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UMA REFLEXÃO SOBRE A IMPORTÂNCIA DA ALFABETIZAÇÃO NA FORMAÇÃO DO SUJEITO

Rosmarí Favaretto Walker
Belmira Batista Chaves

 

Resumo

Numa concepção contemporânea, a leitura e a escrita são vistas como meio para formação dos educandos de modo crítico, e que por sua vez lhe possibilite participar das questões sociais democraticamente. Nesse sentido, a preocupação básica deste estudo é refletir sobre a importância da alfabetização na formação do sujeito. Este artigo tem como objetivo compreender como o processo de alfabetização deve ocorrer para que o aluno se torne um sujeito crítico, reflexivo e participante na sociedade. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica considerando as contribuições de autores como SOARES (2004), FERREIRO (2001), FREIRE (1996), entre outros. Conclui-se que é extremamente importante desenvolver um processo de alfabetização que não considere a leitura e a escrita apenas como um ato mecânico, por meio de atividades que não valoriza o conhecimento de mundo que o aluno traz para a sala de aula, mas que através da alfabetização para o letramento desenvolva a criticidade do educando, possibilitando assim a sua plena participação na sociedade.

 

Palavras-chaves: Educação. Alfabetização e Letramento. Formação do indivíduo.

 

Introdução

A leitura e a escrita exercem influência para uma formação crítica do educando, além de possibilitar uma participação democrática na sociedade. Nesta perspectiva de considerar a leitura e a escrita processos essenciais na formação cidadã dos educandos, que este trabalho tem como tema: Uma reflexão sobre a importância da alfabetização na formação do sujeito.

Neste sentido, as questões que nortearam o trabalho foram:

  • Quais as consequências dos processos de alfabetização tradicionais?

  • Que metodologias o professor alfabetizador deve utilizar a fim de prevenir o insucesso escolar e priorizar a construção de conhecimentos pelo educando por meio da leitura e escrita?

O domínio da língua escrita tem estreita relação com a possibilidade plena de participação social, pois é por meio dela que o ser humano se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende seu ponto de vista, partilha ou constrói visões de mundo e produz conhecimento.

Diante disto, é importante investigar como o processo de alfabetização deve acontecer para que o aluno domine a escrita de forma que o possibilite a ser sujeito ativo na sociedade, além disso, a alfabetização é uma das etapas de maior relevância da fase de escolarização da criança, pois de acordo com Freire (1996) ela integra a dimensão democratizadora da função da escola, sendo também uma questão básica na discussão sobre o processo educacional.

A problemática que envolve esse estudo está em torno de que atualmente nos deparamos com um quadro de fracasso escolar dos alunos nos requisitos leitura e escrita, em que, muitas vezes, a criança ‘copia’, mas não lê e quando lê não consegue interpretar.

O que se percebe em algumas escolas são processos de alfabetização centrados ainda apenas na codificação e decodificação da língua escrita, sem considerar a realidade e o conhecimento de mundo do aluno. Freire e Macedo (1992, p. 92), afirmam que: “alfabetização não pode ser encarada simplesmente como o desenvolvimento de habilidades que vise à aquisição da língua padrão dominante”. Os autores nos trazem uma importante afirmação acerca dos processos tradicionais de alfabetização, cujo objetivo principal é dar entrada da criança no mundo da leitura e escrita sem que haja uma construção de conhecimento em torno dessa aprendizagem que seja significativa para o educando.

Neste contexto, o objetivo deste estudo é, pois, compreender como o processo de alfabetização deve ser desenvolvido de forma a promover a formação de sujeitos críticos, reflexivos e participante na sociedade.

Para alcançar os objetivos propostos, utilizou-se como metodologia, a pesquisa bibliográfica, realizada a partir da análise de materiais já publicados.

O trabalho foi fundamentado a luz de teóricos como Emília Ferreiro, Magda Soares, Ana Teberosky, Paulo Freire, entre outros autores que discorrem sobre o tema alfabetização.

 

Desenvolvimento

 

No dicionário Básico da Língua Portuguesa Aurélio (1998, p.29) a palavra Alfabetização se “caracteriza pela ação de alfabetizar, de propagar o ensino da leitura”; alfabetizar significa “ensinar a ler, dar instrução primária”, ou seja, a ação de apropriação do código da língua oral e escrita.

Soares conceitua (2004, p. 15): “[...] Etimologicamente, o termo de alfabetização não ultrapassa o significado de levar a aquisição do alfabeto, ou seja, ensinar o código da língua escrita, ensinar habilidades de ler e escrever”.

De acordo com as autoras citadas, compreende-se que a alfabetização se caracteriza pelo domínio de leitura e escrita, a aprendizagem inicial “do aprender a ler e escrever”. Este processo de aquisição de habilidades de leitura e escrita constitui uma das fases mais importante para o desenvolvimento do educando, pois é o alicerce para as séries vindouras.

Emília Ferreiro (2001) discorre sobre a relevância da alfabetização como a maneira eficaz de se prevenir medidas alternativas para problemas como fracasso e evasão escolar, os quais resultam em jovens e adultos analfabetos funcionais, ou seja, o indivíduo domina o código da escrita, porém seu conhecimento não lhe permite participar ativamente das mudanças e evoluções tecnológicas da sociedade.

De acordo com a autora, o fracasso, a evasão escolar, o analfabetismo funcional são resultados de práticas alfabetizadoras sistematizadas sob uma perspectiva mecânica da utilização do código da leitura e escrita. Entretanto é necessário esclarecer que a ação de alfabetizar em sua concepção semântica é compreendida pelo domínio deste código, porém sua prática requer relacioná-la a significados sociais e culturais.

Neste sentido, Soares afirma (2004, p.16): “Sem dúvida a alfabetização é um processo de representação de fonemas e grafemas, e vice-versa, mas também é um processo de compreensão/expressão de significados por meio do código escrito”. Portanto, ser alfabetizado é reconhecer e compreender as ações de leitura e escrita, interpretando seu significado. Esta relação entre alfabetização e sua utilização com o meio social promove o conceito de alfabetização para letramento ou alfabetismo, ou seja, a ação de aquisição do código como instrumento para a interação do sujeito com a sociedade.

Soares (2003) esclarece que letramento é a apropriação social da escrita, é utilizar o conhecimento do código para compreender as práticas sociais do meio. Em suma, compreendem-se ações específicas de letramento: interpretar textos e livros de quaisquer gêneros; analisar criticamente propagandas veiculadas pelos meios de Comunicação; discorrer sobre um tema tratado; redigir textos, termos e comunicados; entre outros.

De acordo com Soares (2003, p.39): “letramento é o resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e escrita [...]”. Para tanto letramento não se trata de um método que se ensina a ler e escrever, e sim se ensina a utilizar a leitura e a escrita como instrumento social.

Soares ainda (2004) afirma que letramento e alfabetização não se podem dissociar-se, pois a criança entra no mundo letrado simultaneamente por esses dois processos, pois, a alfabetização se desenvolve por meio das atividades de letramento, ou seja, através de práticas sociais da leitura e da escrita que só podem se desenvolver por meio da alfabetização.

Conforme Mortatti (2000) o método tradicional de alfabetização ocupava-se do ensino inicial da leitura e da escrita, objetivando o domínio do código em um esforço mecânico da codificação e decodificação, com ênfase na memorização de letras e sons correspondentes, sem que houvesse de fato uma aprendizagem significativa para o aluno.

Essas práticas convencionais não buscam estabelecer uma relação de comunicação entre texto e o leitor, se trata de leituras fora de contexto que se orientam somente em “reproduzir sons e copiar as letras”, sem que haja construção de significados. Ferreiro (1995, p.34), enfatiza tais métodos:

Nesses manuais apresentam-se orações estereotipadas, impossíveis de encontrar textos com função comunicativa, informativa ou puramente estética: ‘Minha mamãe me ama’, ‘O boi baba’, ‘O dedo de Dudu dói’, são pseudo-enunciados que só existem nos manuais escolares, que não comunicam nada, que não informam acerca de nada, que as crianças devem aceitar sem perguntar’ que quer dizer’.

Apesar de inúmeras pesquisas realizadas sobre a questão e diversos métodos que orientam o desenvolvimento de atividades que envolvam temas e textos informativos, que produzam significados para os alunos, ainda hoje podemos encontrar práticas alfabetizadoras limitadas a cartilhas e manuais com ênfase copista que não apresenta nenhum sentido para o aluno, não contribuindo assim para a formação da criticidade do educando.

Ferreiro e Teberosky (1999) relatam que o ensino fundamentado em métodos tradicionais torna-se muito distante da realidade do educando, pois se trabalha apenas com a decodificação e memorização de letras, e para a criança não é nada atraente passar quatro horas de seu dia decorando. Primeiramente, ensina-se a partir de letras para formar sílabas, ficando para mais tarde a formação de palavras com o intuito apenas de fixar as letras estudadas.

Segundo Soares (2003), no Brasil as práticas educativas sofreram mudanças significativas a partir dos anos 80, pesquisas buscavam novas concepções de alfabetização baseados na necessidade de desenvolver habilidades de leitura e escrita, no intuito de prevenir ou amenizar os efeitos do analfabetismo funcional. As discussões levantadas partiam do pressuposto que inovações pedagógicas na alfabetização inicial seriam imprescindíveis para se evitar futuros fracassos escolares, realidade da educação brasileira que motivou transformações educacionais.

Neste sentido, surge o letramento, cuja proposta é relacionar o código de leitura e escritas às práticas sociais. Letramento, conforme nos elucida Soares (2003) consiste no uso contínuo da leitura e escrita nas diversas situações do sujeito na sociedade, sendo trabalhado como um conceito social.

Esta nova concepção de alfabetização tem como objetivo propor práticas em que o exercício mecânico seja substituído por uma aprendizagem concreta e relevante para o educando possibilitando a ele construir seus conhecimentos por meio de uma alfabetização que possa ser utilizada e vivenciada em seu cotidiano.

O processo de alfabetização com letramento busca desenvolver trabalhos que estimule desde a alfabetização inicial uma leitura interpretativa das atividades que lhe são postas. As atividades devem proporcionar aos alunos estabelecer a relação entre estas e seu contexto social.

Soares (2004) aprofunda o tema esclarecendo que uma alfabetização contextualizada e valorizada como prática social se torna um instrumento para o exercício da cidadania, visto que por meio a leitura escrita o cidadão adquire conhecimento de mundo.

Assim numa alfabetização para letramento o ensino do código da escrita se fundamenta em contextos significativos para a criança colocando-as em contato com vários tipos de textos, Ex.: outdoors, placas, anúncios, embalagens facilitando assim a aprendizagem e não em situações onde o ensino do código é de forma isolada e descontextualizada, pois assim a criança não vai compreender o significado da escrita. A função da escola é possibilitar ao aluno a continuidade da leitura de mundo que eles já possuem, pois, a criança traz para a escola um universo individual que deve ser estimulado e aproveitado pelo professor para introduzir a leitura da palavra escrita.

Com base nos conceitos de alfabetizar e letrar, compreendemos serem processos que requerem um trabalho conjunto, visto que são complementares entre si. A ação de alfabetizar se caracteriza pela apropriação do código da leitura e escrita, enquanto o letramento se ocupa de utilizar essa apropriação como instrumento para estabelecer relações na sociedade.

Por meio do processo de alfabetização com letramento é possível desenvolver trabalhos que possibilitem o exercício de interpretação de diversos gêneros textuais, tais como: livro de histórias, jornais, telejornais, entre outros.

O alfabetizador deve compreender o mundo em que vive seus alunos, a linguagem que usam e como interpretam a sua realidade, pois em momento algum deve desconsiderar seus saberes, embora não escolarizados. O papel do professor é de mediar-lhes a construir seus conhecimentos de acordo com o mundo em que vivem e assim relacioná-lo com o restante do mundo de modo crítico e realista. Isso se chama leitura de mundo, que vem antes da leitura da palavra.

É necessário um trabalho que relacione temas do cotidiano aos conteúdos escolares, pois assim o aluno terá mais facilidade para compreender, argumentar, questionar, facilitando assim o processo de ensino aprendizagem. Assim o professor estará promovendo a alfabetização para letramento, estimulando a criticidade, a construção de uma aprendizagem significativa, ou seja, contribuindo para a formação de um sujeito participativo na sociedade.

Num processo dinâmico, os Parâmetros Curriculares Nacionais na modalidade Língua Portuguesa (2001) colocam a questão do ler e do escrever em estreita relação com a participação social, pois é por meio dela que o cidadão se torna capaz de agir, ter acesso a todas as informações e acima de tudo, saber fazer uso social da linguagem. Nessa perspectiva, o sistema educacional deve colocar em prática a concepção de que o aluno é o sujeito da ação de aprender, cabe a ela possibilitar que o educando tenha acesso a vários textos que circulam socialmente, ensinando-os refletir criticamente, respondendo as exigências da prática cotidiana. Desta forma, o PCN de Língua Portuguesa (2001, p. 30) afirma que:

Toda educação verdadeiramente comprometida com o exercício da cidadania precisa criar condições para o desenvolvimento da capacidade de uso eficaz da linguagem que satisfaça necessidades pessoais -que podem estar relacionadas às ações efetivas do cotidiano, à transmissão e busca de informação, ao exercício da reflexão.

Deste modo educacional precisa propiciar condições para o desenvolvimento da capacidade de uso satisfatório da linguagem, a fim de atender as necessidades pessoais do educando. Nessa perspectiva, visando uma educação comprometida com a formação cidadã, cabe a escola viabilizar o acesso do aluno à infinidade de textos que circulam socialmente, ensinando a produzir e a interpretá-los, para que os alunos sejam capazes de compreender os conceitos, apresentar novas informações, comparar diferentes pontos de vista ou argumentar a favor ou contra uma determinada hipótese.

Portanto o processo de alfabetização deve propiciar uma aprendizagem reflexiva, voltada para um estudo atraente e que seja importante na vida de seus educandos.

 

Conclusão

 

Por meio desta pesquisa que objetivou compreender como o processo de alfabetização deve ser desenvolvido de forma a promover a formação de sujeitos críticos, reflexivos e participante na sociedade, podemos concluir a relevância de se alfabetizar letrando.

Alfabetizar letrando significa então, desenvolver um processo de alfabetização que relacione atividades do cotidiano da criança na aprendizagem, possibilitando assim a construção de aprendizagens significativas, relacionando os conteúdos escolares às vivências sociais dos educandos.

Através das discussões teóricas, concluímos que uma alfabetização centrada na codificação e decodificação da língua escrita dificulta o acesso dos alunos a interação e participação das questões de seu contexto social de forma autônoma e democrática.

Percebe-se então, os benefícios de incluir as práticas de letramento aos métodos alfabetizadores, visto que os alunos vivenciam com maior facilidade a leitura e a escrita durante as atividades, e já compreendem a importância alfabetizado para a sociedade.

O sujeito alfabetizado para as práticas sociais além de ter seu desempenho escolar melhorado, também se sobressai na sociedade onde exerce suas funções como cidadão, interpretando o mundo, segundo as palavras de Paulo Freire (1996), percebendo sua participação na sociedade como sujeito transformador.

Enfim, numa sociedade influenciada pelas tecnologias da informação, a leitura e a escrita são objetos de inserção e participação das questões sociais, no entanto, para possibilitar que o educando seja um sujeito ativo na sociedade, a escola deve oportunizar desde o início da escolarização, que o aluno construa seu conhecimento num processo de alfabetização que considere suas vivências, que relacione os conteúdos a sua realidade, que desenvolva suas capacidades de argumenta, questionar, refletir, ou seja, promover a formação de um cidadão crítico e participante na sociedade.

 

Referências

 

Brasil. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curricular. Nacionais Brasília:2001.

 

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.

 

FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 1995.

 

FERREIRO, Emília e TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre Artmed,1999.

 

FERREIRO, Emília, Reflexões sobre a alfabetização. São Paulo: Cortez,2001.

 

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: sabres necessários à prática educativa. 25 ed. São Paulo; Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura).

FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura de mundo leitura de palavra. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1990.

 

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica,2003.

 

_______________. Alfabetização e letramento. 2.ed. São Paulo: Contexto,2004.

 

MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Os sentidos da alfabetização. São Paulo: Unesp, 2.000.