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A (RE) CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: MEMORANDO A TRAJETÓRIA DAS INSTITUIÇÕES DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO – BELA CRUZ – CEARÁ

Marcos Antônio Pires

 

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa realizada no município de Bela Cruz, interior do Estado do Ceará. A investigação desenvolveu-se vinculada as 37 Instituições da Rede Municipal de Ensino – Bela Cruz – Ceará em parceria com a Coordenadoria Estadual de Formação de Executivos Escolares para a Educação Básica – CEFEB vinculada ao Conselho Estadual de Educação do Ceará – CEE na ocasião do Curso de Formação de Executivos Escolares com foco na (re) construção do Projeto Político-Pedagógico das escolas públicas cearenses. O estudo teve como enfoque a análise do processo de (re) construção do Documento Norteador Oficial/Projeto Político-Pedagógico dessas instituições de ensino. O trabalho se concentrou nas etapas de (re) construção do PPP com ênfase na História/Memória das Instituições Educativas Municipais (1ª etapa); no Diagnóstico das Instituições Educativas Municipais (2ª etapa) e no Marco Referencial (situacional, doutrinal e operativo) das Instituições Educativas Municipais – Bela Cruz – CE (3ª etapa). Além dessas abordagens qualiquantitativas, procurou-se também discutir as concepções e finalidades do PPP procurando defini-lo, mostrando sua relevância para o contexto educacional, visto que ele se consolida como um poderoso instrumento, indispensável à conjuntura escolar capaz de elevar o grau de autonomia, a sistematização das ações pedagógicas, além de garantir a eficiência educacional.

 

Palavras-chave: Referência. Eixo. Unidade.

 

ABSTRACT

This article presents the results of a survey conducted in the municipality of Bela Cruz, the State of Ceará. The research developed linked the 37 Institutions of Municipal Schools - Bela Cruz - Ceará in partnership with the State Coordination Executive Training School for Basic Education - SCETSBE linked to the State Board of Education of Ceará – on occasion of course executive training school with a focus on (re) construction of the Political-Pedagogical Project public schools Ceará. The study was to focus on analyzing the process of (re) construction of a guiding document official/Political-Pedagogical Project of the educational institutions. The work focused on the steps of (re) construction of PPP with anemphasis in History/Memory of Educational Institutions Municipal (1st round) in the Diagnosis of Educational Institutions Municipal (2nd round) and a Framework (situational, doctrinal and operational) of Municipal Educational Institutions - Bela Cruz - Ceará (3rd round). Besides these approaches qualityquantitative, also sought to discuss the concepts and purposes of the PPP see king to define it, showing the irrelevance to the education al context, since it established itself as a powerful tool, essential to the conjuncture school can raise the degree of autonomy the systematization of pedagogicalactions, and ensure the efficiency of education.

 

Keywords: Reference. Axis. Unit.


1 – INTRODUÇÃO

 

O Conselho Estadual de Educação do Ceará, através do Decreto nº 29.761, criou a Coordenadoria Estadual de Formação de Executivos Escolares para a Educação Básica – CEFEB, com a missão de “promover a atualização sistemática e contínua dos executivos escolares, no âmbito das escolas públicas do Estado do Ceará, mediante formação acadêmica e acompanhamento profissional”. Portanto, com o foco na Gestão Escolar, o Programa foi direcionado para os Diretores das Unidades Escolares da Educação Infantil e Ensino Fundamental I e II dos municípios cearenses.

Bela Cruz1 a princípio, aderiu com 37 Instituições de Ensino (escolas, e creches) à formação, totalizando 100% da rede. O eixo central do programa é a (re) construção dos PPP’s das escolas, como parâmetro básico para a posterior construção de políticas públicas de desenvolvimento da educação em âmbito municipal. Entende-se que o PPP2 é a identidade da escola, o retrato da comunidade onde está inserida e estabelece as ações e os caminhos que a escola usará para promover a aprendizagem com qualidade.

A afinidade com o tema ora proposto se justifica pela minha experiência como gestor escolar por vários anos onde pude observar a complexidade do ambiente escolar em todas as suas dimensões. Portanto, a pesquisa encontra-se vinculada não só a gestão escolar em si, mas também aos aspectos pedagógico, social e político pelos quais a escola está condicionada.

Não se pode deixar de pensar nas influências que a globalização exerce na prática do gestor escolar, nos desafios que adentram sua rotina de trabalho que muitas vezes se torna sufocante por exigir novos saberes. Fazer parte desse espaço multicultural requer aperfeiçoamento contínuo, constitutivo de novos ideais, onde o gestor precisa adequar-se à função da escola em sua totalidade. Dessa forma, as inúmeras mutações decorrentes de fatores econômicos, sociais, políticos e culturais, sobrepõem-se a educação, fazendo-a refém das exigências do mercado neoliberal.

A escola é um ambiente sociável e essa sociabilidade deve ser construída pelas famílias dos alunos, professores, funcionários, gestores, alunos e os demais membros da comunidade escolar. Dentro desse contexto sócio-democrático, esses sujeitos participam direta ou indiretamente do planejamento e consecução das ações escolares.

Um poderoso instrumento, indispensável à conjuntura escolar que pode elevar o grau de autonomia, a sistematização das ações pedagógicas, além de garantir à escola maior eficiência educacional é o projeto político-pedagógico.

A motivação para com a escolha do tema se deu por ter feito parte do processo de formação na (re) construção do PPP por parte dos gestores escolares no município de Bela Cruz - Ceará, como articulador municipal junto a agência formadora. O momento foi desafiador, pois ingressei no magistério como professor primário, pouco tempo depois, estive gestor por um longo período no exercício do cargo em comissão, não apenas por indicação política, mas por fazer jus ao cargo rumo à qualificação exigida.

A gênese da pesquisa em questão se deu pela minha participação como articulador no processo de (re) construção dos projetos político-pedagógicos das instituições da rede municipal de ensino em Bela Cruz – Ceará, assim como minha experiência profissional adquirida em ocasião laboral. “A experiência com o projeto político-pedagógico não se resume apenas no seu fazer,” como afirma (GANDIN &GANDIN, 1999), não é simplesmente o fazer alguma coisa, mas também é a possibilidade de todos usufruírem dos seus resultados, e, decidirem sua construção. A participação pode ocorrer de várias maneiras, e tanto pode ser, nas participações extraescolares, como também no fazer propriamente dito.

A experiência mostrou que de fato o PPP não é um instrumento para fins de arquivo, também não é um documento para vir “pronto” da Secretaria de Educação e muito menos onde apenas uma pessoa elabora sozinha – o gestor escolar.

A representação de todos os segmentos da escola foi determinante para que os objetivos traçados no decorrer do trabalho fossem atingidos, pois ele é essencialmente coletivo.

Para que:

 

...a escola, realmente, alcance os seus objetivos, é de fundamental importância que a construção e o acompanhamento do projeto político-pedagógico estejam alicerçados em uma administração participativa, coletiva, em que as decisões sejam democratizadas e que o seu processo de avaliação e revisão seja uma prática coletiva constante, como oportunidade de reflexão para mudanças de direção e caminhos. (BETINI, 2005: 43)

 

Diante desse aspecto, surgiu então, o desejo de conhecer se havia no universo das instituições escolares, a essência da participação do gestor atrelado aos acontecimentos das práticas pedagógicas. E como também, traçar uma identidade do perfil desse gestor escolar municipal e sua trajetória como liderança que mediará à transformação das práticas curriculares existentes, partindo das ações do Projeto Político-Pedagógico na escola.

A partir desses questionamentos ora problematizados, sistematizou-se as reflexões no texto. Para norteá-las, buscou-se aporte na teoria de alguns autores renomados, com publicações de merecido destaque nessa área (BETINI, 2005; MEC/BRASIL, 1996; CARNEIRO [TE AL], 2009; FERNANDES [ET AL], 2009; GANDIN & GANDIN, 1999; GANDIN, 2009; PIMENTA, 1993; VASCONCELLOS, 2004; VEIGA, 2000-2007; WERLE, 2004). Além das considerações desses estudiosos do assunto, também serviram de referência para o estudo os documentos-sínteses 01, 02, 03, 04 e documento norteador oficial/projeto político-pedagógico da Secretaria de Educação de Bela Cruz - CE.

Outras inquietações surgiram ao formatar o projeto, dentre elas se destacam: a sociedade e a educação que temos, a sociedade e educação que queremos construir, o perfil de aluno que queremos formar, valores que devemos cultivar e a principal – a real missão da escola perante os desafios do século XXI.

Dentro dessas dimensões e com foco no prontoatendimento daquilo que me foi proposto, definiu-se como objetivo geral - analisar o processo de (re) construção do projeto político-pedagógico nas instituições da rede municipal de ensino – Bela Cruz – Ceará e específicos (Pontuar as etapas de (re) construção do projeto político-pedagógico problematizando as seguintes questões: Qual o nível de participação dos órgãos colegiados das instituições de ensino?; As informações coletadas são fidedignas à realidade local?; Os resultados a que se chegou são coerentes com as necessidades da realidade escolar?; É possível a aplicabilidade do PPP elaborado?; Que impacto prático esse documento traz para as instituições de ensino e comunidades?); Apresentar encaminhamentos à Secretaria Municipal de Educação (Bela Cruz – CE) no sentido de acompanhar e abrir perspectivas para a operacionalização dos PPPs das instituições de ensino e levantar reflexões baseadas no PPP das instituições de ensino para a construção de políticas públicas de desenvolvimento da educação em âmbito municipal.

 

2 - PERCURSO TEÓRICO DA PESQUISA

 

2.1. Projeto Político-Pedagógico: Concepções e Finalidades.

 

Etimologicamente, o termo projeto vem do latim projectu = lançado. É particípio passado do verbo projicere que significa lançar para frente. É um plano de intenções.

Revisando a bibliografia concernente ao Projeto Político-Pedagógico no que diz respeito a conceito (s), Vasconcellos (2004: 169) dá a seguinte explicação:

 

É o plano global da instituição. Pode ser entendido como a sistematização, nunca definitiva, de um processo de Planejamento Participativo, que se aperfeiçoa e se concretiza na caminhada, que define claramente o tipo de ação educativa que se quer realizar. É um instrumento teórico-metodológico para a intervenção e mudança da realidade. É um elemento de organização e integração da atividade prática da instituição neste processo de transformação.

 

Toda instituição de ensino tem objetivos, metas e ações a realizar. O conjunto dessas pretensões, bem como os meios para consolidá-las forma a estrutura do Projeto Político-Pedagógico. É importante enfatizar que a tríade vocabular do documento já sugere conceitos a respeito: É projeto porque propõe ações a serem executadas num determinado período de tempo. É político porque considera a escola um espaço de discussões e decisões, onde se atua individual e coletivamente, modificando os rumos da sociedade onde se está inserido. É pedagógico porque define e organiza a estrutura curricular, atividades e projetos educativos da escola com foco na qualidade no processo de ensinoaprendizagem.

Neste sentido, “a importância do projeto político-pedagógico está no fato de que ele passa a ser uma direção, um rumo para as ações da escola [...]” (BETINI, 2005: 38). Também é um guia onde indica a direção a ser seguida por toda comunidade escolar. Ele precisa ser elaborado coletivamente para se tornar completo o suficiente a ponto de não causar desvio na rota a ser tomada e, flexível o bastante para facilitar as adaptações necessárias ao longo do percurso.

Segundo Betini (2005: 38) o projeto político-pedagógico mostra:

 

... a visão macro do que a instituição escola pretende ou idealiza fazer, seus objetivos, metas e estratégias permanentes, tanto no que se refere às suas atividades pedagógicas, como às funções administrativas. Portanto, o projeto político-pedagógico faz parte do planejamento e da gestão escolar. A questão principal do planejamento é expressar a capacidade de se transferir o planejado para a ação. Assim sendo, compete ao projeto político-pedagógico a operacionalização do planejamento escolar, em um movimento constante de reflexão-ação-reflexão.

 

Sendo um documento de extrema importância para a escola, o PPP é assegurado por lei - Lei de Diretrizes e Bases, Lei nº 9394/96. Desta forma, a construção do projeto político-pedagógico em âmbito escolar se torna um direito e ao mesmo tempo um dever onde a instituição de ensino é instigada a avançar rumo à organização do fazer pedagógico.

Sendo o PPP um direito constituído, torna-se um dever da instituição de ensino garantir o envolvimento de todos nesse processo, além de estarem cientes de que fazem parte dele; Só assim o PPP deixa de ser apenas um documento e passa a ser uma bússola para com as ações pedagógicas.

Conforme a Lei de Diretrizes e Bases nº 9.394/96, a instituição escolar tem autonomia na construção do seu projeto político-pedagógico. Isto é assegurado no art. 15, Título IV: “Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.” (BRASIL, 1996)

Conforme o artigo supracitado, o grau de autonomia concedido à escola é progressivo, ou seja, a instituição de ensino não goza de autonomia plena, principalmente quando se refere à gestão administrativa e financeira. Para tanto, muitos autores têm levantado discussões a respeito da autonomia e reconhecem que a escola está limitada, ou seja, a autonomia se dá de forma relativa. Segundo Veiga (2007: 14),

 

A principal possibilidade de construção do projeto político-pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva.

 

Porém, a autonomia é resguardada em sua plenitude quando há a participação dos diferentes agentes no processo de construção do PPP. Para Vasconcellos (2004: 47), “não compete à equipe diretiva assumir o papel de guardiã do projeto, e em especial do cumprimento da programação. Isto é tarefa de todos”.

A instituição de ensino que com seriedade e compromisso procura construir coletivamente seu projeto político-pedagógico demonstra disposição no ato de discutir, de se expor e de reorganizar-se de acordo com as necessidades da comunidade escolar e local. A mobilização dos sujeitos no processo participativo na escola fortalece a identidade, reafirma sua função social, tornando-a uma instituição democrática com fomento ao exercício pleno da cidadania.

A relevância de um projeto educacional consiste no planejamento. Com planejamento, fica bem claro a partir da realidade que se tem, chegar onde se quer. Um Projeto Político-Pedagógico bem elaborado com a participação de todos dá segurança à escola. A escola deve buscar um ideal comum: fazer com que todos os alunos aprendam e se tornem cidadãos. “Aqui cabe também um questionamento que deve estar sempre presente, implícita e explicitamente, em toda a construção do projeto político-pedagógico: que sociedade queremos construir?” (BETINI, 2005: 39).

Para tanto, o contexto atual não pode ficar de fora das discussões. É necessário que se faça também o resgate da memória e a escola atual – diagnóstico da realidade. A partir daí segue-se com o estudo do marco referencial que fundamenta as ações a serem desenvolvidas no processo educativo, à luz dos propósitos e expectativas da comunidade escolar.

 

2.2. História/Memória das Instituições Educativas Municipais – Bela Cruz – CE.

 

A dicotomia existente entre memória e esquecimento tem comprometido a história das instituições educativas em âmbito municipal (Bela Cruz – CE). A possibilidade de se quebrar os paradigmas que ofuscam a identidade histórica dessas instituições deve partir do reconhecimento e valorização daquilo que já se fez. Dessa forma, cair no imaginário que se deve recomeçar, refazer e descartar os feitos de outrora é abrir mão da própria identidade. É preciso que a escola encontre sua identidade e se transforme em espaço democrático, de construção do conhecimento e formação contínua para toda a sua comunidade escolar.

Segundo Werle (2004:114) Memória...

 

... implica em cuidado e formação, ela é dinâmica, produz movimentos, articulações entre o presente e o passado. Memória não é “guardar intocado”, apartar, mas retomar, atualizar, preservar e submeter vivências, emoções, lembranças a novas significações. Trabalhar a memória individual, de alguma maneira, oportuniza a recuperação da memória coletiva e de identidades institucionais. Historiar a memória institucional é atribuir poder à memória social, é trabalhar no cruzamento entre lembranças pessoais, grupais e institucionais.

 

É importante que todos os envolvidos tenham conhecimento da realidade, a partir da sua história, para nela intervir democrática e participativamente e, dessa forma contribuir com a construção da autonomia da instituição educativa, onde todos os seus segmentos, além de dar qualidade às relações, tenham como referência a localidade de origem da instituição de ensino.

Para Werle (2004:111)

 

As instituições são lugares de ação social, marcadas pelo tempo, espaços e pessoas [...] Elas são o espaço real, tanto objetivo como subjetivo, no qual vivenciamos relações, valores, normas, poder, experiências, rivalidades, conflitos e competição.

 

É preciso que além da memória subjetiva da instituição educativa (ideia e definição que membros e comunidade dão a respeito), é necessário também que se mantenha em evidência a memória objetiva (prédio/estrutura física), visto que “[..] o prédio escolar é um elemento importante na busca de identidade da instituição educacional, funcionando como agente físico ativo nas subjetividades e na materialidade da cidade”. (IBIDEM)

Por meio do projeto político-pedagógico, a escola tem condições de nortear suas práticas e visualizar seus valores socioculturais. Isso implica estabelecer rupturas e reconstruir o novo com significado coletivo e com a firmeza exigida para a educação como prioridade maior no contexto histórico atual.

Foi indispensável o coerente e rigoroso resgate histórico na (re) construção dos PPPs das instituições da rede municipal de ensino - Bela Cruz – CE. Esse documento oficial não pode se resumir historicamente a elogios a ex-governantes e/ou ex-lideranças, mas sim a valorização de fatos marcantes como as crises do passado e sua superação.

De acordo com Werle (2004:112)

 

[...] Desentranhar estas memórias e histórias da instituição contribui para torná-la mais viva, evitar o esclerosamento e a hipertrofia do instituído. Dar fala a seus diferentes atores que, em diversas posições e em diferentes tempos viveram a instituição, revela suas múltiplas estratégias de construção e as variadas e muitas vezes conflitantes identidades institucionais e os processos de rejeição e aproximação que em seu interior se construíram.

 

O mergulho no passado em épocas distintas nos ajudou a entender que os pilares básicos de uma instituição são decorrentes de sua história, cujo conhecimento e análise se tornaram essenciais para a clareza do que está acontecendo atualmente e para a determinação dos seus rumos futuros.

Para Werle (2004:115)

 

[...] a retomada do passado não significa, como já foi anteriormente discutido, uma retomada de propostas fixas, uma condição de cristalização, algo dado, estabelecido. Muitas vezes o que pode parecer uma volta ao passado pode ser uma estratégia de reposicionamento e reafirmação de novas posições e constituir parte de um processo de construção de novos caminhos, novas propostas na dinâmica das relações institucionais.

 

Retomar o passado não tão distante não significa dizer que devemos adotar uma posição absolutista da memória institucional, partindo de uma narrativa positivista onde o fundamentalismo histórico nos condiciona a uma única interpretação dos fatos com atributo de verdade imutável.

Carneiro [et al] (2009:65) defende que

 

A escuta dessa memória deve ser ampla, analisando as diferenças e singularidades dos que fizeram parte da história, dos que efetivamente registraram a memória desta história e dos que hoje desejam sustentar-se nesta memória. As diferenças de geração, de status, de profundidade no contato com a instituição etc. devem ser levadas em consideração ao procurarmos os significados essenciais da memória institucional.

 

Nesse ínterim, não podemos restringir à memória como algo estritamente individual, visto que ela é construída a partir de uma ação conjunta, consolidando-se como um fenômeno coletivo e social. Porém, “uma atitude de preservação da memória não se desenvolve sem um consciente processo de formação. Uma formação para a memória social deve ser buscada em todas as escolas e em toda comunidade [...]” (WERLE, 2004: 117).

A memória institucional como elemento essencialmente social requer uma busca coletiva intra e extraescolar onde todos os envolvidos investiguem a história dita “oficial”. As informações, recordações e descobertas são muito importantes ao entendimento da história a partir da realidade local (escola e comunidade).

Segundo Carneiro [et al] (2009: 66-67)

 

[...] os lugares evocam lembranças marcantes a nível individual e grupal. É preciso entender o conceito de lugar coletivo: o espaço que adquire significado para um determinado grupo, normalmente pautado por um uso original, transgressor e livre daquele espaço. Nas instituições tais espaços podem ser locais de comemoração, de tomadas de decisão, de concentração de poder e, finalmente, lugares de lazer. É principalmente nesta última categoria, o lugar de lazer, que se encontram características, por assim dizer mais espontâneas do grupo. Porque o lazer é o espaço do não programado, do estar de forma relaxada, não planejada.

 

Para o projeto político-pedagógico a história/memória é o “percurso da escola” e, sem o seu conhecimento e resgate, nenhuma proposta se sustentará.

 

2.3. Diagnóstico das Instituições Educativas Municipais – Bela Cruz – CE.

 

Diagnóstico tem origem no grego diagnostikós, sendo que foi apropriado pela medicina na acepção de conhecimento ou determinação de uma doença pelo(s) sintoma(s) e/ou mediante exames diversos (laboratoriais, radiológicos, etc.) (cf. Aurélio). Sua raiz, diagnose, é também do grego (diágnosis – discernimento, exame), podendo ser entendida a partir de seus dois componentes dia+gnosis como através do conhecimento.

Ocorre que o termo diagnose foi incorporado à História Natural ou Botânica com o sentido de descrição minuciosa do animal e da planta, feita pelo seu classificador, em geral em latim (cf. Aurélio). Seu uso está muito marcado por esta perspectiva de descrição ou mera classificação. No projeto político-pedagógico, todavia, o diagnóstico não pode ser assumido com este significado.

Segundo Gandin (2009:90) O diagnóstico é...

 

... a parte de um plano que profere um juízo sobre a realidade (sobre a prática), à luz do marco operativo (diretamente) e do marco doutrinal (em última instância). [...] Trata-se, de fato, de responder à seguinte pergunta: Até que ponto nossa prática realiza o que estabelecemos em nosso marco operativo?

 

O diagnóstico não é, portanto, simplesmente um retrato da realidade ou um mero levantar dificuldade; antes de tudo, é um olhar atento à realidade para identificar as necessidades radicais, e/ou o confronto entre a situação que vivemos e a situação que desejamos viver para chegar a essas necessidades. Embora a descrição dos fatos seja necessária, não são suficientes para sua compreensão crítica.

Para Pimenta (1993:79-80)

 

[...] Diagnóstico aberto, que não se cristaliza e que não se encerra na constatação da realidade, mas que a lê e a interpreta – o que supõe conhecimento/posicionamento teórico/prático da equipe. [...] Daí ser a realização contínua de diagnósticos dessa realidade um instrumental importantíssimo nessa construção.

 

Diagnosticar, portanto, é identificar os problemas relevantes da realidade, ou seja, aqueles que efetivamente precisam ser resolvidos para a melhoria da qualidade de vida da comunidade em questão. “O projeto político-pedagógico ganha consistência e solidez à medida que vai captando sistematicamente a realidade na qual se insere”. (PIMENTA, 1993:79)

O diagnóstico da prática educacional (escola) deve partir da visualização coletiva da escola que temos. Visto que a qualidade da proposta pedagógica de uma instituição educacional está muito atrelada à visão da comunidade escolar sobre como está à escola, como funciona e quais os seus pontos fortes, os seus estrangulamentos e suas necessidades. Um diagnóstico bem feito se torna um diferencial para uma boa proposta.

Dessa forma, o diagnóstico nos permite um direcionamento para as principais necessidades da escola, através de um levantamento coletivo do que está dando certo, do que já foi construído positivamente, dos entraves ou “nós críticos” que precisam ser trabalhados e superados e de suas necessidades prioritárias nas dimensões físicoestrutural, pedagógica, administrativa e relacional. “A preparação do diagnóstico pode seguir vários caminhos e, sobretudo, utilizar técnicas, instrumentos, modelos e processos bastante variados”. (GANDIN, 2009:92)

O diagnóstico a partir dessas dimensões se torna um instrumento importantíssimo para o planejamento educacional, em suas várias categorias. Temos consciência de que um diagnóstico bem elaborado, que retrate o pensamento do coletivo, é fundamental para a projeção da escola que queremos e necessitamos construir.

Entretanto, a grande questão que devemos considerar é o passar da percepção individual e intuitiva da necessidade à apreensão crítica e coletiva da necessidade. Essa transição é muito importante. A escola, como instituição, implica muitos sujeitos, que têm cada um inúmeras necessidades. Essas necessidades tidas individuais não podem ser descartadas. Elas devem ser articuladas com outras, mais gerais. “[...] geralmente é útil um levantamento, com as pessoas envolvidas, para conhecer interesses, questões, problemas, tendências, sentimentos e conceitos mais evidentes”. (GANDIN, 2009:92)

O maior desafio é chegar às necessidades prioritárias compartilhadas, visto que se o grupo tem necessidades assumidas em comum, a probabilidade de se chegar a uma ação integrada é muito maior.

Diagnosticar significa ir além da percepção imediata, da mera opinião (do grego, doxa) ou descrição, é problematizar a realidade, procurar apreender suas contradições, seu movimento interno, de tal forma que se possa superá-la por uma nova prática, fertilizada pela reflexão teórico-crítica.

De acordo com Gandin, (2010:52) Diagnosticar é

 

[...] comparar uma prática e o horizonte desta prática, ou seja, a comparação entre o que se realiza e aquilo que se diz que se quer alcançar; dessa comparação surge um juízo sobre a prática, mostrando em que essa prática não está contribuindo para o alcance daquele horizonte que se explicita.

 

Fica evidente, pois, que antes da implementação do diagnóstico é fundamental que todo o marco referencial esteja concluído e que comunidade escolar e local tenha conhecimento das aspirações a serem conquistadas.

O diagnóstico se constitui uma das etapas mais importantes na construção do projeto político-pedagógico, pois é nessa ocasião que fazemos uma análise depurada da situação atual da instituição educacional/escola, observando-se todas as suas dimensões e categorias, como sugere Fernandes (2009), a saber:

 

Instalações: construções, reformas e manutenção; Equipamentos: aquisição, manutenção e uso; Recursos diversos: aquisição, manutenção e uso; Proposta pedagógica: conhecimento, prática e atualização; Prática curricular: planejamento, conteúdo, metodologia das aulas, avaliação e projetos; Postura dos educadores e educandos: fidelidade à proposta da escola, responsabilidade e ambiente educativo; Formação continuada: plano e execução; Condições de trabalho: nível de satisfação dos profissionais e alunos; Resultado da aprendizagem dos alunos; Gestores: posturas, competência técnica, humana e política; Serviços: desempenho e qualificação; Colegiados: Núcleo de Coordenações e colegiados dos vários segmentos – existência, desempenho e influência na escola; Normas e disciplinas (regimento): nível de conscientização, atualização e efeitos;Relações internas (vários segmentos e serviços) – clima de compromisso, autoestima e integração. Sistema de comunicação; Relações externas: escola-família; imagem institucional e responsabilidade social e Relações interinstitucionais: com outras escolas, Secretarias do Estado e Município, Conselho de Educação, Universidade/Faculdades e Instituições Culturais.

 

Portanto, o diagnóstico não é um instrumental técnico, provido de neutralidade, que pode ser adaptado ou copiado de outras instituições educativas. Tal documento é marcado e fundamentado por intenções, valores, e não menos importante, de participação, apontando sempre para uma direção. Seus dados são de natureza quantitativa e qualitativa que, uma vez mensurados, sistematizados e interpretados, constituem-se de excelentes indicadores para o planejamento estratégico das ações voltadas à mudança que a escola deseja implementar.

Enfim, o diagnóstico pressupõe uma apreensão analítica de tudo aquilo que constitui o cotidiano escolar. Significa julgamentos, avaliações, emissões de juízos, valores e prioridades. Consumar uma análise em âmbito escolar nas múltiplas dimensões facilita a compreensão de suas determinações para além da realidade local, contribuindo para o alcance das intenções políticas previstas em seu marco referencial.

 

2.4. Marco Referencial (situacional, doutrinal e operativo) - Instituições Educativas Municipais – Bela Cruz – CE.

 

O MARCO REFERENCIAL é a tomada de posição da instituição educativa que busca através do planejamento, fundamentar e definir um leque de procedimentos (teóricos, políticos, filosóficos), além de sua visão de mundo, (utopia, valores, objetivos, compromissos) que norteará o trabalho da escola. Trata-se da explanação das ideias, concepções, diretrizes, princípios que orientarão a prática educativa da escola em sua amplitude.

Neste sentido, Gandin (2009:78) o define como parte de um plano em que uma instituição:

 

  1. se compreende como integrante (componente) de uma realidade mais ampla;
  2. se projeta como portadora de uma proposta sociopolítica;
  3. propõe-se como realizadora de um processo técnico específico de seu campo de ação, com vistas a ser parte na consecução de sua proposta sociopolítica.

 

Para que isso seja plausível, é necessário compreender as relações existentes entre escola/realidade local, mas nacional e mundial. Dessa relação tridimensional (global, nacional e local), fica evidente a compreensão da realidade escolar em sua singularidade, a partir dessas relações mais amplas.

O marco referencial nasce como busca de resposta a um forte questionamento: De que forma, enquanto escola democrática podemos colaborar para a construção de um novo homem e de uma nova sociedade na América Latina? (a partir de um questionamento mais amplo). Já numa perspectiva local: “Que educação queremos e necessitamos construir no município de Bela Cruz – Ceará [...]” (FERNANDES, 2009).

A investigação nos condicionou à definição e explicitação das finalidades sociais da educação e da escola, levando-nos a indagar, que tipo de sociedade a escola deseja se comprometer, que tipo de sujeitos pretende formar, qual sua intencionalidade, a partir dos contextos político, cultural e educativo.

Segundo Betini (2005: 39) Ao se construir

 

... o projeto político-pedagógico, é fundamental que se tenha em mente a realidade que circunda a escola; realidade que se expressa no contexto macro da sociedade: econômico, político e social; e aquela que se verifica ao entorno da escola. A realidade macro da sociedade, certamente, afeta a vida da escola, assim como também a afeta a sua realidade interna específica, o seu funcionamento, possibilidades e limites. Não levar em consideração os aspectos sociais que envolvem a escola no planejamento educacional, mesmo em nível micro, pode fazer com que o planejamento falhe em seus resultados.

 

O discernimento da finalidade social da escola possibilita à comunidade escolar definir com precisão os critérios e projetar-se para as ações nas dimensões pedagógica, administrativa e democrática. Concomitante a isto, Veiga (2000: 23) afirma que “é necessário decidir, coletivamente, o que se quer reforçar dentro da escola e como detalhar as finalidades para se atingir a almejada cidadania”.

Gandin (2009: 79-83), ao problematizar o marco referencial, apresenta três eixos para serem discutidos e os denomina de:

 

  1. Marco situacional – a instituição compreende-se como parte do mundo;
  2. Marco doutrinal – a instituição assume uma proposta político-social e a fundamenta;
  3. Marco operativo – a instituição firma o ideal de sua prática, dentro do seu campo de ação, com vistas a contribuir na construção da sociedade com que se compromete.

 

O marco situacional é um olhar reflexivo do grupo que planeja sobre a realidade em geral. “[...] É, antes, um dar-se conta, um situar-se no mundo, um sentir problemas e esperanças [...]” (GANDIN, 2009: 79) É, portanto, a ocasião de uma ampla análise da realidade na qual a instituição educativa está inserida. Seu ponto de partida é a realidade local da comunidade, suas vivências coletivas, organizativas e comunitárias. No entanto, temos que perceber as dicotomias da realidade e identificar os aspectos positivos como fundamentais, pois podem abrir horizontes e fortalecer a esperança. Contudo, as problematizações deverão partir das seguintes questões, assim como orienta Fernandes (2009), “A sociedade que temos: qual o perfil sócio-político-econômico da sociedade atual? A educação que temos: qual está sendo a atuação da educação nessa sociedade?”.

A discussão dessas questões possibilita a apreensão das mudanças, a ressignificação de valores, o conhecimento por parte do grupo das representações sobre a sociedade brasileira e local, a identificação das satisfações, insatisfações e expectativas.

As divergências discursivas em torno do marco situacional desencadearão reflexões sobre os valores sociais e políticos referentes à sociedade e à educação que por sua vez conduziram ao debate e ao estabelecimento do marco doutrinal do projeto político-pedagógico, ou seja, da explanação dos fundamentos teóricos, políticos e sociais que o embasam. É a proposta de sociedade, pessoa e educação que o grupo assumiu. Neste marco são expressas, portanto as utopias do grupo.

Nesse marco, Gandin (2009: 82) nos chama a atenção e esclarece:

 

[...] quando se fala em marco doutrinal deve-se pensar que a instituição em causa precisa propor o tipo de sociedade que quer ajudar a construir e que isto envolve o pensamento sobre alianças possíveis, sobre missão em relação ao todo. Portanto, envolve-se em “doutrina”, isto é, em pensamento fundamentado teoricamente.

 

Procura-se discutir, nesse eixo, o tipo de “sociedade que queremos e necessitamos construir, a educação que queremos e precisamos assumir” (FERNANDES, 2009). Como sabemos, toda educação se baseia numa visão de homem e de sociedade.

Subsequente aos dois eixos anteriores e não menos importante, o marco operativo, relacionado às relações da escola com a sociedade. Trata-se aqui de expressar o ideal específico da instituição educativa. É a proposta dos critérios de ação para os diversos aspectos de extrema relevância da escola, tendo em vista aquilo que queremos ou devemos ser (utopia meio). O marco operativo foca, então, à realidade local, traz à tona as necessidades, anseios do grupo por mudança. Conforme Gandin (2009: 82), “[...] o marco operativo é também uma proposta de utopia, no sentido que apresenta algo que se projeta para o futuro [...]”; todavia, como alerta o autor, Ele

 

[...] trabalha com o que é próprio de campo de ação do grupo que planeja, apresentando uma proposta que traduz o seu modo de encarar sua prática específica em forma de realidade desejada, proposta esta fundamentada teoricamente. (IBIDEM)

 

Nesse sentido, para que o marco operativo não se torne um jogo de palavras cruzadas, é preciso um forte rigor teórico. Realidade desejada do campo de ação e (sobretudo) da instituição educativa em processo de planejamento. Na elaboração do marco operativo, precisamos nos atentar quanto a sua compatibilidade com o marco situacional e, por sua vez, com o marco doutrinal, pois, caso contrário, pode ficar desarticulado à realidade no sentido macro e às grandes finalidades assumidas.

Baseado em Fernandes (2009), sistematizou-se um rol de questões que orientaram os debates acerca do marco operativo do projeto político-pedagógico:

 

  1. Alunos que queremos formar;
  2. Escola que devemos ter;
  3. Profissionais de educação de que a escola necessita;
  4. Gestores que queremos ter na escola;
  5. Pais de alunos que esperamos ter;
  6. Conselho escolar que queremos ter;
  7. O que a (s) escola (s) espera da Secretaria de Educação (Bela Cruz-CE).

 

Diante do exposto, esses marcos dispensaram a improvisação, visto que a organização e sistematização não podem ocorrer sem uma direção nos processos coletivos de discussão. Na ocasião, as leituras, as reflexões teóricas, os debates em grupo, as pesquisas, a elaboração de instrumentais e textos enriqueceram a aprendizagem de todos os envolvidos. Enfim, observando as peculiaridades e diversidades dos grupos que formam a comunidade escolar. Dessa forma houve a possibilidade de se criar condições objetivas para que todos participassem de forma efetiva.

 

3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Nas minhas considerações, primo em dizer que esse processo de reflexão e (re) construção do projeto político-pedagógico que fora realizado nesse período, trouxe-nos a certeza de que é possível sim envolver a comunidade escolar nas discussões em torno de uma proposta pedagógica consistente, plausível, focada nos anseios e necessidades dos docentes e discentes. A consumação desse fato só foi possível quando o gestor se conscientizou de que o ponto de partida é o PPP da escola/instituição. Posso afirmar que foi o que aconteceu.

Todavia, compreender a importância e a necessidade da (re) construção do Projeto Político-Pedagógico – PPP por parte dos “articuladores escolares” não foi tarefa fácil. Para a grande maioria o PPP deveria ser (re) construído rapidamente através de pesquisas bibliográficas ou a partir de modelos prontos. Segundo eles, estava-se dando voltas e revendo as mesmas coisas.

As alegações até que eram compreensíveis, visto que há alguns anos os PPPs foram construídos a partir de cópias pelo gestor escolar e simplesmente eram engavetados e a partir daí descansavam na penumbra até que técnicos da Secretaria Municipal de Educação solicitassem o documento para uma vistoria.

As discussões em torno da duração do programa (02 anos), as explanações nos encontros em nível de pólo pela articulação central foram decisivas para a percepção e compreensão por parte dos articuladores escolares que o tempo passa a ser o maior aliado; o documento é um conjunto de diretrizes que norteia a prática pedagógica, orientando as ações dos gestores, docentes e discentes mediante realidade local; o PPP deve ser pensado e elaborado coletivamente e que devem estar explícitos as intenções, compromissos sócio-político-pedagógicos articulando interesses reais e coletivos da comunidade escolar e local.

Dessa forma, pontuo o processo pelo qual o PPP passou através das etapas de (re) construção nesse período considerado longo, mas extremamente necessário. Meu intuito é fazer uma reflexão crítica, nunca um julgamento a respeito dos caminhos tomados pelas 37 instituições de ensino. O que se pôde perceber é que as mudanças estão ocorrendo e continuarão a ocorrer. O simples fato de perceberem que o Projeto Político-Pedagógico deixa de ser um item meramente burocrático já pode ser considerado um avanço bem significativo.

Não obstante, o resgate da memória/história das instituições de ensino (1ª etapa) revelou que cada instituição mostrou sua particularidade, porém no geral todas se assemelharam. Como exemplos, mencionaram o empenho das lideranças comunitárias em garantir a educação formal e sistemática das crianças, jovens e adultos nas respectivas comunidades; A contribuição como maior benfeitor para com a educação do município de Bela Cruz foi do Prefeito Júlio França de Souza Neto (in memorian). Pelos relatos, Júlio França não hesitava em atender as solicitações quando se tratavam de “educação”. Essas instituições de ensino apresentaram a partir de então, uma “história real” embora não compatível com a “história oficial” publicada em livros por autores belacruzenses.

Já o diagnóstico das instituições de ensino (2ª etapa) que fora respondido pela comunidade escolar e local através das representações (órgãos colegiados e sociedade civil organizada) revelou de forma fidedigna, na grande maioria – a escola que temos. A realidade educacional foi retratada de forma panorâmica, seguindo-se as dimensões (físicoestrutural, pedagógica, administrativa e relacional) propostas no decorrer das pesquisas que foram conduzidas pelos articuladores escolares.

Ressalta-se que a dimensão físicoestrutural, dentre as demais, foi a que apresentou na sua totalidade as angústias e os anseios da comunidade escolar. As instituições de ensino estruturalmente não apresentaram condições favoráveis ao bem-estar dos sujeitos envolvidos no processo educativo. A falta de acessibilidade, ambientes recreativos, desportivos, espaços para estudo e planejamento são alguns pontos que estrangulam a prática pedagógica, principalmente na zona rural. Essas instituições apresentaram profundas necessidades no aspecto físico-estrutural, requerendo urgentemente ampliação e reforma que garantissem as condições mínimas de trabalho.

Ademais, o marco referencial (3ª etapa) tratou da explanação das ideias, concepções, diretrizes, princípios que orientarão a prática educativa da escola em sua amplitude. Nesse sentido e com o estudo, ficou clara para os articuladores escolares a concepção do (s) marco (s) supracitado e a partir de então, o processo de sistematização dos estudos, bem como as discussões se deram de forma satisfatória ao nível escolar/institucional.

Os exercícios práticos estudados foi o ponto de estrangulamento do processo, pois exigiu dos articuladores escolares maior aprofundamento nas teorias, assim como, qual delas adotar para o embasamento teórico-pedagógico das escolas. É um erro pensar que o ecletismo teórico ou “colcha de retalhos” pode fundamentar a ação pedagógica de uma escola/instituição. Na verdade, são oferecidos vários caminhos, que intercruzados se tornam uma “babel” no fazer pedagógico não levando a lugar algum, a não ser, ao relativismo extremo e ao fundamentalismo didático.

Desde o início do processo, tivemos plena convicção da seriedade desse trabalho essencialmente coletivo. Jamais partiu a ideia de construir um projeto político-pedagógico por questões estritamente legal, e por sua vez, burocrática. “Outrossim, queríamos diagnosticar coletivamente a identidade de nossas escolas/instituições”, assim comentou uma articuladora escolar.

Em meio ao processo, novas práticas foram surgindo e assim, o “novo jeito de caminhar” foi se delineando com mais propriedade. O fazer bem feito se constituiu em autonomia daquilo que se propusera – a (re) construção dos projetos político-pedagógicos. A partir de então, o compromisso foi assumido de forma intensa em procurar respostas para os questionamentos-chave: “Que Escola Temos?” (marco situacional) “Que Escola Queremos?” (marco doutrinal) e “Que Educação Queremos para o Município de Bela Cruz - CE?” (marco operativo).

A caminhada continuará agregando sujeitos rumo a novas discussões, pressupondo atitudes reflexivas e fortalecendo os laços de confiança mútua. Nesse sentido, o futuro será construído por esta e pelas próximas gerações, sujeitos-parceiros que pensarão diante do (re) construído e consequentemente, renovarão os rumos da educação de todos os belacruzenses.

Contudo, acredita-se que os esforços darão bons frutos, possibilitando assim, a multiplicação do saber, dos valores e da esperança de termos novos homens e mulheres emancipados (as) pela educação.

 

4 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BETINI, G.A. A Construção do Projeto Político-Pedagógico da Escola. Rev. Ped. - UNIPINHAL – Esp. Sto. do Pinhal – SP, v. 01, nº. 03, p. 37-44, jan./dez. 2005.

DOCUMENTO NORTEADOR OFICIAL- Projeto Político-Pedagógico do Município de Bela Cruz – Ceará. Bela Cruz – CE, nov. 2012.

DOCUMENTO SÍNTESE Nº. 01 - Recuperando e Compreendendo a História das Instituições de Ensino do Município de Bela Cruz - CE. Bela Cruz – CE, dez. 2010.

DOCUMENTO SÍNTESE Nº. 02 - Diagnóstico – A Educação que Vivenciamos nas Instituições da Rede Municipal de Ensino de Bela Cruz – CE. Bela Cruz – CE, set. 2011.

DOCUMENTO SÍNTESE Nº. 03 - Marco Referencial e Fundamentação Teórico-Prática do Projeto Político-Pedagógico: “A Educação que Queremos e Necessitamos Construir no Município de Bela Cruz – Ceará”. Bela Cruz – CE, set. 2012.

DOCUMENTO SÍNTESE Nº. 04 - PROGRAMAÇÃO: Diferencial; Missão; Visão de Futuro; Princípios Básicos; Objetivos Gerais e por nível de ensino; Plano de Metas. Prioritárias (2013 a 2016). Bela Cruz – CE, out. 2012.

FERNANDES, Maria Estrêla Araújo, CARNEIRO, Fábio Delano Vidas, PEREIRA, Maria Regina dos Passos (org.). Pedagogia do Testemunho: a construção do Projeto Político-Pedagógico do Colégio 7 de Setembro. Livro de Textos. Fortaleza, Editora Ipiranga, 2009.

GANDIN, Danilo. A Prática do Planejamento Participativo: na educação e em outras instituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religiosos e governamental. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO - COMPLETA E ATUALIZADA. Disponível em <http://cptstatic.s3.amazonaws.com/pdf/cpt/educacao/cursos-cpt-ldb-completa-e-atualizada.pdf> Acesso em 18/06/2020.

PIMENTA, Selma Garrido. A Construção do Projeto Político Pedagógico na Escola de 1º grau. In: Idéias nº 8. São Paulo, FDE, 1993.

VASCONCELLOS, Coordenação do trabalho pedagógico: do projeto político-pedagógico ao cotidiano da sala de aula. São Paulo: Libertad, 2004 a.

VEIGA, I. P. A. Projeto Político-Pedagógico da escola: uma construção possível. 10ª ed. Campinas: Papirus, 2000.

VEIGA, Ilma Passos A. Quem sabe faz a hora de construir o Projeto Político-Pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 2007.

WERLE, F.O.C. História das Instituições Escolares: Responsabilidade do Gestor Escolar. Caderno de História da Educação. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia – nº. 3, p. 109-119, jan/dez. 2004. ISSN: 1982-7806.

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1Bela Cruz é um município brasileiro, do estado do Ceará, localizado às margens do rio Acaraú, na microrregião do Litoral de Camocim e Acaraú, mesorregião do Noroeste Cearense. Bem próximo da praia de Jericoacoara.

2Projeto Político-Pedagógico