Esse processo de aulas não presenciais, teve início em maio e está sendo muito produtivo, para as crianças que assim como a aluna X, tem um responsável para auxiliar nas atividades em casa participando ativamente do processo.
A aluna X vem tendo um resultado fantástico. Mas este resultado é fruto de um trabalho mais individualizado que vem sendo desenvolvido com ela em casa mediante acompanhamento efetivo dos pais, não desmerecendo em hipótese alguma o trabalho da professora. Pois sendo a mãe professora, está tendo a oportunidade de trabalhar juntamente com aluna, por que também está em casa e de quarentena, e sabe a mãe, que se estivesse trabalhando não teria a mesma disponibilidade para acompanhar a filha ativamente.
Muitas crianças não conseguem ter este apoio pedagógico em casa, pois a maioria dos pais estão trabalhando, não tem o tempo suficiente, e muitas vezes não possui os conhecimentos pedagógicos básicos para ensinar seus filhos, identificando as suas fragilidades, para propor as intervenções necessárias nesta etapa de alfabetização. Embora muitas crianças vem realizando as atividades não presenciais, com a orientação da professora.
A mãe da aluna X, sendo professora, tendo conhecimentos pedagógicos e estando mais disponível, por estar em casa de quarentena, vem conseguindo nesse processo perceber as fragilidades da aluna X, intervindo de forma pedagógica para que ela consiga superá-las, com qualidade.
O que se quer aqui mencionar e com veemência, é que nesta etapa de escolarização é fundamental que nas turmas de primeiros anos, a pequena quantidade de alunos seja uma realidade, para que as professoras possam desenvolver um trabalho mais individualizado, proporcionando uma igualdade de oportunidades e colocando em prática os dois conceitos prenunciados acima. Equidade para se alcançar a qualidade no processo de ensino aprendizagem. Uma vez que como apontado por Rios, um dos desafios dos professores da alfabetização é de se trabalhar com “os diferentes níveis de desenvolvimento do conhecimento dos alunos” (RIOS 2015, p. 2844).
Um estudo realizado pelo Conselho Nacional de Educação - CNE e apresentado em 2010, apontou inúmeras fragilidades na Educação Básica que afetam diretamente na equidade e qualidade da educação. Dentre estas “A definição de uma relação adequada entre o número de alunos por turma e por professor, que permita uma aprendizagem de qualidade. (PARECER CNE/CEB Nº: 8/2010, p. 19)
Neste parecer o CNE, propõe um quantitativo de 24 aluno/professor para o Custo Aluno Qualidade Inicial, para as turmas do Fundamental I, sendo este quantitativo favorável para um processo de ensino de equidade e qualidade. (PARECER CNE/CEB Nº: 8/2010, p. 19)
A mãe da aluna X, não atua como docente no Fundamental I, mas pela experiência que está tendo em casa, contribuindo para a alfabetização da filha, teve a percepção que este quantitativo de 24 alunos/professor nas turmas de primeiro ano ainda não seria o ideal. Sua compreensão é a de que o máximo de alunos deveria ser 15, para que as professoras e suas auxiliares, consigam desenvolver, com equidade e qualidade, um trabalho com excelência. Esse número de alunos também foi defendido pela professora M, que propõe um quantitativo de 15 a 17 alunos por professor.
Como a mãe da aluna X chegou a essa conclusão?
Antes de iniciar a quarentena, que a princípio teria duração de 15 dias, a professora M, mandou atividades para que os pais trabalhassem com as crianças neste período. Dentre estas, as crianças tinham que realizar as atividades no livro de grafismo, e outras. E assim como solicitado estas foram desenvolvidas.
A quarentena se estendeu e as crianças ficaram sem atividades por um mês, antes de a escola deliberar o ensino não presencial. Assim neste período, foi orientado pela professora M que os pais dessem continuidade ao livro de grafismo. Foi nesse momento que a mãe da aluna X, verificou que ela, no processo de construção da letra cursiva, não fazia as direções indicadas no livro.
Como se verifica em um exemplo abaixo. (apenas um exemplo da letra O)
ATIVIDADE DE GRAFISMO DESENVOLVIDO PELA ALUNA X
Fonte: Reprodução da autora
A BNCC estabelece que as crianças, dentre as inúmeras habilidades que os alunos do 1º e 2º ano tenham que desenvolver, “conheçam o alfabeto e a mecânica da escrita” (BNCC 2018, p. 90), para que se alfabetizem. Ao anunciar a mecânica, a base está se referindo também a este movimento, a essa direção correta na construção da letra.
Assim a mãe percebeu que, na escola a aluna X não fazia a letra seguindo a orientação correta, não por que a professora não ensinou, mas por que a professora diante da grande quantidade de alunos, não consegui ter esse olhar individualizado das crianças na hora em que elas estão construindo as letras.
Em casa, a mãe observou que a aluna ao construir a letra cursiva, não seguia a orientação do livro, o que de certa forma prejudicava a sua escrita. Essa constatação foi possível, por que o tempo disponível da mãe, por estar de quarentena, também foi maior para se atentar a este processo.
Identificado o erro, orientando-a a seguir a direção da escrita correta da letra, e acompanhando ela nessa construção, a mãe percebeu que a aluna X pode escrever de forma muito mais fluída e legível.
Outro aspecto importante nesta fase e que leva consequências gravíssimas no Fundamental II, é em relação a leitura.
Nesta fase a criança, de acordo com a BNCC, deve “saber ler, reconhecendo globalmente as palavras” e “ampliar a sacada do olhar para porções maiores de texto que meras palavras, desenvolvendo assim fluência e rapidez de leitura (fatiamento)” (BNCC 2018, p. 93), dentre outras.
Os alunos quando chegam ao sexto ano, tem muita dificuldade de interpretar o enunciado das questões. Essa problemática de interpretação de texto é indicada nas avaliações externas do PISA (Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes) e das provas do SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
Os alunos no sexto ano ficam esperando os professores explicarem o que fazer nas atividades apresentadas, isso ocorre talvez, por que no Fundamental I, essa explicação pode ser realizada pela professora regente, fazendo com que os alunos não tenha autonomia de interpretar, mas isto é apenas uma hipótese que deve ser investigada.
Mas nesse processo de alfabetização em casa, quando a aluna X ia responder as atividades do livro, seja português, ciências ou matemática, mesmo já sabendo “ler” quase tudo, ela sempre ficava esperando a mãe fazer a leitura do enunciado das atividades com ela, explicando o que é para ser desenvolvido.
Percebendo essa problemática o que a mãe passou a fazer?
Pedir que a aluna X lê-se o enunciado, ajudando-a, quando necessário.
Depois fazia a seguinte pergunta a ela:
O que o exercício pede para você fazer?
Tal indagação busca desenvolver a dimensão do letramento que necessariamente está atrelado à dimensão da alfabetização, uma vez que mais do que codificar e decodificar símbolos e signos, se faz importante que a criança consiga fazer parte da sociedade da informação, de forma a compreender o que está lendo. Tal perspectiva vai ao encontro com o que Freire (1997) advertira, no sentido de que a leitura do mundo precede a leitura da palavra.
A mãe usa essa estratégia para que a aluna faça a interpretação do enunciado e não ela. Ao utilizar esta estratégia, a aluna X passou a interpretar os exercícios com autonomia, de acordo com suas possibilidades e seu nível de conhecimento.
Em sala de aula, a professora também não consegue fazer este trabalho mais individualizado, o que pode ocasionar a explicação geral do enunciado, levando as crianças a se habituarem a esperar a explicação da professora, e não a ler e interpretar o exercício por conta própria, ressaltando novamente que isso é apenas um hipótese. Esta problemática é muito comum nos alunos que chegam ao sexto ano do Ensino Fundamental II.
São duas fragilidades simples, mas que trazem consequências gravíssimas na trajetória escolar do educando. Em relação à escrita por exemplo, há casos que pode ser irreversível. E estas problemáticas, poderiam ser solucionadas se as professoras de alfabetização tivessem poucos alunos em sala, para trabalhar com equidade e qualidade. Dois princípios importantíssimos da BNCC.
As fragilidades que foram identificadas pela mãe na aluna X são “simples”, e ela não apresenta dificuldades de aprendizagem.
Sabe-se dos inúmeros problemas de aprendizagem que uma criança pode apresentar no processo de alfabetização, e que também necessitam de um acompanhamento individualizado com estratégias diferenciadas, e que muitas vezes não acontece, não só influenciados pelo quantitativo de alunos, mas inúmeros outros fatores.
Porém com uma menor quantidade de alunos por professor, com condições adequadas de trabalho e uma maior valorização docente, a equidade poderia ser uma realidade nas escolas e a qualidade ser ampliada.
Nesse processo de ensino não presencial, desenvolvido pela Escola Municipal Selvino Damiam Preve, e pela professora M, está longe de atender os 100% de alunos. Na turma da aluna X, por exemplo, tem 25 alunos para a professora e sua auxiliar. A professora, como já colocado, está desenvolvendo um excelente trabalho a distância, mas segundo ela apenas 50% da turma está realizando as atividades em casa.
O objetivo deste trabalho, não é apontar os fatores que estão colaborando para que os 50% dos alunos não estejam desenvolvendo as atividades em casa, pois sabe-se que muitos pais não tem acesso internet, o contexto dos alunos são diversos, e a quarentena obrigatória possibilitou a mãe de fazer um acompanhamento mais ativo com a aluna X nas suas atividades não presenciais, o que seria diferente se ela estivesse trabalhando.
Mas esta realidade vivenciada pela sociedade com a pandemia do Covid 19, evidencia o papel importantíssimo que a escola desenvolve na Educação dos jovens. Uma escola que vem sendo desacreditada na contemporaneidade, principalmente num contexto de defesa de ensino cada vez mais semipresencial, inclusive na Educação Básica.
Que a sociedade com esta experiência que está passando, em que muitos jovens não estão tendo acesso à Educação Escolar, sirvam de norte para políticas mais eficientes que corroboram para a equidade construindo qualidade. Conforme destaca Girroux (1992), todo ato educativo é intencional e mesmo que a escola se apresenta como espaço de lutas e de contradições, ela faz diferença na vida da sociedade, condição que a pandemia evidencia mediante sua imprescindibilidade.
REFERÊNCIAS:
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. 3. ed. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1999.
BNCC – Base Nacional Comum Curricular. 2018
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 34. ed. São Paulo: Cortez, 1997.
GIROUX, Henry. Escola crítica e política cultural. 3. ed. Trad. Dagmar Zibas. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1992. Coleção Polêmicas do nosso tempo
IMBERNÓN, Francisco Qualidade do Ensino e Formação do Professorado. São Paulo: Ed. Cortez, 2016.
MEC/CNE. PARECER CNE/CEB Nº: 8/2010. Estabelece normas para aplicação do inciso IX do artigo 4º da Lei nº 9.394/96 (LDB), que trata dos padrões mínimos de qualiade de ensino para a Educação Básica pública. Aprovado em 05/05/2010.
RIOS, Aline dos Santos. A prática pedagógica no processo de alfabetização. EDUCERE. XII Congresso Nacional de Educação: V Seminário Internacional sobre Profissionalização Docente. PUCPR 26 a 29/10/2015, ISSN 2176-1396.
Disponível em: https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2015/17816_8726.pdf
1 Professora do Ensino Básico da Rede Estadual de Educação de Mato Grosso – SEDUC. EENSA – Escola Estadual Nossa Senhora Aparecida. Graduada em Geografia pela Universidade Estadual de Goiás e Especialização em Educação Inclusiva pela Universidade Estadual do Mato Grosso. Santa Carmem. MT. BRASIL
2 Dra. Em Educação. Pedagoga no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia de Mato Grosso- IFMT.Cuiabá. MT. Brasil.
3 No Brasil, as primeiras ações ligadas à pandemia do covid-19 começaram em fevereiro, com a repatriação dos brasileiros que viviam em Wuhan, cidade chinesa epicentro da infecção. Em 15 dias, o país confirmou a primeira contaminação, quando a Europa já confirmava centenas de casos e encarava mortes decorrentes da covid-19.Estamos em julho de 2020 e o Brasil já soma 75 mil mortes pela doença que tem forçado um novo tipo de comportamento com base no isolamento social.
4 O termo simples não é colocado no sentido de qualificar as estratégias como “simples”, mas referindo a delicadeza, objetividade, linguagem, técnicas que requer simplicidade para serem inteligíveis por todos os pais e também pelas crianças.