O único veículo!

Estávamos reunidos aqui no instituto quando a profª. Luzinete (diretora do ISCI) fez uma observação bastante reflexiva: – O único veículo capaz de trazer um ser humano ao mundo é o ventre de uma mãe!

Acabamos debatendo sobre dois sentidos bem distintos de ser mãe: 1- o sentido biológico, gerou um filho, logo é mãe; 2- acolheu, criou, educou, logo, é mãe.

Essas duas personagem, indispensáveis para a manutenção da humanidade,  na maioria das vezes são assumidas pela mesma pessoa, mas em muitos casão são pessoas distintas.

Nossos parabéns à todas as mães! Ás mães que tiveram a oportunidade e o amor necessários para assumirem esses dois papéis; às mães que tiveram a determinação de assumir apenas o segundo papel e também àquelas que, tendo cumprido o papel biológico, não querendo ou não sendo capazes de criar, consciente ou inconscientemente, permitiram que outra pessoa o fizesse. 

Na sequência deste post, colocamos um texto (também nosso) abordando a questão do aborto e do direito da mulher em decidir sobre o que deve ou não acontecer com seu corpo.  Clique ⇊ Vale a pena ler o resto! 


O corpo é meu!

Vamos supor que eu tenha um carro. Eu comprei, paguei por ele com o meu dinheiro e transferi para meu nome. Este carro é meu e está pago, logo eu posso fazer o que quiser com ele. Eu posso mudar de cor, trocar os estofamentos, tirar o banco de traz e colocar caixas de som no lugar. Posso até pegar um machado e quebrar todos os vidros dele, quebrar também os faróis, drenar o óleo do motor e deixar funcionando até travar completamente. Jogá-lo de uma ribanceira ou atear fogo nele. Eu posso fazer tudo isso se eu quiser e não existe uma lei que possa me punir por isso, a menos que eu tenha colocado outras pessoas em risco por isso. Eu não posso andar na rua com o carro em más condições, mas posso fazer o que eu quiser com ele e você que está lendo este texto agora não poderá fazer nada contra mim (ao menos legalmente). Pode até me taxar de louco, mas vai ficar só nisso.
Agora, vamos imaginar uma situação hipotética:
– Eu não quebrei o meu carro, ele está perfeito. Então eu resolvo ir ao clube no domingo e você também está indo pra lá. Então eu permito que você entre no meu carro e vá comigo. Sim, eu permito, visto que nesta hipótese ninguém me forçou a aceitar você dentro do meu carro e eu tenho à disposição inúmeros recursos que poderiam evitar que você ou qualquer outra pessoa entrasse no meu carro.
Pois bem, estamos nós (felizes ou não) a caminho do clube. Porém, no meio do trajeto eu percebo que você me atrapalha. Sim, sua presença me incomoda e além do mais eu quero chegar no clube sozinho e não com alguém inconveniente como você do meu lado. E se eu tiver que cuidar de você no clube? Nem pensar! Sou novo demais pra isso e você atrapalharia totalmente meus planos e minha vida.
Então eu posso parar no acostamento e pedir a você que desça e chame um táxi, um uber, ou faça seja lá o que queira fazer. Pronto, você segue seu rumo e eu sigo o meu!
Seria bem fácil se fosse assim.
Mas não é!
Nós estamos atravessando um túnel. Sim, havia um longo túnel no trajeto até o clube e agora estamos dentro dele. O trânsito é intenso, não tem acostamento e, como você já deve estar imaginando, não há como parar e muito menos voltar ao ponto de partida. Então a única opção é atravessar todo o túnel com o inconveniente de sua presença dentro do meu carro e, só do outro lado, parar no acostamento e deixar você em um local onde alguém possa ficar com pena e te dar uma carona.
Já que estamos neste ponto, gostaria de lembrar que somos humanos, sentimos emoções e muitas vezes elas se desordenam a tal ponto que nossos horizontes vão se fechando até restarem poucas (ou pouquíssimas opções).
Sim, o túnel é bem longo e os sentimentos travam grande batalha em minha mente. Sua presença me incomoda e o simples fato de eu lembrar que você está dentro do meu carro já torna minha vida um inferno. Você começa a perceber que a situação está ficando tensa e vasculha a memória recente em busca de algo que tenha feito para me deixar irritado e nada. Você então, se lembra de que eu não lancei mão de nenhum recurso que te impedisse de entrar em meu carro e agora percebe que minha ira cresce de forma desordenada.
Neste momento eu cheguei ao meu limite e tento te empurrar do banco do carona para que se estatele em meio aos veículos que vêm atrás, mas sozinho eu não consigo e você já não sabe o que vai acontecer e nem tampouco por quanto tempo ainda estará vido.
Em meio a todo esse desespero percebe-se que um outro veículo alcança o meu passando a andar ao lado, tão encostado que basta eu abrir o vidro para que o outro condutor possa tocar em você. Nem um de nós sabe quem é essa pessoa, de onde veio ou pra onde ela vai. Mas sabemos que ele pode me ajudar.
Você agora está desesperado e sabe que o fim chegou, mas não há nada a se fazer, não há pra onde fugir. Nesse momento o condutor desse outro veículo mostra-me ferramentas com as quais ele poderá remover você do meu carro. Não me interesso pelos detalhes, só quero que faça!
Ele passa o presso! Eu passo o dinheiro!
É desesperador! É horrível. Eu acabei de tirar uma vida humana. Uma vida que eu mesmo deixei que entrasse no meu carro!
O interior do veículo está todo ensanguentado agora e até pequenos pedaços seus ainda estão ali para apodrecerem sozinhos, já que não houveram tempo e vontade de fazer um trabalho melhor.
Eu tinha urgência e ninguém deveria saber!
Mas eu me consolo! Eu nem te conhecia ainda. Não sabia quem era você, ou quem seria um dia. E o sangue do interior do carro vai secando com o tempo. Daqui há pouco nem dá mais pra perceber.
O importante é que o carro é meu e estou sozinho novamente. Estou livre!
E caso você tenha achado essa hipótese estranha, lembre-se: nessa situação hipotética o carra é meu!
– Meu carro, minhas regras!
Obs.: Estamos fazendo uma analogia com os casos de aborto em que o casal não lançou mão de métodos contraceptivos, mesmo existindo uma infinidade de opções à disposição atualmente. Na maioria das vezes, uma gravidez indesejada por meio de sexo consentido tem origem na falta de cuidado, seja por falta de informação, de responsabilidade ou algum outro motivo. Ficando assim a questão: se o carro é meu e a partir da adoção de medidas simples eu posso impedir que um passageiro indesejado entre nele, qual solução você me indicaria? Devo tomar os devidos cuidados? Ou quando entrar alguém eu mando matar e jogar para fora?
Outro ponto importante é o fato de o governo poder reduzir o número de abortos em nosso país através de investimentos mais intensos em campanhas de conscientização e no oferecimento de métodos contraceptivos de forma mais intensa às pessoas de baixa renda.
Nós do Instituto Saber defendemos o direito da mulher decidir por seu corpo e sua vida. Descordamos apenas do direito (ainda discutido em esferas políticas e populares) de deixar que uma vida surja para depois extingui-la, haja vista a existência de inúmeras opções contraceptivas atualmente.

Por Lúcio Mussi J.
Professor, Escritor e Psicanalista.