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CARACTERIZAÇÃO DOS ACIDENTES DE TRABALHO COM EXPOSIÇÃO A MATERIAIS BIOLÓGICOS DENTRO DO CONTEXTO DA ENFERMAGEM

Robson Gomes de Sá[1]

 

RESUMO

Os acidentes de trabalho com exposição a materiais biológicos constituem um grave problema de saúde pública, podendo repercutir no profissional em situação de risco consequências graves no que tange a saúde do trabalhador. Este artigo tem como objetivo analisar os acidentes de trabalho envolvendo materiais biológicos considerando as atividades desenvolvidas pela equipe de enfermagem, afim de compreender o contexto em que ocorrem e os motivos  para  o alto índice de subnotificação destes acidentes.  Realizou-se uma  pesquisa bibliográfica considerando as contribuições de autores como JULIO, FILARDI E MARZIALE (2014), SILVA, et al. (2010) e VALIM, et al. (2014), entre outros. Conclui-se com este estudo a presente  necessidade de um trabalho mais intensivo voltado para os profissionais de saúde em situações de risco , afim de trabalhar a prevenção aos acidentes de trabalho, as medidas perante o acidente, doenças infectocontagiosas possivelmente adquiridas, manutenção da segurança do trabalhador e valorização das notificações compulsórias. Vale destacar a importância de um bom dimensionamento da equipe de enfermagem, distanciando os fatores de risco relacionados com a sobrecarga de trabalho.

Palavras-chave: Acidente de trabalho. Material biológico. Enfermagem.

 

ABSTRACT

Work accidents with exposure to biological material poses a serious public health problem and can pass the professional in a position to risk serious consequences when it comes to workers' health. This article aims to analyze occupational accidents involving biological material considering the activities developed by the nursing staff in order to understand the context in which they occur and the reasons for the high rate of under-reporting of these accidents. We conducted a literature review considering the contributions of authors such as JULIO, FILARDI And MARZIALE (2014), SILVA, et al. (2010) VALIM, et al. (2014), among others. The conclusion of this study was this need for more intensive work aimed at health professionals at risk in order to work to prevent accidents at work, the measures before the accident, infectious diseases possibly acquired, maintaining security of worker and appreciation of the compulsory notifications. It is worth highlighting the importance of proper sizing of the nursing staff, distancing the risk factors related to workload.

Keywords: Work accident. Biological material. Nursing.

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a caracterização dos acidentes de trabalho  com exposição a materiais biológicos dentro do contexto da enfermagem, correlacionando os principais tipos de acidentes com as atividades de risco desenvolvidas por estes profissionais.

Nesta perspectiva, construiu-se questões que nortearam este trabalho:

·        Quais os motivos relacionados  a subnotificação dos acidentes com exposição a  material biológico no contexto da equipe de enfermagem?

·        Quais os tipos de acidente com material biológico mais comuns no desempenho das atividades da enfermagem?

Levando em consideração as características dos procedimentos realizados no cuidado a saúde dos pacientes, o maior tempo de contato com o paciente   e as condições em que o trabalho é executado, as atividades desenvolvidas por profissionais de enfermagem possibilitam grande risco de contato e contaminação por patógenos. Desta forma, é imprescindível que novos estudos sejam realizados para o levantamento de dados que darão suporte às ações de  vigilância às  doenças e agravos à saúde do trabalhador  bem como para reforçar a necessidade de tais ações.

Segundo JULIO,  FILARDI  e  MARZIALE  (2014, p. 120) os tipos de exposições mais comuns a que podem estar sujeitos os profissionais  de enfermagem  são a exposição a materiais cortantes ou perfurocortantes, contato de mucosa ou pele não íntegra com sangue ou demais fluidos  potencialmente  contaminantes. Ainda segundo este autor, destacam-se como patógenos de maior importância epidemiológica na áreas de acidentes ocupacionais  o vírus da  imunodeficiência humana (HIV), o vírus da hepatite B (HBV) e C (HCV).

Neste contexto, o  objetivo primordial deste estudo é  analisar  os acidentes de trabalho envolvendo materiais biológicos considerando  as atividades desenvolvidas pela equipe de enfermagem, afim de compreender o contexto em que ocorrem e  os motivos para o alto índice de subnotificação destes acidentes.

Para alcançar os objetivos propostos, utilizou-se  a pesquisa bibliográfica como  recurso metodológico, realizada a partir da análise pormenorizada de materiais já publicados na literatura e artigos científicos divulgados no meio eletrônico relacionados ao tema do presente estudo.

O texto final foi  baseado  nas  pesquisas e discussões dos resultados  dos seguintes autores:  Julio, Filardi e Marziale (2014), Silva, et al. (2010), Marziale, et al. (2014), Valim, et al. (2014), Gessner, et al. (2013) e Soares, et al. (2013).

 

DESENVOLVIMENTO

Os acidentes de trabalho com exposição a materiais biológicos constituem um grave problema de saúde pública, podendo repercutir no profissional em situação de risco consequências graves no que tange a  saúde do trabalhador (GESSNER, et al. 2013, 620).

Segundo Silva et al (2010, p. 616) os principais motivos para a incidência de acidentes de trabalho estão relacionados a vários fatores, dentre eles  o não cumprimento de normas, imperícia, condições de trabalho inadequadas, falta de orientações ou orientações incorretas, bem como o não uso ou uso incorreto dos equipamentos de proteção individual (EPI).

Ainda quanto aos fatores predisponentes a estes agravos, Gessner et al. (2013, p. 620) e Soares et al. (2013, p. 854) concordam que a alta carga de trabalho desempenhada pelos trabalhadores da enfermagem, a expressiva  jornada de trabalho, seja por mais de um  vínculo empregatício ou pela adição de horas extras, continuidade da assistência em turnos e plantões  noturnos,  são  fatores que culminam na falta de concentração e fortes  pressões  psicoemocionais, consequentemente, maior risco de acidentes de trabalho.

No que diz respeito aos acidentes de trabalho com material biológico, destacam-se como principais meios  de exposição aos agentes patógenos os acidentes com objetos cortantes os perfuro cortantes, contato de mucosa ou pele não íntegra com sangue ou outros fluidos potencialmente contaminados, tais como sêmen, secreção vaginal,  líquor e líquidos sinovial, pleural,  peritoneal, pericárdico e amniótico. (JULIO; FILARDI e MARZIALE, 2014, p. 120).

Segundo Marziale et al. (2014, p. 11) os acidentes de trabalho com exposição a materiais biológicos detêm grande relevância visto que tais substâncias podem transmitir doenças  infectocontagiosas, notadamente as causadas pelo vírus da imunodeficiência adquirida (HIV), o vírus da hepatite B (HBV) e hepatite C (HCV).

Segundo indica estudo de Silva, et al (2010, p. 618) “trabalhadores com maior tempo de serviço acabam se arriscando mais, por adquirir uma autoconfiança na execução de suas atividades, por vezes negligenciando medidas de precaução para proteção individual”.

Segundo afirma Marziale et al. (2014, p. 11) os acidentes de trabalho com material biológico possibilitam consequências  para a vida do profissional e demais pessoas de seu convívio social ou familiar, comprometendo inclusive sua qualidade de vida e individualidade diante seus planos e expectativas, além de trazer prejuízos para instituição no que diz respeito a qualidade de assistência prestada e ao afastamento do trabalho. Destacam-se como sentimentos mais comuns após o acidente o medo, a preocupação, a indecisão, raiva, revolta, desespero, a ansiedade e angústia.

Segundo Marziale et al. (2014, p. 11) tais tipos  de acidente apresentam maior incidência nos trabalhadores da área de enfermagem, mais especificamente os auxiliares de enfermagem, devido ao maior quantitativo destes profissionais dentro dos hospitais  e ao  maior contato com os pacientes se comparado as demais profissões. Os procedimentos realizados que conferem maios risco de acidentes são a punção venosa e  a  administração de medicamentos.  No que diz respeito aos locais de trabalho, pode-se afirmar que locais de trabalho desorganizados, com intenso ritmo de trabalho, redução do número de servidores ou locais que executam procedimento de maior complexidade apresentam maior risco de acidentes de trabalho com exposição a materiais biológicos.

Quanto ao gênero de maior incidência de acidentes de trabalho, todos os autores pesquisados apontam o gênero feminino com maior número de casos de acidentes de trabalho. Segundo Silva, et al (2010, p. 617) e Gessner et al. (2013, p. 621)  isso pode ser justificado devido a prevalência do sexo feminino dentro da equipe de enfermagem.

Segundo estudo realizado por Silva, et al (2010, p. 617) afim de analisar a incidência de acidentes de trabalho com exposição a material biológico  dentro da equipe de enfermagem, evidenciou-se  uma prevalência de acidentes com objetos cortantes ou perfurocortantes, destacando-se o sangue como material orgânico mais envolvido, o que está de acordo com estudo de  Valim et al. (2014, p. 283)  onde 52,1% dos acidentes foram ocasionados por perfurocortantes. Em consonância ainda com estudo de Soares et al (2013, p. 855) onde a incidência de acidentes com agulha foi de 30,8%.

Segundo estudo de Marziale et al. (2014, p.  13) parte dos  profissionais entrevistados identificaram como causa para o acidente de trabalho com exposição a materiais biológicos a falta  de atenção de colegas, sua própria falta de atenção ou pressa e o não uso de EPIs, o que aponta para necessidade de maior conscientização para adoção de práticas que promovam a segurança no trabalho e para o reconhecimento dos riscos ocupacionais a que estão expostos.

Assim como afirmado por Julio, Filardi e Marziale (2014, p. 122) a prevenção para  estes acidentes  de trabalho diz respeito ao uso das precauções padrão, o uso de EPIs, manejo adequado dos  resíduos dos serviços de saúde, bem como vacinação pré-exposição  de todos os profissionais que trabalham em risco ocupacional.

Ainda quanto aos métodos de prevenção aos acidentes de trabalho, vale ressaltar o disposto na Norma Regulamentadora (NR) 32 com intuito de estabelecer e implementar medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores do serviço de saúde, reforçando dentre outras coisas a utilização de EPIs, a higienização das mãos, a vacinação contra a hepatite B, tétano e difteria. (SILVA, et al, 2010, p. 616)

Segundo Marziale et al. (2014, p. 11) os profissionais em risco para os acidentes de trabalho devem correlacionar a segurança no trabalho com sua própria segurança, incitando e valorizando as estratégias de prevenção, tais como ações educativas, orientações e treinamentos com ênfase ao uso adequado de EPIs, a manutenção de um ambiente de trabalho seguro,  a diminuição dos riscos a exposição com materiais biológicos e a importância da prevenção de acidentes.

A prevenção aos acidentes de trabalho se estende ainda no correto

dimensionamento da equipe de enfermam, objetivando a manutenção da qualidade de assistência sem sobrecarga de trabalho. Portanto, o quantitativo de trabalhadores deve ser compatível com o número de pacientes assistidos e com a complexidade dos cuidados prestados, o que quase sempre não é realidade dentro do exercício da profissão de enfermagem (SOARES, L.G. et al, 2013, p. 858).

No Brasil, os acidentes de trabalho com exposição a material biológico potencialmente contaminado constituem agravo de notificação compulsória.  Estudo divulgado por Valim et al. (2014, p. 283) evidenciou que  cerca  de 80%  dos profissionais enfermeiros vítimas de acidente de trabalho com exposição a material biológico realizaram a  notificação  do acidente. Ainda neste estudo as justificativas ressaltadas pela ausência de notificação foram  considerar a notificação desnecessária, não considerar  o risco dos acidentes de trabalho  sofridos, esquecimento ou estresse gerado pelo acidente e a demora nos retornos às unidades responsáveis.

Segundo pesquisa de Gessner et  al. (2013, p. 624) grande parte, cerca de 32%, das notificações de acidentes de trabalho com material  biológico  envolvem paciente-fonte com sorologia positiva. Isso pode ser evidenciado como causa para subnotificação já que o conhecimento prévio da  sorologia positiva do paciente-fonte determina maior preocupação por parte do profissional para o risco de contaminação. Consequentemente, por várias vezes apenas estes casos  são notificados e recebem a devida importância.

 

CONCLUSÃO

Diante do exposto, concluiu-se  que todos os autores concordam que os acidentes de trabalho com materiais biológicos ocorrem em maior incidência com a categoria de auxiliares de enfermagem, do sexo feminino, tendo como principal fluido potencialmente contaminado o sangue,   em  exposição percutânea principalmente durante a execução de procedimento de punção venosa e administração de medicamentos.

A incidência maior no sexo feminino se justifica devida ao maior quantitativo deste gênero dentro da equipe de enfermagem. Da mesma forma a incidência maior na categoria de auxiliares de enfermagem deve-se em grande parte ao maior contato desta categoria profissional com os pacientes bem como as atividades e procedimento invasivos realizados por estes integrantes da equipe de saúde.

Considerando as situações de risco, percebe-se como medidas de prevenção aos acidentes de trabalho com exposição a material biológico a utilização de EPIs, a organização do ambiente, a valorização de equipamentos com mecanismo de segurança, vacinação de todos  os profissionais  em risco ocupacional  e o descarte adequado dos resíduos dos serviços de saúde.

Quanto as subnotificações, percebe-se uma falta de conscientização e valorização das consequências dos acidentes envolvendo materiais biológicos.

Dessa forma os profissionais acidentados consideram em sua maioria que o acidente tem baixo risco de contaminação e portanto não atribuem o devido valor a notificação. Isto, por sua vez, impossibilita uma análise e avaliação fidedigna das ocorrências de acidentes de trabalho afim de atribuir as devidas intervenções focalizando os principais erros na prevenção de acidentes.

Diante do exposto, verifica-se a  necessidade de um trabalho mais intensivo voltado para os profissionais de saúde em situações de risco, no caso do presente estudo, para equipe de enfermagem. Tal trabalho tem por interesse promover a orientação, capacitação e treinamento,  afim de trabalhar  a prevenção aos acidentes de trabalho,  as  medidas perante o acidente, doenças infectocontagiosas possivelmente adquiridas, manutenção da  segurança do trabalhador  e valorização das notificações compulsórias.  Vale destacar a importância de um bom dimensionamento da equipe de enfermagem, afim de  que  distanciar os fatores de risco relacionados com a sobrecarga de trabalho.

 

REFERÊNCIAS

GESSNER,  Rafaela; et al.  As notificações de acidentes de trabalho com material biológico em um hospital de ensino de Curitiba/PR.  Saúde em Debate.  Rio deJaneiro, v. 37, n. 99, p. 619-27, dezembro, 2013.

 

JULIO, Renata Siqueira; FILARDI, Monique Borsato Silva; MARZIALE, Maria Helena Palucci. Acidentes de trabalho com material biológico ocorridos em municípios de Minas Gerais.  Revista Brasileira de Enfermagem, Minas Gerais, n. 67, p. 119-126, janeiro,2014.

 

MARZIALE, Maria Helena Palucci, et al. Consequências da exposição ocupacional a material biológico entre trabalhadores de um hospital Universitário. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem. São Paulo, n. 18, p. 11-16, março, 2014.

 

SILVA, Talita Rodriges da, et al. Acidente com material perfurocortante entre profissionais de enfermagem de um hospital universitário.  Revista Gaúcha de Enfermagem. Porto Alegre, v. 4, n. 31, p. 615-22, dezembro,2010.

 

SOARES, Leticia Gramazio; et al. Multicausalidade nos acidentes de trabalho da Enfermagem com  material biológico.  Revista Brasileira de Enfermagem. Paraná, v. 6, n. 66, p. 854-99, dezembro, 2013.

 

VALIM, Marília Duarte; et al. Ocorrência de acidentes de trabalho com material biológico potencialmente contaminado em enfermeiros.  Acta Paulista de Enfermagem. Ribeirão Preto, v.3, n. 27, p. 280-86, maio, 2014.

 



[1] Graduação em Enfermagem pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Pós graduação em Enfermagem em terapia Intensiva pela Faculdade de Enfermagem Luiza de Marillac. Enfermeiro Prefeitura Municipal de Sinop – Mato Grosso (MT).