Buscar artigo ou registro:

 

A INCLUSÃO DO SURDO NOS ANOS FINAIS DA REDE REGULAR DE ENSINO

 

Flávia Ferreira Muniz

 

RESUMO

A inclusão do surdo nos anos finais da rede regular de ensino, é um tema atual e relevante. Nesse seguimento, a questão da inclusão do deficiente auditivo, tem gerado reflexões a respeito de sua real viabilidade na escola regular. Considerando essa problemática, buscou-se por meio de pesquisa bibliográfica, o contexto e análise sobre as ações da escola para a inclusão do aluno surdo no espaço escolar e a reflexão sobre a caracterização do sujeito surdo. Partindo dessa premissa, foram realizadas leituras de livros, artigos e legislações sobre o tema, a fim, de analisar as principais dificuldades presentes na inclusão e no ensino para os alunos surdos matriculados nos anos finais das escolas regulares. Os estudos realizados apresentam a Língua de Sinais como a primeira língua usada pela criança com surdez, e através dela que ocorre toda interação, aprendizado e comunicação do surdo com o mundo. A pesquisa também aponta que a Língua Brasileira de Sinais-Libras ainda é pouco explorada nas instituições de ensino, dificultando a eficácia no processo de inclusão dos deficientes auditivos. A partir disso destaca-se a importância do processo coletivo da inclusão do surdo, perante todos que estão envolvidos nesse contexto da efetiva educação inclusiva.

 

Palavras-chave: Inclusão. Aluno surdo. Anos Finais. Ensino Regular. Libras.

 

 

1.INTRODUÇÃO

 

A inclusão das pessoas com deficiência tem sido uma pauta corrente no cenário mundial. Quando se trata da inclusão dos alunos surdos na rede regular de ensino em nosso país, nota-se, que há uma falta de clareza por parte das escolas, de como devem atuar frente a esse quadro. No Brasil, percebe-se uma convergência de sentidos em relação à construção de estratégias educacionais que alcancem os segmentos da sociedade brasileira e atendam as pessoas com necessidades específicas de aprendizagem (RAMALHO, 2005). Por esse sentido, a questão da inclusão do aluno surdo na escola regular, tem suscitado reflexões a respeito de sua real viabilidade.

Ao falar dos sujeitos da educação inclusiva, a referência que se faz são as pessoas que dela usufruem. Sabe-se que o assunto é bem retratado nos diversos espaços escolares, buscando-se obter uma escola igualitária, onde existe espaço e lugares para todos. Sendo assim, a escola regular, que acolhe todos os alunos, precisa apresentar meios e recursos adequados para desenvolvimento dos educandos, além de, oferecer apoio àqueles que encontram barreiras em sua aprendizagem. Nesse ponto de vista, a instituição escolar, além de promover aprendizagem da leitura e da escrita, necessita ser um espaço que dê oportunidade para o aluno desvendar o mundo ao seu redor, bem como, aprender a conviver em sociedade. Entretanto, para que o que o educando surdo que frequenta essa escola, tenha a garantia de aprendizagem e conhecimento de mundo, a acessibilidade precisa ser uma realidade na instituição escolar de ensino regular que atende esse aluno (CASTRO,2013).

Dentro da perspectiva educacional, a inclusão dos alunos deficientes auditivos encontra, além, de desafios na adaptação curricular, uma grande barreira relacionada à língua. Um aluno surdo ao ser matriculado em uma escola regular, pode ter grandes dificuldades para se comunicar com a comunidade escolar.

Com base nos assuntos relatados sobre a inclusão de alunos com deficiência, optou-se, como objeto de estudo dessa pesquisa a inclusão do surdo nos anos finais da rede regular de ensino. Diante dessa temática, levantou-se o seguinte problema: Como a inclusão do aluno surdo está sendo realizada nas escolas de ensino regular?

Sendo assim, para a resposta dessa problemática tem-se como objetivo geral dessa pesquisa, promover uma reflexão sociocultural sobre os desafios da inclusão dos surdos no contexto escolar. Porém, para alcançar esse objetivo, foram necessários os seguintes objetivos específicos: contextualizar e analisar o histórico e as políticas públicas vigentes para a inclusão do aluno surdo no espaço escolar; refletir sobre a caracterização do sujeito surdo.

A pesquisa foi realizada de forma bibliográfica e a metodologia utilizada foi de caráter exploratório, através de leituras de Leis, livros e artigos de pesquisas já publicados a respeito do tema.

Diante da importância desse tema, visou-se buscar novos conhecimentos relacionados à prática da inclusão do surdo em escola regular, procurando compreender as barreiras que surgem nas práticas pedagógicas com concepções entre professor/aluno surdo que, muitas das vezes apresentam caráter excludente e dificultam a inclusão e o aprendizado do aluno surdo.

 

2. A INCLUSÃO DO SURDO NA REDE REGULAR DE ENSINO

 

2.1 Contexto Histórico

 

A educação diante das grandes transformações no cenário educacional, político, social e cultural, se depara com o grande desafio de promover a inclusão dos surdos na rede regular de ensino. Para entender os atuais desafios da inclusão dos surdos nos anos finais da rede regular de ensino, é preciso saber um pouco do contexto histórico que envolve esse grupo de pessoas.

Durante séculos, as pessoas surdas foram mantidas excluídas da sociedade. Esse fato, partia da ideia de que a pessoa que não possuía linguagem oral, não tinha capacidade de desenvolver o pensamento, ou seja, quem não escuta não fala, e quem não fala não desenvolve o pensamento. Os surdos, não eram considerados como sujeitos e viviam as margens da sociedade sem nenhum direito assegurado, sendo privados da educação básica.

A partir do século XVII, surgiram as primeiras escolas na Europa, mudando parcialmente esse quadro. No Brasil, esse processo foi um pouco mais demorado. Ao longo de toda trajetória de Educação dos surdos, três correntes metodológicas ou filosóficas tiveram destaque, são elas:

Oralismo: método que propunha desenvolver a fala em pessoas surda, um modelo clínico que parte do princípio que o surdo possui uma deficiência que deve ser tratada, sendo assim, a surdez deve ser minimizada através do estímulo auditivo, semelhante a reabilitar para a “normalidade”.

Comunicação total: método que consistia em usar qualquer que fosse a forma para resgatar a comunicação de pessoas surdas. Era usado de forma complementar ao oralismo, levando em conta, todas as outras formas de comunicação do surdo: mímicas, gestos, linguagem de sinais e leitura labial.

Bilinguismo: método que promove o aprendizado através de duas línguas, a língua portuguesa na sua modalidade escrita e a língua de sinais – LIBRAS. O bilinguismo valoriza o canal visual, dando ênfase a Libras como língua que possui características próprias.

Em Milão, na Itália, no ano 1880 o oralismo foi defendido no Congresso de Educação de Surdos. Seu maior defensor foi Alexander Graham Bell, o qual exerceu grande influência no resultado da votação. Guarinello (2007, pág. 28) ressalta que:

 

Em 1880, no Congresso Internacional de Milão, Bell, aproveitou-se de todo o seu prestígio em defesa do oralismo, e ajudou na votação sobre qual método deveria ser utilizado na educação dos surdos. O Oralismo venceu., sendo o uso da língua de sinais oficialmente proibido. Nesse congresso, os professores surdos foram excluídos da votação. Após o evento, a metodologia oral passou a ser utilizada em todas as escolas para surdos, destacando-se a prática terapêutica da fala. É importante salientar que os aspectos referentes à escolarização do surdo eram colocados em segundo plano, já que a ênfase recaía sobre a reabilitação da surdez, com o objetivo de curar o surdo. (GUARINELLO 2007, pág. 28)

 

Henrique Nascimento, em 23 de abril de 2018, em sua matéria “Educação de surdos: entenda os desafios no Brasil”, publicada na plataforma da UNINASSAU, retrata que:

 

Segundo Anderson Douglas, professor da pós-graduação em Educação Inclusiva da UNINASSAU, a partir desse evento foi adotado o oralismo como forma de ensino para os surdos. Contudo, a linguagem de sinais, que já estava em desenvolvimento antes disso, foi proibida em escolas de alguns países. Uma das primeiras medidas implantadas, foi obrigar que os alunos sentassem sobre as próprias mãos durante a aula. O método oralista foi aplicado por mais de cem anos e resultou em vários surdos analfabetos marcados pela violência simbólica e institucional. (NASCIMENTO, HENRIQUE 23/04/2018, uninassau.edu.br)

 

Conforme abordado, a consequência desse congresso foi a proibição da língua de sinais na educação dos surdos, modificando o foco das escolas de educacional para reabilitadoras.

Em 1857 no Rio de Janeiro, foi fundado o Imperial Instituto de Surdos Mudos, atualmente conhecido como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).

No entanto, somente em 1960, a língua de sinais teve novamente seu lugar de destaque enquanto a língua do sujeito surdo. Esse retorno foi através de Willian Stokoe, que realizou estudos e pesquisas sobre as línguas de sinais e sua aplicação na educação de crianças surdas.

Em 1968, Roy Holcom desenvolveu outra abordagem que deu origem a filosofia denominada de Comunicação Total. Porém, os surdos com esse método, não adquiriam profundidade em nenhuma das línguas (oral e de sinais).

A partir da década de 1980, surge então o Bilinguismo e mais efetivamente na década de 1990, ganha cada vez mais adeptos em todos os países do mundo (GOLDFELD,2002, p.32).

O início da inclusão no Brasil, foi influenciado por dois eventos educacionais importantes, a “Conferência Mundial de Educação para Todos” e a “Conferência de Salamanca”, ambos debatiam sobre o fracasso escolar.

A Conferência Mundial de Educação para Todos, ocorreu em 1990, na Tailândia. Nesse encontro, foram discutidos a necessidade de desenvolvimento de políticas educacionais de qualidade que alcançasse o maior número de crianças na escola, ressaltando a importância de serviços que atendessem aos alunos tanto àqueles ditos normais, quanto aqueles com necessidades especiais.

O segundo evento, a Conferência de Salamanca, ocorreu na Espanha, no ano de 1994. O evento evidenciou de forma mais sistemática a Escola Inclusiva. Segundo Borges (2014), o principal objetivo era o desenvolvimento de um trabalho pedagógico de qualidade, colocando o aluno no centro, oferecendo oportunidade de aprendizagem a todos. Durante a Conferência foi estabelecida uma declaração, a Declaração de Salamanca, nela era mencionado que qualquer aluno que apresentasse dificuldades em sua escolarização seria considerado com necessidades educativas especiais, cabendo a escola adequar-se a necessidade de cada aluno.

No Brasil a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 208, define que o atendimento aos deficientes deve ser dado preferencialmente na rede regular de ensino. Além disso, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996 (BRASIL, 1996), também propõe a inclusão dos alunos com necessidades especiais na rede regular de ensino.

Apesar da inclusão dos alunos deficientes na rede regular de ensino, ser amparada por Lei, quando se trata da inclusão do surdo em sala de aula regular, surgem vários questionamentos sobre como ocorrerá o processo de ensino-aprendizagem.

LACERDA, em “A inclusão escolar de alunos surdos: o que dizem alunos, professores e interpretes sobre essa experiência”, diz que:

 

A inclusão se apresenta como uma proposta adequada para a comunidade escolar, que se mostra disposta ao contato com as diferenças, porém não necessariamente satisfatória para aqueles que, tendo necessidades especiais necessitam de uma série de condições que, na maioria dos casos não tem sido propiciada pela escola. (LACERDA, 2006)

 

Decorrente dessa situação, entende-se que o sujeito surdo compreende que faz parte de uma cultura (a cultura surda) que o significa e o constrói enquanto sujeito que entende o mundo através de experiências visuais (BATAGLIN,2012). Portanto, esse aluno não deve ser visto apenas pelo caráter da limitação auditiva, e sim, como um sujeito completo.

 

2.2 Entendendo as Diferenças

 

Ao falar de inclusão do surdo nas escolas regulares, precisa-se primeiramente, entender as diferenças humanas. Existe uma crença entre os ouvintes que poder ouvir é melhor que ser surdo, no ponto de vista dos ouvintes, surdez é quando um ser humano perde uma habilidade disponível a ele, o que acaba tornando o indivíduo menos capaz que o outro. Porém, essa parece ser uma questão de mero ponto de vista.

 

Maupassant, em seu conto “Carta de um louco”, reflete sobre a tese acima, defendendo que todas as ideias de proporção são falsas, já que não há limite possível, nem para a grandeza nem para pequenez(...) a humanidade poderia existir sem a audição, sem o paladar e sem o olfato, quer dizer, sem nenhuma noção do ruído, do sabor e do odor. Se tivéssemos, portanto, alguns órgãos a menos, ignoraríamos coisas admiráveis e singulares, mas, se tivéssemos alguns órgãos a mais, descobriríamos em torno de nós uma infinitude de outras coisas de que nunca suspeitaremos por falta de meios de constatá-las. Se não há limite para entre a grandeza e a pequenez, e nenhum ser humano é exatamente igual ao outro, podemos concluir que ser surdo não é melhor nem pior que ser ouvinte, mas diferente. E por não se tratar necessariamente de uma perda, mas de uma diferença, que muitos surdos, especialmente os congênitos não tem a sensação de perda auditiva. (...)Nesse sentido, Pimenta (2001:24), autor surdo brasiliense, declara que “a surdez deve ser reconhecida como apenas mais um aspecto das infinitas possibilidades da diversidade humana, pois ser surdo não é melhor ou pior que ser ouvinte, é apenas diferente. Se considerarmos que os surdos não são ouvintes com defeito, mas pessoas diferentes , estaremos aptos a entender que a diferença física entre as pessoas surdas e pessoas ouvintes gera uma visão não-limitada, não-determinística de uma pessoa ou de outra, mas uma visão diferente de mundo, um jeito Ouvinte de ser e um jeito Surdo de ser, que nos permite falar em uma cultura da visão e outra da audição. (Ensino de Língua Portuguesa para Surdos, Caminhos para Práticas Pedagógicas. Ministério da Educação, 2004)

 

2.3 Políticas de Inclusão

 

Frente as mudanças relativas à educação, a sociedade atual encontra-se com o grande desafio de promover com qualidade a inclusão dos surdos na rede regular de ensino.

Os debates para uma educação inclusiva no Brasil, segundo Mantoan (1998), deram início com os avanços estabelecidos na Constituição Federal de 1988, que, no artigo 206, afirma igualdade de condições de acesso e permanência na escola e, no artigo 208, que trata da Educação Básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos, destacando o dever do Estado em garantir atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência preferencialmente na rede regular de ensino.

De modo consequente, a inclusão no Brasil, teve influência de dois eventos educacionais importantes, que discutiam o fracasso escolar. O primeiro evento, a Conferência Mundial de Educação para Todos, ocorreu em 1990, na Tailândia. Nesse encontro, foram discutidos a necessidade de desenvolvimento de políticas educacionais de qualidade que alcançasse o maior número de crianças na escola, ressaltando a importância de serviços que atendessem aos alunos tanto àqueles ditos normais, quanto aqueles com necessidades especiais. O segundo evento, a Conferência de Salamanca, ocorreu na Espanha, no ano de 1994. O evento evidenciou de forma mais sistemática a Escola Inclusiva. Segundo Borges (2004), o principal objetivo era o desenvolvimento de um trabalho pedagógico de qualidade, colocando o aluno no centro, oferecendo oportunidade de aprendizagem a todos. Durante a Conferência foi estabelecida uma declaração, a Declaração de Salamanca, nela era mencionado que qualquer aluno que apresentasse dificuldades em sua escolarização seria considerado com necessidades educativas especiais, cabendo a escola adequar-se a necessidade de cada aluno.

Decorrentes desses dois momentos, a inclusão ganhou reforços com a reformulação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº.9394/96), que veio contribuir com uma formação educativa comprometida com a formação de cidadãos, mostrando que a Educação Especial é parte integrante da educação básica, adotando o princípio da Inclusão. Esse princípio defende que todos os alunos com deficiência devem estar incluídos e serem atendidos em salas de ensino regular, e destaca a inclusão educacional como elemento transformador da sociedade.

Em 2001, com a convenção de Guatemala, foi proibido qualquer tipo de diferenciação, exclusão ou restrição baseada nas deficiências das pessoas. Sendo assim, manter as pessoas deficientes fora do ensino regular é considerado exclusão.

A Constituição Brasileira, de 1988, deixa evidente que a criança com deficiência deve receber atendimento especializado complementar, de preferência dentro da rede regular de ensino. Uma vez, entendida a lei, a discussão deve permear sobre a qualidade da educação para todos. A inclusão faz parte de um grande movimento de melhoria no ensino, não atendendo apenas as pessoas com deficiência, mas também, as excluídas e descriminadas (Lei nº.9394/96).

 

2.4 Inclusão dos Surdos nas Escolas Regulares

 

Embora o Brasil tenha compartilhado das convenções internacionais e do processo de organização da Educação Especial, a inclusão gera preocupações e questionamentos na busca de qualidade educacional e na transformação da escola comum para uma escola inclusiva.

O objetivo da educação inclusiva, é que a escola ofereça oportunidades de aprendizagem a todos sem distinção. No entanto, a inclusão dos alunos surdos ainda é um grande desafio, mesmo com as inúmeras legislações que tratam a respeito. A educação dos alunos deficientes auditivos na rede regular de ensino, apresenta-se de forma relativa à inclusão, visto que o surdo possui a sua língua materna, que é a língua de sinais, a qual não é a primeira língua de instrução usada nas escolas regulares. Nessa perspectiva, o acesso é possível, a permanência é possível, mas o prosseguimento nos estudos não é. Skliar (1998), define esse processo como inclusão excludente, ou seja, o aluno surdo parece fazer parte de um sistema plural e democrático, porém, dentro da escola é praticada a exclusão.

Segundo Bortoleto; Rodrigues e Parlamin (2002/2003), a inclusão do surdo deve garantir sua permanência na escola com igualdade de oportunidades, bem como, ensino de qualidade. Essa intenção, deve estar explicita no Projeto Político e Pedagógico (PPP) das escolas, de forma que, o currículo proposto seja dinâmico e flexível, permitindo adaptações e ajustes de acordo com as necessidades de cada aluno.

Para Dorziat (2004), a inclusão de pessoas surdas, objetivando sua participação social efetiva, depende de uma organização das escolas considerando três fatores fundamentais: a interação por meio da língua de sinais, a valorização de conteúdos escolares e a relação conteúdo-cultura surda.

Além desses fatores, segundo o documento Ensino de Língua Portuguesa para surdos: caminhos para a prática pedagógica.(BRASIL,2002), as escolas devem oferecer em sua organização, atividades em classe comum, com professores capacitados para o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, com apoio de professor de educação especial e, se for o caso, do interprete de LIBRAS/ Língua Portuguesa em concordância com o PPP da escola, e serviços de apoio especializado, complementando também em salas de recursos, em turno diverso.

No ano de 2000, através da Lei nº 10.098, a legislação educacional trouxe um grande avanço para educação dos surdos, a Lei prevê que o Poder Público deve tomar providencias no sentido de eliminar as barreiras de comunicação dos surdos, garantindo o acesso à educação, à informação, incluindo a formação de intérpretes de língua de sinais.

Entende-se, que a língua é o código composto por um conjunto de signos utilizados na comunicação entre pessoas de um mesmo grupo. A LIBRAS, foi reconhecida nacionalmente, em 2002, através da Lei nº10.436 de 24 de abril, após incessantes lutas da comunidade surda. A Língua Brasileira de Sinais, é a língua materna do surdo, sendo composta por todos os aspectos linguísticos como qualquer outra língua falada. A Lei nº10.436, traz em seu artigo 1º, “É reconhecido como meio legal de expressão a língua brasileira de sinais-LIBRAS e outros meios de expressão a ela associados;”. Em seu corpo, a lei também legitima a importância da utilização e da difusão da LIBRAS, mas, também, deixa explicito que a língua brasileira de sinais, não substituirá a língua portuguesa na sua modalidade escrita, destacando que é necessário a articulação entre as duas línguas na educação do aluno surdo. (Lei nº10.436 de 24 de abril de 2002), a saber:

 

Parágrafo único: Entende-se como língua brasileira de sinais – LIBRAS, a forma de comunicação e expressão em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundas de comunidades de pessoas surdas no Brasil;

Artigo 2º - Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da língua brasileira de sinais – LIBRAS, como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil;

Artigo 3º- As instituições públicas e concessionarias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado as pessoas com deficiência auditiva de acordo com as normas legais em vigor;

Artigo 4º - O sistema educacional Federal e os sistemas educacionais Estaduais, Municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, Fonoaudiologia e de Magistério em nível médio e superior, do ensino da língua brasileira de sinais – LIBRAS, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais PCN, conforme legislação vigente;

Parágrafo único: A língua brasileira de sinais – LIBRAS, não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa. (BRASIL,2002)

 

Apesar de todo amparo Legal, observa-se que grande parte das instituições de ensino regular e dos professores não se encontram preparados para receber o aluno surdo. O processo de inclusão do aluno surdo em sala de aula, vem sendo acompanhado por professores e profissionais que desconhecem a língua de sinais e as condições bilingues dos surdos, afirma Souza e Góis (1999). Essa razão, faz com que os professores se sintam despreparados para atuarem com esse público.

Considerando a importância da LIBRAS, na educação dos surdos presentes nas salas de aula regular, Skliar (2005, p.26) destaca que:

 

O sentido que dou a uma educação e a uma escola possível se refere a criação de políticas linguísticas, de identidade, comunitárias e culturais, pensada a partir do que os outros, os surdos, se representam como possível e do modo como os outros, os surdos, reconstroem o próprio processo de educação (SKLIAR, 2005 p.26).

 

Nessa perspectiva, a linguagem só se desenvolve com a aquisição de uma língua natural, sem a comunicação através da linguagem, não é possível o desenvolvimento cognitivo, emocional e afetivo.

Tendo em vista, que, a escola deve se adequar ao aluno e não o contrário, a autora Lorenzetti (2012/2013), apresenta a partir de uma pesquisa realizada com cinco professoras que atuam com alunos surdos na Rede Municipal de Ensino, no município de Itajaí/ Santa Catarina, que a realidade encontrada nas escolas brasileiras se apresenta diferente do esperado. Em sua pesquisa, fica evidente que os professores estão despreparados para trabalhar com alunos surdos na rede regular. Em seu estudo, os professores acreditam que o fracasso escolar e a defasagem na aprendizagem do surdo justificam-se unicamente em função de sua deficiência, e que esse discurso, na prática, possa se reverter em ações que marginalizam o aluno. Além disso, os professores participantes de sua pesquisa, consideram que a linguagem do aluno surdo é uma barreira no processo de comunicação.

Em outra pesquisa, essa realizada por Schneider (2006), a autora entrevistou quatro professoras do ensino regular que tinham em suas salas de aula, alunos surdos com idades entre 5 e 6 anos. Através das respostas obtidas, verificou-se que as professoras não tinham condições para realizar a pratica inclusiva, mesmo elas tendo a intenção de praticar a inclusão. Schneider, também afirma que, as professoras, através de suas posturas diante aos alunos surdos demostravam a segregação que existe nas escolas, já que no geral os alunos surdos eram excluídos das exposições orais e dos trabalhos em grupo.

Borges (2004), por meio de entrevista, investigou as percepções em relação a educação inclusiva de nove alunos surdos que estudavam no ensino médio em escolas regulares do município de Pelotas. Os alunos destacaram como uma das dificuldades encontradas na inclusão, é a comunicação com os colegas e professores ouvintes. Esses alunos, fizeram vários apontamentos de como a escola regular poderia se adaptar para atender às suas necessidades, como por exemplo: metodologias diferenciadas de ensino, a necessidade de intérpretes de libras e a divulgação da LIBRAS para a comunidade escolar.

Sabe-se, que, as dificuldades encontradas pelos professores na inclusão do surdo nas escolas regulares perpassam por todos os anos escolares. Professores e alunos surdos se deparam com uma enorme barreira comunicativa durante esse percurso.

Quadros (2005, p.59) salienta que, “a cultura surda tem características peculiares, específicas diante das demais culturas”. O autor destaca, que a língua de sinais, distingue se das orais pela utilização do canal comunicativo, as línguas orais utilizam canal oral auditivo e as línguas de sinais utilizam o canal gestual visual. Quadros, ainda, completa dizendo que “a cultura surda é multifacetada, é própria do surdo, se apresenta de forma visual onde o pensamento e a linguagem são de ordem visual e por isso é tão difícil de ser compreendida pela comunidade ouvinte” (p.60).

Pozzer (2015), evidencia em sua pesquisa, a existência de vários exemplos de alunos surdos matriculados nas escolas regulares, onde a inclusão não acontece devido a falta de comunicação, gerando um sentimento de revolta pelo descaso desses professores que não se importam em desenvolver uma intervenção educativa eficaz. “Isso gera a necessidade de melhorar a comunicação entre professor e aluno, que precisa ser refletida no que diz respeito a prática educativa.” Pozzer (2015, p.26). A autora, ressalta também que:

 

Por um lado, o educador se sente impotente para solucionar os problemas advindos no cotidiano escolar inclusivo. Há o período da negação do aluno para não reconhecer sua impotência e falta de estudo acerca do que se pretende ensinar. Não é que o educador seja o vilão no processo inclusivo, mesmo porque não lhe é atribuído nos cursos de licenciatura devido suas matrizes e ementas que não sofreram mudanças e avaliações para a perspectiva da formação inclusiva. (POZZER 2015, p.27).

 

De acordo com a autora, se faz necessário avaliar e discutir os componentes curriculares, revisar ementas, inserir práticas pedagógicas, adaptar e adequar os cursos de formação docente, para que o professor proporcione ao aluno da educação básica, ascensão ao ensino superior. Pozzer (2015), também, evidencia, que a inclusão do surdo ocorrerá, quando autoridades competentes e profissionais enfrentarem o problema sob uma perspectiva crítica de inclusão, atuando com frequência na ampliação dos conhecimentos e das teorias acerca dessa problemática, bem como na atuação profissional sobre a mesma. Esse processo fará com que ocorra a superação das dificuldades e que em contrapartida a educação alcance seu objetivo: Educação para todos.

 

3. METODOLOGIA

 

A metodologia utilizada para a pesquisa foi a bibliográfica. Essa metodologia, segundo Gil 1994):

 

[...] possibilita um amplo alcance de informações, além de permitir a utilização de diversos dados dispersos em enumeras publicações, auxiliando também na construção, ou na melhor definição do quadro conceitual que envolve o objeto de estudos proposto (GIL,1994apud LIMA; MIOTO,2007, p.40)

 

Os procedimentos adotados foram consultas em fontes escritas (livros, revistas sites, trabalhos científicos) para embasar, complementar e responder à problemática proposta pela pesquisa.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O desenvolvimento da presente pesquisa, possibilitou analisar como acontece a inclusão e o processo ensino-aprendizagem dos surdos em escolas regulares. A problemática foi apresentada buscando levantar uma reflexão sobre as dificuldades encontradas no processo de inclusão dos alunos surdos na rede regular de ensino.

Para abranger as questões propostas foi realizada uma pesquisa bibliográfica procurando compreender as práticas pedagógicas no processo ensino-aprendizagem do aluno surdo e a interação do professor dentro do contexto de inclusão em sala de aula.

Após estudar cada conceito sobre a inclusão do aluno surdo, percebeu-se nas Leis apresentadas que há garantia de processos específicos àqueles que necessitam. No entanto, também se identificou que as dificuldades encontradas no processo de inclusão do surdo em sala de aula regular de ensino, baseia-se na falta de formação adequada dos professores e profissionais da escola para atuarem com os alunos surdos; falta de conhecimento da LIBRAS; e falta de comunicação e interação entre Professores ouvintes e alunos surdos.

Diante dos resultados expostos em relação a essa pesquisa foram observados a ausência de formação adequada dos professores e profissionais para atuarem com os alunos surdos nas escolas de ensino regular, o que faz com que um dos principais desafios seja a comunicação professor/aluno e aluno/professor. Uma vez que, o conhecimento advém da formação e essa formação para os professores que recebem os alunos surdos em suas salas regulares é ausente, as práticas pedagógicas e a metodologia adequada para esses alunos ficam prejudicadas.

Outro ponto observado, mostra que falta distinção por parte dos professores do que é deficiência e do que é dificuldade de aprendizagem.

Também é importante ressaltar, que para haver a comunicação dos alunos surdos com os alunos ouvintes e professores, é necessário que exista a presença do Interprete de Libras em sala de aula, visto que a maioria dos ouvintes não dominam a Língua de Sinais, dificultando a interação e o diálogo dos surdos com a comunidade ouvinte.

Com tudo, concluímos que a inclusão nas escolas regulares tem muitos aspectos que precisam ser modificados. Perante toda pesquisa realizada constatou-se que mesmo com algumas dificuldades, as encolas estão caminhando para o processo de inclusão, recebem e tentam trabalhar de maneira satisfatória para o ensino - aprendizagem dos alunos surdos que estão frequentando a sala de aula regular, porem o que impossibilita esse processo de fluir adequadamente é a ausência de formação adequada na área da Língua Brasileira de Sinais. A falta de formação, o desconhecimento da Libras nas instituições de ensino regulares afeta diretamente a comunicação entre surdos e ouvintes, acarretando na ausência de metodologias adequadas voltadas para a educação dos Surdos e na escassez de recursos didáticos favoráveis ao desenvolvimento desse alunado. Todos esses pontos ressaltados, são responsáveis pela inclusão excludente definida por Skliar (1998).

Sendo assim, a inclusão dos surdos na rede regular de ensino, vai muito além da criação de vagas, e oferta de materiais didáticos soltos. A inclusão requer, uma comunidade, uma escola e professores capacitados, que assegurem igualdade de oportunidade a todos os alunos.

 

REFERÊNCIAS

 

BORGES. A. R. A inclusão de alunos surdos na escola regular. Revista Espaço. Rio de Janeiro, v.21, p.63 – 68, 2004.

 

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

 

BRASIL. Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN. Diário oficial da União, sessão 1. Brasil, 1996.

 

BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e das outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br>. Acesso 15 de fevereiro 2019.

 

BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica/ Secretaria de Educação Especial. MEC:SEESP, 2001. 72 p. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf>. Acesso 15 de fevereiro 2019.

 

BRASIL. Ministério da Educação. Ensino de Língua Portuguesa para Surdos- Caminhos para a Prática Pedagógica/ Programa Nacional de Apoio à Educação dos Surdos/Secretaria de Educação Especial. Brasília: MEC: SEESP, 2004.

 

Bortoleto, R.H.; RODRIGUES, O. M. P. R.; PALAMIN, M. E.G. A inclusão escolar enquanto prática na vida acadêmica de portadores de deficiência auditiva. Revista Espaço. Rio de Janeiro, v.18/19, p. 45-50, 2002/2003.

 

CASTRO,J. Ir e vir. Acessibilidade: Compromisso de cada um. Campo Grande-MS: Gibim, 2013

 

CONFERÊNCIA Mundial Sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade Salamanca, Espanha, 7-10 de Junho de 1994. Disponível em: <http://www.redeinclusao.pt/media/fl_9.pdf.> Acesso 12 de fevereiro 2019.

 

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br>. Acesso 15 de fevereiro 2019.

 

DORZIAT, A. Educação de Surdos no ensino regular: inclusão ou segregação? Revista Centro de Educação. V. 24, p. 1-7, 2004.

 

GUARINELLO, A.C. O papel do outro na escrita de sujeitos surdos. São Paulo: Plexus,2007.

 

GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2010.

 

GOLFELD, M. A criança surda: linguagem e cognição numa perspectiva sociointeracionista. São Paulo: Plexus,2002.

 

LACERDA, Cristina Broglia Feitosa de. A inclusão escolar de alunos surdos: o que dizem alunos, professores e intérpretes sobre esta experiência. São Paulo, Campinas. Cadernos ___________Cedes, vol. 26, n. 69, p. 163-184, maio/ago. 2006.

 

LEGISLAÇÃO Citada Anexada Pela Coordenação de Estudos Legislativos - CEDI Lei Nº 10.436, de 24 de Abril De 2002 – Udesc. Disponível em:

<https://www.udesc.br/arquivos/udesc/documentos/Lei_n__10_436__de_24_de_abril_de_2002_15226896225947_7091.pdf> Acesso em: 12 de fevereiro de 2019.

 

LEI de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9394/96 - Portal do MEC.1996. Disponível em : <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394_ldbn2.pdf.> Acesso 15 de fevereiro 2019.

 

LIMA. VERÔNICA A.P. A Inclusão Dos Alunos Surdos Nas Escolas Regulares da Rede Pública de Educação: Uma Questão Linguística. 2010. 28fls. Trabalho de Conclusão de Curso. (Pós-graduação, especialização educação especial) - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro-RJ2010.

 

LODI. ANA CLAUDIA B. Educação bilíngue para surdos e inclusão segundo a Política Nacional de Educação Especial e o Decreto nº 5.626/05. 2013. 15 fls. São Paulo, v. 39, n. 1, p. 49-63, jan./mar. 2013. artigo I- Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil.

 

LORENZETTI, M. L. A inclusão do aluno surdo no ensino regular a voz das professoras. Revista Espaço. Rio de Janeiro, v. 18/19, p. 63 -69, 2002/2003.

 

MANTOAN, Maria Tereza Egler. Integração X Inclusão: educação (de qualidade) para todos. Porto Alegre Revista Pátio, a5, p. 18- 23, 1998.

Nascimento, Henrique. Educação de surdos: entenda os desafios no Brasil. Disponível em: https://www.uninassau.edu.br/noticias/educacao-de-surdos-entenda-os-desafios-no-brasil

POZZER, Angélica. A inclusão de alunos surdos em escola regular e os desafios para a formação de professores. 2015. 58 fls. Frederico Westphalen, Uruguai.

 

QUADROS. Ronice Muller. IV Congresso internacional e X Seminário Nacional INES. Rio de Janeiro. 2005.

RAMALHO, B. Educação com exercício em diversidade. Brasília: UNESCO, MEC, ANPED,2005.

REVISTA EDUCAÇÃO. Informe Publicitário, 09 de agosto de 2018. Apresenta Educação Bilingue no Brasil. Disponível em: <http://www.revistaeducacao.com.br/educacao-bilingue-no-brasil/>. Acesso dia 18 fev.2019.

SCHENEIDER, R. Educação de surdos: inclusão no ensino regular. Passo Fundo:Ed. UPF, 2006.

SCKLIAR. Carlos (org.). Educação & exclusão: abordagens socio-antropológicas em educação especial. 5.ed. Porto Alegre: Mediação 2006.