PROFESSORA DE BEBÊS: ENTRE O PROFISSIONAL E O DOMÉSTICO
Kellen Simonini Molina[1]
Roseli de Souza[2]
Joice Aparecida dos Santos Rocha[3]
Raquel Camargo da Silva[4]
Raquel Machado Santana[5]
RESUMO
A presente pesquisa tem por objetivo principal angariar conhecimento relativo aos profissionais atuantes na etapa de Educação Infantil por meio do entendimento acerca do perfil observado nos docentes do CMEI “Carmen Vieira Dias” da cidade de Diamantino, Mato Grosso. Buscou-se ainda entendimento relativo à forma que tais profissionais veem o fato de serem professores de bebês. O embasamento teórico utilizado para nortear este trabalho foram os trabalhos de autores como MOSCOVICI (2003), JODELET (2001), MORENTTINI (2000), CERISARA (2002), HADDAD (2002/2009) entre outros. Durante este estudo, foi analisada a rotina na Creche I Integral, a pesquisa foi de observação, foram 150 dias de observação.
PALAVRAS-CHAVE: Representações Sociais; Professora de Bebês; Educação Infantil.
INTRODUÇÃO
Pode ser observado que, durante nossa história, as instituições de educação voltadas às crianças até a idade pré-escolar atuavam, na maioria das vezes, de forma dicotômica, ainda que as funções exercidas nestes ambientes sempre estivessem entorno do cuidar e educar.
Neste sentido, Cerisara (1999) explica que esta dicotomia se fundamenta, até certo ponto, em um modelo de atenção hospitalar-familiar e, de forma complementar no modelo escolar praticado no Ensino Fundamental I.
Contudo, frente a estas duas origens, é possível perceber que as atividades mais ligadas à saúde, como cuidados de higiene, alimentação e sono, acabaram desvalorizadas em detrimento das atividades pedagógicas.
Deste modo, as atividades do ensino são consideradas, em boa parte dos casos, como o foco da educação da criança, ficando a parte do cuidado em segundo plano.
Contudo, é preciso destacar que essas duas partes de um mesmo processo, educação e cuidado, devem ser observadas com a mesma atenção e valorização, tanto pela equipe da instituição escolar, quanto pelas famílias das crianças. O fato de ambas as instituições desempenharem funções parecidas, causa uma falta de clareza no tocante às responsabilidades de cada uma.
Assim, fica evidente que as práticas nas instituições de Educação Infantil podem gerar eventuais conflitos de identidade para a instituição, por estarem entre o domínio público e o domínio doméstico, sendo a partir de tais conceitos que se definem as funções educativas e de cuidado. (Cerisara, 2002).
O presente trabalho objetiva o estudo de questões sociais e pessoais apresentadas pelas professoras e as TDIs que fazem parte do CMEI “Carmen Vieira Dias” com relação à sua atuação enquanto professoras de crianças da Educação Infantil, ou seja, bebês. O embasamento teórico utilizado para nortear este trabalho foram os trabalhos de autores como MOSCOVICI (2003), JODELET (2001), MORENTTINI (2000), CERISARA (2002), HADDAD (2002/2009) entre outros. Assim esta pesquisa constituiu-se a partir do embasamento bibliográfico e de observações diárias durante 180 dias letivos.
Os resultados apresentados neste artigo podem fomentar as discussões sobre a formação docente para a Educação Infantil, a relação teoria/prática, bem como refletir sobre a reformulação de currículos dos cursos de Pedagogia, a fim de contemplar a especificidade do atendimento às crianças menores de três anos.
ATUAÇÃO PROFISSIONAL ENQUANTO DOCENTE DE BEBÊS: QUESTÕES DE ESTRANHAMENTO, FOCOS DO TRABALHO EM SALA E AS QUESTÕES RELATIVAS À IDENTIFICAÇÃO E IDENTIDADE PESSOAL, PROFISSIONAL E SOCIAL
Destaca-se, primeiramente, que este trabalho foi fundamentado na “Teoria das Representações Sociais” (TRS) em conjunto com teorias relativas à Educação Infantil, propondo importante reflexão relativa à formação básica dos professores atuantes nesta área.
Haddad, 2000) afirma que, por muito tempo em nossa história educativa, o trabalho do professor no berçário esteve associado à função de substituição à figura materna. Aponta-se que tal fato se deve à tentativa do docente em suprir a falta da família naquele momento, fomentando uma relação próxima à da mãe com seu filho.
Atualmente, após grandes reflexões e debates relativos ao papel exercido pela Educação Infantil e o trabalho docente com bebês, percebeu-se claramente que o papel exercido pela mãe e por uma educadora são bem definidos e distintos. Contudo, ainda se pode perceber algum estranhamento por parte das professoras iniciantes (ou futuras professoras) quando se trata da Educação Infantil e principalmente do termo “professora de bebês”. Tal fato justifica-se pela questão maternal envolvida quando se fala no cuidado de bebês.
Cerisara (2002, p. 63-64), ao discutir essa questão, explicita que [...] “as professoras que passaram por uma formação específica para poder assumir uma vida profissional no universo público, têm suas expectativas tanto mais abaladas quanto mais constatam que desenvolvem um trabalho que se opõe ao que se convencionou chamar de profissional” [...]. Para a autora, no âmbito do senso comum, quanto menor a criança, maior a atividade direta e a proximidade com seu corpo, menor a valorização da professora. No contexto da Educação Infantil tal desvalorização se operacionaliza na dicotomia entre o cuidar e o educar, sendo o primeiro associado às condutas maternais assumidas por monitoras e, o segundo, relacionado a práticas escolarizantes organizadas pela professora.
Cerisara (2000) desta que existe grande diferença entre as atividades executadas pelo docente da Educação Infantil se comparadas às do professor do Ensino Fundamental I, por exemplo, tendo em vista as necessidades apresentadas pelas crianças de 0 a 5 anos de idade que aproximam o papel da professora ao papel exercido pela mãe, fato que determina uma dificuldade, em parte dos casos, de se distinguir o que é uma função profissional e o que já é uma função familiar.
De modo geral, a literatura tem anunciado que a história das profissionais da Educação Infantil tem circulado pelo universo doméstico e profissional. Morenttini (2000) reportando-se a Pereira (1996) afirma que a profissão do magistério tem a função de acomodar esses dois padrões. Historicamente essa acomodação tem como referência a distribuição das atividades por sexo nas sociedades ocidentais, que obedecia a um processo de diferenciação em que a mulher deveria exercer funções domésticas não remuneradas que compreendiam as tarefas do lar e os cuidados com as crianças, e aos homens eram reservadas as atividades profissionais. Esses dois espaços de trabalho privado (mulheres) e público (homens) revelam a dominação masculina, Bourdieu (1999).
Sobre este assunto é válido análise das reflexões de Bourdieu (1999, p. 17-18) sobre a divisão entre os sexos:
A divisão entre os sexos parece estar na ordem das coisas‖ [...] a ordem social funciona como uma imensa máquina simbólica que tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça: é a divisão social do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a cada um dos sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos; é a estrutura do espaço, opondo o lugar de assembleia ou mercado, reservado aos homens, e a casa, reservada às mulheres; ou no interior desta, entre a parte masculina, com o salão, e a parte feminina com o estábulo, a água e os vegetais [...]
A divisão foi socialmente construída entre os sexos, tanto o espaço privado quanto o público, tidos como naturais, vão interferir no processo de constituição da representação da mulher, uma vez que a imagem feminina ao longo dos tempos foi associada à submissão, docilidade. Deste modo, levando-se em conta os padrões historicamente construídos em torno dos papéis sexuais e seus reflexos no trabalho feminino, pode-se considerar que, em muitos casos, ser professora da Educação Infantil não foi uma escolha; uma vez as mulheres eram tidas como dóceis, tinham mais jeito para desempenhar essa função que os homens. O universo doméstico acaba influenciando de maneira significativa no perfil que se espera para o profissional a exercer esta função, onde a questão emocional se mostra fortemente presente. Neste sentido, Louro (1997) destaca a afetividade maternal como componente desse perfil pedagógico geralmente adotado.
Afirmavam que as mulheres tinham, por natureza, uma inclinação para o trato com as crianças, que elas eram as primeiras e naturais educadoras, portanto, nada mais adequado do que lhes confiar a educação escolar dos pequenos. Se o destino primordial da mulher era a maternidade, bastaria pensar que o magistério representava de certa forma, a extensão da maternidade, cada aluno ou aluna vistos como um filho ou uma filha espiritual [...]
De acordo com a autora, nesta perspectiva, a formação profissional não seria necessária para ser professora, uma vez que a docência seria uma extensão do trabalho doméstico. Sendo assim, pode-se identificar que a história das educadoras infantis é marcada por representações sociais que enfatizam com maior densidade funções vinculadas ao doméstico, à maternidade tendo especial destaque as práticas de cuidado e guarda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da presente pesquisa, ficou primeiramente evidenciada a grande problemática envolvendo a separação do que é profissional e o que é pessoal (e familiar) no trabalho pedagógico com as crianças da Educação Infantil, sobretudo os mais novos.
Neste sentido, percebeu-se que, mesmo que os papeis exercidos pela mãe e pela professora do bebê sejam distintos e delimitados, sempre houve e, ainda há, em grande parte dos casos, um problema em separar o que é de fato profissional nesta questão.
Contudo, nota-se que as especificidades das necessidades apresentadas pelas crianças da Educação Infantil confundem a função da professora com a função materna. De modo que a afetividade e a maternalidade são traços fortemente presentes na maioria das professoras atuantes nesta etapa do ensino.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ANDRADE, Daniela Barros Silva Freire. Criança nas entrelinhas dos discursos de acadêmicos brasileiros sobre professor da educação infantil.Revista. Educação. Pública, Cuiabá v. 22 n. 49/1 p. 361-377, maio/ago. 2013.
ALVES, I.L. Bebês, por entre vivências, afordâncias e territorialidades infantis: de como o berçário se transforma em lugar. 2013. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2013.
ANDRÉ, Marli; HOBOLD, Márcia de Souza. A profissão docente nas representações de estudantes de licenciatura. In: SOUSA, C. P.; PARDAL, L. A.; BÔAS, L. P. S. V. (Org.) Representações Sociais sobre o Trabalho Docente. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2009.
ASSIS, Mauriane Sirlene de. Práticas de cuidado e educação na Instituição de Educação Infantil o olhar da s professoras. In ANGOTTI, Maristela (org). Educação Infantil: para que, para quem e por quê? Campinas, SP: editora Alínea, 2008.
BOURDIEU, Pierre. A dominação Masculina. Pierre Bourdieu; tradução Maria Helena Kuhner. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1999.
CAMPOS, P.H. F.As representações sociais como forma de resistência ao conhecimento científico. In: OLIVEIRA, D. C.; CAMPOS, P.H. F. Representações sociais uma teoria sem fronteiras. Rio de Janeiro: Museu da república.
CERISARA, A. B. Professoras de Educação Infantil: entre o feminino e o profissional. São Paulo: Cortez 2002.
DE LAUWE, M. J. C. Um outro mundo: a infância. Tradução de Noemi Kon. São Paulo: Perspectiva, Editora da Universidade de São Paulo, 1991.
DESCHAMPS, Jean-Claude. A identidade em psicologia social: dos processos identitários às representações sociais / Jean-Claude, Pascal Moliner; tradução de Lúcia M. Endlich Orth – Petrópolis: RJ, Vozes, 2009.
GILLY, M. As representações sociais no campo da educação. In: JODELET, D. (Org.). As Representações Sociais. Tradução de Lilian Ulup. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p.321-341.
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